Drummond e porque deveríamos votar nos EUA

Carlos Drummond de Andrade, que aniversariaria hoje, há 75 anos celebrava com seu poema “Com o russo em Berlim” a imensa solidariedade que, por todo o planeta, sentia-se sobre os soltados que derrubavam, em maio de 1945, definitivamente o regime nazista, com a tomada da capital alemã aos nazistas.

Pois acho que muitos de nós gostariam, nestes dias, de estar com os norte-americanos que, já em mais de 90 milhões, estão votando antecipadamente e – espera-se – a maioria em que se ponha fim a um período de estupidez e desumanidade que, instalado na capital econômica e política do mundo, de lá se espalhou e, em alguns casos, como o nosso, com “franqueados do ódio” como o que temos aqui.

Mas, é certo, não gostaríamos de estar lá apenas por nós, ainda que isso seja verdade.

Queríamos estar lá porque é uma batalha pela humanidade.

Por um mundo em que gente que usava um muro como argumento em defesa da liberdade passou a querer erguer muros pelo egoísmo, pelas crianças e pais separados pelo ódio racial contra os latinos, por vidas importarem sejam de que cor forem (se é que vida tem cor, além de luminosas e sombrias), pelo direito das mulheres de decidirem sobre seus corpos, ou para que não se idolatre o que foi o bordão de Trump nos programas de TV que o projetaram na política: “You’re fired“, “você está demitido”, redução exemplar da ideia da exclusão, do “cancelamento”.

Sim, no fundo queríamos estar decidindo os destinos do mundo onde os destinos do mundo estão sendo decididos.

Mas não estamos lá, como dizia o poeta mineiro sobre Berlim: “Só palavras a dar, só pensamentos /ou nem isso: calados num café“. Ou nem isso, pela pandemia.

Sim, palavras a dar, e esperanças, porque não se pode ver, sem desesperar, a humanidade reduzir-se à barbárie, ao sofrimento e morte pelos sagrados valores do capital.

O importante é abrir a economia, enquanto se fecham caixões, o importante é a saúde do dinheiro, à custa da doença das pessoas: afinal, o que é uma taxa de mortalidade diante de um índice Dow Jones?

A derrota de Trump vai além, muito além de dar aos EUA um governo diferente, é dar ao mundo o direito de ter seus próprios governos, não pastiches da caricatura em que vivem os EUA.

 

 

 

Fernando Brito:
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