Mangabeira Unger : Dilma e Aécio, quais são as diferenças?

O professor Roberto Mangabeira Unger escreve hoje na Folha um artigo em que elenca, de forma didática e sucinta, as diferenças de programa entre Dilma Rousseff e Aécio Neves.

É pena que o debate eleitoral, despolitizado por uma onda histérica de acusações e manipulações esteja impedindo que muita gente trate destas que serão as opções reais que nosso país irá fazer.

Porque Mangabeira não é um governista incondicional, como muito menos o é o professor e ex-ministro Luís Carlos Bresser Pereira, que também manifestou seu voto em Dilma embora com muitas críticas à situação econômica.

Como disse em outro post, não estamos diante de uma campanha eleitoral democrática, onde se discutem propostas e caminhos, mas em meio a uma marcha de tomada de poder com o uso da mídia, da Justiça e das instituições em geral para criar um clima de insanidade que, deploravelmente, não pode ser combatido com luvas de pelica.

De qualquer forma, é boa leitura e ajuda a compreender, bem claramente, as direçoes em que o país irá se mover.

Em tese, claro, porque a voracidade do conservadorismo está tão acerba que uma vitória pode gerar um “esparramo” de medidas duras, precipitando uma crise social e econômica  que seria um verdadeiro pesadelo para este país.

Por que votar em Dilma?

Roberto Mangabeira Unger

 O povo brasileiro escolherá em 26 de outubro entre dois caminhos.

As duas candidaturas compartilham três compromissos fundamentais, além do compromisso maior com a democracia: estabilidade macroeconômica, inclusão social e combate à corrupção. Diferem na maneira de entender os fins e os meios. Diz-se que a candidatura Aécio privilegia estabilidade macroeconômica sobre inclusão social e que a candidatura Dilma faz o inverso. Esta leitura trivializa a diferença.

Duas circunstâncias definem o quadro em que se dá o embate. A primeira circunstância é o esgotamento do modelo de crescimento econômico no país. Este modelo está baseado em dois pilares: a ampliação de acesso aos bens de consumo em massa e a produção e exportação de bens agropecuários e minerais, pouco transformados. Os dois pilares estão ligados: a popularização do consumo foi facilitada pela apreciação cambial, por sua vez possibilitada pela alta no preço daqueles bens. Tomo por dado que o Brasil não pode mais avançar deste jeito.

A segunda circunstância é a exigência, por milhões que alcançaram padrões mais altos de consumo, de serviços públicos necessários a uma vida decente e fecunda. Quantidade não basta; exige-se qualidade.

As duas circunstâncias estão ligadas reciprocamente. Sem crescimento econômico, fica difícil prover serviços públicos de qualidade. Sem capacitar as pessoas, por meio do acesso a bens públicos, fica difícil organizar novo padrão de crescimento.

O país tem de escolher entre duas maneiras de reagir. Descrevo-as sumariamente interpretando as mensagens abafadas pelos ruídos da campanha. Ficará claro onde está o interesse das maiorias. O contraste que traço é complicado demais para servir de arma eleitoral. Não importa: a democracia ensina o cidadão a perceber quem está do lado de quem.

1. Crescimento econômico. Realismo fiscal e manutenção do sacrifício consequente são pontos compartilhados pelas duas propostas. Aécio: Ganhar a confiança dos investidores nacionais e estrangeiros. Restringir subsídios. Encolher o Estado. Só trará o crescimento de volta quando houver nova onda de dinheiro fácil no mundo. Dilma: Induzir queda dos juros e do câmbio, contra os interesses dos financistas e rentistas, sem, contudo, render-se ao populismo cambial. Usar o investimento público para abrir caminho ao investimento privado em época de desconfiança e endividamento. Apostar mais no efeito do investimento sobre a demanda do que no efeito da demanda sobre o investimento.

Construir canais para canalizar a poupança de longo prazo ao investimento de longo prazo. Fortalecer o poder estratégico do Estado para ampliar o acesso das pequenas e médias empresas às práticas, às tecnologias e aos conhecimentos avançados. Dar primazia aos interesses da produção e do trabalho. Se há parte do Brasil onde este compromisso deve calar fundo, é São Paulo.

2. Capital e trabalho. Aécio: Flexibilizar as relações de trabalho para tornar mais fácil demitir e contratar. Dilma: Criar regime jurídico para proteger a maioria precarizada, cada vez mais em situações de trabalho temporário ou terceirizado. Imprensado entre economias de trabalho barato e economias de produtividade alta, o Brasil precisa sair por escalada de produtividade. Não prosperará como uma China com menos gente.

3. Serviços públicos. Aécio: Focar o investimento em serviços públicos nos mais pobres e obrigar a classe média, em nome da justiça e da eficiência, a arcar com parte do que ela custa ao Estado. Dilma: Insistir na universalidade dos serviços, sobretudo de educação e saúde, e fazer com que os trabalhadores e a classe média se juntem na defesa deles. Na saúde, fazer do SUS uma rede de especialistas e de especialidades, não apenas de serviço básico. E impedir que a minoria que está nos planos seja subsidiada pela maioria que está no SUS. Na segurança, unir as polícias entre si e com as comunidades. Crime desaba com presença policial e organização comunitária. A partir daí, encontrar maneiras para engajar a população, junto do Estado, na qualificação dos serviços de saúde, educação e segurança.

4. Educação. Aécio: Adotar práticas empresariais para melhorar, pouco a pouco, o desempenho das escolas, medido pelas provas internacionais, com o objetivo de formar força de trabalho mais capaz.Dilma: A onda da universalização do ensino terá de ser seguida pela onda da qualificação. Acesso e qualidade só valem juntos. Prática empresarial, porém, tem horizonte curto e não resolve. Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia indicam o caminho: substituir decoreba por ensino analítico. E juntar o ensino geral ao ensino profissionalizante em vez de separá-los. Construir, do fundamental ao superior, escolas de referência. A partir delas, trabalhar com Estados e municípios para mudar a maneira de aprender e ensinar.

5. Política regional. Aécio: Política para região atrasada é resquício do nacional-desenvolvimentismo. Tudo o que se pode fazer é conceder incentivos às regiões atrasadas. Dilma: Política regional é onde a nova estratégia nacional de desenvolvimento toca o chão. Não é para compensar o atraso; é para construir vanguardas. Projeto de empreendedorismo emergente para o Nordeste e de desenvolvimento sustentável para a Amazônia representam experimentos com o futuro nacional.

6. Política exterior. Aécio: Conduzir política exterior de resultados, quer dizer, de vantagem comerciais. E evitar brigar com quem manda. Dilma: Unir a América do Sul. Lutar para tornar a ordem mundial de segurança e de comércio mais hospitaleira às alternativas de desenvolvimento nacional. E, num movimento em sentido contrário, entender-nos com os EUA, inclusive porque temos interesse comum em nos resguardar contra o poderio crescente da China. Política exterior é ramo da política, não do comércio. Poder conta mais do que dinheiro.

7. Forças Armadas. Aécio: O Brasil não precisa armar-se porque não tem inimigos. Só precisa deixar os militares contentes e calmos. Dilma: O Brasil tem de armar-se para abrir seu caminho e poder dizer não. Não queremos viver em mundo onde os beligerantes estão armados e os meigos indefesos.

8. O público e o privado. Aécio: Independência do Banco Central e das agências reguladoras assegura previsibilidade aos investidores e despolitiza a política econômica. Dilma: A maneira de desprivatizar o Estado não é colocar o poder em mãos de tecnocratas que frequentam os grandes negócios. É construir carreiras de Estado para substituir a maior parte dos cargos de indicação política. E recusar-se a alienar aos comissários do capital o poder democrático para decidir.

Aécio propõe seguir o figurino que os países ricos do Atlântico Norte nos recomendam, porém nunca seguiram. Nenhum grande país se construiu seguindo cartilha semelhante. Certamente não os EUA, o país com que mais nos parecemos. Ainda bem que o candidato tem estilo conciliador para abrandar a aspereza da operação.

Dilma terá, para honrar sua mensagem e cumprir sua tarefa, de renovar sua equipe e sua prática, rompendo a camisa de força do presidencialismo de coalizão. E o Brasil terá de aprender a reorganizar instituições em vez de apenas redirecionar dinheiro. Ainda bem que a candidata tem espírito de luta, para poder aceitar pouco e enfrentar muito.

Estão em jogo nossa magia, nosso sonho e nossa tragédia. Nossa magia é a vitalidade assombrosa e anárquica do país. Nosso sonho é ver a vitalidade casada com a doçura. Nossa tragédia é a negação de instrumentos e oportunidades a milhões de compatriotas, condenados a viver vidas pequenas e humilhantes. Que em 26 de outubro o povo brasileiro, inconformado com nossa tragédia e fiel a nosso sonho, escolha o rumo audacioso da rebeldia nacional e afirme a grandeza do Brasil.

Fernando Brito:

View Comments (44)

    • Agora são dois que ganharam a maioridade precoce. Dom Pedro II e Aécio.

      Se Brizola estivesse vivo, num debate diria:A écio meu guri, tu és filho do Nepotismo.

      • Se o grande Brizola estivesse vivo diria: na dúvida, no que a globo é a favor devemos ser contra, no que ela for contra devemos ser a favor.

  • Até que se Aécio ganhasse teríamos um efeito pedagógico pros menores de 25 anos: veriam de perto o que é uma crise de verdade!

    • Não se iluda. Tudo de ruim que acontecer num possível governo Aécio, a mídia convencerá essa população nada politizada que foi herança do PT.

      • Num improvável governo do aecioporto o massacre e criminalização da esquerda vai se acentuar por que a mídia sabe o que precisa ser feito quando o projeto do arrocho naufragar !O que der certo é do Arrocho, o que der errado é culpa do PT, Lula/Dilma !

        • Para um povo abrir mão de ter um presidente de sua terra, caso aécio, para votar em Dilma que verdade seja dita, o povo mineiro vota nela não por ser mineira e sim pelo seu governo. Não precisa ser um gênio para saber o motivo né.....agora me diga quem esta comprando um bonde.....rs
          PS Sou mineiro.

          • Aécio representa tudo de ruim que já vivemos.
            Sou mineira e professora. Sei o que é muito bem o (des)governo dele. Se ele ganhar, podem saber que ele alinha todos os poderes aos seus propósitos e povo que se dane.
            Será um retrocesso tão grande para a classe trabalhadora.E a imprensa chapa branca ficará sempre a seu favor.
            O diálogo dele com os trabalhadores será como os de Alkimim em São Paulo: Na base do cassetete.

  • Não considerar como crescimento econômico a redução significativa da desigualdade é, para mim, tomar partido pelos ricos contra os pobres. É papo de economista, que quer o que está sendo feito na Europa e nos Estados Unidos com a chamada austeridade, ou seja, encher o bolso dos ricos. Austeridade é a palavra de ordem do aumento da concentração da riqueza e a política econômica da fabricação de pobres.

  • A análise é simples e clara para quem quer ver o Brasil continuar integrando os brasileiros a uma economia responsável que privilegie os interesses nacionais, para a maioria dos nacionais e, então, não se trata de uma questão de escolha, pois claro está que a presidenta tem que ser Dilma. Aécio é desqualificado para ser responsável por um país com a importância que o Brasil conquistou nestes anos de Lula/Dilma. Sem querer desrespeitar quem quer que seja, a verdade é que Aécio deve continuar com sua vida de menino do Rio, pois além de um passado que não recomenda Aécio não tem a menor noção do significado do país para os brasileiros e para os demais países do mundo. Seria a maior sacanagem que se poderia fazer com o país escolher alguém que parado em uma blitz se recusa a fazer o teste do bafômetro e se verifica que sua carteira de motorista está vencida.

  • Depois de ouvir o depoimento daquele detetive da polícia civil de Minas, acusando o cidadão Aécio de uma série de crimes, todos eles impunes e abafados, me lembrei do caso da garota encontrada morta num flet em Belo Horizonte, onde vários políticos do PSDB estavam envolvidos e o caso foi arquivado. Lembrei-me do caso do goleiro Bruno. Onde o assassino, um serial Killer, até então era um intocável pela polícia mineira. Vivia a serviço de quem este matador profissional, antes do caso Bruno? Não estou acusando, mas ninguém, em sã consciência pode confiar num governo que se contenta em ver processos criminais sendo arquivados sem ir ao fundo das investigações, só para depois dizer em campanhas políticas que seus governos são aprovados pela população. Se o próprio candidato esconde a sua vida privada, permite o faz de conta nos órgãos publicos, que moral tem de exigir um comportamento diferente do cidadão? A comparação não pode ser entre Aécio e o Costa ou Yousef, mesmo porque nem sabemos quem usufruiu mais do dinheiro público. Mas entre o Aécio e a Dilma. Aécio como acusador tem que mostrar e provar quanto Dilma roubou do Pais e não ficar caluniando e fazendo denúncias vazias.

  • Eu fiz uma pesquisa rigorosa sobre a vida do Senador Aécio neves, dos seus oito anos de casamento com a Dra. Andreia Falcão e mais os 14 anos em que ele viveu solteiro. O resultado foi uma página completamente em branco. Istou me deixou perplexo, por ser ele um homem público. A vida dos príncipes da Inglaterra, da princesa Diana, do Presidente da França, de ministro da Itália e de toda parte do mundo chega até nós sem nenhuma censura. Porque tanto segredo na vida do Senador Aécio? Gostaria de lembrar aqui o caso da garota que foi encontrada morta num flet em Belo Horizonte, com vários políticos do PSDB envolvidos e que foi completamentre abafado. Para mim, a vida do político Aécio é de fazer medo ao próprio Satanás.

    • Aqui em Ipatinga, foi assassinado um jornalista investigativo e alguns dias depois, o seu fotógrafo. Logo em seguida o Novo Jornal do Carone, publicou alguma coisa a respeito, onde envolvia alguns políticos do alto escalão de MG. Essa foi uma das últimas publicação do NJ. O jornalista Carone foi preso, e se encontra até hoje no cárcere, sem julgamento.

  • Esta pessoa merece o meu respeito.
    Não por votar em Dilma, mas por ser uma
    pessoa que demonstra conhecimento vasto
    em ações de Nação e ideias Cosmopolitas.

  • "ESQUENTANDO" OS DEBATES!

    ... "Uma pergunta básica" [RISOS] que a presidente Dilma Rousseff, A Magnífica, bem que poderia perguntar ao 'candidato, do atraso, do entreguismo e da CORRUPÇÃO':

    "Candidato, o Paulo Roberto Costa envolvido em atos de corrupção, ingressou na Petrobras em 1978 e começou a assumir cargos de direção a partir de 1995, ainda no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, tendo sido indicado diretor da Gaspetro de 1997 a 2000 pelo mesmo presidente Fernando Henrique Cardoso, seu correligionário e apoiador. Posto isto, eu pergunto: Candidato Aécio Neves, o senhor, por acaso (sic), sabe quem solicitou ao presidente Lula a permanência do, agora, acusado de corrupção na Petrobras?!"

    Réplica da presidente Dilma Rousseff: "candidato, pois eu vou responder à nação brasileira pelo senhor! Quem avalizou a permanência deste senhor foi o deputado Francisco Dornelles do PP (RJ)! E o senhor sabe que o deputado Dornelles é seu primo?! E se sabe, o senhor acusa o seu primo de envolvimento nessas maracutaias e mal-feitos criminosos? E lembrar que o seu primo Francisco Dornelles é o mesmo o nomeou, junto com Sarney, o senhor para Diretor da Caixa Econômica Federal - na época o senhor tinha, apenas, 25 anos de idade! [meritocracia?!]

    • Messias,
      Parabéns pela sugestão. Muito boa pergunta. Agora, será que os dorminhocos proporão esta pergunta. Tenho muitas dúvidas sobre isso. Falta coragem deles para isso. Não há como a Dilma se sair bem se não der umas "borrachadas", pois ela só levou até agora.

      • Prezado e consciente Pafúncio Brasileiro,

        parece que 'o PT da Governança' esqueceu a, digamos, 'contundência pedagógica', e quer, portanto, "engessar" o discurso destemido e a intrépido da presidente Dilma Rousseff!

        Ah esses marqueteiros!..,

        E 'nois' da militância só comendo poeira - e ouvindo os desaforos dos beócios da DIREITONA!

        Pafúncio, felicidades ao amigo!

        Saudações democráticas, progressistas, civilizatórias, nacionalistas, antigolpistas e antifascistas,

        Messias Franca de Macedo
        Feira de Santana, Bahia
        República de 'Nois' Bananas

  • Pergunta: A REDE GLOBO DE TELEVISÃO não tem q ser responsabilizada uma vez que confessou ter apoiado a Ditadura e isso ter mudado o destino de centenas de milhares de pessoas?? pessoas foram mortas... ninguém pra fazer um petição pública (a ser entregue no MP)???

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