Quando enfermeiros, técnicos de enfermagem e auxiliares foram chamados a arriscar suas vidas – nem vacina havia – na epidemia da Covid-19, nenhum tribunal achou que o risco de vida daqueles profissionais fosse razão para que eles deixassem de atender a multidão de pacientes infectados.
Mas quando se promulga uma lei que lhes dá um salário que nada tem de “marajaico” – R$ 4.750 para enfermeiros graduados e dois salários mínimos, aproximadamente, para técnicos e auxiliares – o Sr. Luís Roberto Barroso, suspende por pelo menos dois meses a aplicação da lei que daria a estes profissionais uma remuneração ainda modesta mas menos indigna do que o que hoje é praticado, sob o argumento que empresários e entes públicos, tendo que pagar-lhes mais, optariam por demiti-los, colocando em risco o funcionamento dos serviços de saúde.
O Sr. Barroso suspenderá por dois meses as contas de luz, gás, telefone, o condomínio, o IPTU e todos os boletos que estas pessoas têm a pagar? Fixará um “pendura aí” para eles no supermercado e na escola que pagam para os filhos?
Barroso atendeu ao pedido da Confederação Nacional de Saúde que, apesar do nome, é o sindicato das empresas do setor que dizia que estava para ocorrer uma “onda” de demissões no setor, por conta do aumento.
E que isso violaria o direito à Saúde, matéria constitucional, portanto.
Se a recente garantia legal à cobertura dos tratamentos de saúde fora do chamado “rol taxativo” que as mesmas empresas ajuizaram sobre a lei que determina a cobertura de portadores de doenças crônicas e raras pelo planos de saúde cair em suas mãos, por “coerência”, é de esperar que as famílias tenham de deixá-los sem atendimento ou se enforcarem para pagá-los enquanto Sua Excelência decide e isso não vai sangrar os cofres gordos da empresas de seguro.
É que estas empresas, cujos donos circulam pelo jet set do capitalismo não podem sofrer prejuízos, coisa que os trabalhadores mais humildes estão aí para aguentar no lombo.
O dinheiro público que, pela via da renúncia fiscal (porque os planos são pagos, em última análise, pelo dinheiro público, via abatimento do Imposto de Renda) é intocável, mas só pelos trabalhadores.
O Sr. Barroso, tão dócil quando tratou de introduzir as Forças Armadas numa tarefa que não era a sua, a de cuidar da lisura das eleições, sabe ser duro e insensível quando se trata de um reajuste, modestíssimo, a um categoria de profissionais a que o uniforme branco não dá os privilégios do verde-oliva.
E enfraquece a imagem do STF no momento em que o Tribunal mais precisa dela, aí sim, para defender a legalidade constitucional.