Para o Alan, de coração aberto

O Tijolaço recebeu um comentário que julgo importante reproduzir e comentar.

Veio do Alan, que por tudo parece uma pessoa respeitável e bem intencionada, como são muitos dos manifestantes que enchem as ruas.

Vamos lê-lo, sem cortes, e procurar dialogar. Eis o que ele diz:

Me parece um típico texto de um militante petista q n quer ouvir e enxergar as verdades q está a situação atual do país. A maioria do povo q está nas ruas como eu não aceita q partidos entrem com suas bandeiras por serem oportunistas querendo se aproveitar da situação, a grande verdade é q partido q faz OPOSIÇÃO séria e forte n existe faz tempo e como o ministro Joaquim Barbosa (e futuro proximo presidente qeu acho q sera eleito pelo povo das ruas) disse, os partidos de hoje são partidos de mentirinha. A grande maioria ja teve sua chance e de uns 20 anos pra cá (8 de FHC-PSDB e + 12 de PT-Lula e Dilma) o Brasil nao evolui em nd, continua corrupção e a lei so funciona pros pobres. Eu como a maioria n defendemos a ditadura, anarquia nem fascismo, longe disso, a questão é q o povo de hj n se sente mais REPRESENTADO em sua síntese por esses partidos de “mentirinha”, a democracia deve continuar o q tem q mudar URGENTEMENTE é uma REFORMA POLÍTICA e PARTIDÁRIA e se for o caso vejo a necessidade de surgir novos partidos com os líderes dos movimentos das ruas como por exemplo a maioria é de estudantes.
OBS: n sou militante de nenhum partido, sempre votei no menos pior ou nulo.

Alan, meu caro, a primeira coisa: não sou um militante petista e quero ouvir e enxergar.

A situação atual do país é muito ruim, mas, acredite, já foi muito pior.

Não sei se você sabe, mas ser um jovem inconformado como você, como eu fui,  já foi algo que condenava um cidadão à perseguição, à prisão, à tortura e à morte.

Os “cegos” como eu deram a juventude para lutar contra isso.

É por isso que prezamos a democracia, mesmo pensando como você, que ela pode ser o regime de gente horrenda no poder, mas que nos permite dizer “não” sem temer por nossa liberdade e até por nossa vida.

Sabe, Alan, no tempo em que eu tinha a sua idade,  a gente brincava: “O que você acha? Eu não acho nada, porque o último que achou ainda não acharam ele…”

Mas, cara, eu não vou ficar dando uma de velho sabido para você.

Você está coberto de razão em dizer que os políticos se dissociaram do povo.

É verdade, mas quem os elegeu não foi esse povo?

A democracia é o regime dos eleitos ou dos que deveríamos ter eleito?

Essa é uma regra do jogo que, se não for respeitada, hoje pode nos servir, mas amanhã servirá contra nós.

Você se diz eleitor de Joaquim Barbosa, embora ele, ao menos confessadamente, não seja candidato.

Mas qual é a legitimidade dele para ser candidato?

Ele se submeteu, alguma vez, ao voto popular ou foi alguém indicado pelos “políticos” para estar onde está?

A quem ele deve “estar lá”, senão a Lula, que indicou um negro e filho de pobres para Ministro do Supremo?

Eu também tenho nojo da influência do poder econômico nas eleições.

Mas você sabia que este governo propôs o financiamento público das campanhas e todos – inclusive a turma do movimento do qual você participa, o recusaram?

Vai dar dinheiro público aos candidatos, dizem eles, como se o dinheiro dado pelos “contribuintes” de suas campanhas viesse do bolso e do uísque desta galera e não da corrupção, não é?

Você tem razão ao dizer que não se sente representado. Eu também não me sinto.

Mas eu posso sentir coisas sem achar que elas devem ser como eu as faria.

Afinal, eu não sou eleito, mas eleitor. E, confesso, dificilmente seria eleito.

Sabe o porquê, Alan? Eu sou muito direto, muito desbocado, muito sincero. E duro.

Eu não sou “sabidão” nem tenho resposta para tudo, talvez como você.

Nossa única diferença, talvez, é que não tenho raiva da pessoas, mas apenas das ações das pessoas.

Olhe para nós dois, Alan, e veja se o Brasil não evoluiu em nada, como você diz.

Eu vim de um país onde pobre era burro, negro era inferior, mulher não tinha direitos, divórcio era proibido, gay era doente mental e esperteza era virtude.

Estamos aqui, diante da humanidade, discutindo nossas razões e sentimentos.

Só podermos fazer isso é uma mudança imensa.

Você não sabe, talvez, o que foi derrubarmos o poder dos oito anos de PSDB, onde o país se arruinava e a mídia comemorava, dizendo que estávamos “fazendo o dever de casa” do sistema de dominação colonial.

Eu peço que você leia o que escrevi sobre o nosso “abismo” geracional, aqui.

Tudo o que eu defendo é o podermos falar, diretamente.

Sabe, Alan, a corrupção e a “lei só pra pobre” são uma merda, mas já foram bem piores neste país.

Mas será que os movimentos dos quais vocês participam estão sendo duros e intransigentes com o vandalismo e os arruaceiros que se intrometem neles ou os desculpam à medida em que servem aos seus propósitos, cuja legitimidade eu não discuto aqui?

Ah, mas vocês não têm nada com isto, não é?

Alan, acredite, o inconformismo não nasceu com você, nem comigo.

Quando a gente acha que nasceu conosco, despreza as lições da história e não consegue pensar pela nossa própria cabeça.

E, aí, se não somos donos dela, alguém é.

O pensamento alienado é isso, o que pertence a outro, não a nós mesmos.

Fernando Brito:

View Comments (19)

  • Dizer que o Joaquim Barbosa salvará o Brasil, é a mesma coisa que cantar que Obina é melhor que E'to.

  • não entendo porque investir tanto no "jovem Alan". Dar espaço a essa gente? para quê?
    esse pessoal já foi convertido. Foram seus pais e avós que fizeram a "Marcha da Familia". Deu no que sabemos. Agora, é a mesma marcha. Com outro nome.

  • Perfeito Brito e só para acrescentar o disparate. A RUA não é do povo? A RUA não é dos não políticos, dos apartidários e dos partidários também? Que movimento do povo foi aquele meu filho? Não foi o PASSE LIVRE que chamou o povo a principio se dizendo apartidário, mas não foi esse mesmo PASSE LIVRE em cuja a demanda tinha sido vitorioso disse: Agora os partidários podem participar. Os partidos de esquerda, movimentos sociais foram a Rua na ultima quinta-feira a convite do PASSE LIVRE e não de penetra. O PASSE LIVRE foi claro: Somos apartidários mas sim a maioria dos membros é de esquerda

  • Alan, vê se cresce muléque. Larga esse facebook e vai estudar história. #todesacocheio dos que chegaram agora e acham que são a nata da humanidade, tomei muita borrachada nas costas pra termos Democracia hoje.

  • Eu tenho um testemunho a dar e não sei se Alan está disposto a conhecê-lo, mas o farei.

    Sempre fui pobre. Vim no Noroeste mineiro fugindo da extrema pobreza. Ainda na primeira infância fui obrigado a puxar pequenos tufos de mato com as mãos para limpar a lavoura e, em geral, nosso alimento era angú de milho ou de banana verde, leite que furtávamos do dono da fazenda enquanto ajudávamos na ordenha das vacas e algumas frutas igualmente furtadas.

    Cheguei no RJ em 1971; frequentei a primeira escola pública em 1972 sendo obrigado a ir para as aulas descalço uma vez que me faltava chinelos. Nesta época para se conseguir vaga em escola pública éramos obrigados a dormir na fila a partir de uma quarta feira para ser atendido na segunda feira seguinte. Até para renovar a matrícula era essa peleja ou perdia a vaga para um novato. Em 1976 troquei a escola pela feira livre. Educação nunca foi prioridade: prioridade era sobreviver. Ainda nesta época a pobreza era tamanha que meu apelido era "Rildo pouca-roupa" com apenas algumas peças que se revezavam tanto que mesmo quando trocava uma pela outra parecia estar com a mesma.

    Também nesta época eu e meus pares (meninos e meninas da mesma idade) se calava absolutamente quando via uma patrulhinha ou camburão (Alan conhece isto?) porque estar livre nas ruas era vagabundar e isso era tratado como crime. Tocar violão no botequim, jogar cartas na rua ou reunir-se em pequenos grupos nas esquinas tornava-se alvo certo para a PM.

    Talvez ele não saiba, mas eu frequentei fila para comprar feijão. A inflação de 80% ao mês faziam os preços acordarem de um jeito e ao fim do dia ser quase o dobro do que era pela manhã. Já na idade adulta para se conseguir um emprego era outra luta. Se ficasse desempregado o tempo médio para se conseguir um novo emprego era de aproximadamente 18 meses. Os salários não passavam de 80 dólares e, não raro, trabalhadores viajavam pendurados nas portas e janelas dos trens de tão lotados eram.

    Talvez o Alan não saiba, mas a escola pública foi construída para reproduzir esse estado de coisas e assim ela sempre foi de péssima qualidade porque servia aos pobres e pobres não tinham direito a uma educação de qualidade porque o saber liberta. E diferente do que era até o ensino médio, as universidades públicas sempre foram de excelência, mas aí só pertenciam aos ricos, uma vez que poucos eram os pobres que chegavam a frequentar o ensino universitário.

    Então veio um governo popular e democrático que jurou que todos os brasileiros teriam 3 refeições diárias; que o ensino seria universalidado; que teria mais empregos para os trabalhadores; que teríamos mais crédito para ter bens e serviços até então negados para os mais pobres; que brasileiros e brasileiras teriam direito à moradia etc. Como não apostar numa proposta assim Brito?

    Lula assumiu o poder em 2003. Alguns anos depois criou o Bolsa Família e os mais pobres passaram a almoçar e jantar, outros incluíram o café da manhã. Criou o Prouni para que pobres pudessem ir à faculdade e fazer o ensino universitário (chamado de ensino superior porque para ricos, e então superior à maioria dos brasileiros que só alcançavam o ensino médio. Por isto que a maioria dos professores do Brasil só tinha o magistério (médio) para lecionar na escola pública). Eu mesmo fui à faculdade com 44 anos e hoje, graças ao Prouni e aos impostos dos brasileiros tenho o ensino universitário. Lula criou ainda mais de 10 milhões de empregos com uma política de valorização do produto brasileiro, de incentivo às indústrias, ao comércio; abriu linhas de créditos para o setor de serviços; criou o programa Minha Casa-Minha Vida e quem morava em palafitas teve o direito de ter sua casinha melhorada.

    Eu apostei e deu certo. Quando a gente vê brasileiros e brasileiras indo às compras, felizes com seus empregos e apostando em algo novo buscando melhorar condições de vida a gente pode sorrir e dizer: Foi uma luta dura, mas os partidos de esquerda (PT, PC do B, PDT, PSB e alguns outros) começaram tudo isto. Não fosse por eles nós pobres ainda estaríamos retraídos submetidos ao sub emprego, sub salário, educação ainda super precarizada e sem perspectiva de acesso aos bens e serviços.

    Rildo Ferreira

  • Onde se lê: "...porque estar livre nas ruas era vagabundar e isso era tratado como crime." leia-se "porque estar livre nas ruas era ser vagabundo e isso era tratado como crime".

  • E ae Rildo beleza.
    Outro dia comentava com um grupo de amigos que só quem viveu em realidades como a sua e a minha (de pobre, rural e sem oportunidade) sabe dar valor as reais mudanças pelas quais o país vem passando.
    Não foi fácil chegar à faculdade e ter um diploma de ensino superior, mas hoje podemos dizer que, todos tem a oportunidade de chegar lá.
    Aos 11 aos andava mais de 7km para pegar onibus ou arrumar uma carona para estudar na época do ginásio, estive outro dia na região onde morei e passa um onibus a 50 metros da casa onde morava para levar os estudantes de ensino básico em escola da região e os maiores para estudar na cidade. Lhe confesso que as lágrimas me vieram aos olhos, por que vi ali que esta dura realidade esta mudando.
    Só quem viveu a luz de um candeeiro e caminhar as escuras pelas estradas no retorno para casa depois de um dia no colégio sabe que o projeto luz para todos trás inúmeras oportunidades de melhoria na qualidade de vida e inclusão de quem mais precisa.
    E por ai vai...
    Muita coisa precisa mudar: combate a corrupção, melhoria da qualidade na saúde, educação, combate à inflação, o país precisa produzir mais alimentos para enfrentamento da crise, o combate ao tráfico precisa de muito investimento principalmente em inteligência, as nossas polícias precisam de incentivos não financeiros mas em treinamento e melhor preparo destes oficiais, os nossos professores precisam de valorização e de recursos para educar nossas crianças e jovens.
    Dos problemas que pontuei acima acredito que o combate a corrupção é o mais gritante de todos e incluo aqui o combate a sonegação de impostos.
    Bola pra frente. Empenhemo-nos em fazer um Brasil cada vez melhor.
    Somos um povo lindo, criativo, trabalhador.
    E merecemos um país que corresponda ao nosso orgulho de ser brasileiros.