A armadilha do dólar ameaça se fechar

É verdade que a imensa quantidade de reservas em moeda estrangeira acumulada durante os governos Lula e Dilma – que multiplicaram por dez o colchão cambial  – é um escudo contra movimentos especulativos do dólar.

Mas não é verdade, em em absoluto, que ela proteja o Brasil dos efeitos  da tendência de recuperação, em escala mundial, do valor da moeda americana e de uma alta consistente de juros internacionais.

A manchete do Estadão, hoje, é o sinal mais  forte de que o “mercado” começa a sentir os efeitos da mudança de patamar do dólar.

Diz a repoortagem:

A busca por hedge [contratos de compra futura de dólar, por preço fixo, com juro embutido] ficou nítida entre os investidores estrangeiros. No fim de março, eles carregavam uma posição comprada em contratos de dólar futuro de US$ 1,944 bilhão. No fim de abril, essa posição já era 595% maior, de US$ 13,493 bilhões. Na prática, uma posição comprada significa que os investidores travaram um valor para o dólar. Se a moeda americana se valorizar – o que vem ocorrendo nas últimas semanas – quem está comprado em dólar terá ganhos com o movimento ou pelo menos evitará perdas. É a “proteção” contra as oscilações da moeda. 

As empresas exportadoras têm um espaço de compensação na elevação, em reais, dos preços de seus produtos. Mas as que dependem de receitas em real, 65% do total das empresas endividadas em dólar, não têm grande espaço, dada a retração da demanda interna, de acompanhar nem de longe os custos que lhe geram as oscilações do câmbio. Diz o jornal, com dados do BC, que as não exportadoras sem o “seguro cambial” do hedge são 47% das endividadas em dólar.

O ex-embaixador Rubens Ricúpero, absolutamente conservador, tem uma crise de sinceridade, em O Globo:

(…) penso que o que está acontecendo com a Argentina é a primeira manifestação da tempestade que pode vir por aí, com o aumento da taxa de juros. Na economia mundial, desde que houve a crise de 2008, temos vivido uma situação anômala. Nos países desenvolvidos, como os Estados Unidos e os países da União Europeia, as taxas de juros têm sido praticamente zero. Nunca houve isso no passado. As pessoas não investiam nos Estados Unidos e na Europa, porque não tinham retorno. Por isso vinha tanto dinheiro para o Brasil. Mas, agora, isso está acabando. Estamos vivendo o fim de uma era. Não tem mais retorno, porque a inflação começa a aumentar nos EUA. Tudo que o Donald Trump está fazendo, não só em relação ao Irã, mas também na guerra comercial com a China, terá uma incidência negativa nessa turbulência. Não há nenhuma incerteza a respeito de um ponto fundamental: as taxas de juros internacionais vão subir. 

Traduzindo o economês: o dinheiro fácil, com o qual, nem assim, a economia se recuperava, acabou.

Fernando Brito:

View Comments (27)

  • Marolinha ou tsunami? Numa economia onde poucos ganham, enquanto a maioria experimenta queda de renda, do emprego, do consumo numa roda viva que traz baixa atividade industrial e comercial, queda de renda e desemprego. O governo Temer de forma criminosa cortou investimentos e esvaziou os bancos públicos, os verdadeiros colchões de proteção aos desastres cíclicos do capitalismo, sistema que privilegia a acumulação e concentração de renda de poucos e precariza o esforço produtivo de muitos.

    • AGORA É TARDE... A DEMOCRACIA PLENA É UM COLCHÃO IDEOLÓGICO DE ESTABILIDADE DA ESTRUTURA SÓCIO-ECONÔMICA!
      QUEM VAI APOSTAR EM UM SISTEMA POLÍTICO ONDE O FASCISMO NAZI-JUDICIAL DESTRUIU O TECIDO SOCIAL E A DEMOCRACIA?
      STF AGORA JÁ PODE BOTAR AS BARBAS DE MOLHO!
      O GOLPE NAZI-JUDICIAL DEU RUIM... E, O MANTRA KOXINHA DA BLOBO-MOSSACK ERA: TIRA A DILMANTA QUE TUDO MELHORA! TAÍ.... DEU CHABU!
      O CAOS KOXINHA ESTÁ CHEGANDO!

    • A enxurrada de dólares criados a partir do nada pelo FED percorreram o mundo (enquanto os juros americanos estavam no zero) e agora voltam a sua origem. A montanha de capital ficticio (descolado da economia real) volta para casa em busca de rentabilidade e segurança, engordados pelos altos juros dos paises periféricos. Nem precisa dizer que a pressão inflacionária nos EUA vai aumentar e as taxas de juros também e que a periferia vai ficar no seco.

  • Precisamos mais uma vez do Lula para transformar essa crise em " marolinha " . ELEIÇÕES SEM LULA É GOLPE , LULA LIVRE E JÁ " .

  • Ainda "acham" que o sucesso dos governos do PT foram porque o FHC pavimentou o caminho e também pela alta das commodities? Se acham, estão (como sempre) completamente enganados.

    • Commodities? Um país com uma população de 207 milhões de pessoas,commodities não daria para abrigar nem 10 milhões de pessoas, quanto mais 200 milhões.Esses paneleiros ignorantes telespectadores dos Marinhos e Veja, MBL são o motivo dessa NAÇÃO não ter deslanchado ainda.
      LULA LIVRE, LULA PRESIDENTE, BRASIL INDEPENDENTE.

  • FORO PRIVILEGIADO

    Por que mesmo que juíz e promotor ficaram de fora do novo entendimento sobre foro privilegiado? Ah, sim, porque são seres humanos perfeitos, certo?!

    "Os registros de violência de autoria do juiz recém-afastado da Corte Interamericana de Direitos Humanos Roberto de Figueiredo Caldas contra a ex-mulher, a universitária Michella Marys, revelam muito além de fatos isolados ou considerados pontuais."

    https://www.metropoles.com/brasil/audios-ineditos-escancaram-agressoes-de-roberto-caldas-a-ex-mulher

    Hipócritas !!!!!

  • ainda temos reservas? deve ser por descuido dos golpistas

    • O ponteiro, como no tanque de combustível, diz que estamos já na "reserva".

  • A Tempestade Perfeita se aproxima. E com um timoneiro como Temer e um capitão como a Globo, não temos chance. Peguem seus coletes salva-vidas, senhores...

  • Uma das metas do golpe era justamente destruir o empresariado nacional, que será substituído por grandes corporações multinacionais.
    Lembrando que o dono da Dolly foi preso. Logo não veremos mais Dolly no supermercado, para felicidade da Coca-Cola.
    "O importante é que tiramos o PT".

    • O caso da Dolly é emblemático. A empresa, desde o seu início, concorria e tomava mercado da Coca-Cola, tornando-se alvo de todo tipo de medidas para eliminá-la do mercado, inclusive frequentes fiscalizações por parte dos diversos órgãos tributários, numa operação bastante sintomática e direcionada, como a que foi realizada agora. Busca destruir concorrentes e manter quase o monopólio no segmento.

  • Por 20, Fernando. As reservas terminaram em 17 bilhões, sob FHC. O resto era dinheiro do FMI e o Bacen jogou como reserva, mas não podia, óbvio.

  • Agora que foi consultado o espetáculo idealizado pelos golpistas, com a prisão de Lula, os protagonistas já se sentem confortáveis para assumir suas posições

  • Além dos riscos descritos há um outro mais terrível ainda. Com as empresas compradas a esse nível, se ocorrer o crash que alguns economistas importantes anunciam e o dólar desmoronar, aí essas empresas estarão quebradas. "Trombetas do apocalipse" tocando de todos os lados.

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