Recebo, de uma querida amiga, muito anti-Dilma – não vai deixar jamais de ser minha amiga por isso – um artigo de Eliane Brum, ótima colunista da versão brasileira do El País, onde ela , apesar de afirmar a legitimidade da eleição de Dilma Rousseff, pretende tornar relevante o fato de “mais de 37 milhões de brasileiros” não terem votado em nenhum dos dois candidatos.
Seria, de fato, relevante, se fosse uma novidade.
Como sou um velho chato – perdoem-me o pleonasmo – fui conferir os números.
Em 2014, foram 105.542.273 votos válidos, ou 93,66% do total de votantes. Abstiveram-se 30.137.479 eleitores inscritos, ou 21,10%do total.
Nas eleições anteriores, o número de votos válidos (ou dados a um dos dois candidatos) foi menor, 93,30% do total. Portanto, menos votos brancos e nulos, percentualmente. E a abstenção foi maior do que em 2014, 21,5% do total.
Se tivéssemos de falar na “muita gente que não se sentia representada por nenhum dos dois candidatos, pelas mais variadas razões, à esquerda e também à direita”, mais teríamos a falar disso após 2010, e ninguém falou.
“Num tindi”, portanto, qual é a lógica deste argumento que, para começar, é numericamente falso.
Falar da diferença menor, ok, é válido.
Falar da diferença de postura do derrotado Serra para o derrotado Aécio, que se proclamou vitorioso com seus votos em quantidade menor, também é compreensível.
Eliane, que é boa profissional e pessoa de bem, deixa-se capturar por uma visão que, afinal, resvala para o campo da discussão da legitimidade eleitoral com números que, como mostro cartesianamente acima, não se sustentam.
A disputa eleitoral acabou e não adianta buscar nela razões para a crise política.
A política, sim, é a raiz da crise, porque a radicalização estimulada pelo derrotado e pela mídia, derrotada também, é o que nos leva a este paroxismo.
É claro que tudo o mais que acontece, a economia e o banho seletivo e diário de Lava Jato têm seu peso importante.
Mas o essencial é que as nossas classes médias urbanas – tão endeusadas pelo PT, no tempo das vacas gordas – mudaram de lado e, mesmo perdendo, não o aceitam.
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A legislação permite que o eleitor se abstenha de votar. Abster-se significa delegar a outros a decisão da escolha.
Até uma criança entende o funcionamento dessa regra.
Abster-se e depois reclamar da escolha que outros fizeram é ilegítimo. Judicializar essa insatisfação é ilegal. Pedir a deposição de um governante com esse argumento é golpe.
Malandragem. Papo de malandro. Então que se acabe a democracia. pois nela se tem liberdade até de escolher votar ou não votar.
Concordo com você!
Abster-se , anular ou votar em branco é o mesmo que votar no vencedor.
É dizer; aceito o que a maioria decidir.
É dar um cheque em branco para outro preencher.
E não me venham dizer que não se sentiram representados;faço a pergunta:se informaram o suficiente, ou acreditaram nas informações da midia ?
Eu cheguei à mesma conclusão que um amigo meu: as pessoas não querem ter trabalho, querem reclamar!
As manifestações de ódio nas ruas mostraram que uma boa parte da população é infantil.
Infantil ou alienada? Pensar a política tinha que fazer parte do curriculum desde a creche.
A querida amiga anti Dilma deveria ir aos USA para pôr em duvida a legitimidade de Obama que foi eleito por uma parcela muito menos de eleitores votantes, aqueles que se dispuseram ir as urnas.
Perdão mas isso é papo de malando. Ela repete o que se lê na internet para deslegitimar Dilma. Como aécio não foi eleito vem com esse papo para justificar o GOLPE. É simples assim.
Perdão mas eu resolvi não aliviar nem para minha querida sobrinha que sofreu lavagem cerebral da opus dei, seita nos mesmo moldes da TFP, que ressuscitou e saiu dia 15/03 às ruas pelo GOLPE, quanto mais para "amigos" queridos ou não.
Como faz falta ao BRASIL HOMENS como BRIZOLA.
É GOLPE, Eliane. Puro e simples. GOLPE CONTRA A DEMOCRACIA.
Vcs não aceitam a DEMOCRACIA, o veredito das urnas, a soberania do povo nas urnas,que decidiu contra o candidato de vcs, que se dizem contra a CORRUPÇÃO, mas votam em um candidato que confessou o uso de dinheiro público na construção de aeroportos em terras particulares de um tio, de sua família, entregando a chave a um primo. Os coxinhas são GOLPISTAS e a favor da CORRUPÇÃO TUCANA.
Para isso é bom ter os dados de outras democracias no mundo:
Brasil (2014):
População: 203 milhões
Votação Dilma: 54,5 milhões (26,8%)
Estados Unidos (2012):
População: 316 milhões
Votação Obama: 65,9 milhões (20,8%)
Alemanha (2013):
População: 81 milhões
Votação Partido da Merkel: 18,1 milhões (22,3%)
França (2012):
População: 65 milhões
Votação Hollande: 18 milhões (27,6%)
Reino Unido (2010):
População: 63 milhões
Votação Partido de Cameron: 10,7 milhões (17%)
Claro que cada eleição tem um sistema diferente e também existe número de eleitores. Mas é claro que a votação da Dilma, percentualmente sobre a população, é maior que destes países com democracia considerada sólida.
O problema dos coxinhas é a MONUMENTAL ignorância. Aí o PiG aproveita para tripudiar em cima.
Vale lembrar que, dos países citados acima, apenas o Brasil tem voto compulsório.
É um compulsório relativo, né?!?
Pois convenhamos, justificar ou pagar multa de R$ 3,51 não é lá uma sanção tão proibitiva assim...
é que o voto "compulsório" no Brasil é beeeem entre aspas. Se você não vota, o máximo que acontece é ter que ir num cartório e pagar uma taxar ridícula.
Vale lembrar que o chamado "voto obrigatório" reduz apenas a parcela das abstenções por motivo de preguiça ou comodismo.
Quem realmente quer se abster pode votar em branco ou nulo.
Na verdade a obrigatoriedade é de comparecimento em uma seção eleitoral, pois qualquer um pode ir a outra seção eleitoral diferente da que vota e justificar sua ausência.
Portanto o chamado "voto obrigatório" não altera nada no raciocínio apresentado pelo autor do post.
Excelente argumentação. Matou a cobra e mostrou o pau.
Bom dia,
se é numericamente falso, só existe um entendimento. Manipulação de resultados para a tv, com o sentido de diminuir e desqualificar o voto do brasileiro. E assim os barões perpetuarem no poder. Simples assim!!!
Creio que o nobre jornalista optou por publicar um contraponto raso ao texto da Eliane Brum. A análise cartesiana é só uma das muitas possibilidades. A meu ver -e eu na minha condição de poeira estelar, não vejo muita coisa-, os constantes atritos entre as "torcidas partidárias", só aumentará o número de indivíduos que como eu, não compactuam com modelos políticos liberais ou de esquerda que governa por meio de fisiologismo político... Os brasileiros estamos nos tornando refratários à política, inclusive a política cotidiana, da gentileza e da alteridade.
Caro Fernando,
Também sou um velho, pleonasticamente, chato.
Li o texto da Eliane e o achei ótimo.
Sob meu humilde ponto de vista, o foco do texto não é a abstenção, nulos ou brancos. O foco é o distanciamneto do PT para com os eleitores (ou vice versa).
O assunto tema do texto "A mais maldita das heranças do PT" é o que aconteceu e , eventualmente, como sanar os erros cometidos pelo partido. E neste ponto, vc há de concordar, que ela tem um caminhão de razão (o PT tem pisado na bola a torto e a direito).
Penso que aquele texto seria um ótimo ponto para a reflexão do partido no sentido de uma auto-crítica e na definição do que fazer para continuar a ser o grande partido da esquerda no Brasil.
Bem, é isso o que eu penso.
Umforte abraço a todos
Bom e se o voto não fosse compulsório e apenas 5% de brasileiros votasse? Nenhum presidente seria legitimo, é isso?
Bem sabemos que só seria legitimo se fosse do agrado dos mais ricos.
Além do mais, a alta abstenção faz cair por terra a ladainha de que apenas o voto facultativo é legitimo. Quem não quer não vota, e não vi ninguém preso por isso.
Brito, uma boa questão para a Justiça Eleitoral.
Quantos destes 30 milhões que não compareceram estão vivos, tem mais de 70 anos ou simplesmente se abstiveram? Acredito que a abstenção (retirando os mortos e com mais de 70) é bem menor. Como descobrir este número?
Uma parte da abstenção sem dúvida é composta de eleitores falecidos.
A Justiça eleitoral convoca os eleitores que não comparecem a três eleições seguidas (primeiro e segundo turno contam como duas eleições separadas, e eventuais plebiscitos também contam) a se manifestarem. Se eles não atendem à convocação, são então excluídos da lista de eleitores. Significa que os eleitores podem continuar a fazer parte da lista anos após o falecimento. E nesse caso são contados como abstenção.
Mais recentemente, a Justiça Eleitoral firmou convênio como o INSS, pelo qual a previdência repassa ao TSE, ou aos TREs, a lista de segurados falecidos a cada três meses. Isso deve ter reduzido substancialmente a abstenção por morte, mas nem todo mundo é segurado do INSS (cerca de metade da população adulta ainda não é).
Quando a Justiça eleitoral faz a exclusão de eleitores que não se manifestam ao serem chamados, ela costuma excluir um pouco mais de um milhão de pessoas da lista. Dá para ver que é um contingente grande, mas está longe de ser a maioria dos eleitores que se abstém (e, por outro lado, nem todo mundo que não comparece de fato morreu, deve haver um contingente de pessoas que simplesmente não se interessam mais pelo assunto).
Há duas outras formas de abstenção involuntária que devem ter sua importância: os eleitores presos ou detidos, e os eleitores alistados para o serviço militar, que não podem votar.
Agora, a maior parte da abstenção provavelmente é de pessoas que tem dificuldade de chegar à urna, nas regiões rurais. Eu diria que se todo esse pessoal votasse, o percentual de votos da Dilma na última eleição teria sido maior.
Abstenção de pessoas que rejeitam o processo eleitoral como um todo, ou que rejeitam todos os candidatos, isso deve ser relativamente pouco - até por que, no ambiente de classe média onde se faz esse tipo de argumento, ir à urna e anular o voto seria a maneira mais óbvia e prática de manifestar esse sentimento.
Enfim, se é verdade que 81 milhões de pessoas não votaram na Dilma, então é também verdade que 84 milhões de pessoas não votaram no Aécio. Portanto, continua a haver mais pessoas que não querem o Aécio do que pessoas que não querem a Dilma.
Está cheirando à antiga manobra. Aécio está envolvido desde sempre com inúmeras situações de improbidade (lista de Furnas, Aeroporto de Claudio, verbas para comunicação para os negócios da família, helicóptero do pó,etc) Agora envolvido direta e comprovadamente em novas ações nos assuntos do momento, a opinião pública pode ser desviada à saída 'são todos farinha do mesmo saco'.
A manobra é essa: se não dá para acusar somente o PT, que os considerem iguais e acuse ambos.
Em 2006, houve uma avalanche de campanhas pelo voto nulo ou em branco, pois, segundo alguns, se a maioria dos votos fosse "não válida", a eleição teria que ser anulada.
Evidentemente, era uma bobagem: a lei fala em votos válidos, ou seja, pouco importa se eles são muitos ou poucos dentro do universo de votantes.
E qual a importância de haver tão grande contingente de pessoas que não votou nem em Dilma nem em Aécio? Ora, em 2010 conheci muita gente que também não queria nem Dilma nem Serra; em 2006 vi uma montanha que também não gostava nem de Lula nem de Alckmin.
Mas a verdade verdadeira é que, a despeito de má vontade com a polarização, um tal de PT e um tal de PSDB vem encabeçando a disputa desde longuíssima data.
A vida segue aqui, como segue nos Estados Unidos, país em que também se encontram milhões que não estão nem aí para democratas ou republicanos.