Em outros tempos, pareceria “forçação de barra”.
Mas o tema que a Época aborda na edição do final de semana, afinal, coincide com tantas manifestações que tenho lido nos comentários e ouvido de amigos – vários deles, aposentados, pensando em “dar no pé” do país – que achei justo destacar a reportagem da revista que afirma que a crise política e econômica está causando surtos de depressão, angústia e abuso do álcool.
Claro que, ao longo da história, crises sociais e crises pessoais sempre tiveram forte associação.
Mas, desta vez, há um ingrediente novo: o ódio, intolerante e intransigente, que torna tudo pior, até porque envenena relacionamentos afetivos e familiares, antes um porto em geral seguro para vidas e almas avariadas.
Transcrevo alguns trechos, até porque na matéria inteira há muitas questões que, fora do âmbito estritamente pessoal, não interessam. Mas outras são coletivas. E pior, generalizadas:
Muitos se sentem insanos neste momento porque o Brasil e o mundo estão longe do que se convencionou chamar de são. As crises — política, econômica, ambiental, cultural — abalam o otimismo natural dos homens e a crença na bondade humana e no progresso.(…)
Christian Dunker, psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), disse não se lembrar de tempos como os atuais. “Atendo há 30 anos, já assisti a outros momentos tensos. Mas nunca a política ocupou tanto espaço na vida das pessoas.” Para Dunker, o presidente Bolsonaro é um agente de ativação “das modalidades de sofrimento e de sintoma que já estão presentes” nas pessoas. “Ele torna mais agudo os conflitos familiares, de raça, de gênero, de classe”.
Outro fator é a precarização do trabalho e da renda, apontada pelo psiquiatra e psicanalista Nilson Sibemberg como fator de depressão e angústia. “As pessoas estão com um temor muito grande de perder aquilo que é seu sustento. Isso se traduz em mais depressão e mais angústia”, afirmou.(…)
Para Dunker, o presidente Bolsonaro é um agente de ativação “das modalidades de sofrimento e de sintoma que já estão presentes” nas pessoas. “Ele torna mais agudo os conflitos familiares, de raça, de gênero, de classe. Faz isso ao se instituir como referência simbólica para a prática da autoridade pública, o registro opressivo. Isso tem poder de incrementar a angústia que já estava lá.”
O psiquiatra e psicanalista Rodrigo Lage, da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, tem observado “a exacerbação de ansiedade e de angústias, muitas vezes ante manifestações públicas de governantes que geram medo e insegurança”. (…)
Gostaria de dizer que tudo isso vai passar, como passará o governo Bolsonaro. Mas é forçoso reconhecer que na economia e nas cabeças, estes tempos deixarão cicatrizes que só com muito tempo não arderão mais.
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Verdade Brito, a vida está quase insuportável.
Nas corporações o estresse é, desgraçadamente, normal, pois a pressão por resultados dia a dia sendo brutais. Ocorre que a sociedade viu a importância dos governos e agora cada um quer o governo do seu jeito. Coisa que antes só ricos tinham.
A manipulação por meio da Imprensa ficou explícita e as falsas notícias tornaram-se instrumento descarado de manutenção (volta) da Direita ao poder. Toda a antiga Imprensa virou Mídia e a mídia internacional veio pro Brasil.
O Brasil foi invadido!
Burramente a maioria da classe média tomou o partido dos ricos e derrubou o governo que melhorou sua vida.
Assim haja psicólogo, igreja, seita e etc para destrinchar isso na cabeça dos coxinhas...
Igreja? Ja tem pastor vendendo os cartos p pagar o aluguel do templo
Ruim de conta como sao nao perceberam q 10% de zero é nada
Só a cachaça para acalmar esses miseráveis acéfalos que votaram nessa desgraça. Que se danem.
Como bem disse Boaventura Sousa Santos: "É uma fábrica incessante de ódio, medo e mentiras".
O conservadorismo retrógrado (nem todo conservadorismo anda para traz) joga a sociedade num passado idílico que obviamente não deu certo, porque se tivesse dado certo tinha ficado lá atrás como estava. Sempre se avança, sempre se corrige e se tem a ideia de que as coisas vão melhorando. Mas lá atrás, certamente não estava bom. A correção dos costumes, o resgate de um comportamento entendido então como adequado, a restauração do exercício de fé (qualquer fé, desde que manifesta, porque fé não se prova e ninguém pode dizer que está certa, basta tê-la), a salvação da família, uma economia e riqueza para poucos, etc. etc., é um lugar no espaço e na memória que não tem sustentação real. Não existe mais. As pessoas que assim se iludem são massa de manobra para outros interesses econômicos e de poder. Por isso é inevitável que vão cair na real mais cedo ou mais tarde, e perceber que no meio da destruição não sobrou nada mesmo, porque nada havia lá para ser recuperado. Aí, quem sabe, este ciclo em que vivemos chega ao fim... em meio ao caos.
Ou o povo brasileiro aprende a votar e a não fazer besteira na hora de clicar o número do candidato, ou vai ficar em depressão eternamente.
Votaram num louco,que está fazendo exatamente o que um louco faz: LOUQUEAR.
O médico que criou o monstro Frankenstein, sabia exatamente que o bicho poderia matá-lo, o que REALMENTE OCORREU.
(modo bozonaro)olha o spoiler ai, meu(/modo bozonaro) ano q vem tem eleiçao p prefeito e dezenss de deputados e senadores q se elegeram as custas do bozo se candidatarao a prefeito. Vamos ver se o povo aprende
Se bem q limpar o congresso dessa gente e devolver alguns monstrinhos a quem os elegeu nao seja o pior cenario.
Doutrina do Choque. É preciso resistir. https://youtu.be/Y4p6MvwpUeo
Muito cuidado para não venderem um caminho do meio, do equilíbrio, que seja apenas mais um neoliberal travestido de novo. Não adianta muita coisa sair do bolsonarismo para voltar à era tucana. No próprio gov Bolsonaro já há muita gente da LIDE e assemelhados, que estariam em um gov Dória, Moro ou Amoedo. Mesmos defensores de um estado mínimo.
Estou percebendo que a mídia direitista está investindo muito em Huck, que além de neoliberal é cria da Globo. Se Ciro e alguns eleitores radicais da esquerda continuarem criticando o PT e Haddad, ao invés de criticar as políticas neoliberais de direita, o povo vai acabar comprando o candidato da direita travestido de caminho do meio. Parece que Ciro e os radicais de esquerda não conseguem perceber que os votos que tiram do PT e de Haddad não vão para outro candidato da esquerda, vão para o candidato da direita. Ou talvez algum deles prefira mesmo que vença o da direita, para depois poder dizer que se fosse ele para o segundo turno teria vencido...
Para quem não leu, o sensacional artigo de Ester Solano na Carta Capital já alertou para este risco:
https://www.cartacapital.com.br/opiniao/dona-maria-ela-votou-em-bolsonaro-idolatra-lula-e-sonha-com-huck/
Como ela diz, precisamos escutar o que já está sendo dito alto e claro. Parabéns por ter ouvido acurado, Emília.
Acabei de ler o artigo que vc recomendou. Muito importante!! Mas te farei uma provocação. E daí? O artigo é importante, e daí?!
Eu quis chamar a sua atenção para o fato de que muitos leem, mas entra por um ouvido e sai por um outro. O artigo mostra o que dezenas de autores e pessoas, inclusive eu, dizem nos seus jornais e comentários. Eu já coloquei aqui, nos sites de esquerda, a minha solução. Já levei ao PT a minha solução. E a minha solução, que não estou pedindo para que vc concorde, é a seguinte: formar agrupamento de pessoas, nada virtual, que crie o mesmo empoderamento dos grupos evangélicos. A mensagem do texto da carta capital foi muito claro. Aquela senhora está restrita aos grupos da assembleia de deus. Assim acontece com a universal e outras. Na minha cidade, fundaram uma igreja evangélica. Fizeram escola, quadras, ginásio, igreja. Praticamente todo o lazer dos frequentadores da igreja é feito no mesmo local. Criam desta forma, um bloqueio para influência de outros meios. Na assembleia, os cultos são quase diários. A pessoa trabalha e vai para o culto. Qual é o tempo para discutir qualquer outra coisa? O MST é um grande exemplo de organização. Ele e as igrejas evangélicas deveriam ser um exemplo de casos de sucesso em termos de organização social. Tentei incentivar algumas pessoas de esquerda a formar um grupo de relacionamento com estes modelos. Não consegui. Posso estar errado. Mas concluí que, no fundo, a maior parte das pessoas, dentro da esquerda, não é socialista.
Grato pelo comentário e pela discussão do tema. Concordo que não basta ler ou escrever em fóruns engajados, restringirmo-nos a isto seria "pregar para convertidos", algo sem sentido diante de uma ameaça concreta como a que vemos. Contudo, o ponto do artigo que me motivou a citá-lo não está na mensagem, mas nas entrelinhas. Não se trata apenas de ter um contato frequente, cotidiano, ou de realizar benefícios materiais para as pessoas deste estrato. Assim fosse, em todas as comunidades periféricas das cidades o controle estaria dividido apenas entre as milícias e o crime organizado, pois as duas estruturas fazem isto (pelo menos no inicio) e têm tanto ou mais contato com os populares, além da força para se impor. Vejo como essencial o fato de que estas pessoas não estão sendo adequadamente ouvidas, há uma ausência de interlocução com elas que inviabiliza quaisquer tentativas de esclarecê-las para os fatos ou convencê-las a mudar de posição. Talvez seja por aí que os neopentecostais ganhem de lavada, os camaradas têm uma paciência imensa para ouvir toda sorte de problemas, mesmo que a solução oferecida seja sempre a mesma. Tal vantagem caiu de paraquedas no colo deles, quando os papados conservadores de João Paulo II e Bento XVI roubaram a interlocução com as comunidades eclesiais de base ao desmontá-las, e eles aproveitaram muito bem. Alguém escreveu, dentre os comentários deste post, que "pobre não faz análise, luta pela sobrevivência". Claro, mas os pobres têm tanta necessidade de escuta quanto os ricos, quem se dispuser a ouvi-los terá um caminho seguro à sua atenção. O que não estamos vendo acontecer, inclusive dentro dos partidos de esquerda e movimentos sociais, que parecem deliciar-se em falar apenas aos seus e estigmatizar os opostos. Quando polarizamos, descemos ao nível da bolsominionzada, segregando mais que agregando. Acho que este foi o ponto maior do artigo de Solano, como foi sua tentativa de formar grupos de relacionamento, a qual eu aplaudo. Deveríamos todos insistir mais nisto, sob pena de tornar irrelevante o caráter justo de nossas posições e oposições, entregando mais uma vez uma vantagem de bandeja a adversários. Talvez seja um aprendizado necessário, mas nunca é tarde para aprender. Saudações!
Em nenhum momento, eu tentei dizer que o caminho seria a formação de grupos de favorecimento. E muito menos comparar com grupos milicianos. Acho que foi infeliz a sua comparação. Mas o favorecimento também importa. Para uma pessoa escolarizada as oportunidades são maiores. Mas para uma pessoa pouco escolarizada a indicação é muito importante. Portanto acredito que não seja só isto, mas isto também, como forma de agregar pessoas para o mesmo discurso. Um evangélico, normalmente, indica outro.
Quando falei da formação dos grupos, quis atentar para a situação de pertencimento, que estava embutida implicitamente no texto, ou seja, de identificação pessoal com um grupo. E realmente isto também se faz pela discussão de temas comuns, como fazem os evangélicos. A diferença é que os pastores apontam as causas dos problemas como advindas da esquerda. Criam medos,e ameaças. E muitos deles só tem a intenção de enriquecer. Os grupos que eu tentei mostrar, seriam aqueles que te favoreceriam como ser humano em todas as suas dimensões. Sozinho não somos ninguém!!! Mas também não adianta querer enfrentar a situação atual apenas com passeatas.
Eu já tinha comentado isso. Esses ataques e rompantes do Ciro, que por sinal nunca foi de esquerda, ampliam o ódio ao PT e transferem votos para o principal candidato que capitanea esse ódio e que não é ele próprio. Um demagogo ao final.
Kkkk Fernando não é Cyrista e nem Brizola seria, perfeita observação
Até porque FHC é um Bozo intelectual, que mata de fome e tortura o povo com a mansidão dos psicopatas.
Mas em um debate publico o candidato do estado minmo vai ter q abrir o jogo
Nao va ter facada com doria
Não tenho mais esperança no brasileiro.
Depois do que fizeram nas urnas no ano passado eu acho que nos empurraram de vez ao abismo.
Dificil sera sair de onde essa corja nos jogaram.
Olha, essa matéria para mim é forçação de barra. É mais uma matéria daquelas com até boas intenções, mas só servem pra encobrir uma coisa: O papel que a mídia puxa-saco teve e ainda tem em relação ao cãoverno Bolsonaro.
Cabe a este Dunker, no trânsito da sua inteligência psicanalítica, integrar uma análise sólida sobre essas relações sociais que envolvem nossa sociedade atual, no seio da psicologia das massas e análise do eu freudina, ou com base na filosofia (como em Hannah Arendt, p.ex.). Youtuber, que com seus drops psicanalíticos (num viés que parece tão somente autopromocional) revela aquilo que Lacan chamava de semblante; estando eu irritado com essa palhaçada toda, é o que penso dele. Enfim, tá devendo isto, ee nã se perguntar se a psicanálise é apolítica, como fez no 247, questão absolutamente extemporânea.
Quer uma análise sólida sobre o que o povo brasileiro está passando? Pois vou te dar: ????????????????????????????????????????
Mais sólido do que isso, impossível. A quem interessa uma análise política sob o ponto de vista da psicanálise? Pobre não faz análise. Pobre luta pela sobrevivência. Não existe algo mais irritante do que um pseudo-intelectual falar sobre pobreza de dentro de um escritório/consultório. Nesse caso não interessa o que disse Freud, Arendt ou outro qualquer. É a sobrevivência e a vida digna que estão em jogo.
Rsrs pode ser... Mas também, no curso do que vocês consideram um sentimento de democracia, de trânsito de ideias, meio que falhou, não acha?. Fazer o que não se deve, dizer o que não se sabe, toma parte de uma prática reiterada, da qual certamente vocês não escapam disto. No fim, caberia perguntar? Se o povo, que enche as lotações a partir da madrugada, este, não pequeno burguês, pelos mesmos motivos que vocês , Dunker e Cia expõem, estaria igualmente à beira de um ataque de nervos? Bem, cada um tem seu momento. De todo modo, gosto muito das análises de vocês, as quais não vou deixar de ler. Este "vocês estão malucos" que soltei foi em decorrência de um ato de surpresa. No mais, ninguém é perfeito.
Em sex, 13 de set de 2019 21:39, Disqus escreveu:
Apesar do belo jogo de palavras, o momento político atual não precisa de citações de grandes pensadores. O problema pontual é que a direita faz discursos vazios, que em nada contribuem para nossos problemas políticos, econômicos e o desemprego. Nossas indústrias estão ociosas, as exportações em baixa, o meio ambiente em risco e o que a direita faz? Quer discutir Marx, Maduro, Fidel e Chaves. Onde o ponto comum nisso? Sempre a mesma ladainha de "vai prá Cuba", "vai prá Venezuela"...
E o mote de sempre: "Onde o comunismo/socialismo deu certo?".
Quando respondemos "CHINA", temos que ouvir "mas a China é Capitalista", como se isso fosse verdade. Essa afirmação da direita não encontra respaldo em nenhuma nomenclatura. Mas cada um acredita no que quiser. Isso é assunto para a psiquiatria ou psicologia.
Pense em Marx. Qual foi o trânsito intelectual de Marx, como se deu o perpassar da sua teoria? Sua relação foi com as ciências humanas, o que ele e outros fizeram foi teorizar. Não é bem assim como você indica, que no final acaba por estar no reverso da matéria do artigo "à beira de um ataque de nervos". De todo modo, não deixo de concordar contigo. A grande massa trabalhadora, a grande maioria do nosso povo, que enche as lotações pela manhã, não se encontra "a beira de ataque de nervos" pelos mesmos motivos da classe mérdia. Disso não há dúvida. Agora é possível sim uma análise da baralisação do mal, de como se articula o plano psíquico das pessoas individua e coletivamente, de como se dá o sem sentido da razão manifesta nas opiniões, de como se põe para escanteio o contrato social que impõe limites para o lado obscuro do ser, da perversão, da maldade, da violência.
Sejam bem-vindos à guerra híbrida.
Irmão contra irmão, povo contra povo, empresário contra empresário, autoridade contra autoridade.
Parece que o resultado superou os 100% de sucesso projetado. Chegou a 200%.
Tudo viabilizado pelo próceres das fake news, Boçal Nato e seu filho Flávio, com a inestimável ajuda do Steve Bannon. Menções honrosas também a Olavo de Carvalho, o Clube Militar, o MBL, a turma da Farsa a Jato e a Globo (esta última ficou chupando o dedo porque queria os tucanos).