No Estadão, os “libertários” que pariram coxinhas

Valmar Hupsel Filho e Pedro Venceslau, hoje, no Estadão, tocam num intrigante assunto que, a rigor, precisa ser aprofundado e mais bem analisado, agora que os fatos reais se sobrepuseram à “condescendência libertária” na análise do estopim dos movimentos de rua de 2013, que se estenderam, curioso, até o “não vai ter Copa” de 2014: Em dois anos, manifestações por tarifa zero dão lugar a coxinhas

A abertura da matéria coloca claramente tal questão:

“As passeatas contra o aumento da tarifa do transporte público lideradas pelo Movimento Passe Livre nas principais cidades brasileiras transformaram o mês de junho de 2013 no símbolo da retomada dos grandes protestos de rua no Brasil, após silêncio de mais de 20 anos. Dois anos depois, o legado das manifestações, que na origem foram lideradas por anarquistas, estudantes universitários e militantes de esquerda, foi a formação de uma nova geração de ativistas com perfil e bandeiras diametralmente opostas”.

Obvio que não quero dizer que os grupos de “negação da política” sejam todos ideologicamente coxinhas, porque não são. Há de tudo.

Mas, na prática, é inequívoco que a fecundação que fez parir coxinhas  – para muitos involuntária, reconheço – aconteceu ali.

Não quer dizer, também, que não se deva fazer manifestações ou que estas só possam ocorrer quando pró-governo. E muito menos que as tarifas de ônibus sejam socialmente justas, e não são.

Mas não eram apenas 20 centavos.

Era, com o proclamado “apoliticismo” – mais, a rejeição da política que, vimos depois, desborda para a rejeição das urnas e das escolhas populares –  a recriação de uma direita militante, como o Brasil não conhecia desde as marchadeiras da UDN em 1964 e logo depois, com as marotagens “voluntárias” como uma campanha de “voluntariado” chamada “Dê ouro para o bem do Brasil” em que as senhoras carolas perderam suas até então inamovíveis alianças e cordões.

Virou, naquele tempo, graças à mídia, falar do caráter direitista que assumiam aqueles atos. Mas e porcamente, era possível falar – e não muito – dos blacblocs  sua expressão mais imbecil. Lembro do quanto apanhei aqui quando falei no caricato Batman, que agora é seguidor de Jair Bolsonaro.

Tinha – e tem – também ali a opção preferencial pelo silêncio do Governo Dilma e do PT que, com imensa frequência esquecem que a ascensão pessoal que não é percebida como fruto de um avanço coletivo  se torna, mentalmente, resultado exclusivo do merecimento pessoal e não parte de um projeto nacional.

E claro, como catalisador deste processo uma articulação internacional dos fomentadores de crise da direita, sempre prontos a agir quando um paós opta por um projeto autônomo – ou mesmo semi-autônomo – de desenvolvimento.  O que está acontecendo no Chile – este, como diria o José Simão, “no va a tener Cuepa” América – é para esclarecer até mesmo os mais ingênuos.

Radicalizar um processo político é uma arte de sensibilidade, onde o ingrediente fundamental é e a formação de uma percepção nacional sobre onde estão os entraves ao progresso e à justiça.

Não é pretender mandar a burguesia brasileira para Miami – até porque, mesmo quando aparece um bobalhão feito o Lobão para prometer, não cumpre – nem para pretender que ela possa ser uma aliada senão circunstancial e pontualmente.

O aliado de sempre, a força do povo brasileiro, porém, não pode deixar de ouvir e ouvir que se faz uma mudança e saber que a mudança que se faz é por ele, para ele e com ele.

E sem enfrentar a polêmica isso não se fará.

 

Fernando Brito:

View Comments (9)

  • Aqueles R$ 0,20 saíram caros demais.
    De lá para cá as coisa pioraram e muito. A mídia golpista se apropriou muito bem daqueles acontecimentos de 2013 e os inocentes da esquerda, como o PSOL, ajudaram bastante.
    Quantos mil empregos custaram aqueles R$ 0,20?

    • Tem razão..
      Mas acredito que a Esquerda voltou a acordar..
      E agora não dormira mais..

      • A imensa impopularidade de Dilma e do PT, ambos vaiados, decorre da percepção da contradição entre o discurso e prática. O Povo não é bobo e perguntar: o governo se diz trabalhista e atenta contra direitos trabalhistas e previdenciários do pobre! A Pátria é Educadora mas cortaram bilhões da educação. O país tá em crise, mas os magistrados estão nababescos. E assim por diante, por isso as vaias e hostilidades a quem promete mel e enfia é fel guelra abaixo do povo.

  • Deêm graças à Deus o Lobão abrir a boca,pois o Min da Saúde economizou uma boa grana com campanhas contra o consumo de ganja!

  • Em ótimo artigo no Nassif, Ion de Andrade comenta a transformação da antiga PF em milícia tucana: http://jornalggn.com.br/fora-p...

    PS - Pra mim, uma das principais causas é a falta de um Ministro da Justiça que ponha ordem na casa.

  • Confirmando que existe ajuda externa para as passeatas "espontanêas" contra o governo, encontrei no youtube um vídeo revelador sobre a interferência dos EUA nas manifestações de rua na América Latina e, claro, também no Brasil.
    Vale a penar ver. Em tempo: o autor do texto é norte-americano; está traduzido para o português. Segue o título:

    EUA JÁ AGEM PARA DERRUBAR DILMA ROUSSEFF (Por F. William Engdahl na Revista americana NEO)

  • HEDIONDOS

    Por conspícuo jornalista Janio de Freitas - Jornal Folha de São Paulo

    Era esperado que os senadores se lembrassem de que todos são iguais perante a lei. Mas o Senado aprovou o projeto da Câmara, de autoria do peemedebista Leonardo Picciani e de Carlos Sampaio, do PSDB, que eleva a crime hediondo o assassinato de policiais, militares e carcereiros, estejam ou não em serviço. E agrava as penas também para quem atacar parentes de policiais até terceiro grau.
    Os parentes dos demais brasileiros, e os próprios, têm vidas menos valiosas, podem ser apenas vítimas vulgares. Exceto, claro, a dinastia dos Picciani, felizes produtos da política fluminense, e do explosivo Carlos Sampaio. E Renan Calheiros, com a profundidade de percepção e ideias que se conhece, considerou o projeto uma das "ações profundas que a segurança pública pede".
    Afora o seu período de teatro de sordidez da ditadura, jamais houve no Congresso tantas ações parlamentares hediondas.
    Entre estas há de ficar também, para a história e para certas biografias, a redução da idade mínima de candidatos ao Senado e a governos estaduais. Aprovada como "reforma política", no país de mais de 200 milhões de habitantes, pelo interesse de um só, o milionário paraibano (des)conhecido como Wilson Filho. O deputado Rodrigo Maia a incluiu no relatrio, e os seguidores de Eduardo Cunha aprovaram a idade estapafúrdia de 29 anos.
    Isso é que é maioridade penal. Devia submeter aqueles deputados ao Código Penal, com investigação e acompanhamento dos seus patrimônios.
    Agora é ver como os senadores tratarão o interesse de Wilson Filho. Ou como o interesse de Wilson Filho os tratará.

    FONTE [LÍMPIDA!]: http://jornalggn.com.br/noticia/um-lado-e-a-outra-por-janio-de-freitas

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