Carta aberta a Eros Grau, o homem que ignora a ira dos justos

Senhor Eros Grau,

Desejando, pode processar-me por esta carta aberta.

Tenho certeza que, jurista e ex-ministro do Supremo que é, o processo será justo e equilibrado e eu, um pé-de-chinelo, terei tando respeito do Judiciário quanto sua ex-Excelência, não é verdade?

Animo-me a escrever porque, como foi certa era pregressa o senhor também  fui  alguém que foi tão inconformado com a ordem vigente que se filiou ao Partido Comunista Brasileiro.

Desta origem comum,  perguntaria se já se lhe vão longe suas ideias de que, independente do Governo, há um poder de classe no aparato estatal – no Judiciário, inclusive – que aplica ou não aplica as regras de que “todos são iguais perante a lei”segundo o lugar que alguém nela ocupa.

Nem mesmo diante da Constituição somos iguais, ex-Excelência.

Vá ver numa vila do Nordeste ou numa favela do Rio se “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- -se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Percorra os 78 itens do artigo 5º da Carta e veja se eles são, de fato, garantidos a todos os brasileiros.

Admita-se que, com a idade, lhe tenha fugido Marx:

Admira-se a justiça capitalista! Quando um proprietário de terras [… é] expropriado […] não se contenta apenas em receber uma indenização integral […] é preciso que ele seja consolado […] com um lucro substancial. O trabalhador, quanto a ele, é jogado na rua com mulher, trastes e filhos” (O Capital, I, XXIX.).

Ou aquele outro “rapaz”, chamado de Hegel pelas sumidades do MP de São Paulo:

“Para o burguês, a lei é sagrada, aí está sua obra, votada com seu acordo para sua proteção e vantagem […] A lei é para [o operário] uma chibata feita pelo burguês à sua intenção”. (Engels, Situação da Calsse Trabalhadora na Inglaterra).

Mas que, ao menos, lhe tenha ficado Rousseau:

As leis criaram novos empecilhos aos pobres e deram novas forças aos ricos […] Elas fizeram de uma hábil usurpação, um direito irrevogável. E, para o proveito de alguns ambiciosos, subjugaram, a partir de então, todo o gênero humano à servidão e à miséria (Discurso sobre a origem da desigualdade)

Ainda assim, não há um de nós, na esquerda, que pregue a sua ruptura, porque boas regras, mesmo declaratórias apenas, são melhores que as más e, mais ainda, do que regra alguma.

Convenhamos, para julgar segundo a letra estrita da lei, bastariam rábulas, com barbaças ou não a lhe emprestarem erudição.

Portanto, quando o senhor diz que “”quem não é criminoso enfrenta com dignidade o devido processo legal, exercendo o direito de provar não ter sido agente de comportamento delituoso”, não só está se desgrudando da realidade como, na prática, obrigando-me a desafiar, com meu único semestre de Direito cursado na UERJ, antepor-me à sua vasta sabedoria jurídica.

Refiro-me à presunção da inocência, princípio universal.

Ninguém tem que provar ” não ter sido agente de comportamento delituoso”. É o contrário. É o acusador, seja mesmo um acusador político, como o é no impeachment, que tem de provar que o foi.

Mesmo neste processo, iniciado por Eduardo Cunha, homem que não lhe merece uma palavra sopesando sua suspeição, precisa existir a formação de culpa. Não é “eu quero cassar a presidenta e isso tem maioria aqui”. Do contrário, estaríamos no parlamentarismo, onde basta a perda da maioria para a derrocada de um governo – aliás também instituído no parlamento, donde a legitimidade para que o parlamento o destitua sem amarras.

O senhor, porém, ultrapassa este absurdo.

Diz que “a conduta tendente a impedir o estrito e rigoroso cumprimento do que dispõe a Constituição do Brasil consubstancia desabrida confissão de prática de crime de responsabilidade pela Presidente da República”. “Cai como uma luva, no caso, a afirmação de que quem não deve não teme. Apenas o delinquente esbraveja, grita, buscando encontrar apoio para evitar que a Constituição seja rigorosamente observada, escusando-se a submeter-se a julgamento perante o Senado Federal”.

Desafio-o publicamente a nominar esta conduta.

Em que se tendeu a ” impedir o estrito e rigoroso cumprimento do que dispõe a Constituição do Brasil”?

Diga-o, caso contrário será uma velhacaria, expediente de quem afirma generalidades por ser incapaz de apontar objetividades.

Do restante, “quem não deve não teme” é expressão que vai à conta do humor no Brasil. Quem deve é que não teme, mostraram a Operação Zelotes e centenas de autuações a gente poderosa, daquelas que têm os nomes na lista do HSBC – ouviu o senhor falar dela? – que devem, devem muito e não temem nada.

Vá para a subida de um morro, o pé de uma favela para ver como funciona o “quem não deve não teme” por lá.  Se o pedreiro Amarildo estivesse neste mundo poderia contar-lhe. Eu sou um homem honesto, ex-Excelência, e se for vítima de uma injustiça, vou esbravejar e gritar e só a tapa e arma me porão numa condução coercitiva ilegítima, sem que eu antes tenha sido convidado a dar explicações.

O senhor sabe, como ex-preso político, a inferioridade de forças de um homem ou de uma mulher honrados, submetidos a violências “em nome da lei”, que  só lhe deixam a insubmissão como forma de afirmar sua dignidade.

Mas não creia o senhor que minha insolência seja dirigida ao antigo ocupante de cargo de ministro do Supremo por estes que o senhor supõe hoje criminosos.

Não, vai ao mais atual, anunciado de boca própria ao portal UOL.

Àquele que se disse, espontaneamente, ao jornalista Fernando Rodrigues, “um soldado” de Aécio Neves.

E que, o tendo dito, não de peja de dar, como ex-ministro e jurista, opiniões que satisfaçam ao seu general.

Não o ofendo, senhor.

São seus atos e palavras que ofendem o que o senhor foi, a serviço daquilo que o senhor se tornou.

 

 

 

 

Fernando Brito:

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  • Não precisava desmoraliza-lo tanto, Brito.
    O que ele disse já o desclassifica. Inexplicavel. Está falido de moral.

  • Caro FB: fino e elegante como sempre. JORNALISTA como sempre. Que bom ler os teus artigos. Todos a quem te apresento adoram você. Essa figura tomou umas decisões esquisitas no STF. Não seria o caso de alguém dar uma verificada? Se processar estou na vaquinha. Forte abraço. A Democracia, o Brasil e a Justiça te agradecem.

  • Caro Fernando,

    Por que a delicadeza com esse cara?...

    É ridículo pensar que ele foi ministro do STF, e, mais, nomeado por Lula no delírio do seu republicanismo!....

    Mas, esse País já teve Jânio Quadros como presidente e prefeito de São Paulo!...

    Pra cima deles!...ÀS ruas contra os canalhas!...

  • Tá explicado o inconformismo com a derrota de 2014!....A casa caiu e o Moro não vai sozinho!....

  • Eu fico impressionado com a incompetência do pt (Lula e Dilma ) na hora de indicar ministros do stf.
    À maioria dos indicados pelo PT cai muito bem aquele trevo de "O principe", de maquiavel, onde ele diz que o ser humano é volúvel e ingrato.

    • Sim Rodrigo. Basta ver o Tóffoli parceiro -pucha saco- do Gilmau. Pode trairismo maior. Mas damos uns descontos...o CARA tendo uma merda gigante -deixada pelo fhc- pra limpar...milhões de miseráveis e esquecidos pra tornar gente...um mundo à conquistar com o País que governava...ainda ter que entender de uma elite de almofadinhas, com a bunda nos livros -e que justo por isto, sabem muito pouco de vida e suor- porque observem, com raras exceções, quando dão seus votos, mais citam os outros, do que tiram algo da mente. No próximo mandato que nós o daremos em 2018, ele -já gato escaldado- deverá cuidar também dos "letrados"...tanto é que o tentam impedir de apenas ser Ministro!

      • Ah...esqueci, quanto ao soldado canastrão Erros de 1º Grau...ele já morreu na batalha...falta só deitar!

  • Erus Bundau Mole, a soldo de Aecio. Realmente Aecioporto vai precisar de muito apoio jurídico e Bundau é um apoio de "peso" uns 50kg só de bunda.

  • No DCM (Diário do Centro do Mundo), talvez na mesma entrevista a Fernando Rodrigues, citada na ilustração do post, Eros Grau disse que não entende porque as pessoas tentam liga-lo ao PT só porque foi indicado ao STF por Lula. Afirma que sempre foi ligado ao PSDB.
    Essa informação, importantíssima, foi escondida pela grande mídia. Pois, com essa informação, fica claro que, como soldado, obedece e segue o roteiro traçado por Aécio e PSDB.
    Palmas para o texto.

  • Impressiona, mesmo o mais cético, as palavras desse senhor: “um soldado” de Aécio Neves.
    Fosse Aécio Neves alguém com uma história de vida pública/privada/acadêmica etc... motivadora de alguma reverência, poderia-se, com enormes ressalvas, situar as palavras ditas pelo sr Eros Grau, como um infeliz elogio.

    Contudo, sabemos, sobretudo graças ao trabalho de pessoas como o Brito, a história do playboy carioca.

    O que leva esse senhor a se rebaixar a tal ponto?
    Quais forças são justificadoras de postura tão abjeta?

    Depois de oferecer-se como "soldado" o velho revira a memória e saca um juridiquês colonial, embebido de senso comum. Numa demonstração, ainda pior, da miséria moral e intelectual do fariseu dos tribunais.

    Os anos de vida servirão ao velho para aflorar sua indigência e viralatice.

  • Devia ter vergonha na cara este senhor de 74 anos. Tendo sido ministro do STF, por obra e desgraça de uma escolha infeliz do ex-presidente Lula, este sujeito se presta a servir à quadrilha que existe no parlamento brasileiro, em nome de um moralismo mais sem moral e canalha. O que será que move estes tipos? Idealismo é que não é, pois suas palavras indicam sede de poder e nenhuma sede de justiça. Como antigo magistrado, deveria pelo menos manter a pose, esforçar-se, pelo menos, para parecer justo, ainda que não tenha sido, como tudo indica. Talvez o valor da pensão dele esteja abaixo do que ele desejaria e ele esteja em busca de novos mimos. Neste caso, bateu na porta certa: Temer, Aécio, Cunha, Serra, Agripino, entre outros, são as melhores escolhas para pessoas como ele. São como almas gêmeas, feitos uns para os outros. Eles se merecem e é bom que se manifestem publicamente, para que o Brasil conheça bem claramente quem são os seus inimigos.

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