Navegando pela imprensa internacional em busca de novidades, me deparo com uma excelente reportagem no New York Times sobre uma possível guinada à esquerda da Alemanha. O título do artigo é: “A Fiscal Scold, Merkel Softens Tone at Home”. Tradução: Linha dura fiscal, Merkel alivia em casa.
Em português ainda mais claro: pimenta nos olhos dos outros é refresco.
A reportagem, assinada por Alison Smale diz que a chanceler alemão, reeleita para seu terceiro mandato (se fosse na América Latina, seria chavismo), vem sinalizando que pode aliviar o rigor fiscal de seu governo, para satisfazer pressões da esquerda alemã, que saiu fortalecida nas últimas eleições.
Entre as medidas que a esquerda vem cobrando de Merkel estão:
1) introdução de um salário mínimo (que ainda não existe na Alemanha) de 11,5 dólares a hora. Num regime de 40 horas semanais, isso dá US$ 1.840 por mês, ou quase R$ 4.000. Nada mal, hein?
2)equalização das aposentadorias e pensões entre oeste e leste do país (o leste, ex-alemanha comunista, é mais pobre); e entre homens e mulheres.
3) Maiores subsídios estatais para crianças.
4) Aumento de impostos para os mais ricos.
5) Forte aumento nos investimentos estatais em infra-estrutura, educação e energia.
6) Aumentar investimentos em países mais pobres da Europa.
Para justificar acusações de hipocrisia, visto que a Alemanha prega severa austeridade no exterior e pode afrouxar internamente, alguns analistas ouvidos pela reportagem vieram com lindas pérolas de cinismo:
“Os alemães dizem para si mesmos: somos uma família, os outros europeis são parentes distantes. Numa família, você fica junto; parentes distantes, você ajuda quando pode”.
De qualquer forma, uma flexibilização da política fiscal alemã, que é a quarta maior economia do mundo, seria bem-vinda, diz a matéria, pelo resto do mundo, sobretudo na própria Europa.
Segundo a reportagem, Merkel se fez politicamente junto ao Partido Democrata Cristão, nos anos 90, o qual ela teria trazido mais à esquerda, num movimento que a ajudou a ganhar as últimas eleições, ocorridas em setembro, nas quais, diz o jornal, os eleitores mostraram vontade de mais políticas de esquerda, mas dirigidas pela chanceler, que é conservadora, em tese.
Esse movimento à esquerda de Merkel se deu, concretamente, através de sua aliança com o partido social democrata, que na Alemanha é realmente social-democrata, ao contrário do nosso PSDB. É mais parecido com o PT. Essa aliança representou, segundo o New York Times, numa guinada ainda mais forte à esquerda num país onde a maioria das pessoas entende que o Estado deve assisti-las em tempo de necessidade e onde a diferença entre ricos e pobres – embora crescendo – é bem menor do que nos EUA ou mesmo na Inglaterra.
Em setembro, o governo alemão arrecadou 55 bilhões de euros, ou 75 bilhões de dólares, mais ou menos R$ 150 bilhões de reais. A dívida soberana do país está em torno de 80% do PIB, muito menor que nos EUA, França e Inglaterra.
Um estudo recente divulgado na Alemanha mostrou que são necessários mais de 135 bilhões de dólares em investimentos, nos próximos 15 anos, apenas para manter a infra-estrutura existente de estradas, pontes, trilhos, os quais, na parte oriental do país tem sido negligenciados há anos.
Lição da história: como sempre, os países ricos da Europa caminham para uma recuperação baseada em grandes investimentos domésticos, além de gastos crescentes em assistência social. Essa é a fórmula não apenas do sucesso econômico da Europa, mas sobretudo de seu sucesso em termos de qualidade de vida oferecida a seus cidadãos.
Enquanto isso, há candidatos a presidente no Brasil que, fingindo-se de modernos, defendem um abstrato e famigerado “tripé econômico” que nada mais é do que a política de tirar dos pobres (cortar programas sociais) para dar aos ricos (aumentar juros).
É algo irônico, mas assustador, descobrir que Angela Merkel pode acabar anos-luz à esquerda de Marina Silva…
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Marina, não me representa.
Tudo demais é veneno, ou seja, pra tirar a Europa do buraco, terão que aprender com o Brasil: Fortalecer a economia interna através de programas sociais, o que gera a inclusão social e doravante o aumento o cosumo interno , gerando emprego e renda...
Paulo José 3 de novembro de 2013 às 19:24
Tudo demais é veneno, ou seja, pra tirar a Europa do buraco, terão que aprender com o Brasil: For?talecer a economia interna através de programas sociais, o que gera a inclusão social e doravante o aumento o cosumo interno , gerando emprego e renda…
Continuo achando que o Estado tem obrigações com seus filhos por direito adquirido em Lei. Aposentadoria e saúde é apenas um reflexo do trabalho que o jovem prestou ao pais que comeu o file e se recusa a roer os ossos.
Eles já combinaram com o Chirico?
Vamos, todo mundo pra Paris!
Vamos, todo mundo pra Paris!
Vamos, todo mundo pra Paris!
Alguém duvida do desespero em pegar a comi$$ão pelas obras, para "fortalecer" a campanha eleitoral que se avizinha?
Eu que faltou só ele dizer que pra ser chique e elegance total, no caso dele, faltou ele revelar que também "queima a rosca"...