Mino Carta e a crônica do país que a elite não deixa ser o Paraíso

O povo brasileiro, de uns tempos para cá, vivendo em – formalmente – uma democracia, começou a ficar como cantava o Chico Buarque em seu quase hino anti-ditadura, o “Apesar de Você”: “A minha gente hoje anda/falando de lado/ e olhando pro chão”.

Quem sabe o sacolejo deste esdrúxulo pedido de impeachment nos provoque uma reação – e sem reação ele prosperará  – e tenhamos, outra vez, um governo que possa parar de falar de lado e olhar pro chão, despertando no povo brasileiro aquilo sem o que povo algum chegou a ser desenvolvido e feliz: consciência de um destino próprio e de identidade e objetivos comuns.

Tempos de chantagem

Mino Carta, na CartaCapital

Em qual país dito democrático o destino do governo e do seu partido fica sujeito à chantagem do presidente da Câmara dos Deputados, disposto a vender caro a sua pele de infrator?

Somos espectadores de um enredo assustador, a negar a democracia que acreditamos viver, mas nem todos entendem que o espetáculo é trágico.

O PT nega-se a uma capitulação ignominiosa e preserva o que lhe resta de dignidade, logo Eduardo Cunha parte para a vingança. Também o gesto do presidente da Câmara é tipicamente brasileiro, ao exprimir a situação de um país que há tempo perdeu o senso e a compostura.

Se já a teve, a capacidade de entender a gravidade do momento político, sem contar o aspecto pueril e os complicadores econômicos e sociais.

Até ontem, o governo jogou contra si mesmo, ao ensaiar a rendição à chantagem: desenhou-se nas últimas semanas a tendência a instruir os integrantes petistas da Comissão a votarem a favor de Cunha, donde a pergunta inevitável do cidadão atento aos seus botões: quer dizer que todos os envolvidos têm telhado de vidro?

Ora, ora. Impeachment era, e continua a ser, golpe. Quanto a Cunha, suas mazelas são mais que evidentes. Então, por que o governo cederia à chantagem? Quem se deixa acuar está perdido.

Tempo de chantagem, a delação premiada resulta dela também, a partir de prisões preventivas que põem em xeque a presunção da inocência, o indispensável in dubio pro reo. Esta é a democracia à brasileira, diariamente chantageada pela mídia nativa. Segundo uma pesquisa Datafolha, a maioria dos entrevistados enxerga na corrupção o calcanhar de aquiles do País.

Não procuro saber das técnicas empregadas para chegar a esse resultado, de todo modo é certo que a corrupção não passa de uma consequência de 500 anos de desmandos na terra da predação. O poder verde-amarelo muda seu endereço, mas não altera propósitos e comportamentos. É sempre o mesmo, desde as capitanias hereditárias. Feroz, hipócrita, velhaco. E impune.

De pé, ainda e sempre, a casa-grande e a senzala, e também sobrados e mocambos. Gilberto Freyre referia-se ao Nordeste, mas a dicotomia se impõe até hoje do Oiapoque ao Chuí, e é mesmo possível que agora, nas terras do historiador pernambucano, seja menos acintosa do que em outros cantos.

Permanece, em pleno vigor, a lei do mais forte, e desta brotam os nossos males, a começar pela desigualdade, pelo assassínio anual de mais de 60 mil brasileiros, pelo caos urbano. E assim por diante. Supor que a situação atual tem alguns responsáveis, identificados pela Lava Jato, não esclarece a real dimensão do problema.

Responsável é quem usa o poder em proveito próprio. Colonizadores, escravagistas, bandeirantes, capitães do mato, os senhores do império, os militares golpistas que proclamaram a República etc. etc.

O golpe de 64 foi precipitado para evitar uma mudança apenas vagamente esboçada graças à convocação dos gendarmes fardados, coroada a operação 20 anos após, paradoxalmente, pelo enterro da campanha das Diretas Já.

A chamada redemocratização foi uma farsa, com a contribuição dos fados que levaram à Presidência Sarney, principal artífice da derrota da Emenda Dante de Oliveira, a favor das diretas, e vencedor da batalha da indireta à sombra de uma Aliança pretensa e hipocritamente apresentada como Democrática.

A casa-grande e sua mídia elegeram Fernando Collor, para apeá-lo quando passou a cobrar pedágio alto demais, e Fernando Henrique, que “não é tão esquerdista assim”, como dizia Antonio Carlos Magalhães.

O governo tucano em oito anos cometeu as maiores infâmias contra os interesses nacionais, esvaziou as burras do Estado, organizou com as privatizações a maior bandalheira da história brasileira, comprou votos a fim de reeleger FHC, para não mencionar as aventuras do filho do então presidente, grandiosas e silenciadas. Quem pode, pode.

Lula, Dilma e o PT são intrusos nesta pantomima e esta presença, usurpada na visão dos antecessores no poder, explica por que hoje são visados como únicos réus. A eleição do ex-metalúrgico em 2002 ofereceu uma esperança de renovação, e assim pareceu divisor de águas no rumo do progresso. No poder o PT portou-se como os demais partidos (partidos?) e os bons augúrios minguaram progressivamente. É bom, para a dignidade do governo e do seu partido que enfim não capitulem diante da chantagem de Eduardo Cunha.

Seria o suicídio. Infelizmente, há muitos outros erros morais e funcionais, falhas, deslizes, e até tramoias, trambiques, falcatruas, a serem remidos, e não é fácil imaginar que o serão.

Às vezes me colhe a sensação de que atravessamos a fase final do longo processo da decadência crescente e inexorável de um país destinado a ser o paraíso terrestre e condenado ao inferno por sua elite, voltada a cuidar exclusivamente dos seus interesses em detrimento da Nação.

E de administrá-los contra a lei, se necessário. Na circunstância, cheia de riscos e incógnitas, a saída pela Justiça soa como o recurso natural. Não seria o STF o guardião da Constituição ofendida, o último defensor do Estado de Direito?

Os botões me puxam pelo paletó: que esperar desta Justiça desvendada, embora tão verborrágica, empolada, falsamente solene?

Fernando Brito:

View Comments (19)

  • A acusação contra Dilma são as pedaladas as mesmas que o Temer cometeu então por que o PT não entra com processo de impedimento contra ele para se precaver de uma facada nas costas ou seja o PMDB se alinha com o PT ou ambos perdem e o PSDB tira proveito e acaba aparecendo como salvador da pátria o que seria o fim de tudo. Não tem segredo ou o PMDB e o PT enfrentam o golpe juntos ou perdem juntos.

  • Para Mino Carta, o paraíso seria um Brasil com cara de Cuba, ou seja, um socialista Cu-Brasil.

    • Paraíso para essa patota é país sem imprensa livre, sem justiça implacável, sem povo educado..... sem grades para os camaradas.
      Um lugar onde o roubo seja infinito e uns blogues cheios de 'adevogados'.

      • "Imprensa livre" é essa nossa aí? Um oligopólio de direita a serviço da casa grande e dos Estados Unidos?

      • É por energúmenos, quinta coluna como este tal e literal minúsculo klaus que nosso país não se torna uma nação verdadeiramente unida. Nem o Paraguai merece traidores anencéfalos como estes tipos ai. Acorda!

  • [... E parte da Senzala ainda concilia com a impiedosa Casa Grande...]

    Marina [Silva?!] 'A Escrota arrivista' destila ódio e ressentimento!
    E ainda por cima golpista a 'Aecista' de merda!
    Entenda a patife "que engana os incautos"!

    $$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$$

    Cassação, impeachment não!
    Cassar Dilma e Temer no TSE é mais viável, diz Marina

    Fernando Rodrigues

    04/12/2015 20:46

    (...)

    CACHOEIRA - perdão, ato falho -, FONTE: http://fernandorodrigues.blogosfera.uol.com.br/2015/12/04/cassar-dilma-e-temer-no-tse-e-mais-viavel-diz-marina/

  • Porque amanhã
    será um sábado,
    à claridade, digo:
    *
    *
    SÉTIMO
    by Ramiro Conceição

    Não vou cantar às sete
    fontes, às sete cores
    nem… ao sétimo selo
    do louco profeta João,
    nem aos sete pecados
    cometidos, num só dia,
    por Set ? filho de Adão.

    Do sábado? Nem falar,
    após sete cervejas!
    Não vou narrar os sete
    tiros na encruzilhada:
    seis mortos e 1 em coma.
    A coisa aqui tá branca,
    não tá pra brincadeira.

    Não contarei dos sete
    tombos do demônio, nas
    sete esferas celestes
    até o inferno terrestre,
    onde não se escapa com
    botas de sete léguas,
    fé ou versos de sete pés.
    *
    *
    Ainda mais,
    preciso saber…

    *
    *
    QUE DOR É ESSA?
    by Ramiro Conceição

    Que dor é essa
    que sonha, acorda, ama e odeia,
    banha-se e que, depois, faz café,
    escova os dentes… e se arruma,
    apruma-se, desce e sobe escadas,
    canta, se encanta e dança,
    tem um time… um partido,
    um amor escondido, um drama,
    uma trama, uma receita de bolo,
    um rolo - com o fisco, um fiasco
    diário, na igreja, na mesa, ou é ateia
    porque deus é uma ideia que perece,
    que vem ou vai pra rua, que está
    no jornal, que chega com chuva
    ou em relâmpagos advindos do sol,
    que se esconde em uma tempestade
    efêmera…

    É… Eu ando doente, porém
    física e psiquicamente, bem.
    Mas, então, que dor é essa?

  • Mino Carta é lelé da cuca.
    Não há diferença entre PT e os 'outros a elite'. São carne e unha e não estão presos juntos à toa.
    E esse papo furado de 'nóis esquerda é bom, eles direita é mau ..' não cola nem no maternal.
    São todos mamadores e rapinadores do dinheiro público.
    É o apogeu do Estado-Bandido, da política-bandida.
    O caminho é expurgação, quis o destino errático desse país que comece com as cabeças de Lula, Dilma e PT, animal de três cabeças a ser abatido.

  • MAIÊUTICA DOS FAVOS
    by Ramiro Conceição

    O que fazer com os bens adquiridos
    a não ser doá-los aos mais queridos?
    Não é assim… se não se teme o fim?

    O que fazer com o capital conquistado
    a não ser consagrá-lo à humanidade?
    Não é assim… o existir além de si?

    O que fazer com toda a ciência,
    a não ser ensiná-la à inocência?

    O que fazer com a consciência obtida
    a não ser favorecer os favos da vida?

    *
    *
    BALANÇO
    by Ramiro Conceição

    Quem fez o balanço
    que virou presente,
    a enfeitar a cidade?

    Que coisa bem feita.
    Que coisa bem-vinda.
    Que coisa do Bem…

    Escalou a castanheira.
    Escolheu o galho forte.
    Engenhou a brincadeira.

    (Sem dúvida ? é um mestre,
    pois se percebe, pelos nós,
    o cuidado dum marinheiro).

    Ah… Com certeza, foi um carpinteiro:
    a madeira da cadeira era envernizada,
    sem qualquer farpa nem cantos vivos.

    O brinquedo foi deixado pra brincar por muito tempo
    com graça, fantasia e gargalhadas, em movimentos
    a ensinar que, com alegria, cada dia se torna... lento.

    Sim… Só pode ter sido um artista:
    dum balanço fez a cidade moradia.

    *
    *
    RODA D’ÁGUA
    by Ramiro Conceição

    Numa roda d’água cada pá
    cumprimenta a sua vizinha:
    “Fui”… a da frente berra;
    “Voltei”... a detrás vocifera.

    Fui-voltei-fui-cheguei
    à rua que roda…
    Fui-voltei-fui-cheguei
    à mariposa que pousa…

    Fui-voltei-fui-cheguei
    à Lua que ousa…
    Fui-voltei-fui-cheguei
    ao Sol das rosas…

    Fui-voltei-fui-cheguei
    às praças loucas…
    Fui-voltei-fui-cheguei
    ao país dos poucos…

    Fui-voltei-fui-cheguei
    à música rara.
    Fui-voltei-fui-cheguei
    à Bola d’água.

    Fui-voltei-fui-cheguei
    à cidade, ao cume da torre de televisão.
    Agora só desço em carro de bombeiro
    que me leve ao arco-íris da imaginação.

  • “O vice-presidente Michel Temer é cupincha íntimo do Eduardo Cunha!
    (…)
    O Michel Temer – que eu conheço bastante bem – é um homem do Eduardo Cunha, e não o inverso! E eu sei o que eu estou dizendo!…” Por Ciro Gomes

    https://www.youtube.com/watch?v=_5oDIFJQ7KQ

  • SENSACIONAL! EXTRA!…

    “Amigo do Lula, segundo o PIG”, pecuarista Bumlai “amarra os chifres dos golpistas na lama da “Samarco”!
    KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK

    ENTENDA

    #####################################

    Bumlai diz à PF que ajudou a fundar PFL e PSDB
    Pecuarista nega que tenha desviado dinheiro do BNDES para o PT

    POR LEONELROCHA
    04/12/2015 20:24
    (…)

    FONTE: http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/bunlai-diz-a-pf-que-ajudou-a-fundar-pfl-e-psdb/

  • E aí tijolecos?
    O PT desistiu de expulsar o rato do Delcídio depois que ele ameaçou entregar a dupla-petralha Lula e Dilma. Só um refresco de 60 dias.
    Vejam só, por muito menos o reacionário DEM expulsou Demóstenes. Depois do língua plesa temos a República do rabo pleso.

    • Tá todo mundo do PT piscando com medo da delação do Delcídio.

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