Nada foi mais agradável que começar o dia lendo o que eu gostaria de ter escrito e não pude, pela falta de tempo e de condições.
Paulo Nogueira, do Diário do Centro do Mundo, porém, lavou-me a alma com o desagravo feito a memória política de Hugo Chavez e aos sentimentos do povo venezuelano depois que Marina Silva apelou para uma referência ao “chavismo” como forma de criticar o PT.
Se ela quer criticar os petistas, tem todo o direito. Vai criticá-los por outras razões, diferentes dos que aquelas que os nacionalistas e trabalhistas como eu o fazem, mas é seu direito.
O “chavismo”, porém, como o “getulismo” foi há mais de 60 anos, não é uma política, mas um sentimento popular e, nos dois casos, provocado na população por ter visto, pela primeira vez e assombrada, um governante se preocupar com ela. Ao criticá-los, dessa forma, pelo “ismo” que criaram, Marina critica o que de melhor estes sentimentos produziram, que vai além dos homens e sobrevive à sua morte, como sobreviveu aqui e lá: a ideia de que o povo tem direitos e que o governo do país pode e deve ser ocupado por quem se preocupe com eles.
E aqui me permito falar pessoalmente, por isso.
Meu avô era um trabalhador humilde, pintor de paredes. Sabia assinar seu nome e ler os jornais. O suficiente para ser um homem esclarecido, como muitos que habitavam Realengo, um subúrbio operário, nos anos 40 e 50.
Portanto, sabia perfeitamente quem foi o governante que lhe possibilitou sair de uma “casa de cômodos”, como eram conhecidos os cortiços na época, para uma boa casa ali, num conjunto de IAPI, no tempo em que os conjuntos habitacionais não “enlatavam” seus moradores.
Também sabia quem lhe tinha proporcionado, como trabalhador, ter uma carteira que lhe assegurava horário de trabalho, descanso semanal e férias e a aposentadoria, que ele adiou o quanto pôde, para não deixar de ser o que sempre foi: um trabalhador.
Igual tinha consciência de quem começou a massificar a escola pública e que fez com que seus filhos pudessem estudar. Minha mãe – que dorme aqui ao lado, no hospital, lutando para viver – tornou-se uma professora primária e pôde educar-me, aliás também numa escola de Getúlio, a Escola Técnica Federal Celso Suckow da Fonseca, hoje Cefet.
Somos, ela e eu, filha e neto da escola pública, do acesso do povo aos direitos sociais, e, em última análise, também do governante que inaugurou a ideia de que o povo era titular do país e não, como na república Velha, “um caso de polícia”.
Nem meu avô, nem minha mãe, nem eu somos ingratos ao ponto de usar o nome de alguém assim como ofensa e, sobretudo, para designar os sentimentos que isto provoca no povo como algo pejorativo. Meu avô pode, na sua simplicidade, ensinar-me muitas coisas: como segurar um martelo pela ponta do cabo, como usar corretamente um serrote e como ser um homem de bem só depende de nossas decisões e de nosso respeito ao próximo.
São coisas que me permitiram respeitar o trabalho e as pessoas.
Aliás, as incompreensões sobre Getúlio acabam sendo esclarecidas por duas palavras: país e povo. Quem os ama, acaba entendendo o que ele representou. Quem despreza o Brasil e os brasileiros, acaba por odiá-lo, como fez Fernando Henrique ao dizer que sepultaria a Era Vargas, sem contar que o espírito barbudo – um daqueles que, mesmo sem saber, virou herdeiro dos direitos sociais que Getúlio promoveu – de um operário viria enterrar sua vanglória.
Se Marina quer usar chavismo no lugar de lulismo, para não ficar evidente sua ingratidão com o movimento político que a tirou das brenhas do Acre para lhe dar os holofotes de que dispõe hoje, que o faça diretamente.
E se sujeite a carregar o estigma de Caim.
Posto, abaixo, o artigo de Paulo Nogueira.
Marina e o chavismo
Que Marina quis, exatamente, dizer com “chavismo”?
Paulo Nogueira
Bem, coisa boa não foi. Chávez foi usado por ela mais ou menos como Zé Dirceu por Serra num debate com Haddad na disputa pela prefeitura de São Paulo.
“Você é amigo do Dirceu, não é?”, perguntou Serra, uma, duas vezes. Ele parecia achar que o eleitor de São Paulo é um fundamentalista cujo Corão é a Veja. Deu no que deu a estratégia de Serra para derrubar Haddad à base de uma amizade.
Marina demonizar Hugo Chávez é algo que diminui não a ele, que já entrou na história como um homem que não se conformou em ver seu país ser tratado como quintal pelos Estados Unidos e mudou isso com coragem, abnegação, sacrifícios e colossal integridade.
Diminui a ela, porque mostra – se não oportunismo baixo, como foi o caso de Serra – falta de compreensão histórica.
A Venezuela era boa, até Chávez, para uma minúscula elite que vivia em Miami. O petróleo venezuelano acabava fazendo coisas como asfaltar Nova York e inflar a fortuna de uns poucos nativos — pouquíssimos, é mais apropriado.
Os chamados 99% — no caso venezuelano, 99,99% — eram desprezados e mantidos numa pobreza abjeta comparável à das periferias brasileiras.
Chávez acabou com isso.
Colocou os pobres no topo das prioridades quando chegou ao poder, pelas urnas. Os recursos do petróleo passaram a ser canalizados para os próprios venezuelanos, o que valeu a ele um ódio sem limites – e golpista – da parte dos Estados Unidos.
Chávez chegou a ser vítima de um golpe orquestrado pelos americanos e mais a plutocracia contrariada venezuelana, mas dois dias depois voltou ao poder por pressão popular.
Chávez pôs foco na educação e na saúde pública. Deu petróleo a Cuba, e em troca médicos cubanos não apenas foram atender venezuelanos pobres que jamais tinham visto um consultório como também passaram a lecionar em escolas de Medicina.
As urnas consagraram Chávez repetidas vezes. Foi tamanho o impacto de Chávez na Venezuela que Caprilles, o principal líder da oposição, assegurou que manteria os programas sociais chavistas caso vencesse as eleições presidenciais.
No ano passado, uma pesquisa sobre os países mais felizes do mundo colocou os venezuelanos no topo na América do Sul. Chávez elevou a auto-estima de um povo que era invisível para seus governantes.
Um esplêndido documentário mostra o que foi o chavismo: “A revolução não será televisionada”. Recomendo vivamente que seja visto. Ele está no pé deste artigo.
As cenas de devoção e tristeza do povo pobre da Venezuela em sua morte foram extraordinariamente tocantes. Jornalistas de todo o mundo se perguntavam: onde se veria tal comoção na morte de um líder? Na França, na Inglaterra, nos Estados Unidos?
Pausa para rir.
No Brasil, Chávez foi submetido a um linchamento criminoso e incessante por uma mídia que temia acima de tudo que Lula combatesse privilégios – a começar pelos dela, mídia – com a intensidade de Chávez.
O chavismo é um marco fundamental na nova atitude dos líderes sul-americanos diante da predação centenária dos Estados Unidos.
Se Marina não sabe disso, é ignorante. Se sabe, é uma oportunista que está em busca dos afagos da mídia como os políticos dos quais ela diz ser diferente. Fora dessas duas hipóteses, existe a possibilidade de que ela seja uma mistura de ambas as coisas.
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MARINA FALOU PARA A CASA GRANDE..............ELA JÁ ESTA LÁ.......AFINAL "NECA"DE SABEDORIA ,DE CULTURA ,DE OBSERVAÇÄO DOS FATOS..................NECA DO ITAU ,COM CERTEZA APLAUDIU.
Temo que Marina nao chegue nem ao meio da campanha. Vai passar vergonha. Vai ser humilhada pelo desprezo do povo. Coitada.
Irretocável!!
Chavismo e a obra de Hugo Chaves. Chavequismo e a maracutaia em que se meteu Marina.
O legal disso é que os sonsos vão tirar o palanque da direita e assumir junto com o PIG e depois, sumir.
e a Venezuela está hoje em uma situação de dar inveja a qualquer país. inflação controlada, investimentos maciços em infra estrutura, em papel de igualdade com os chineses que são os maiores compradores do petróleo, desprezando a parceria comercial dos EUA... o povo está no melhor dos mundos, bens de consumo à vontade!! não é mesmo??? (vamos ver quem percebe a ironia)
Débora o que?
Debora, você acredita que mesmo passando por tudo isso que seu grande conhecimento dos problemas da Venezuela expos o povo ainda está melhor do que antes da era Chaves.
"No ano passado, uma pesquisa sobre os países mais felizes do mundo colocou os venezuelanos no topo na América do Sul. Chávez elevou a auto-estima de um povo que era invisível para seus governantes."
meu conhecimento é bem pequeno, concordo. mas discordo que a situação que está posta, em termos de economia do país, indica prosperidade, crescimento do PIB, etc.
Para fazer-se ironia necessita-se inteligência. Como não vi sinal desta, não me foi possível encontrar aquela.
bem colocado.
Vou argumentar, primeiro não sou venezuelano.
Segundo, um país que foi espoliado pelos USA, dificilmente
se reergue.
Um país que tem por enquanto só petroleo para alimentar
seu povo, é um país de se tirar o chapeu, e ele sabe que precisa
inventar condições do povo daqui a cinquenta anos se nutrir
por conta própria.
Este povo tem uma coisa que nós não temos ainda, tem a
mesma ação patriotica que CUBA, coisa que não temos ainda
esta é a arma maior de um POVO, não se engane que sejam
carros, casas, dinheiro no bolso, festas e viajens ao mundo...
não são o que Chaves deixou a seu povo é maior que isto...
"One refresh for you, you now the Vietnan?".
A Déborah sabe porque ela mora na Venezuela e convive diariamente com sua população mais pobre e necessitada. Oh, wait!!! Não, ela não sabe.
é verdade, eu não moro na Venezuela mas sei, sabemos, o que é inflação descontrolada. todos que criticaram o meu post não rebateram os fatos: inflação alta, dependência comercial da China e Cuba (majoritariamente), etc. vamos crescer na discussão, se os fatos que eu trouxe estão errados, argumentem.
Vocês me lavaram a alma com esses textos. parabéns aos missivistas pela bela resposta. Somente o tempo para revelar o que se esconde por trás de certos abjetos.
Realmente, capitei vossa irônia! A mesma que demonizou o Estado novo, que transformou Jango no maior salafrario da historia, que suplicou aos militares que nos salvassem dos comunistas, que colocou o Collor higienicamente no poder para nos libertar dos marajás, que colocou FHC no poder para nos salvar das dificuldades econômicas, e por fim a mãe das irônias "Eu tenho medo", tenho medo de um País justo, de um País onde a maioria tem voz, de um País onde os poderosos tentam nos impor sua vontade mas ja não somos tão otários como antes, os blogs sujos nos põem a par da verdade, e a mídia oficial se afunda a cada dia no buraco que ela mesmo cavou levando com sigo seus iguais, eu realmente tenho medo de que se o atual governo continuar do jeito que esta, nos aproximamos da Escandinávia!
Não alimentem o troll. Ele sabe o que é certo e o que é errado, mas não deseja o debate; seu único objetivo é fszer seus inimigos (nós) gastarem energia defendendo suas ideias contra uma parede impenetrável (ele). Matem sua vaiade de fome - NUNCA RESPONDAM A UM TROLL.
Marina, Marina, voce se entregou!