As notícias – acho eu que exageradas – em torno da imensa massa de ar frio que avança sobre nosso território, não pode escapar de uma metáfora com o que se passa com o Brasil.
De fato, parece que situações se congelam e as consciências se encolhem, como se todos estivessem condenados à paralisia por uma realidade pavorosa, cristalizada e imutável.
Como descrever de outra forma a aceitação plácida de 110 mil mortes, a ruína econômica do país e a ausência total de qualquer perspectiva de nos arrancarmos de um quadro de crise que irá ainda muito mais longe que este interminável vírus mortal?
Espanta-me, porém, que intelectuais, gente apetrechada para conhecer a realidade dos processos políticos passe a se dedicar a expelir conclusões frágeis, sem outro suporte senão pesquisas rasas, feitas por celular, na base do !aperte o um ,aperte o dois, aperte o três”, que Jair Bolsonaro e a obtusidade bolsonarista espalharam-se oceanicamente pelo povão, para ficar.
Parece que todos se esqueceram que este é um governo decididamente antitrabalhador e antipovo, que é o governo da destruição dos direitos trabalhistas, o governo inimigo dos programas sociais, o governo de liquidação dos empregos e dos investimentos, o governo do atraso e da insensibilidade para com o ser humano?
Alguém realmente pode acreditar que um programa de renda na base do famoso “quem quer dinheiro” de Sílvio Santos, sem foco, sem contrapartidas sociais, sem efeito sobre produção e consumo vá levar de volta o Brasil a um caminho de progresso e de justiça social? Ou que ele é compatível com um arrocho fiscal que terá de aumentar ainda mais frente à queda na arrecadação provocada pela recessão mundial e nacional?
Não há nenhuma semelhança com o enfrentamento da “marolinha” da crise de 2008, quando a crise era apenas externa e notadamente financeira.
A verdade é que muita gente se deixa levar pela falsa impressão que distribuir umas pelegas de cem – ou até os futuros guarás – e resolvem-se os históricos processos de atraso e de exclusão deste país.
Ou que a salvação do país possa estar na mão de engomadinhos togados, desconectados do povo, que só lhe frequenta os discursos hipócritas e o elevador de serviço?
Com este primarismo, que no fundo encara o problema do Brasil como sendo tão simplório que assim poderia ser solucionado, perde-se a ideia de que o nosso problema é – e já era durante os governos de centro esquerda – o de nos identificarmos como coletividade, o de nos impormos – pacífica e autonomamente – como nação e de deixarmos de ser um país retalhado por uma visão de que é o nosso povo a raiz de nossos problemas.