Bolsonaro, a maçonaria e o próprio veneno

Nada mais definidor – e assustador – do processo que está usando a fé religiosa como plataforma eleitoral do que a atitude do bispo Samuel Ferreira, da Assembleia de Deus, ontem, ao preparar-se para receber Jair Bolsonaro, de ameaçar a imprensa caso registrasse o encontro:

“”Receberemos aqui algumas autoridades que foram convidadas por nós. Somente esses e membros da igreja podem permanecer aqui. Se algum órgão de imprensa não autorizado estiver presente saiba que está atrapalhando o bom andamento desta assembleia e saiba que pode ser processado por atrapalhar o culto em local que é guardado pela Constituição. […] Esse é um assunto de família”.

Não foi só. Os repórteres Mariana Zylberkan, Carlos Petrocilo e Renan Marra, da Folha, registram que “no momento em que Bolsonaro subiu ao púlpito, seguranças da igreja pediram aos fiéis que desligassem os celulares”.

As igrejas evangélicas, assim, viraram palcos de comícios. E o debate sobre o país – em lugar de ser sobre crise, fome, pobreza – vira maçonaria, satanismo, banho de pipoca e congêneres.

Segundo escreve o comentarista Otávio Guedes, da Globonews, “o termo “maçonaria” ficou durante oito horas no ranking dos 10 assuntos mais comentados no Twitter mundial. Sim, mundial. “Bolsonaro satanista” também ficou quatro horas como o assunto mais comentado no mundo todo. Segundo levantamento do analista de dados de redes sociais Pedro Barciela, as palavras “maçonaria” e “Bolsonaro” foram as mais buscadas ontem no Google, no Brasil”.

Sim, Bolsonaro até provou um pouco do seu próprio veneno, com esta história aloprada da maçonaria. Sentiu o golpe, é verdade, mas não será aí que vai colher a derrota.

Por mais que haja quem vote abduzido pelas maluquices que eles espalham – terra plana, vacina-jacaré, kit-gay, fechar igrejas, etc – Lula ficou a meros 1,6% da vitória porque, apesar das mentiras, existe a vida real: a das dificuldades de morar, de comer, de vestir, de ter saúde, de que seus filhos tenham futuro.

A mentira, com suas pernas curtas, vai ficar para trás e a realidade vai se impor, se não nos deixarmos levar por esta transformação da política em uma espécie de seita.

Foco na vida real é o que importa.

Fernando Brito:
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