Abstive-me de comentar a demissão de Paulo Nogueira Batista Jr do cargo de diretor brasileiro do Banco dos Brics antes que ele próprio o fizesse. Não acho ético falar sobre o rompimento de um contrato de trabalho se o personagem ainda não disse como e porque ela aconteceu, ainda que, desde o golpe, se tivesse a certeza de que o governo ilegítimo brasileiro não o queria lá.
E não o queria porque Batista é um desenvolvimentista, um homem que alimenta a crença num crescimento harmônico e distributivista de nosso país e que tem coragem de dizer que a “turma da bufunfa” – expressão genial que criou para os donos do dinheiro que, ao contrário, pensam em políticas predatórias e de ganho rápido.
No fundo, afinal, é este o sumo do embate político-econômico do Brasil: crescimento estrutural e com justiça social progressiva (e não apenas prometida) ou predação colonial, financeira inclusive.
Por suas convicções, Batista vai acumulando “saídas” dos lugares onde foi parar pela capacidade como economista e pela sinceridade como cronista: a Folha, o FMI e agora o Banco dos Brics.
Hoje, na Folha, ele conta a história de sua saída, obra de homens que querem um Brasil miúdo, atrasado, capacho. Registro, abaixo, na esperança que , agora, livre das peias que o cargo impunha, ele possa dividir mais conosco suas ideias políticas e econômicas.
Minha demissão do banco dos Brics foi
politicagem, diz Paulo Nogueira
Demitido na semana passada do NBD (Novo Banco de Desenvolvimento), o banco dos Brics, Paulo Nogueira Batista Jr., 62, se diz vítima de “politicagem”.
Em entrevista por e-mail à Folha, como solicitado pelo entrevistado, o economista afirma que limitou-se “a comentar o processo de impeachment”, sem fazer críticas ou elogios à ex-presidente Dilma Rousseff (que foi quem o indicou ao cargo) ou ao sucessor, Michel Temer.
Batista Jr. foi desligado da vice-presidência do banco após um processo interno concluir que ele quebrou as normas ao escrever artigos críticos à política interna do Brasil. Além disso, ele foi acusado de assédio moral por um funcionário brasileiro.
Em artigo de abril do ano passado, o economista escreveu que “impeachment sem configuração de crime de responsabilidade ou de crime comum é golpe”.
“Os defensores do impeachment não estão invocando crime comum. É preciso verificar, então, se têm base as alegações de crime de responsabilidade”, afirmou.
Em julho deste ano criticou a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo juiz Sérgio Moro. “O juiz bateu recordes de desfaçatez”, escreveu.
Segundo Batista Jr., as investigações foram “enviesadas e viciadas, atropelando procedimentos”.
“Por trás de toda história, estava a tentativa de encontrar meios de me acusar de quebra do código de conduta para permitir meu afastamento. Politicagem.”
Procurado, o Ministério da Fazenda informou que não iria comentar. Já o Banco Central afirmou, em nota, que se “trata de assunto interno” do banco dos Brics.
“A demissão foi aprovada pela diretoria da instituição, que é autônoma, e referendada por unanimidade pelos membros do conselho.”
Folha – Acha que foi injustiçado?
Paulo Nogueira Batista Jr – A demissão foi injusta e irregular. Por motivos não inteiramente claros —não quero fazer conjeturas—, alguns integrantes do governo brasileiro, especificamente o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, e um assessor do ministro [Henrique] Meirelles, Marcello Estevão, decidiram encontrar formas de me afastar e pressionaram o presidente do NBD, KV Kamath, que não se destaca pela firmeza ou coragem, a iniciar investigações contra mim. Eu tinha mandato e contrato. Só poderia ser afastado, se rompesse o meu contrato.
Como não havia base ou motivo para argumentar que eu havia desrespeitado o contrato ou o código de conduta, o banco acabou dando um mergulho na arbitrariedade. As investigações foram conduzidas de forma enviesada e viciada, atropelando procedimentos e desrespeitando o vice-presidente brasileiro.
O argumento do NBD é que o sr. desrespeitou normas de conduta do banco ao fazer críticas à política do Brasil.
Não fiz críticas à política interna do Brasil. Nos artigos que publiquei jamais fiz qualquer crítica ao governo Temer ou ao governo Dilma, tampouco fiz elogios. Isso porque uma das obrigações estabelecidas pelo código de conduta do NBD é manter a neutralidade política.
Escrevi poucos artigos sobre a situação política e econômica do Brasil nesses dois anos em que estive na China.
Em um dos artigos que foram considerados impróprios comentei o processo de impeachment então em curso, limitando-me a discorrer sobre os requisitos constitucionais para o impeachment.
O sr. foi indicado pelo Brasil ao NBD. Mesmo sem a missão de ser o representante brasileiro no banco, não excedeu seu mandato ao criticar o chefe do Estado que representa?
Desafiei o advogado que havia sido contratado pelo NBD para investigar os meus artigos —e que me acusava de parcialidade política— a mostrar um exemplo de crítica ao governo Temer ou elogio ao governo anterior. Ele ficou sem resposta.
Cogitou entregar o cargo após o impeachment?
Não. Eu estava muito empenhado no projeto do banco, trabalhando de 9h às 21h todo os dias.
O NBD é uma instituição potencialmente muito importante, pois poderá ser em quatro ou cinco anos um dos maiores bancos multilaterais do mundo, com capital que pode chegar a US$ 13 bilhões se entrarem novos
membros. O Banco Mundial tem US$ 16 bilhões em capital.
Não se deve perder de vista que o NBD é a primeira instituição financeira multilateral, de alcance global, desde Bretton Woods, quando foram criados o FMI e o Banco Mundial. As que foram criadas depois são de âmbito regional ou sub-regional.
Meu envolvimento com o projeto é anterior à criação da instituição, já na fase de negociação do banco e do fundo monetário dos Brics. Participei do processo de cooperação dos Brics desde o início, em 2008. Era um investimento pessoal grande, não tinha por que renunciar.
Quando esteve no FMI, sua opinião provocou controvérsia quando criticou o pacote de austeridade grego.
Eu não tenho receio de ficar isolado. Em certos momentos, eu fui o único dos 24 diretores-executivos do FMI que discordou do programa de austeridade grego —que era um massacre para a Grécia. Acredito que o tempo deu razão aos que, como eu, criticaram desde o começo.
Chegou a tecer opiniões críticas aos demais membros do NBD? A política econômica chinesa desagrada o setor produtivo brasileiro.
Não fiz críticas a outros países-membros. Nos meus dois anos e pouco na China, a minha admiração pelo país só fez crescer. É um país que tem coesão e rumo —coisas que fazem falta ao Brasil. A China é a grande âncora do NBD. Se o banco fracassar, não será por falta de apoio do país hospedeiro.
O sr. é acusado de assédio moral por funcionários.
Eu recomendei a demissão de um funcionário brasileiro que tinha desempenho muito fraco. Ele foi instado a prestar uma queixa de assédio moral e retaliação. A queixa não tinha base, mas serviu para sustar a demissão dele.
A acusação decorre de divergências na indicação de um funcionário. A equipe técnica discordou de seu parecer.
Havia um painel de entrevista para selecionar um profissional para a área de estratégia. O funcionário brasileiro cuja demissão recomendei discordou da minha preferência para a escolha.
Passaram a alegar que eu havia recomendado a sua demissão por mera retaliação. Mas o problema real era o desempenho pífio daquele funcionário.
Por trás de toda essa história, estava a tentativa de encontrar meios de me acusar de quebra do código de conduta para permitir o meu afastamento. Politicagem, em resumo.
O sr. também acusa o presidente do NBD de assédio, poderia relatar o que ocorreu?
Não foi acusação por assédio, foi por quebra da neutralidade política. Estavam me acusando de quebrar a neutralidade política em alguns artigos. Ao me defender dessa acusação, eu mostrei que o presidente do banco, que é indiano, tinha claramente quebrado o código de conduta em entrevistas à imprensa da Índia. Chegou a declarar-se um devoto seguidor do primeiro-ministro. Eu perguntei, com ironia, isso é manter neutralidade política?
Vai tentar algum tipo de recurso para receber uma indenização do banco devido ao seu desligamento antecipado?
Não sei se tenho essa possibilidade. Voltarei ao Brasil
Volte, Paulo. A partir de 2018 precisaremos de gente como você para reerguer este gigante ajoelhado.
http://oglobo.globo.com/videos/v/temer-atende-ao-telefone/6222026
View Comments (10)
Que país será o Brasil de Temer e CIA?
O mandato deste cara iria até 2021 e o Temer não tinha poder algum para demiti-lo (muito menos a CIA). Quem o mandou embora foi a diretoria do Banco dos Brics, porque ele descumpriu as suas normas internas. Nós estamos acostumados a ver folgados como ele e até bandidos condenados criticarem a aplicação das nossas leis, os nossos juízes, a nossa Justiça e a nossa Constituição. Mas no resto do mundo o pessoal leva a coisa mais a sério e essas molecagens têm consequências.
De quebra, cai com ele outra mentira petista:
Aquela de que os BRICS amavam o PT e estavam contra o "golpe".
De fato o Pelego foi vítima de "politicagem"... Mas feita por ele mesmo. Só esqueceu que o banco possui normas. Rodou! Segue o jogo...
Ele ja não teria mais função novo banco de desenvolvimento, porque o Brasil na realidade com esse governo não faz mais tarde do BRICS, apenas no papel, o Brasil não tem mais ação relevante como ator Global, nem mesmo na América do Sul, suas decisões vem de Washington por meio de um Sr insano, que dá ordens por meio do seu canal de comunicações Globo, ao lacaio ladrão a quem eles colocaram como vendedor das nosso patrimônio.
Voltamos a ser o Brasil dos tempos de FHC sendo que naquela época nunca nos haviam convidado a ser membro de coisa alguma a não ser republica bananeira.
Eh.. os santiago dantas, darcy ou jk não temos mais. Melhor valorizar o que temos e temos alguns embora com mais dificuldade em emergir sob o clangor da midia atual que se tornou unissonamente cúmplice.
Bravo Paulo nogueira!
Cara arrétado, brasileiro como poucos, não sei como sempre tive dele a ideia de um Celsinho Furtado, redivivo e corajoso.
Para que precisamoss de um representante no BRICS? O governo golpista vai ter tudo de que que precisa via Trump e o Banco Mundial. E com "assistência" do famigerado FMI. Estamos lascados ao quadrado.
Assim como Fernando Brito, nenhum comentário fiz acerca da demissão do economista Paulo Nogueira Batista Jr., antes que ele se manifestasse. Mas desde que foi anunciada a demissão, eu me lembrei do que ocorreu com o jornalista Ricardo Melo, diretor presidente da EBC, que possuía mandato não coincidente com o de presidente da república e que pela Lei 11.652/2008, de criação da EBC, não poderia ser destituído da função. Após o golpe de Estado, Ricardo Melo foi demitido ilegalmente, entrou com Mandado de Segurança no STF e foi reconduzido ao cargo de Diretor-Presidente da EBC. Mas os golpistas não se deram por satisfeitos e tentaram mudar a Lei por meio de Medida Provisória. Tal estratégia também seria derrubada no STF, pois não havia justificativa de ser urgente. Então os golpistas apresentaram Projeto de Lei modificando a Lei 11.652/2008, extinguindo o conselho Curador (em que representantes da sociedade civil podiam estabelecer diretrizes para a comunicação pública) e transformando a EBC numa insossa empresa de comunicação do governo golpista.
A demissão de Paulo Nogueira Batista Jr. da vice-presidência do NBD (BRICS) guarda enorme semelhança com o caso da EBC e da demissão do Diretor-Presidente da empresa, Jornalista Ricardo Melo.
Certamente a China atendeu ao Temer porque como vendilhão da pátria, está entregando boa parte do patrimônio público a eles, na bacia das almas.
Enquanto isso os coxinhas só sabem falar em comunismo e bolivarianismo, mas não vêem que o nosso capital é cada vez mais vermelho.
O Banco Central do Brasil é brasileiro?
quem o controla?
Acho que o buracos nos BRICS é mais embaixo. B e I são, hoje, marionetes americanas, fato que absolutamente não interessa a R e C.
O "governo, nossa "República de Vichy". vai é tentar colocar algum pau mandado a serviço dos EUA, FMI, etc. no lugar do diretor demitido. Nossa submissão aos ianques não se resume à entrega de riquezas, mas também ao vexatório papel de país-capanga do império.