Palmas para a Suprema Corte americana. Mas é bom lembrar que aqui já vale há quatro anos

Merece os mais efusivos aplausos a decisão da Suprema Corte dos EUA afirmando que nenhuma lei estadual poderá impedir a união entre pessoas do mesmo sexo.

É monstruoso negar direitos – porque impedir de viver, ninguém impede – que duas pessoas que vivam juntas não tenham a mesma proteção que outras, se forem do mesmo sexo.

Mas é  curioso que nossa mídia não tenha “comemorado” tanto o fato de que no Brasil, há quatro anos, em votação unânime (e não pelos apertados 5 a 4 da Corte americana), derrotou, no dia 5 de maio de 2011, um pedido de um membro do Ministério Público para que se derrubasse uma decisão da Justiça Estadual que permitia a adoção de uma criança por um casal homossexual.

O então advogado que defendeu o direito ao reconhecimento da união homoafetiva ao par do casamento ou da união heterossexual foi o hoje Ministro Luiz Roberto Barroso, que atuou em defesa da constitucionalidade que reconhecia, na previdência estadual do Rio de Janeiro, os direitos dos companheiros/companheiras do mesmo  aos benefícios dados aos cônjuges heterossexuais, caso que foi anexado ao da adoção no Paraná.

Toda esta onda dos fundamentalistas aqui, portanto, é esperneio e propaganda.

E, por isso, a decisão americana, aqui, só tem mesmo um impacto: como eles acham tudo lindo por lá, fica esta turma sem um argumento, embora ele não precisem bem de argumentos, tantas são as “verdades” que dizem carregar.

Tem que ficar claro, para as pessoas, que este debate – o do direito dos homossexuais de formarem suas famílias – não é algo a ser conquistado, aqui, mas a ser cumprido e respeitado, o que deve ser, pois já tem, e faz tempo, força de lei.

O resto é nosso “complexo de vira-latas”, pois temos, neste campo, legislação muito mais avançada, desde a Constituição de 1988 que, na prática, torna iguais o casamento e a união estável e, portanto, segundo a decisão de 2011 do Supremo, a união homoafetiva.

Nos Estados Unidos, a decisão foi muito menos abrangente, embora seja apresentada como uma “formalização” do “casamento gay” – outra expressão sem qualquer sentido.

Usou-se, aliás, como base a Emenda 14 da Constituição dos EUA, de 1868, que diz que nenhum Estado da Federação (americana) deve “privar qualquer pessoa da vida, liberdade ou propriedade, sem o devido processo legal.” Esta emenda, feita três anos após o fim da Guerra Civil naquele país foi, editada para que os estados do Sul, ex-confederados, legislassem vingativamente.

Como todo avanço das liberdades, individuais ou coletivas, a decisão de hoje deve ser saudada.

Mas sem esquecer o quanto é reacionário o âmago do pensamento norte-americano e o quanto é parco seu reconhecimento da igualdade humana, tanto que agem como agem em muitas – ou quase todas – partes do mundo e dentro de seu próprio país com muitos imigrantes, como se os não-americanos (americanos são eles só, né?) não fossem tão humanos quanto eles.

E, também, lembrando que, aqui no Brasil, não faz muito tempo, já vivemos um ambiente de tolerância e respeito aos direitos de todos – independente se sua orientação sexual, ideológica, sua origem étnica ou credo religioso – que, infelizmente regrediu à barbárie, pelo empoderamento de fundamentalistas religiosos, pela ação histérica de parte do Judiciário e pela ação da mídia, que se diz democrata, mas promove, apóia e insufla os autoritários.

Esses são os ultravioletas e os infravermelhos que não aparecem aqui no espectro do arco-íris que o esperto Mark Zuckerberg, farejando sempre oportunidades, espalhou pelos  facebooks.

Sempre é bom festejar o que é bom.

O problema é esquecer o quanto se caminhou aqui, porque isso faz parecer que estivemos andando na direção errada antes.

Não estávamos, a direção errada é coisa que nos foi imposta nos últimos tempos.

E pela onda conservadora que ocupa, neles, todos os espaços.

Fernando Brito:

View Comments (9)

  • Mas, há uma diferença. Qd se aprovou isso no Brasil, ninguém saiu as ruas para comemorar. O palácio do planalto não ficou da cor do barco íris. O presidente não foi na tv afirmar que isso era bom. Nenhum político pintou seu perfil de arco íris. É isso que está sendo comemorado nos Usa hj.

  • O que o Brasil tem que aprender com a Justiça americana é enquadrar o político corrupto que lá não tem foro privilegiado e é processado como cidadão comum, sem idolatrias ou intocabilidades.

    • Mentira deslavada. Todos os políticos depois dos Kennedy aos atuais são corruptos, genocidas, nunca foram e nunca serão cassados. Hoje praticamente quem não pegar dinheiro com o Loby pró Israel, não terá chances em eleição e esta elite está destruindo um povo exemplar e trabalhador, que poderia continuar a ensinar muito influenciar toda a humanidade.Nossa jovem democracia corre o risco de dar o salto suicida e se transformar nesta "putocracia", que elege jagunços como senador e até como ministro do supremo. As exceções, poucas nos EUA, pecam pela omissão, os que são condenados pela suprema corte, são somente, porque fizeram a cagada tão fedida, que seria inevitável a descarga.Percebe-se que genocídio, prisões ilegais, são aceitáveis, desde que praticados com nativos, ou alheios.

  • O aue aconteceu nos EUA não foi a mesma coisa do que aconteceu aqui. Aqui já se reconhecia a união civil, mas aqui ainda não se tem um casamento homossexual nos mesmos molde do heterossexual. A uniao civil é como se fosse um passo atrás (sem trocadilhos, por favor). Nos EUA o que aprovaram é um casamento completo. Então eles estão na frente nisto.

  • SUS e legislação em internet são outras coisas que nos colocam na vanguarda dos EUA. Além, é claro, dos braços abertos e do calor humano. A onda neoconservadora não vai conseguir mudar isso.

  • Fernando, novamente tua visão é mesmo curta.
    Os evangélicos e fundamentalistas tem os 2/3 necessários no congresso para aprovar a PEC que quiserem.
    Até 2018 o brasil deixa de ser estado laico, se esse pessoal continuar ditando a agenda do congresso.
    E o STF não vai poder fazer nada a respeito

  • Diferente da Argentina, Uruguai, Estados Unidos e muitos países da Europa que aprovaram o "casamento gay" aqui no Brasil ainda estamos um passo atrás. A "união estável" é diferente do "casamento gay" em termos de direitos. Um casal homossexual consegue estabelecer no cartório um contrato de "união estável" mas perante a sociedade seu estado civil, diferente do casamento gay, permanece como "solteiro". Essa é a diferença que pode parecer bobagem mas faz muito sentido para os casais gays que desejam casar e assumir esse status de "casados" perante a sociedade. O Brasil ainda está atrás dos Estados Unidos e muitos outros países nesse quesito.

  • Concordo Fernando. Entretanto é importante ressaltar uma diferença estrutural entre as sociedades brasileira e norte americana.
    Nós, embora ainda exista uma enorme exceção, somos uma sociedade menos discriminante.
    Os EUA historicamente é um país discriminante. É verdade que a discriminação racial é a maior. Mas também existem altos índices de discriminação em relação aos homossexuais.
    É um avanço importante para eles, assim como foi no Brasil.

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