A dominação sexista no mundo está muito longe de terminar.
Mas é bacana ver como evoluímos no tempo de uma vida humana, muito mais que em séculos de história.
Hoje, completam-se 50 anos desde que Valentina Tereshkova, então com 26 anos, tornou-se a primeira mulher a viajar no espaço, a bordo da Vostok-6.
A “afirmação do homem, normal, gradativa sobre o universo natural”, que Gilberto Gil cantou em seu Lunik 9, passava a ser, também, de uma mulher, sozinha em uma pequena nave.
Propaganda ou não, Tereshkova não era apenas um “rostinho bonito”, como se dizia então. Órfã de pai, operária têxtil, paraquedista amadora – os então “cosmonautas” eram ejetados de pára-quedas na aterrissagem das naves da URSS – ela se tornou uma dirigente política importante na extinta União Soviética e em 2011, com 73 anos, ainda elegeu-se deputada.
Só 20 anos depois os EUA teriam uma mulher astronauta, Sally Ride, integrante da tribulação do ônibus espacial Challenger.
Para uma geração de mulheres que cresceu tentando se libertar da visão machista, Tereshkova foi, com viagem de três dias ao espaço, um grande vôo para o reconhecimento da igualdade de capacidades.
Quem cresceu nos anos 60 sabe disso, de toda a carga discriminatória que havia – abertamente, então, embora prossiga, ainda hoje, velada – sobre a mulher.
Porque hoje ainda se adota subterfúgios para negar às mulheres a decisão sobre seus próprios destinos e até sobre seus corpos vitimados por violências.
O direito a não prosseguir numa gravidez provocada pela brutalidade de um estupro, que há décadas a legislação brasileira abriga, não pode ser tocado, nem mesmo sob o encobrimento da tal “bolsa-estupro”.
Ninguém, em nome do quer que seja, pode considerar a mulher um mero instrumento da reprodução humana, muito menos na mais vil forma que ela pode assumir.
A afirmação, normal, gradativa, da mulher é um vôo que não vai parar, senão quando todos os seres humanos tiverem espaços iguais.