O bacalhau imaginário

Os mais novos talvez não creiam, mas na minha infância, bacalhau era comida de pobre.

Havia até o bordão de “para quem é, bacalhau basta”, sinal da desimportância do sujeito, não merecedor de muitas deferências.

Mas a deferência do bacalhau às narinas e ao paladar era imensa, quando vinha em travessas fumegantes, com as batatas, ascebolas, tomates e pimentões cortados em rodelas, para serem postos sobre os descansos da mesa “esticada” para cabermos mais por ali.

Era a Páscoa que não tinha os ovos de chocolate, coisa chique que não era para nosso “bico” e sem gosto de juntar gente, como o peixe que não parecia peixe.

Pois esta será assim, sem bacalhau para juntar gente, sem gente para se juntar, porque se há Deus, certamente não lhe faz prazer ver seus filhos contaminarem de morte uns aos outros.

Os que não fizerem assim, seguem o exemplo ao contrário: não sacrificam a si para salvar os outros.

Desejo, sentimento, oração, seja o que for que emanar do peito hoje é bom, porque nos eleva da lama podre e má em que se mergulhou nosso país.

Tudo é posto a se julgar impiedosamente, pelos sumos sacerdotes da estupidez: reputação, honra e, agora, até medicamentos.

Julgamentos assim, desde 2020 anos atrás, sabemos ao que levam.

Pelas gerações que nos criaram e protegeram, para que pudéssemos criar e proteger, deixemos para chorar mais tarde os mortos, pois agora temos de gritar pelos vivos.

A humanidade é quem está num calvário, vergastada por uma doença que tem na ignorância e na maldade seus vetores.

O bacalhau da infância estará presente na omelete de hoje, como avós, pais e tios que o tempo levou, estão presentes nos que não hão de ser levados antes de sua hora pela criminosa ação de um homem que ama a morte, um anticristo moderno, a frente de hordas de imbecis.

 

Fernando Brito:

View Comments (16)

  • Sr.Fernando.tais argumentos,justos na sua plenitude,me evoca velhos versos,dos SAMBAS CANÇÕES da minha juventude.Infortunadamente,INÚTEIS CANÇÕES! Perdemos,de tempos atras,a sensibilidade social.À cada dia,isso embrutece mais,a sociedade capitalista.

    • É triste...mas esses dados são falsos e maquiados pelo governo...São bem mais pessoas que perderam a vida...Sem diagnóstico e por ai vai...É triste...A PASCOA DESSAS FAMÍLIAS...

  • VEJAM, que boa notícia, em meio a tantas ruins: a WEG, fabricantes de equipamentos elétricos,maior fabricante de motores elétricos no país, está alterando uma fábrica e já tem um acordo de transferência tecnológica - vai fabricar respiradores. 500 pra começar.

    https://www.weg.net/institutional/BR/pt/news/produtos-e-solucoes/weg-se-estrutura-para-fabricar-respiradores-artificiais-para-pacientes-com-covid-19

    Imaginem se a FIESP tivesse uma liderança capaz de organizar as fábricas paulistas e (???) de organizar os esforços no Brasil, além de agilizar acordos e quebra de patentes, linhas rápidas de suprimentos, troca comerciais,etc etc etc

    • Sim, imaginem. Mas a FIESP, depois que se rendeu aos patos, só pensa no futuro político de seu estranho presidente, um industrial que não é industrial. Mesmo só pensando naquilo, não age com inteligência, pois conjumina com um governante que odeia o país, classificado por ele como lixo, e que fatalmente não terá em breve uma única ficha de cacife político.

  • Feliz pascoa Fernando Brito que a luz do DIVINO ilumine aos idosos, e livre-nos dos idiotas e dos milicianos do Planalto.

  • Eu não entendia que peixe era aquele tão fininho, magrinho. E não gostava, até que um dia vi um filme que mostrava os portugueses pescando bacalhau nos mares do Norte. Achei tão legal que experimentei de novo e gostei muito. O paladar também sofre influências culturais.

    • As histórias da transição do bacalhau das mesas pobres para as granfinas aqui dá pano prá manga, como diria o Alencastro. Intrigado, porque na minha infância o peixe já era caríssimo em Juiz de Fora, comecei a pesquisar o porquê do dito adágio. Um amigo, dado a deliciosas teorias mirabolantes, melhor que tira-gosto em boteco, entendeu que, como os nobres comiam carne de caça, proibida aos servos, isso na Europa medieval, peixe era comida da plebe, por aí. Acreditei e continuei intrigado. Até que achei uma notícia superinteressante, que nas cadeias de Nova Friburgo - RJ, no final do séc. XIX, nas sextas-feiras o cardápio incluía bacalhau. Uau! Bingo. Mas... por quê? Veio a indagação. Finalizando, descobri no livro Os jacobinos negros (C. L. R. James - 1938/Boitempo hoje), que as embarcações da burguesia marítima que comandava o tráfico para o Caribe (Índias Ocidentais), completavam a carga com bacalhau seco para alimentação do plantel escravizado. Em Cuiabá o peixe seco chama mulato-velho e, aqui em JF, um amigo dono de bar, anos 70/80, ia no Disco (supermercado) comprar bacalhau para fazer o delicioso bolinho que vendia, sem muito sucesso. Chegando lá, foi na banca de peixe-seco e pegou uns 10, não sem piscar o olho malandramente para um eu intrigado.

  • Como disse Rubem Gonzalez, no dia em que um pastor pilantra dessas igrejas neopentecostais encontrar o demônio, não o eliminará, pois assim o seu "negócio" perde razão de existir.

    A adesão deles ao anticristo com a faixa presidencial não é mera coincidência.

  • Me identifico tanto com vocês...Semana que vem faço 70 anos, sou brizolista, lulista e tenho uma lembrança viva de muita coisa que o Brasil passou desde o primeiro governo do Brizola no RJ. É um alento ler o Tijolaço e os comentários! Apesar de não conhecê-los pessoalmente, vocês são a minha turma.

  • Feliz Páscoa, Brito!! Que Deus/Alá/Jeová/Oxalá, qualquer um dos tantos que existem por aí, abençoe a todos nós. E todo mundo cuida de todo mundo. Grande e fraterno abraço.

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