Dizem que é do grego Esopo, mas todos conhecem a fábula da galinha dos ovos de ouro, a quem todos atribuem o sentido da ambição e, modestamente, enxergo como crítica à tolice, infantil e impaciente.
Porque, afinal, a galinha poria todos os seus dourados ovos ao camponês que era seu dono e, camponês que era, sabia que galinha vai pondo um ovo por dia – tem dias que “faia”, é verdade – e que ela era a sua garantia de prosperidade.
Mas porque, em plena efervescência eleitoral, nos vem este sujeito aqui falar de galinhas, quando o Brasil está ameaçado de voltar às mãos de um esquema de poder onde já não se disfarça a tutela da direita financista?
É que, da velha escola das metáforas de Brizola, vejo que, se revertido o crescimento de Marina Silva na classe média baixa – que só no Brasil mesmo pode ser considerada classe média, porque se trata apenas de um contingente retirado parcialmente da pobreza – a candidata do PSB reduz-se ao que é: um patético pseudomoralismo udenista e um fait divers de uma elite que enriqueceu materialmente e empobreceu-se intelectualmente até chegar às vias da indigência cultural, que enxerga o progresso como um gadget, o lançamento do Iphone 6,7,8…
Como eu não sou um intelectual, um sociólogo, um cientista político, deixo o aprofundamento desta análise para eles e vou é me socorrer do que o pensamento humano produz espontaneamente, como aquela fábula, e o encontro nos versos de uma antiga composição, chamada “Mundo Melhor”, do eterno parceiro de Vinícius de Morais, o Toquinho:
Você que está me escutando
É mesmo com você que estou falando agora
Você que pensa que é bem, não pensar em ninguém
E que o amor tem hora
Preste atenção meu ouvinte
O negócio é o seguinte
A coisa não demora
E se você se retrai
Você vai entrar bem, ora se vai
Que maravilha tomar conselhos com os poetas, coisa que os sabidos acham tão ridículo!
Mas eu explico ao paciente leitor que aguenta, até aqui, minha falta de senso.
É que, entre os que considero os piores defeitos do governo Lula – que seguem, tanto quanto suas virtudes, com o de Dilma – está o de ter deixado que o progresso social de dezenas de milhões de brasileiro não fosse percebido como um fenômeno social, mas apenas pessoal.
“Minha ascensão é minha, deve-se aos meus méritos e esforços.”
E, como é, em parte, uma verdade, isto acaba, por falta de idéias e discursos que lhe ponham limites, ocupando todo o terreno do que se supõe ser verdadeiro.
Salvo em poucos momentos eleitorais, Lula não deu qualidade coletiva a este progresso, ajudando a formar uma consciência política na população. Do PT, então, nem se fala, mais preocupado em acomodar interesses eleitorais e a se tornar palatável – eles acreditam que o leão pode se tornar herbívoro – à elite, da qual, aliás, orbita boa parte de seus quadros.
A obra de seus governos, entretanto, foi aquém do que poderia ir, mas muito, muito além do que este país estava acostumado a viver, sob o tacão – militar, depois civil – do capital.
Ela é real e é ao mundo real que devemos nos fixar, quando se trata de mostrar a verdade, como é necessário nos momentos em que um povo escolhe seus rumos.
E, com o devido perdão pelas lucubrações, é hora de um choque de realidade, porque ela – e nada mais – é o recipiente onde se acha a verdade.
Lula, o personagem símbolo do processo que vivemos nos últimos 12 anos, precisa usar a autoridade de que dispõe para perguntar diretamente à “classe média” (vá lá que seja) ascendente:
– Você vive melhor hoje que há dez anos?
– É mais fácil conseguir um emprego hoje que há dez anos?
– E comprar um automóvel?
– E pensar em financiar a casa própria?
– E manter os filhos na escola?
– E fazê-los chegar à universidade?
Mostrar obras realizadas, projetos, planos, muito bem.
Necessário e imprescindível numa campanha eleitoral.
Como o é travar, corajosamente, a polêmica sobre os fatos e seu sentido na mídia, mais ainda com este momento em que ela vacila entre abrir ou não um “caso Lunus” na esperança de recolocar Aécio no páreo, o que parece impossível, embora seja desejado.
Mas é neste conjunto de confrontações diretas, objetivas, que se contêm os fundamentos da decisão que um contingente imenso de beneficiários dos governos Lula-Dilma irá tomar, e só irá tomar por si -e não pelo que lhe dizem – se o fizermos olhar para si mesmo e sua vida, uma visão que mesmo o maior massacre de mídia não pode impedir que tenha.
A comunicação de campanha de Dilma – e de Lula, inseparável – precisa mirar nestes brasileiros.
Na empregada doméstica, que tem agora carteira profissional ou, se lhe recusaram assinar, está ganhando mais como diarista ou em outro empregos, que já não faltam.
No pedreiro, que batia de obra em obra atrás de trabalho, que não havia.
Na mocinha, que engravidou, parou de estudar, mas tem uma chance de sobreviver nas vagas que não terminam nos mercados e lojas.
A eles não se chega com estatística. Nem a grande maioria deles está em programas sociais, como o Bolsa-Família, o Pronatec , o “Minha Casa” e outros.
São muitos, milhões e milhões de outros mais.
Não há, para eles, Governo presente em suas realidades.
Embora a sua realidade esteja plena de um tempo de progresso social, que ele só enxerga como seu.
Pensam, sim, que são bem, sem pensar em ninguém.
E que precisam ouvir, como disse Toquinho, que “o negócio é o seguinte/A coisa não demora/E se você se retrai/Você vai entrar bem, ora se vai “
View Comments (23)
Perfeito, Fernando Brito. Seu artigo é impecável e seria necessário ser lido pelo maior número possível de pessoas. Lula, Dilma e o PT, verdadeiros cabeças de vento, vaidosos e ignorantes, cometeram erros grosseiros muito bem explicitados no artigo, que agora estão tentando corrigir. Espero que não seja tarde demais porque senão será trágico, muito trágico, e eles deverão ser responsabilizados por isso, por essa inconsciência em relação à política ficando apenas no mesmismo dos resultados das ações práticas, ignorando o óbvio: que o poder executivo tem, essencialmente, um caráter político.
Cabeças de vento, parceiro?
Mais respeito com os companheiros. Que promoveram a maior transformação social desse país em 500 anos!
Acho no entanto que a campanha de Dilma tem que projetar uma MISTICA DE FUTURO E FALAR MENOS DE PASSADO. A Campanha de Marina pegou porque PROJETOU UMA MISTICA DE FUTURO. Um projeto politico tem que falar de futuro e esta campanha do PT esta com pouca proposta e imagem neste quesito.
A campanha da Marina tem uma Mistica de Futuro FALSA, mas tem!!!!É essa a questão.
Desculpa Laura, mas não vejo vantagem em acompanhar promessas misticas ou míticas de futuro como faz Marina. Ela não oferece nada de concreto, de objetivo. Dizer que vai fazer isso e aquilo - sem dizer como e com que recursos - é conversa mole dos velhos políticos. Dilma, ao contrário está acenando com mais investimentos, mais infraestrutura, mais emprego, mais educação e saúde concretamente. A partir do que fez no passado e respaldada pelos recursos crescentes do pré-sal. Lembre que mostrar o que foi feito é uma necessidade da campanha petista, já que a mídia de oposição passou 11 anos escondendo da população o bom o Brasil enquanto mostrou apenas o ruim, devidamente manipulado para parecer pior ainda.
Sr.Fernando.Isto para mim,tirante poucas variantes interpretações abstratas de muitos INTELECTUAIS,tem um ingrediente visível,do velho ANARQUISMO ,velho de guerra,que espera para se manifestar,quando se esgotam todos as prédicas do DEMOCRATISMO,que após ua longa duração,somente trouxe para todos nós,a igualdade,humanidade e fraternidade,às classes dominantes,que a cada dia que passa,diminui o número de personagens,devido a acumulação.E nada melhor para isso,do que a vigência,das prédicas da ideologia do pequeno-burgues,que não passaram,não passam e não passarão,do VELHO ANARQUISMO DE GUERRA!
Avião enrolado com "laranja", Banco da cor "laranja" e candidata "laranja", precisa dizer mais.
Fernando, para onde foi o texto sobre o Merdal Pereira? Eu estava lendo os comentários e depois de alguns minutos ele sumiu. Você o retirou? Por que? Cara, o que está acontecendo com o PT e aquele pulha de ministro da justiça? Estou esperando uma reação a esse vazamento programado pela porca grande mídia e seus aparelhos no mp e na pf.
Acho que sou dos que mais toca-lhe pau no PT e seus caciques, quando acho que devo. Porém, elogiar também deve ser nossa obrigação. E o Programa da Dilma ontem -sábado o6/07- estava nos conforme. Dilma falou direto ao povo e à Bláblá, sem meios termos. Literalmente alertou para os riscos que todo este povo corre, numa eventual vitória dos aventureiros à serviço do capital dominante. Alertou sobre o retrocesso em escala Nacional, nos programas sociais, no emprego e renda, na industrialização -presente e futura-, nos investimentos públicos essenciais para a agroprodução, contrução civil e o perigo de "independência do BC" e sua consequente diminuição dos créditos dos bancos Públicos, BNDES, BB e CF a juros baixos e prazos longos. Na minha modesta opinião, foi o mais eficiente programa de TV e o mais acertivo. Porque com o "povão" tem que falar direto, sem rodeios, e tem que dar nome aos "bois", no caso, "candidatos". Agora se os incautos "apolitizados" beneficiados com todas estas mudanças ocorridas nos governos Lula/Dilma, preferem da ouvidos e olhos à Veja(e fique cego) e a Globo e seu rebanho, à Folha e Estadão, bueno, tem que se foder mesmo! Chega um ponto em que a gente enche o saco de tentar tirar viseira de burro...aí continuam arrodiando que nem este quadrúpede nas velhas olarias para fazer tijolo.
Também acho que Dilma certou ontem em seu programa.Tem que ser didática, quase professoral, falar simples. Sinto falta também do tema da política externa, não aparece nunca e é um dos trunfos do PT. O Brasil não se fechou para os EUA, mas se abriu também para o mundo e isso deve ser dito claramente.
Sinto falta de se falar do futuro da lei que regulamenta o aumento do salário mínimo que termina agora em 2015. Quem e quais partidos se comprometem a mante las...
A transformação da política numa coisa negativa, retira das pessoas a percepção do quanto ela é responsável pelo que está acontecendo no Brasil. De que as transformações em curso no País aconteceram por causa da política. Não são apenas quem é da classe média baixa, mas de todas as classes sociais, que deixam de relacionar o que está acontecendo no Brasil com a política. Os resultados sociais e econômicos tem relação direta com decisões políticas e isso afeta a todos. O desenvolvimento é consequência das decisões políticas, são elas que propiciam a direção que permite ou impede o desenvolvimento do País. As pessoas não tem a percepção desse fato.
Quando alguém assume que melhorou apenas por si mesma, está esquecendo que vive em sociedade e que depende umas das outras e que tudo afeta a todos. A política afeta tudo, é ela que cria as condições para o desenvolvimento e nós prosperamos em virtude do desenvolvimento. Nosso futuro é melhor ou pior em virtude das decisões tomadas pela política. É essa a comunicação que precisa ser feita de forma mais adequada.