Vejo no UOL/ Folha uma “reportagem” sobre o ator e poeta Eduardo Tornaghi, apresentado quase como um misantropo, um anômalo, por ter largado a “máquina de celebridades” global e ter ido fazer o que gosta e crê que pode ser útil às pessoas: como ele diz, “conhecer o Brasil real e o mundo subterrâneo da cultura”.
Por acaso de relações familiares, conheci Tornaghi, embora superficialmente. Não é, como a matéria induz em seu título capcioso – Eduardo Tornaghi, o Fábio Assunção dos anos 70, hoje sobrevive nas ruas – algo parecido com um indigente. Nada a ver com um “ripongão” sem compromissos. Sereno, tranquilo, pai amoroso, presente na vida das filhas, inteligente, antenado e delicado ao falar: pouco e só um pouco mais quando se emociona.
E a pobreza na reportagem não é a dele, é a de quem escreve hoje nos jornais.
Nem era preciso que conhecesse: a minoria que lê com atenção verá que ele não fez e faz mais do que queremos ou já quisemos fazer: viver o que queremos para o mundo, não o que “certo” mundo nos faz ser, querendo ou não.
Verdade que ninguém consegue isso todo o tempo. No seu Memórias do Cárcere, Graciliano Ramos escrevia:
(…)como outros espíritos miúdos dependiam de nós, e era preciso calçá-los, vesti-los, alimentá-los, mandá- los ouvir cantigas e decorar feitos patrióticos, abandonamos as tarefas de longo prazo, caímos na labuta diária, contando linhas, fabricamos artigos, sapecamos traduções, consertamos engulhando produtos alheios. De alguma forma nos acanalhamos.
Mas, da mesma forma torta , sobrevivemos para, como fez Tornaghi um dia, acharmos nosso caminho com menos pesos e mais asas (embora asas sempre nos deixem um certo medo de despencar).
Infelizmente, o mundo da mídia não alcança estes graus de liberdade. Recusar o glamour da “celebridade” é estranho, “anormal”, algo louco, embora aquilo seja uma evidente e lucrativa tolice. Tornaghi diz que volta e meia é procurado para reportagens (de TV inclusive. como a Record) para matérias sobre um “eremita” que não existe:
“Foi maravilhoso, porque jogou uma luz no que faço. No entanto, focaram no meu sumiço e não no fato de que saí do circuito para fazer o que Manuel Bandeira [poeta, 1886-1968] e Villa-Lobos [maestro e compositor, 1887-1959] fizeram: olhar para a cultura brasileira e ajudar a desenvolvê-la. Também falaram pouco do pessoal com o qual convivo. Gente comum que faz um trabalho educativo. Mas é TV. Foi válido. Fiquei apenas um pouco decepcionado”
E deve continuar, porque não há uma palavra sobre o que ele faz, de verdade: refletir e divulgar arte e entendimento das palavras e do mundo que elas tentam descrever.
Por isso, coloco aí embaixo uma reflexão útil para quem faz do escrever sua profissão e compulsão: o que está no texto só revive e toma forma quando é lido e, por isso, o ritmo e o clima que a escrita induz trazem, eles próprios, boa parte do significado que o escrito conterá.
PS. Para quem gosta de poesia, de Brasil e de inteligência, no canal de Tornaghi no Youtube, há centenas de poesias, situadas, refletidas e interpretadas com a sua gentil simplicidade.
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Fernando, que post!!!!!
Vi a chamada na capa do UOL. Mas não li.
Taí, ganhei o dia.
Não existe razão alguma para não considerar a Rede Record como integrante do PIG. Seja por omissão ou por ações coordenadas com outros canais de TV, rádio e revistas.
Se for assim o que o PHA, o grande bestial guru dos tijoleiros está fazendo lá ainda?
Fosse assim, o que você está fazendo aqui ainda?
Por que você entra aqui só pra agredir?
Sr.Britto.Grande matéria.Bom rever esse personagem em PAZ consigo mesmo.Sr.Britto,uma das razões da importância que particularmente a IDEOLOGIA PEQUENO BURGUESA da à fama,reside numa compulsão que todo o MEDIANO CÉREBRO tem,que é A REVERÊNCIA À NOTORIEDADE.Seja ela o que for,mas que possibilite a reverência!Quanto a IDEOLOGIA PEQUENO BURGUESA,é uma cultura que o BURGUÊS PLANTA NA CABEÇA DESSA GENTE,e eles a reproduzem diuturnamente.
Isso mostra que o mundo ainda não está perdido!
uma teoria que com o tempo abracei é que, quanto mais uma pessoa reuna em si objetivamente no mais alto grau um 'cesto' das + genuinas e belas qualidades humanas - como os genios , va lá, Da Vinci, Simon bolivar,
Lennon, Tereza de calcutta, o Che, Pasteur, Mandela...- ele passa a ser universal, pertence a humanidade. É assim que todos nos o vemos, instintivamente e dele falamos como que familiarmente...
Mas quando é o pior ser humano possivel, um restolho bipede incapaz de um ato nobre, entao nós o localizamos e individualizamos o mais possivel: é africano da terra tal, lugar tal , bem delimitado...
Tornaghi é da primeira espécie, sem duvida alguma.
Total falta de assunto!! Este "brog deveria tratar de temas mais importantes, por exemplo como o PT presenteou o povo brasileiro com o maior deficit da historia "defipaiff" , 100 bilhoes!!!!
Fazendo o maior programa de transferencia de renda do mundo , seu imbecil.
Se for pra tirar gente da linha da fome , que haja deficit.
Transferencia de renda para Lula, filhos, nora e mais chegados!!!
35 millhoes segundo a ONU de chegados
Valeu pela dica! Vou ver os vídeos dele.