Kátia Abreu, a vermelha

Do blog de Juremir Machado, no Correio do Povo, de Porto Alegre:

Kátia Abreu é mulher de faca na bota. Enquadrou José Serra quando este lhe dirigiu umas gracinhas. Na última terça-feira, ela jogou uma boa dose de verdade na cara dos seus colegas senadores: “Nós estamos vivendo aqui uma farsa. O inadmissível. E não vejo ninguém dizer da corrupção no governo da Dilma: foi ela sozinha ou foram todos os partidos que mamaram, sugaram esse governo durante cinco anos e agora estão do outro lado da mesa pedindo o impeachment da própria?” Seria Kátia Abreu uma petralha em pele de ruralista?

Uma sequência de fatos desmascara a farsa do impeachment: se era um combate à corrupção, como se justifica que o governo de Michel Temer seja campeão em ministros citados por delatores, investigados por delitos ou réus em algum processo? Três caíram no primeiro mês. Um deles, Romero Jucá, foi premiado com a eleição para segundo vice-presidente do Senado. Dilma não pode ser julgada pelo “conjunto da obra”, pois isso não está na regra do jogo nem nos autos do processo. O próprio Temer já apareceu duas vezes em relatos da Lava Jato. Incompetência e má gestão não são crimes de responsabilidade. A perícia do Senado não encontrou as impressões digitais da presidente nas pedaladas, que se esboroaram como razão jurídica para a saída.

A senadora Rose de Freitas (PMDB), líder do governo no Congresso Nacional, confessou que não houve “esse negócio de pedaladas”, mas sim um país parado. O ministro Osmar Terra admitiu que o fundamental para o afastamento foi a crise econômica. O ministro do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, responsável pela ideia de que as pedaladas deveriam ser consideradas crimes de responsabilidade, declarou que elas não são importantes para o impeachment, mas sim os decretos de suplementação orçamentária.

A perícia destacou que os organismos responsáveis não alertaram a presidente. O Congresso Nacional validou, no final de 2015, a alteração na meta fiscal promovida pelos decretos. Arrependeu-se?

Os decretos alteraram a meta das economias a serem feitas para bancar juros a credores internacionais conhecidos pela agiotagem. O PMDB, cúmplice do PT no saque a Petrobrás, tomou o poder com seus caciques atolados na Lava Jato. Romero Jucá foi flagrado em gravação querendo “estancar a sangria” liquidando a Lava Jato. As panelas não bateram contra ele. As pedaladas não contam mais. A corrupção não está no processo em julgamento e jamais foi provada qualquer participação direta da presidente em crimes. Arrogância não é motivo para destituição. Conjunto da obra só garante distinção no Oscar. O impeachment revela-se, cada vez mais, como uma armação sustentada como um pretexto vago para trocar o governo por insatisfação com seu desempenho.

Baixa popularidade também não acarreta destituição.

O impeachment é um golpe que pode ser explicado com uma imagem esportiva: a regra do jogo só permite expulsar por falta violenta, mão na bola para impedir o gol, não sendo goleiro, ou ofensa grave ao árbitro. Mas, este, contrariando o escrito, resolveu expulsar um jogador por entender que ele estava atuando mal, atrapalhando os outros, truncando a partida, comprometendo o espetáculo, comportando-se com arrogância e arrancando vaias da torcida já em retirada.

– Era preciso fazer alguma coisa para virar o jogo – diz.

Luís Roberto Barroso, ministro do STF, observou que o Supremo legitimou “um pouco” o impeachment ao normatizar o seu ritual. Mas não tudo. O mérito, a prova da prova, ficou em aberto. Qual era o jogo? A regra. Julgar e condenar pela mesma regra, conforme a mesma acusação. O resto é trapaça. Eis a grande farsa do golpe legalizado. A senador Kátia Abreu deu nome aos bois: “Eu gostaria muito de ver também na boca de algumas pessoas por aqui a fraude dos R$ 170 bilhões para guardar R$ 50 bilhões para garantir o impeachment, também nós poderíamos citar isso aqui”. Temer inflou o déficit previsto pelo governo Dilma para poder gastar mais na conta da presidente deposta. Um truque com a impressão digital do PMDB.

Na coluna da Taline Oppitz, nesta semana, um quadro de filme de terror: Michel Temer pretenderia acabar com o bolsa-família em 2017, desvincular aposentadorias do salário mínimo, mexer radicalmente na previdência, diminuir jornadas de trabalho e salários de funcionários públicos e por fim à estabilidade do funcionalismo. Em países onde reinam as modernas condições de acumulação democrática, um projeto desse porte exigiria alta legitimidade obtida nas urnas. Temer garante que não está pensando eleitoralmente. Faz sentido. Não foi eleito. Nem será.

Pode se dar o luxo de propor medidas de exceção.

FHC, em entrevista para a rede Al Jazeera, admitiu que os deputados podem ter votado o impeachment por oportunismo. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, parte do PSDB não parece disposta a cassar Eduardo Cunha em homenagem aos serviços prestados por ele ao impeachment. E a corrupção de Cunha? Como diria o outro, não vem ao caso. Michel Temer tirou a urgência de um projeto de combate à corrupção. Um presidente cair por ter economizado menos do que o prometido para pagamento de juros a agiotas é mais uma jabuticaba.

Só no Brasil.

Falar assim é coisa de comunistas como Kátia Abreu.

Essa mulher é um perigo vermelho.

Basta olhar o seu batom.

Fernando Brito:

View Comments (33)

  • É uma pessoa decente da direita. Não é um Caiado nem um Serra. Só isso.

    Seriedade no Lixão do Congresso destoa, não é?

  • Kátia Abreu demonstra cabalmente que a descência e a fidelidade a princípios independem da coloração politico-partidário. A cidadã Kátia Abreu conquistou meu respeito.

  • FAUZI ACHOA: você é o que na Mackenzie? Professor? Aluno?
    Só para esclarecer: verbo "deixar" é com X.
    O que mais posso dizer?

    • Tu leste o post? Algo a dizer sobre o que escreveu Juremir? Não? Claro, tu és um PATETA ESTATIZADO DO TEMER!

  • "Estou probta para ser a vice de Serra" diz Katia Abreu.

    Revista Terra 10/04/2010

    • E daí? Isso impede de uma pessoa enxergar e mostrar a verdade dos fatos? E sobre os fatos citados pelo Juremir, algo a escrever?~
      Não?
      Claro, tu és um PATETA ESTATIZADO DO TEMER!

  • Foi a minha grande surpresa no governo Dilma. Quando de sua nomeação como ministra, fiquei enfurecida contra Dilma e o PT. Onde estariam com a cabeça ao chamar a miss motosserra para governar com eles? Pois ela provou que a Dilma estava certa. Raríssimo ver uma liderança da direita, ainda mais no setor ruralista, um dos mais atrasados em termos democráticos, defender com unhas e dentes aquilo em que acredita, peitar seus próprios correligionários e manter a lealdade a toda prova. É difícil enfrentar inimigos mas é ainda mais difícil enfrentar os próprios amigos. Sinal de que a pluralidade democrática precisa de mais gente como Kátia: capaz de reconhecer honestidade e defende-la com bravura, independente do lado de onde venha. Ao contrário de tantos e tantos "ditos de esquerda" que se esconderam embaixo das mesas do Planalto na hora da onça beber água.

    • Pois é. Algo que cheirava a indicação fisiológica acabou se mostrando muito positiva! Katia Abreu, ruralista, auto-declarada a favor do liberalismo econômico é a que mais intransigentemente defendeu o mandato legítimo da Dilma, contra os interesses escrotos do partido ao qual ela pertence. Mais intransigente e contundente do que o PT, o que não faz sentido sob nenhuma ótica, mas é a verdade.

    • Ela se tornou amiga pessoal de Dilma. Isso fez a diferença. Não mudou seu modo ruralista de pensar ou deixou de ser megalatifundiária.

    • Mais precisamente" neopente costais " . Sabemos que gran de parte dos Protestantes são sinceros , leais , honestos , es clarecidos e bons . São estes verdadeiramente Cristãos. Os neopent se dizem evangélicos quase que com exclusividade. Qualquer um que leia Os Evan gelhos, que analise e observe, mas acima de tudo - ponha em prática - seus ensinament os , é um homem/mulher evan gelhizado. Há muita gente qu e que se diz atéia, que contud o vivencia-O. Rótulos servem para identificar e quando troc ados podem levar ao envene namento.

  • A Senadora Kátia Abreu tem tido um comportamento digníssimo com o Governo da Dilma e com a própria Presidenta, num mundo onde políticos só pensam em si e traem sem fazer cerimônia, ela se coloca ao lado da Presidenta e defende seu Governo, até mais quem muitos políticos que se dizem progressistas. Que seja louvada essa atitude da Senadora Kátia Abreu, ela nos mostra que tem caráter e que isso é possível na política, mesmo tendo posições ideológicas diferentes da Presidenta, do PT e da esquerda em geral.

  • Katia Abreu virar heroína da esquerda é um sinal claro de falta de bons quadros. Preocupante...

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