Confissão de ‘erro’ no caso do avião é maior derrota do Irã

O reconhecimento oficial de que um disparo de míssil feito pela defesa aérea do próprio Irã foi o causador da queda do Boeing da Ucrânia que havia acabado de levantar voo de Teerã é, até agora, a maior derrota do governo iraniano, interna e externamente.

Externamente, porque o faz, no final das contas, responsável pelos danos mais extensos da recente escalada dos conflitos e traz para si a condenação mundial, que , do contrário, estaria voltada apenas para a agressão aventureira dos EUA.

Além disso, põe em xeque a capacidade iraniana de defender-se, com um mínimo de eficiência, de eventuais ataques externos: afinal, trata-se de um fiasco inadmissível para baterias de mísseis designadas para proteger Teerã e com um alvo muito próximo, que jamais poderia ter gerado um erro tão grosseiro de leitura de seus sistemas de radar.

Grosseiro tanto sob o ponto de vista técnico – proximidade do alvo, tamanho do objeto no sinal de radar, trajetória ascendente – quanto sob o aspecto da coordenação miliar: se era esperada (e devia ser) uma retaliação norte-americana com mísseis, a suspensão do tráfego aéreo era providência mais que obrigatória, deixando a varredura dos radares “limpa” de aeronaves civis.

O presidente do país, Hassan Rouhani, fez um comunicado envergonhado, que prenuncia uma crise dentro do comando militar do país:

Esse doloroso acidente não é algo que pode ser facilmente esquecido. É necessária uma investigação mais aprofundada para identificar todas as causas e raízes desta tragédia e processar os autores deste erro imperdoável e informar o povo honrado do Irã e as famílias das vítimas sobre o assunto. Também é necessário adotar as providências e medidas necessárias para lidar com as fraquezas dos sistemas de defesa do país para garantir que esse desastre nunca se repita.

Repare: o núcleo da mensagem está nas palavras “erro” e “fraquezas”. Duas condições inaceitáveis para um país que se diz capaz e forte militarmente. E a nítida impressão de que haverá uma “degola” dos oficiais responsáveis pela decisão de disparar os mísseis.

Outra conclusão grave, se é verdadeiro – como parece ser – que a liderança política do país demorou dias para saber da verdade é a de que a cumplicidade de seus sistema militar com a origem de um acontecimento grave se superpôs à autoridade do Governo, mantido vários dias em declarações de inocência que, agora, revelaram-se ridículas.

Ficaram, os líderes do governo, no papel de tolos ou, pior, de mentirosos.

O caso vai inibir, em princípio, qualquer outra ação militar do Irã, porque o coloca em uma posição de isolamento bem pouco defensável diante da comunidade internacional.

Curiosa e tragicamente, foi do Irã o disparo mais preciso contra o seu próprio regime.

Fernando Brito:

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  • Se fossem sensatas as pessoas "estratégicas", não deixaria de ser um argumento forte para que ninguém quisesse guerrear com o Irã.

    "Não vamos brincar de míssil hoje, tá?"

    A simpatia antianque não se altera; o medo das coisas que podem dar errado, sim.

  • Se fossem sensatas as pessoas "estratégicas", não deixaria de ser um argumento forte para que ninguém quisesse guerrear com o Irã.

    "Não vamos brincar de míssil hoje, tá?"

    A simpatia antianque não se altera; o medo das coisas que podem dar errado, sim.

  • Dentro de toda essa tragédia pelo menos o Irã reconheceu o lamentável erro... ao contrário dos EUA do N que nunca pediram desculpas por abater uma aeronave iraniana sobre o estreiro de Ormuz na manhã de 3 de julho de 1988 como mostrou o DCM em matéria, coincidentemente, uns dias atrás, antes desse triste acontecimento.

    "O navio de guerra chamado USS Vincennes disparou dois mísseis contra um Airbus A300 da Iran Air, eliminando as 290 pessoas a bordo, entre elas 66 crianças.

    O então vice-presidente George Bush (o pai) falou o seguinte na ocasião: “Eu nunca pedirei desculpas pelos EUA. Nunca. Não ligo para os fatos”.

    Os responsáveis nunca foram punidos e ainda foram premiados. O comandante do navio ganhou a prestigiosa medalha da Legião do Mérito e saiu de cena como herói nacional."

    • Sim, ao menos o Irã apurou e reconheceu envergonhadamente o erro, pedindo desculpas. Já os eua nunca reconhecem seus erros e, num fato desses, nunca se saberia o resultado das investigações. A desculpa é sempre em defesa de ataques "terroristas".

    • Concordo e também penso que, face às circunstância, a admissão de erro pelo Irã é a melhor atitude. Na verdade, o Irã tem a vitória moral ao demonstrar não ter um comportamento psicopata, algo que já não se pode dizer dos assassinos de Qasem Soleimani, que evidenciam claros traços de sociopatia/psicopatia. E numa guerra é isto mesmo que acontece, as pessoas é que se tendem a esquecer. Pena que muitos poucos assumam os seus próprios erros...

      • Os mais respeitados sites progressistas do mundo estavam absolutamente convencidos de que o Irã era inocente neste caso, e estava sendo alvo de uma armação difamatória por parte dos Estados Unidos e de seus aliados. Mas o caso ainda não está encerrado. Parece que houve um incêndio que forçou o avião a retornar, e então ele passou de objeto que ia para objeto que vinha em direção a Teerã, e sem registro oficial. Passou de objeto ascendente, como falou o Brito, a objeto descendente que não era oficialmente esperado. E há ainda outras considerações que devem esperar por uma análise mais detalhada. Até a que ponto vai a lealdade governamental dentro do Irã?

    • Vc não lembrou do Jumbo coreano que foi abatido por um caça da extinta União Soviética em 1983.

  • O responsável é quem tinha obrigação e não providenciou a suspensão do tráfego aéreo civil no meio de um conflito militar.

  • O que deu início à sucessão de eventos que culminaram com o erro humano foi o assassinato gratuito do general Soleimani, o maior inimigo do terrorismo no Oriente Médio que estava desembarcando em Bagdá para mediar uma proposta do governo iraquiano para que o Irã e a Arábia Saudita desescalassem as tensões na região. O sionismo (estadunidense e israelense) estava numa política de provocação contra o Irã para promover uma grande guerra no Golfo Pérsico, como queriam (e querem) o complexo industrial-militar e os bancos dos EUA para levantar a cambaleante economia do Grande Satã. Portanto o assassinato de Soleimani deveu-se à missão de paz que ele estava iniciando, a convite do Iraque. Ao assassinato de Soleimani seguiram-se ameaças repetidas do Império, inclusive contra relíquias culturais iranianas, colocando o sistema de defesa do Irã com os nervos à flor da pele:

    https://www.brasil247.com/mundo/russia-condena-ira-e-estados-unidos-por-desatres-com-aviao-ucraniano

    • Dia 13 no mesmo horario tem um voo marcado Teeran Kiev pela mesma companhia. Esta agendado nao confirmado. Cancelado hoje so um p Viena.

  • horrível. civis mortos por incompetência e um erro inaceitável. uma tragédia.

  • É bom o Irã não renovar mais ameaças aos Estados Unidos. O Irã tinha toda a razão. Foi atacado de forma vil e covarde pelos americanos. O assassinato de seu general lhes dava toda a razão. Mas, o Irã perdeu a guerra antes de ela começar. Derrubar um avião civil em seu próprio território é perder todo apoio. Os americanos devem estar rindo à toa. Nem precisaram fazer força. Fim.

  • É bom o Irã não renovar mais ameaças aos Estados Unidos. O Irã tinha toda a razão. Foi atacado de forma vil e covarde pelos americanos. O assassinato de seu general lhes dava toda a razão. Mas, o Irã perdeu a guerra antes de ela começar. Derrubar um avião civil em seu próprio território é perder todo apoio. Os americanos devem estar rindo à toa. Nem precisaram fazer força. Fim.

  • Os EUA matam um número superior a esse diariamente só por ganância.

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