Não é difícil entender porque a mídia, mesmo com todo o dinheiro do mundo, tem dificuldade para encontrar nomes novos. Elegem-se alguns especialistas e os jornalões todos passam a falar apenas com estes. Lembro-me que, durante um bom tempo, Roberto Romano, professor de Ética na universidade de Campinas, era a figurinha mais fácil da imprensa: só dava ela, nos jornais, na rádio, na tv, como se fosse a única pessoa que entendesse de “ética” e “corrupção” no Brasil. A razão era simples: Romano fora treinado para falar mal do PT.
Entre os profissionais, o incesto é diário e crescente. Colunistas da Folha se tornaram âncoras da Globonews. Um blogueiro da Veja ganhou mais um trabalho na TV Cultura, mais que nunca aparelhada pelo PSDB, e outro se tornou comentarista da Jovem Pan, rádio que integra o sistema midiático tucano. Repartem-se os mesmos colunistas, como Gaspari, Marco Villa, Demetrio Magnoli, Reinaldo Azevedo, como se não houvesse outros. Está tudo dominado.
Quando a imprensa decide sair um pouco da “casinha” e entrevistar nomes diferentes, perde-se o controle. A gente vê isso de vez em quando em programas de entrevista na Globonews.
Aconteceu isso agora com essa entrevista da Folha com Adalberto Moreira Cardoso, um sociólogo da UERJ. A análise dele é primorosa e a gente fica a pensar: onde estava esse cara antes? Por que tão raramente entrevistam pessoas assim?
Cardoso analisa a conjuntura política, fazendo comentários francos sobre todos os candidatos.
Sobre o Aécio: “(…) Essa eleição reinaugura a disputa política propriamente dita. O PSDB, que agia de maneira errática nas últimas três eleições, está claramente com um projeto mais definido, mais conservador, mais à direita, definindo um eixo de retomada de um projeto que foi bem-sucedido no primeiro mandato de FHC. Mas que fracassou no segundo mandato. O que o Aécio tem afirmando é o projeto do segundo mandato de FHC.
(…)É de voltar às políticas de FHC. Seu possível ministro da Fazenda é Armínio Fraga, um dos responsáveis pela grande fragilidade do Brasil no segundo mandato do FHC. Ele colocou o Brasil numa rota de dolarização da economia num momento em que a dolarização já tinha destruído a economia da Argentina. Ele está fazendo o programa do PSDB, baseado nas políticas neoliberais de financeirização da economia.”
Sobre Campos: “(…) É uma oposição que saiu do governo, uma candidatura de oportunidade. Com a saída de Lula da disputa, ele se sentiu livre para, entre aspas, trair o seu aliado principal. Entre aspas porque a lealdade dele era em relação à pessoa de Lula, não ao partido. Uma aliança típica das oligarquias no Brasil. Ele, como filho de oligarca, agiu como tal. É perfeitamente legitimo. Foi um movimento oportunista, assim como foi oportunista a aliança com Marina Silva, com quem ele não tem a menor afinidade ideológica.”
O cientista identificou um movimento que temos notado por aqui, a ruptura crescente entre Aécio e Campos, motivada pela disputa pela vaga no segundo turno.
“Eduardo Campos sabe que a única possibilidade de ir para o segundo turno é destruir Aécio. O inimigo de Campos não é Dilma; é Aécio.”
Eu só discordo de Cardoso num ponto. Ele acha, por exemplo, que no segundo turno, Campos tenderá a apoiar mais Dilma do que Aécio. Acho difícil que isso ocorra, até por conta da pressão da mídia. Qualquer lua de mel entre Campos e mídia será desfeita imediatamente se o ex-governador aderir novamente ao PT. Pipocarão escândalos diariamente contra sua gestão em Pernambuco.
(Atualização: notinha publicada na coluna do Jorge Bastos Moreno vai na mesma linha da opinião de Adalberto. Diz a nota que “Lula mandou o PT amenizar suas críticas ao candidato Eduardo Campos para facilitar o apoio dos socialistas, na eventualidade de segundo turno. É que, ao enfatizar suas diferenças com Aécio Neves, Campos tem reafirmado também que qualquer aliança no segundo turno será dentro do seu quadrado. E o seu quadrado é o PT.”)
Cardoso expôs, na entrevista, uma teoria interessante sobre os juros. Não sei até onde ele está certo, mas me parece bastante plausível.
Trecho sobre os juros: “Quando a taxa de juros chegou num patamar que todos, inclusive a Fiesp, saudaram como uma taxa civilizada, juros reais de 2%, todo mundo começou a aumentar preço. Porque o empresariado no Brasil deixou de investir quando a taxa de juros ficou muito baixa, ao contrário do que acontece no mundo inteiro. No mundo inteiro, quando a taxa de juros está muito alta, os empresários não investem. No Brasil é o contrário: os empresários investem com taxa de juros alta, porque ela reduz o risco do investimento. Por incrível que pareça! Quem financia o investimento no Brasil é o BNDES, o investimento é com juros subsidiados. Com taxa de juros alta, os empresários podem ganhar no mercado financeiro. O que ajuda a segurar preço não é o fato de que a demanda é contida pelos juros altos. Porque os empresários compensam os preços das mercadorias ganhando no mercado financeiro. Não é preciso aumentar preço: eles estão ganhando em outro lugar. Quando a taxa de juros cai, a primeira atitude do empresário que começa a perder dinheiro no mercado financeiro é aumentar preço “
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Traduzindo os empresários ganham com a vagabundagem.Ganhando juros não precisam trabalhar.
E o sociólogo Adalberto Cardoso ainda disse essa para Eleonora de Lucena, a repórter do FOLHÃO: "Passaram os últimos quatro anos tentando destruir o legado de Lula, INCLUSIVE O SEU JORNAL e a imprensa em geral no Brasil."
Boa.
Tudo o que disse é muito verdade e só não ve quem não quer, agora eu acho que aliança com o ec no segundo turno seria uma falta de vergonha na cara sem tamanho, o cidadão era aliado, passou desavergonhadamente para a oposição falando cobras e largatos do governo, se aliou com o principal adversario do PT ao ponto de formarem uma aliança contra o governo e no final tudo é esquecido? È muito complexo de inferioridade para o meu gosto,
Não. Não é esquecido é apenas guardado para um outro momento. A ética política é diferente da ética regiosa, social, etc...
Fernando e Miguel dupla que só nos honra. A regulação da mídia colocada abertamente, como projeto de campanha, nos faz um bem imenso.Aguenta coração! O PIG - mídia oligárquica,PSDB,DEM,PPS e judiciário"justiceiro", não deixarão por menos. LIBERTA QUAE SERA TAMEN. Que Deus nos Abençoe e nos Guarde.
Os economistas do governo sabendo deste truque do empresariado deveriam chamar estes a mesa de negociações e deixar bem claro. Se subir o preço liberam as importações. É simples.
Se fizer não terá grana para campanha e isso ninguém ganha nada, pois o povo faz questão de votar em corrupto. O petismo quando não tinha arrecadador, fora militante molambento e impertinente vendendo jornal e broche, e defendia que dinheiro público não podia ser roubado não ganhava uma, isso só fez depois que começou faze acordo como os piores corruptos
Que o psdb é de direita, até aí nenhuma novidade...
[definindo um eixo de retomada de um projeto que foi bem-sucedido no primeiro mandato de FHC] O petismo tem que ter um comitê para aprovar quem pode fala em seu nome e só publicar o que for aprovado.
Essa opinião sobre os juros parece bem plausível. Nunca entendi porque não houve apoio dos empresários às medidas do governo visando reduzir os juros. Quando finalmente o governo conseguiu atender aos pedidos dos empresários de redução dos juros da selic, eles não deram o apoio necessário, e começaram a aumentar os preços, atendendo aos apelos do mercado financeiro e da mídia oposicionista. No final das contas, todos eles ganham com os juros altos.
Infelizmente o PT no RJ não existe.
A Executiva Nacional do Partido nunca se interessou pelo Estado.
Um erro.
O Rio é o espelho do Brasil. Não porque queira, mas porque o mundo assim decidiu.
Luis Fernando,
O PT do Rio se desmantelou quando houve o acordo da Benedita c o Garotinho. Desde então não se recuperou, parece que a ferida ainda continua aberta, mas o PT do Rio, ainda é uma das maiores militâncias. Acho que o momento da recuperação pode ser agora. Tomara!!!
Este "sair da casinha" de que você fala é um dos pontos que mais têm causado preocupação. Alguns consideram que sejam "gafes", que de vez em quando são cometidas pela Globo news e por outros veículos, quando entrevistam alguém que contradiz e esmaga seus pontos de vista. Mas não são meras gafes, seria ingenuidade demais pensar que a Globo vai chamar para entrevistar alguém que ela não conheça como a palma da mão. De onde então vem isso? É relevante e causa especulação, o fato de que vez por outra surge na própria imprensa de uma só opinião algo aparentemente quase fatal a esta mesma opinião, a esta mesma orientação geral da imprensa. Devemos entender que isso é adubo essencial para a credibilidade, credibilidade que por sua vez é tudo, é o ouro e a prata de toda informação.
Devemos fazer um paralelo entre isso e o fato de que, em patamar superior, há os Snowdens da vida e há até artigos inacreditavelmente verdadeiros que saem de veículos "dominados" como o New York Times e o Economist. Uma hipótese provável sobre isso é a de que haja um cálculo matemático, talvez formulado em algum supercomputador, que medirá o efeito causado por estes fenômenos e afirmará que tais inserções de verdades verdadeiras não têm impacto tão grande quanto as mentiras cotidianamente veiculadas. Numa soma, o resultado pende para a maior exposição, anula a verdade e expõe um bom saldo a favor .