Há um inequívoco regresso a tempos de selvageria, no Brasil e no mundo, e ele está associado a um processo, que vem de anos, de destruição da política como forma de representação e afirmação dos grupos sociais.
É o píncaro da obra do neoliberalismo que data do final do século passado e a aceitação da ideia de que a política é um mal, é a corrupção, que os partidos se assemelham – e tudo se faz para que pareçam, mesmo – a quadrilhas.
A ideia de liberdade se reduziu, em todos os campos, a um direito individual que se sobrepõe ao coletivo, inclusive na própria questão sanitária, onde estes grupos começaram recusando as vacinas e, agora, clamam pela liberação ampla, geral e irrestrita de todas as atividades em meio a uma pandemia mortal.
Da mesma forma, a ideia de progresso foi sendo restringida ao sucesso individual, dissolveu-se a ideia de classe, categoria profissional, sindicato, associação e tudo o que pudesse ser o progresso como ganho social.
Em 2013 começamos a colocar em prática de forma expressa esta despolitização da vontade coletiva, quando até na própria esquerda passou-se a louvar a ausência dos partidos e de suas bandeiras nas manifestações, numa demonização da política que, nos anos seguintes, iria demonstrar todo o seu desastroso potencial de nos levar aos agora conhecidos “apolíticos de direita”. Ou de extrema direita.
O resultado é que as manifestações, seja pela infiltração de provocadores (inclusive nas próprias forças policiais fascistizadas) seja pela incontrolável e irresponsável agressividade de algumas de suas periferias acabam deixando margem para que o discurso da lei e da ordem termine por ser invocados contra elas.
Não se deve temer o discurso fácil e descomprometido de que somos todos “antifascistas”, porque somos desde sempre e nada nos confundirá com provocadores e irresponsáveis. Nem mesmo os que tenham “boas intenções” que, como se sabe, lotam o inferno.
Movimentos sociais são do povo, mas se as lideranças do povo são excluídas deles, tornam-se erráticos e contraproducentes, pois legitimam, pela ação de provocadores e de irresponsáveis, o castigo do próprio povo.
O que ocorreu em Curitiba, ao final do ato antiditadura, mostra o perigo de deixar, como deixou-se outras vezes, que a provocação e o conflito, como deseja a direita, sejam a marca dos protestos.
Já nos basta a pandemia para nos tirar da rua, não precisamos de provocadores.
PS. Como se já não bastasse tudo o mais, os tais “anonymus” ressuscitaram.
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Perfeito, Brito.
Prezado Brito, os provocadores são as instituições. Veja-se os EUA: será que o levante popular furioso foi fruto de provocadores? Acho que não, foi fruto de um acúmulo de dor, miséria e sofrimento que explodiu por causa de uma faísca, que foi o brutal assassinato de George Floyd.
Um membro de torcida organizada de São Paulo definiu bem: "somos esquerda, mas não somos da esquerda". Assino embaixo. Eu sou esquerda, mas não sou dessa esquerda que faz "convites" ao golpista FHC, que tem conversas" com o nazi-sionista Luciano Huck.
As bandeiras partidárias se ausentaram voluntariamente dos protestos anti-fascistas, com exceção do PCO. Então, o povo terá que forjar novas lideranças no fogo da luta. PCO sai na frente.
E o que esperar-se mais,de uma realidade,onde a quase totalidade dos CIENTISTAS SOCIAIS,colocam o IMPERIALISMO FINANCEIRO,vulgo,NEOLIBERALISMO,como centro do que chamam, fim dos tempos? E ao mesmo tempo,chamam isso,de SISTÊMICO,e não REGIME?E que a maioria das VITIMAS,creem nisso?E que confundem,por burrice e má intenção,regime com sistema,para esconder que o fazem,somente pra defender os interesses de quem os paga?E que sustentam serem as massas populares,necessárias em sua miséria,como método para manter-se o EQUILÍBRIO SOCIAL,PRIVILEGIANDO AS MINORIAS,que não produzem nada,senão apoderam-se do que ainda se produz,e reduzem toda a atividade econômica,à especulação financeira?E que veem reduzidas suas especulações,NOS TESOUROS dos países,exauridos que estão,em face da não crianção de TRIBUTOS ,incidentes sobre a AUSENTE PRODUÇÃO DE RIQUEZAS,restando então, pura AGIOTAGEM DO QUE NÃO EXISTE MAIS?Então ,chegamos ao FIM DOS TEMPOS? E os especialistas em tudo que existe,passam suas vidas,esperando que a ELITE,lhes jogue pelas janelas,já quase que fechadas,as migalhas do restou dos banquetes ?
Quando vi em Curitiba fotos de pichações da foice e martelo tive certeza de armação .
Para variar, um texto impecável.
É óbvio que em qualquer massa,sempre haverá grupos mais exaltados,mas,todo passa por organizar ,fiscalizar,para tentar diminuir a ação deste grupos.
Mas por outra parte ,como segurar a raiva que hoje habita em inúmeros cidadãos que foram vítimas impotentes do saqueio?????
NÃO TENHO DÚVIDAS PELA MINHA EXPERIÊNCIA,A MAIOR PARTE DOS BADERNEIROS,SÃO OS BANDIDOS DE FARDA MANDANDO SEUS "SOLDADINHOS" A SUJAR O MOVIMENTO DO POVO.
É tambem isso, mas o pessoal da extrema esquerda, especialmente pstu, adoram fazer isso. E eu conheço alguns. Claro que é a esquerda que a direita gosta. Precisariamos quantificar. Quando fizemos os atos em maio do ano passado, pela educação, como as manifestaçoes eram extremamente densas, nao vi nenhum black block;
Desenhar ou pichar, símbolos que remetem a partidos de esquerda em depredações, remetem a ação de black blocks, que são pessoas pagas pelo estado, com a única finalidade de gerar o caos e notícias mentirosas ou distorcidas, pela mídia elitista. É uma arma de desinformação que foi muito empregada em 2013, pela direita.
É triste dizer, mas dificilmente escaparemos da armadilha. Tudo que foi exemplarmente descrito no artigo é uma construção da mídia capitalista, que não será desmontada com facilidade. As grandes lideranças de esquerda terão de mostrar muita inteligência e competência para esclarecer o povo sobre a verdade. A melhor ajuda que recebemos neste momento, para virar esse jogo, é a própria monstruosidade do governo que esse processo nos legou. Mas isso tem de ser mostrado com clareza ao povo.
Se jovens liberais tipo MBL ou o próprio MBL rebatizado tentarem entrar nesse movimento, devem ser repelidos categoricamente. Os trabalhadores e jovens da periferia não precisam de grupos neoliberais aproveitadores para fazer coro! A pauta deles pode até ser também pela democracia, mas é a falsa democracia do poder do deus mercado e manutenção das desigualdades sociais. É necessário marcar posição a favor da pauta dos trabalhadores e não nos deixarmos ser manipulados para que um novo bolsonaro cheiroso e com etiqueta seja alçado à presidência.
Gostei também da avaliação do Leonardo Attuch:
https://www.brasil247.com/blog/manifestos-que-nao-exijam-a-devolucao-dos-direitos-politicos-de-lula-e-a-reparacao-pelo-golpe-de-2016-nao-sao-democraticos