Esqueçam a Justiça e a mídia. Lula tem de se defender na política

Como facilmente era antevisto ontem, os jornais de hoje publicam a chamada, com alguns acréscimos: “Lula admite ter ido ver apartamento”.

“Admite” é uma versão mal disfarçada de “confessa”, que é o sentido que a palavra tem ali.

Mas usar “confessa” seria evidenciar o absurdo e o nonsense do que se está fazendo: criminalizar o que não é, nem nunca foi, crime: ver, pretender comprar, eventualmente comprar aquilo que desejar e pelo qual puder pagar. E com seu dinheiro, pois ex-presidente sequer pensão pelo cargo recebe, o que é outra distorção moralista ao revés, pois não lhe permite a opção de não ter atividade remunerada por empresas ou instituições privadas.

No caso de Lula, chega-se ao absurdo de criminalizar idas a um sítio e até um barquinho de lata vira “sinal” de favorecimento indevido.

Ontem, Lula chegou ao extremo de transparência que um homem tem a seu alcance: exibiu, sem ser obrigado, sua declaração de bens à Receita Federal.

Não adianta.

Convence, com isso, apenas as pessoas que estão fora da “onda” criminalizante que despejam sobre ele. A mídia, a quem caberia esclarecer com base nos fatos e nos documentos apresentados, faz o inverso: trata tudo como “confissão”, “admissão de culpa”.

Culpa de quê? Não importa, culpa.

Se não for disso, é daquilo; se não for daquilo também, alguma achar-se-á.

Não é preciso provas e nem sequer lógica no fato de que se trata de um bem ao alcance de quem teve oito anos o salário de Presidente (R$ 35 mil, hoje), quem tem aposentadoria, que recebeu, depois de deixar a Presidência, como dirigente do PT e que se dedicou à única que parece ser a atividade possível a ex-mandatários do País: o mercado de palestras.

Quem tiver dúvidas, leia a avaliação de George Legmann, que respondia (não sei se ainda o faz) pela organização das palestras do tucano:

(…)Lula deve ganhar R$ 200 mil a cada apresentação de uma hora no Brasil, e R$ 300 mil quando falar no exterior, considerando que são esses os valores médios pagos a a ex-presidentes e grandes nomes de organismos internacionais ou CEOs de multinacionais na área de tecnologia.(…)Legmann revelou ao GLOBO que FHC ganha R$ 180 mil com palestras no país, e cerca de US$ 170 mil (aproximadamente R$ 300 mil) ao falar nos Estados Unidos ou Europa.

Verifique que os valores estimados pelo “empresário” de FHC são de janeiro de 2011 e que, até por sua posição, ele não poderia valorar com equilíbrio as diferenças de prestígio entre um e outro presidente.

Embora não o seja mais, porém, a “culpa” do Lula é ser “um pobre” e um pobre não pode comprar um apartamento que não vale nem a metade (e olhe lá) de só um dos dois que pertencem a Aécio Neves, embora este nunca tenha tido um emprego privado na vida.

Não pode comprar um bote de lata para pescar no lago de um sítio, embora o outro possa fazer, com a aprovação do Ministério Público, um aeroporto com o dinheiro do Governo de Minas Gerais para ir de avião à fazenda da família.

Reside aí o grande crime de Lula, não ter entendido que é e será sempre maldito para a mídia e a elite brasileira. Pode até ser tolerado, jamais respeitado e , quando lhes é possível – e a Lava Jato o tornou – será apontado como execrável aos urros de uma classe média emburrecida, comedores de migalhas que desprezam os famintos.

Pobre não pode ter apartamento que não seja na periferia, não pode ter carro para não engarrafar as ruas, não pode dar aos aeroportos um clima de rodoviária.

É como escreveu, ontem, o professor Flávio de Castro, da UFMG, arquiteto e homem afeito, portanto, às questões da estética no sentido filosófico, dos sentimentos que alguma coisa bela (e, por oposição, também as “feias”) desperta dentro de cada indivíduo.

Lula carregando uma caixa de isopor e sendo dono de um barco de lata é uma cômica farofa. Se FHC carregasse uma caixa de isopor e fosse dono de um barco de lata seria uma concessão à humildade.
A questão é classista.
Um Odebrecht sentado à mesa com FHC é um empresário rico. O mesmo Odebrecht sentado à mesa com Lula é um pagador de propina.

Está aí a raiz da questão e, por isso, a forma pela qual tem de ser enfrentada. Não temos uma imprensa ou um judiciário com o senso de isenção mínimo suficiente para jogar no lixo o que lixo é.

Não, o que temos é uma matilha, em parte ávida de sangue e em parte lívida de medo de também ser atingida pelas presas dos que rosnam e mostram os dentes.

A luta tem que se dar no campo onde eles, apesar de toda a sua força e poder, jamais conseguiram subjugar completamente o povo deste país: na política.

Porque passou da hora de entender que, embora sem descuidar – como fizeram tanto tempo – das respostas judiciais à detratação e aos abusos, é na política que se pode encontrar como juiz o povo, o povo pobre que, instintivamente sabe como embora não saiba a diferença entre Guarujá, Leblon e Higienópolis, sabe e sente a diferença de representação que têm Lula, Aécio e FHC.

Não esperem – como faz, preguiçosa e repetidamente o PT – que esta onda se quebre e vire espuma naturalmente. Não vai virar, senão oferecermos o peito ao choque e ao embate do mar de armações.

É como se diz na primeira cena de A tempestade, de Shakespeare: “Permanecei nos camarotes; estais mas é ajudando a tempestade.”

 

 

 

Fernando Brito:

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  • “Aqui pra ‘nois’, para que ninguém nos ouça!”

    Manhã de segunda-feira (01 de fevereiro de 2016), tapei as narinas, e fiz uma, digamos, varreduras nas ‘manchetonas’ nazifasciterroristas da ‘Foia’ dos Frias da puta!

    RESCALDO:
    não se fala “nem no iate, nem tampouco na ‘mansão’ do Lula”!
    Muito menos no Merendão do “Picolé de Chuchu”!
    Mais tarde, “voltarão o iate e a ‘mansão’ do Lula”!
    Quiçá também a suposta compra de um latifúndio no Planeta X!
    [“Dona Marisa Letícia deve gostar de aventuras!”]
    Por outro lado, o Merendão do DEMoTucano “Picolé de Chuchu” continuará ‘vazado’ para os Quintos dos Infernos do esquecimento do ‘CU(nha)’ do ‘Aécio El Chato Furnas Forever’!

    Mas, para não fugir por demais do script golpista, por ora temos [mais] uma fofoquinha e [mais] um factoide [um tanto envergonhado]!

    Primeiro, a fofoquinha

    ‘Tensão no Planalto
    Dilma cogitou deixar PT no auge da crise, no fim do ano passado’

    O factoide

    'Para vender caças, lobista prometeu investimento em berço político de Lula'

    EM TEMPO:
    em relação ao factoide envergonhado, melhor seria afirmar:
    Para vender caças, lobista prometeu investimento em berço [de ouro!] do neto do Lula. Ou, talvez, Para vender caças, lobista prometeu investimento em berço [de ouro!] da neta do Lula.

    RESCALDO:
    lá isso é jornalismo?!
    Lá isso é oPÓsição, siô?!

    • ... Quando, deliberadamente, se quer porque quer acusar/incriminar alguém, o processo se transforma numa, digamos, peneira!
      Franz Kafka – e o ‘desMOROlizado’- que o digam!

  • Quando a mídia golpeia a verdade com fins eleitorais, por Jota A. Botelho
    ‘Goebbels disse em seus diários que as massas são muito mais primitivas do que nós imaginamos. A propaganda deve ser essencialmente simples, baseada na técnica da repetição. No entanto, a técnica moderna, ensinadas pelas empresas de publicidade americanas, devem ter uma única proposição de venda, uma proposta de verdade original’.
    (Giancarlo Bizanti/Gian Maria Volonté, editor-chefe do Il Giornale)
    Sbatti il mostro in prima pagina (Golpear o monstro na primeira página, tradução livre), filme de 1972, dirigido por Marco Bellocchio e estrelado por Gian Maria Volonté, destaca as relações estreitas entre imprensa, política e aplicação da lei. O filme narra como um grande jornal – ou uma rede de jornais, porque não? – pode manipular a informação pública e os desdobramentos dos eventos em si, para tentar induzir uma reação específica no eleitorado.
    (…)

    FONTE [LÍMPIDA!]: http://jornalggn.com.br/blog/jota-a-botelho/quando-a-midia-golpeia-a-verdade-com-fins-eleitorais-por-jota-a-botelho

    • E infelizmente está dando resultado. Mesmo com obvio a frente do nariz fica difícil desfazer, tento todos os dias, mas aqui nas minhas bandas, como se diz na minha periferia: "tá tudo dominado"!

  • Ocorre que com Lula há um outro modo de fazer política, com participação popular, mostrando que um sonho tão generoso não se deixar matar assim tão facilmente: o de um Brasil menos malvado, mais digno, justo pacífico. As classes dirigentes, por 500 anos, no dizer rude de Capistrano de Abreu, “castraram e recastraram, caparam e recaparam” o povo brasileiro. Há maior corrupção histórica do que esta? (leonardo Boff). É isso que esses bastardos não perdoam.

  • Perfeito mais uma vez. A História também não deixará que a mídia e os agentes públicos da lei partidarizados e parciais escapem de seu julgamento - em futuro quando o país sair desta sanidade verão que o que se faz hoje com Lula é insano.

    • corrigindo: em um futuro próximo, quando o país sair desta falta de sanidade, verão que o que se faz hoje com Lula é insano.*

  • Repetindo o que já disse nesse nosso Tijolaço, aproveitando a máxima da política americana: É a POLÍTICA, estúpidos!
    Primeira ação, apontar às caras com que o inimigo se apresenta para operar seu terrorismo da desinformação e o seletivismo da justiça do NÃO VEM AO CASO, em cadeia de rádio e tv, e a partir daí contrapor-se ao programa de propaganda oficial do inimigo, o JN, pouco importando o que acha ou deixa de achar a camarilha inimiga, com ou sem panelas.
    De imediato, promover o inútil da justiça a chefe de ordenança da presidente, trocando-o por Tarso e chamando Franklin para comandar a SECOM.

  • Observamos que exasperação chegou ao clímax com a entrevista do Lula aos Blogs alternativos recentemente. Naquele instante eles perceberam que Lula é imbatível se for para o palanque, tem chances reais de se reeleger, porque ele fala ao povo. A oposição não tem proposta, projeto, nem rumo e nem candidato p/ se rivalizar. Partiram para a desconstrução de um cidadão de bem. A resposta de Lula será o confronto na política ( ele diz que gosta de ser desafiado) e que se iniciará com a eleição de Haddad.

  • Sou contra qualquer tipo de violência, mas que esses veículos de imprensa malditos depois não reclamem se a fúria do povo voltar-se contra eles. O que estão fazendo com o Lula é inominável, parece uma cena escatológica saída da época do nazismo. O próximo passo do juiz fascista e de seus procuradores amestrados e policiais partidários será criminalizar aqueles que votaram e votam no PT, talvez arrancando delações de favorecimentos em troca do voto. Se esses canalhas pensam que podem botar o Lula atrás das grades sem provas e que vai ficar por isso mesmo, eles que abram os olhos pois a fúria do povo vai caçar esses ratos um a um.

  • Falo e repito para os mais novos. Esta mídia vil foi, é, e sempre será assim. Não adianta comemorar nada. Público e privado combinam. É um verdadeiro conluio. Toda vez que Lula se defende com a verdade e foi o caso de ontem, eles vêm muito mais enraivecidos. Na verdade, se pudessem, fariam picadinho do Lula, tamanho é o ódio que essa gente nutre pelo ex-presidente. O que falta ao Brasil é um grupo de pessoas corajosas para enfrentar essa facção.

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