Convicção não é prova, admite Lava Jato. Mas é indício e indício basta.

A Folha publica hoje uma análise onde se indaga, no caso do julgamento do apartamento do Guarujá que a “Força Tarefa” da Lava Jato sustenta ter sido dado a Lula como “comissão” nos contratos da OAS na Petrobras, se  indícios são suficientes para condenar o ex-presidente.

Vale a leitura, mas falta dizer que os indícios existem, neste caso, a partir de uma convicção que nasceu lá atrás, com aqueles três promotores paulistas  que processaram a Folha por chamá-los de “patetas” – que puseram o ex-presidente no “lote” de uma denúncia de malversação  de recursos no acordo que transferiu para a  OAS um conjunto de prédios da cooperativa dos bancários de São Paulo.

Como se sabe, a Justiça arquivou a ação e absolveu os acusados. Menos um: Lula, sacado arbitrariamente do processo para ser submetido ao “tribunal especial” de Curitiba.

Então, as convicções foram se seguindo: se Lula visitou o apartamento, é porque ia ficar com ele. E se ia ficar com ele, claro que não ia comprar, ia ganhar da empreiteira. E se esta empreiteira tinha também contratos com a Petrobras, é lógico que isso era uma paga pelos contratos com a estatal.

E como os dirigentes que roubaram na Petrobras foram designados pelo Conselho de Administração da Empresa e o Conselho de Administração da empresa é nomeado por Lula, é lógico que ele nomeou os diretores para ganhar propina, em especial este apartamento no Guarujá.

Tudo se desenvolveu, durante mais de um ano, no terreno da hipótese e da suposição.

Não apareceu um documento que pudesse indicar que o apartamento foi ou estava sendo transferido para Lula.

Não havia, é óbvio, qualquer proporcionalidade entre contratos de bilhões e um mero apartamento de 240 metros quadrados. Não havia qualquer ligação objetiva entre estes contratos e o benefício alegado.

O que havia, além da visita ao prédio? Recibos de pedágio mostrando que Lula foi duas ou três vezes à baixada santista em cinco anos – certamente menos do que grande parte dos moradores de São Paulo, um porteiro de comportamento esquisito que diz que “todo mundo sabia” que o apartamento era de Lula e muita, muita convicção de que “tinha da ser de Lula”.

Então, à undécima hora, achou-se uma “prova testemunhal”. O ex-executivo da empreiteira, apodrecendo na cadeia, resolve confirmar tudo, apresentando fotos onde tomava “umas cachaças” com Lula e e-mails cheios de anotações de advogados sobre o que devia destacar. Ato contínuo, pediu ao doutor juiz um “desconto” polpudo em sua pena.

Qualquer um que tenha sido repórter de polícia lembra dos tempos em que o “doutor delegado” arranjava alguém, já bem atolado em outros crimes, para “assinar” mais um.

É este o resumo da ópera da “prova indiciária” neste caso, montado desde o início para “pegar o Lula”.

Como diz o promotor aposentado e professor de Processo Penal Afrânio Silva Jardim, escolheram o criminoso e passaram a procurar o crime.

Os promotores dizem que “faltaram explicações convincentes de Lula”, exatamente como definido pelo professor de Direito Penal Nilo Batista: “para quem deseja previamente a condenação do réu, a prova do processo é um mero detalhe” e, aó, passamos à estranha situação de inversão de ônus da prova penal: eu tenho de comprovar que não matei Dana de Tefé ou Odete Roittman.

Este é um processo que tem o final pronto desde o início.

É político. não jurídico e, por isso, tem de ser enfrentado politicamente, mais que por meios jurídicos.

 

Fernando Brito:

View Comments (13)

  • Talvez nem indícios, mas somente "convicções"! Voltando aos tempos medievalescos... Que perseguição política vergonhosa!

  • Se isso que o Lula fez é crime, pode prender toda a população brasileira.
    Visitou o apartamento e pensou em talvez comprá-lo. Cadeia nele!
    Pelo amor de deus!
    É um absurdo tudo isso. E só é possível pela alienação do povo e pela mídia corrupta e vendida que temos.
    Sociedade que aceita a condenação de um dos seus por ter visitado um apartamento em construção e pensado em talvez comprá-lo é uma sociedade tão atrasada que não deve haver outra cosia pior no mundo.

  • Na obra de Kafka, o cidadão acusado por uma estranha forma de justiça envolve-se com promotores, advogados e juiz, num calvário de perseguições sem saber do que esta sendo acusado, recorrendo a pedidos, requerimentos, e coisas do gênero, num desenrolar de peripécias que "não atam nem desatam" e que levam o cidadão à insanidade.
    O relato surreal de Kafka é uma obra de ficção, e qualquer semelhança com o atual estado da justiça brasileira é pura coincidência... ou.. de canalhice.
    O que sucede com Lula já superou ao do ator de "O Processo", o qual não passou por condução coercitiva da sua família e nem na morte da sua esposa ( por perseguição política), nem por investigação da sua vida privada por mais de 40 anos. A vida de Lula será tema para escritores, cineastas, poetas por centenas de anos.

  • Pelo que percebi da reportagem da "falha", querem criar um ambiente favorável à condenação. Danem-se as provas.
    Se a condenação ocorrer, a "falha" estará entrando numa "frias" pois, se a moda pega, um dia poderá ser um de seus diretores que cairão na "frias" que aqueceram.

  • PQP! Qualquer pessoa pode inventar qualquer *narrativa* sobre qualquer pessoa; distorce-se um fato aqui, omite-se outro ali, estica-se outro acolá e pronto. Tem-se uma história da carochinha completa para qualquer gosto. Provas? Ora, provas! Quem precisa de provas quando se tem convicções? Epa, pera lá, o que diz a lei? Cabe, a quem acusa, o ônus da *prova*. Não existe o ônus da convicção e muito menos o ônus do indício (baseado em convicção).

    Esses MOLEQUES da LaVaCu* deveriam ser obrigados a devolver aos cofres públicos os bilhões de reais em prejuízos causados pelo estrago que fizeram na economia do país. Quem vai devolver os empregos de milhões? Quem?

    *LaVaCu = Lava Jato de Curitiba

  • Eu sugiro a defesa ou os blogueiros fazerem o caminho contrário: juntar os mesmos indícios sobre um outro cidadão qualquer e questionar o ministério público.
    Com base nesses indícios é possível "provar" que Moro é dono da revista IstoÉ e da Veja... os mesmos indícios mostram Dallagnol proprietário XP investimentos.
    Aecio Neves deve ser dono de metade de Minas Gerais... Serra é dono até da Suíça...
    Basicamente qualquer cidadão pode ser acusado de ser dono de qualquer coisa se esses indícios forem levados a sério.
    Acho que o sistema de venda de imóveis deve mudar completamente depois desse caso. Ao procurar um imóvel, eu já criei mais indícios contra mim que o Lula. Já inclusive fiquei de posse da chave de apartamentos que não me pertenciam. Espero que a PF não me prenda.
    O MP também está facilitando a vida dos "laranjas". Não será mais necessário passar imóveis para o nome de terceiros. Basta convencer alguém a visitar o imóvel e a transação já se completou.

  • TENHO ABSOLUTA CONVICÇÃO DE QUE LULA, A DESPEITO DOS FORJADOS INDÍCIOS, SERÁ ABSOLVIDO, EM VIRTUDE DE SUA ABSOLUTA INOCÊNCIA.

  • Situação técnica. É efetivamente dono de um imóvel quem registrar o título aquisitivo no cartório competente. Daí, ficam as perguntas: na hipótese de o doutor moro condenar Lula, atribuindo-lhe a propriedade do imóvel, expedirá ele mandado ao cartório determinando o registro do triplex em nome do Lula? Ou obrigará a OAS a “doar” o imóvel ao Lula? Se não ocorrer qualquer das duas hipóteses, Lula será dono, só que não?

  • Esse processo não é jurídico, esse processo é o do Kafka à realidade política brasileira.
    Uma ignomínia chegar onde chegou, sob silêncio obsequioso, covarde e de quem tem lado, das instituições jurídicas brasileiras e seus responsáveis, ao acatarem tamanha irresponsabilidade, que manchará para sempre o mundo jurídico brasileiro, sem que fosse dado até agora sequer um misero pio, por essa "suprema e tão divina gente".
    Uma VERGONHA!

  • Há indícios de tortura, falsificação de provas, cerceamento de defesa... O que traz a convicção de que há perseguição política.

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