Qual é a força que a China quer mostrar?

A imprensa, verifique esta manhã, tratará o grande desfile militar comemorativo dos 70 anos da vitória chinesa sobre os invasores japoneses, na II Guerra Mundial, como uma exibição de força bélica do país.

 

É um – senão mais que um – erro.

 

A parada de 12 mil soldados, 200 aviões, 500 equipamentos de combate, é muito menos significativa que a presença de 30 chefes de Estado  e o destaque que teve, entre eles, o tratamento de aliado preferencial que recebeu o presidente russo, Vladimir Putin.

 

Os meios de comunicação chineses, em linha com seu governo, destacam a ausência de pretensões militares do país e o gesto do presidente Xi Jinping de anunciar, em pleno desfile, o corte de 300 mil efetivos do Exército Popular de Libertação – cerca de 15% do total de 2,3 milhões de militares chineses – serviu como gesto de comprovação destas intenções.

 

Seria como se os EUA anunciassem um corte de 200 mil pessoas em seu pessoal militar.

 

O maior desfile militar já realizado pela China é, essencialmente, político.

 

As armas e artes de guerra, como dizia Carl von Clausewitz, são apenas a extensão dos objetivos da política.

 

E elas serviram para demonstrar que a China quer ir além de seu papel de mercado (e mercador) da economia mundial.

 

E que a aliança sino-soviética está mais forte do que em qualquer momento desde o início dos anos 60, antes que os dois países deterioraram suas relações ao ponto de quase guerrearem por uma questão de fronteiras que muito mais espelhava um conflito de liderança na Ásia.

 

Observem, no final do mês, como isso se expressará no discurso de Putin na Assembleia das Nações Unidas.

 

A China quer se impor como avalista – financeiro, inclusive – de uma mudança de paradigma na ordem internacional e o tentará fazer  de forma muito diferente do que havia no mundo bipolar da Guerra Fria, que desde a derrocada da União Soviética tornou-se unipolar e norte-americano.

 

A Russia dirá, rebatendo as sanções econômicas que lhe querem impor, que o Ocidente não controla toda a energia do mundo.

 

A China já está dizendo que os EUA e sua ameaça de elevar as taxas de juros já não controlam todas as finanças do mundo.

 

Os dois, juntos – a China com os meios físicos e financeiros e a Rússia com o conhecimento tecnológico, dirão que os americanos já não controlam toda a força do mundo, como há 20 anos vêm controlando.

 

Pode parecer temerário fazer estas afirmações, mas é perceptível que estamos às vésperas do fim de uma era de poder imperial.

 

É obvio que não nos interessa, aos brasileiros, torcermos por um novo império que se substitua ao que decai.

 

Mas, incrivelmente e apesar de qualquer pretensão hegemônica que possa haver, não há a possibilidade de qualquer ruptura que não seja em direção à multipolaridade.

 

É dramático que nosso país, neste momento, esteja à míngua de força e interlocução mundial.

 

Dramático mesmo, pois somos um dos muitos pólos de poder que podem se impor neste novo arranjo.

 

Ainda assim, com a miopia de nossa elite dirigente, presa a fofocas de vila e a “disse me disses”  paroquianos, embora ainda sejamos coadjuvantes, já não somos simples figurantes.

 

É preciso estar de olhos abertos para aproveitar as oportunidades que se oferecem de afirmar o Brasil.

 

Embora os ciclos de poder imperial no mundo sejam, como tudo, cada vez mais curtos, perder o tempo da sua mudança é o maior crime que se pode cometer contra o país.

 

Em seu “Esquerdismo, Doença Infantil do Comunismo”,  Lênin afirmava que quando os de baixo não querem e os de cima não podem continuar vivendo à moda antiga é que a revolução pode triunfar”.

 

Não sou lá um leninista, mas acho que essa afirmação – se não serve totalmente, talvez,  para a ordem social –  retrata com fidelidade os momentos de mudança na ordem internacional.

 

O mundo muda e está mudando vertiginosamente.

 

E vertigem, em História, é um processo de décadas.

 

Os chineses, que hoje desfilam seu poderio, estavam, há 50 anos, lutando por uma tigela de arroz.

 

 

 

Fernando Brito:

View Comments (20)

  • pois Foucault inverteu o aforisma dizendo "a política é a guerra sustentada por outros meios". o que vemos claramente no BR com uma mídia insensata, porca, mentirosa a sustentar a casa-grande decadente

  • Este raciocinio explica a intensa atividade da CIA no judiciario da America Latina. Estão usando os deslumbrados para manter a infruencia do imperio.

  • Há sinais claro que a balança de poder do mundo está se alterando. A Criação do BRICS e esta aproximação Russia e Chima mudam as forças globais. Muito importante será a 70ª sessão da Assembleia Geral do Mundo que será realizada no dia 15 de setembro próximo , onde Putin, líder russo vai discursar na Assembléia Geral, pela primeira vez desde 2005. O que ele tem a dizer trará inúmeras repercussões, sendo considerado o estadista mais influente do mundo e o responsável por alianças que estão alterando o poder mundial.

  • A força da maior ditadura do mundo, a tão adorada china comunista do PT: sem liberdade de expressão, sem oposição, uma corrupção sem limites nas obras públicas.
    A China está por quebrar.

    • você leu isto na Veja ,e depois os comentários na Globonews,

      que dó....

  • " o corte de 300 mil efetivos do Exército Popular de Libertação" = o estado está quebrado e esta cortando custos

    • falar das "ditaduras" que não interessam, e esquecer das ditaduras que interessam (arábia saudita é uma monarquia absolutista) não é uma boa forma de iniciar uma discussão franca, sem bate-boca de torcedor.

      cortar 300 mil, com 2 milhões remanescentes, é cortar 15%, não é sinal de quebradeira, é sinal de ajuste fiscal.

      o mundo quase quebrou em 2008, só não foi igual a 1929 porque o capitalismo aprendeu a ser keynesiano quando necessário. salvaram o sistema financeiro desregulamentado (e temerário) ao custo de arrocho social.

      além disso, a china é melhor amiga dos eua nos negócios e nas finanças. há muitas empresas americanas produzindo barato em solo chinês aproveitando os baixos salários, e isso desde a época de kissinger e nixon, não é novidade para ninguém informado.

      além disso, como gigante exportadora, a china tem imensos ativos em papéis e moeda americanos, é a china que está financiando a farra americana dos seguidos déficits na balança de pagamentos e na emissão do dólar.

      a queda da bolsa da china não é um evento catastrófico como em um país desregulamentado e com livre movimentação de capital especulativo.

      como não adotou a política neoliberal, e faz reservas cambiais baseadas em seguidos superávits comerciais, não depende de "investment grade" e de taxas de juros para agradar capital volátil que não produz nada, apenas mantém a sustentabilidade (credibilidade das dívidas) da economia.

    • Hoje a tecnologia suplanta os homens facilmente. Um drone pode dizimar um pelotão rapidamente. Logo, cortar soldados faz todo sentido.

  • Alex, não seja ridículo! Use só um pouquinho o cérebro. Dói não...

  • Bom dia,

    o Brasil como sempre perde o viés do cavalo selado na porta ou por falta de competencia ou simplesmente por termo uma direita que só pensa em causa própria e não no Brasil como um pais, como os demais lideres mundiais o fazem com um nacionalismo bárbaro. Isso fico demonstrado em uma reportagem aqui quando se compara a política externa do U.S com o exército americano. Até quando vamos viver como vira latas do mundo e de nós próprios?

    • o economista sul-coreano ha-joon-chang, professor da universidade de cambridge, fala que a diferença entre os países ricos e os países pobres não são suas populações pobres, iguais nos dois lugares, mas a elite rica.

      os ricos dos países desenvolvidos querem disputar o capitalismo no mundo, com benefícios para seu país, enquanto os ricos nos países em desenvolvimento se consideram "cosmopolitas", cidadãos do mundo, desligados de sua terra natal e portanto, prontos para serem capatazes das riquezas naturais regionais para as economias centrais.

      é uma elite que não quer competir de igual para igual no capitalismo internacional, se contenta em integrar-se de maneira subalterna à divisão internacional do trabalho, como produtores de commodities, industrialização de baixa tecnologia e exploradores do trabalho barato da classe pobre local.

      um país do tamanho do brasil não pode ter aspirações tão pequenas.

  • Bom dia,

    o Brasil como sempre perde o viés do cavalo selado na porta ou por falta de competencia ou simplesmente por termos uma direita que só pensa em causa própria e não no Brasil como um pais, como os demais lideres mundiais o fazem com um nacionalismo bárbaro. Isso fico demonstrado em uma reportagem aqui quando se compara a política externa do U.S com o exército americano. Até quando vamos viver como vira latas do mundo e de nós próprios?

    • Fico imaginando as relações trabalhistas sem os sindicatos. O trabalhador pediria algo e o patrão diria "corre atrás".
      Não teríamos um mínimo de direitos sem poder de barganha.

  • ô, alex. tua abissal insipiencia em geopolítica é, como diria Roberto Campos..., desumana.

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