A confissão de Barroso, a quem a história não absolverá

É curiosamente trágica a valentia dos covardes.

O artigo em que o ministro Luís Roberto Barroso diz que “a justificativa formal [para o impeachment de Dilma Rousseff] foram as denominadas ‘pedaladas fiscais’ —violação de normas orçamentárias—, embora o motivo real tenha sido a perda de sustentação política”, antecipado pela coluna de Mônica Bergamo, na Folha, equivale a uma confissão, tardia e covarde, de um dos cúmplices do golpe jurídico-político-midiático que derrubou a presidente eleita do país.

Mais um admitir que não existiu violação das leis orçamentárias da República, em nome do que se fez a cassação de Dilma, Barroso assume que não havia crime e, portanto, não poderia haver pena de perda de mandato, porque estar em minoria no Congresso não é, nem nunca foi, razão legal para interromper um mandato legítimo.

É certo que até as pedras das caçadas sabiam disso, mas estamos diante de um juiz do Supremo Tribunal dizendo que ele e seus pares acumpliciaram-se à violação da soberania popular – a regra é presidentes elevarem-se ou decaírem do poder pelo voto dos cidadãos – por decisão de uma maioria parlamentar “moralista” ao ponto de ser liderada por Eduardo Cunha.

Afinal, “perda de sustentação política” tem este presidente rejeitado por dois terços da população mas, comprando – como Dilma se recusou a fazer – a fidelidade do presidente da Câmara e de trezentos picaretas que o acompanham, mas está imune para, agora sim, revogar ou violar qualquer regra fiscal, como está fazendo.

Havia muitas confissões – até de Michel Temer, num ato falho – mas esta é a que vai ficar na história, porque Barroso encarna os 11 covardes que, com medo da mídia, do dinheiro e dos deputados, deixaram de cumprir com seu dever de defender a Constituição e a intangibilidade de um mandato concedido pelo voto.

É verdade que tem um sentido didático, o de esclarecer aos ainda tolos que buscar sustentação política é mais importante do que apenas buscar votos, porque se eles elevam ao Governo, a falta dela mais que depressa dali o derrubam.

Dilma, mais que nunca, está absolvida do que lhe acusaram e é evidente vítima de uma trampa à qual até o STF se associou.

Mas Barroso e seus pares no Supremo, embora possam permanecer nas suas confortáveis cátedras e paparicando-se com os “vossa excelência” para lá e para cá, vão carregar para sempre a condenação moral como covardes e omissos diante de uma farsa e de um golpe.

Tinham a obrigação funcional e moral de defender a Constituição e não o fizeram. Alguns, como Barroso, fazem ainda pior, procurando exibir suas “superioridades morais”, ao dizer de cara limpa que não houve crime.

Houve, Dr. Barroso, houve o pior dos crimes políticos: um golpe de Estado contra o voto popular, no qual muito ajudaram os seus chiliques moralistas.

De que moral pode falar um juiz que assume que não tinha provas, não tinha sequer convicções mas tinha – perdoem-me o chulo – um enorme cagaço da onda da mídia, do parlamento e dos militares e, por isso, desertaram como ratos de defender aquilo que juraram fazer cumprir: a nossa Constituição.

 

 

Fernando Brito:
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