Réquiem por um sonho. Por Nílson Lage


Hoje (escrevo às 10h do dia 25 de maio, 69º aniversário da morte de Roberto Simonsen, 40ºda estreia de “Uma nova esperança”, da série Star Trek), quando o Brasil caminha para pendurar-se no cabide do Império do Ocidente como extenso e desfrutável espaço do domínio, acho por bem lembrar a história do sonho de um país soberano e independente, grande e próspero.

Começou com os Andrada – José Bonifácio, o naturalista, que sonhava com uma reforma agrária para dar terra a escravos libertados – e ganhou concretude com Irineu, nossa primeira ferrovia, nossa primeira aciaria, nosso primeiro estaleiro e nossa primeira presença financeira do mundo.

O Visconde de Mauá faliu em 1878, espremido por bancos ingleses, mas deixou de herança uma geração de engenheiros brilhantes e militares insubordinados que se formaram na escola militar com a ideologia do cálculo integral e a rigidez do pensamento positivista.

Dessa ninhada vieram Rebouças, que varou a Serra do Mar numa ferrovia incrível que ainda lá existe, e Euclides, que viajou como repórter aos sertões do Brasil e descobriu, com assombro, quão forte é, ainda assim, nosso mestiço pobre e inculto. Da mesma cepa descende o índio Cândido, soldado bravo que ordenava morrer, sendo preciso, mas jamais matar quem luta por sua terra.

Descendente mais remoto ainda é o promotor Getúlio, que governou na recessão com mão de ferro, criou a mística do trabalho e, depois, ungido pelo povo em votação direta, buscou a energia dos rios e escavou o óleo que diziam não haver por essas terras, pagando por isso com a vida.

Foi então que o projeto ganhou forma, no tumulto dos anos 50, tempo de Juscelino: ocupação do Oeste e da Amazônia, indústria mecânica, construção naval e aeronáutica, pesquisa nuclear – Álvaro Alberto – implantação da tecnologia no campo e reforma agrária, relações com todos os países. Este o norte do breve governo de Jânio, que condecorou Guevara e criou a Eletrobrás sonhada por Getúlio, e de Jango, em cerco permanente.

Houve um parêntesis, mas a bússola voltou a apontar esse caminho aos militares com a Embrapa fertilizando o cerrado, a indústria de defesa, o apoio ao MPLA de Angola e os demais eventos surpreendentes do governo Geisel.

Mais um parêntesis de quase vinte anos. O Brasil cedeu na informática, nos projetos nucleares, no domínio das telecomunicações e do espaço aéreo; quase entregou o petróleo e os bancos que alavancavam seu progresso. E mais cederia, não se alçasse ao poder um governo trabalhista conciliador que, no entanto, retomou o que pôde desses projetos, expandiu o ensino técnico, promoveu a mobilidade social e a formação universitária.

Foi demais a dose e a ressaca é amarga. Parece que o sonho acaba aqui, de morte prematura, jovem ainda no tempo das nações. Salvo eventos inesperados, será esquecido por novas realidades. Só tenho uma pena a mais, ao lembrar essa história: que, tendo sido tão rico de pensadores, poetas, canções, homens de ciência e sabedoria, possa terminar assim, sepultado por gente tão medíocre e cheia de ódios insensatos.

Fernando Brito:

View Comments (28)

  • EU SÓ LAMENTO NOSSA CAPACIDADE DE ESCONDER COVARDIA COM A DESCULPA DO PACIFISMO,SÓ LAMENTO AS MORTES DE JOVENS QUE LUTARAM EM VÃO POR UM POVO QUE NÃO MERECE A LIBERTAÇÃO.

  • Mais um parêntesis de quase vinte anos. O Brasil cedeu na informática, nos projetos nucleares, no domínio das telecomunicações e do espaço aéreo; quase entregou o petróleo e os bancos que alavancavam seu progresso. E mais cederia, não se alçasse ao poder um governo trabalhista conciliador que, no entanto, retomou o que pôde desses projetos, expandiu o ensino técnico, promoveu a mobilidade social e a formação universitária.

    É essa a menção que merecem os governos Lula e Dilma? Tenha paciência.

    • Só de citar a promoção da mobilidade social já expressa o que de mais importante aconteceu no período Lula-Dilma. A redução do tamanho da base da pirâmide social foi um feito extraordinário dos governos petistas, mas só os livros de História do futuro vão mostrar. Por outro lado, achei bastante equilibrada e realista a visão dos períodos anteriores, sem o tradicional maniqueísmo binário de certa esquerda.

    • Tenha paciência a senhora! Podemos acusar os trabalhista de muitas coisas, menos de entreguistas! Que entraram nesse nosso ancestral jogo político sujo é verdade, nada diferente dos 'doutos' pseudo liberais que infestam nossa política. Gente que mata antes que sejam delatado!

  • um belo texto, mas a historia nao acabou; o povo esta acordado, atento e com disposiçao de ir pra luta; essa corja que reagiu e temporariamente tomou o poder é fragil, sem a menor capacidade de implantar um projeto de tamanho retrocesso; é, de novo, um parentesis, mas que tera um periodo menor que aquele, e sera o combustivel de um grande salto adiante

  • Uma correção nerd: Uma Nova Esperança é de Star Wars, não Star Trek.

  • Só para lembrar: esse povo "que não merece a libertação", apoiou Getúlio e o elegeu quando pôde; elegeu Juscelino; elegeu Jânio, também - não sejamos seletivos - mas elegeu Jango como vice; teve suas lideranças eliminadas logo no primeiro momento do Golpe de 64 e ao longo de toda a Ditadura (e até hoje, veja-se o recente massacre no Pará) ; elegeu Collor, sim, após a maior campanha de manipulação da informação levada a efeito até então; ah! elegeu o FHC, que havia derrubado a inflação e o reelegeu; elegeu Lula duas vezes; elegeu Dilma duas vezes e, conforme demonstram as pesquisas de intenção de voto de todos os institutos, mesmo após 3 anos de massacre midiático, elegeria Lula novamente em 2018. Não, o problema de nosso país NÃO É O POVO.

  • A história do brasil não começou ontem e nem vai terminar amanhã. Muito leite foi derramado por esta "elite" escrota ao longo dos séculos, sufocaram dezenas de rebeliões ao longo de nossa história, mas a coisa não acaba por aqui. A eleição de Lula em 2002 e as vitórias em 2006, 2010 e 2014 não deixaram à elite escrota outra alternativa que não o golpe com ajuda gringa. Isso mostra que eles já estão com dificuldades para manter o poder. Uma data na história é fruto de um longo processo que, por vezes, leva séculos se desenvolvendo. "Apesar de você(s), amanhã há de ser outro dia".

    • Exato ! Esses "medíocres cheios de ódio" (segundo o autor) sempre foram os donos do "poder". Vamos a partir de agora, como diz Requião, visar o PODER ao lado do governar ! A esquerda precisa IMPOR o PODER a si mesma para que finalmente o Brasil pare seus retrocessos sistemáticos provocados pelos oligarcas canalhas de 500 anos. Basta !!!

  • Só uma retificação? "Uma Nova Esperança", que completou 40 anos no último dia 25, é um episódio da série "Star Wars", e não da série "Star Treck", como colocado no texto. No meio nerd, isso é um erro gravíssimo, tão grave quanto ser flagrado em conversas escusas, na sua residência, com um empresário envolvido em tramenhas ilícitas, altas horas da noite.

    • Perfeito, exatamente isso, pena que o autor errou de filme, mas o texto é brilhante. Vivemos hoje o Império Contra Ataca ou The empire strikes back no original, enquanto o nosso Yoda estiver VIVO ainda há esperanças.

      Erra, feio contudo, quem deposita a s esperanças no POVO, esse vem dando mostras imensas de alienação e calhordice, afinal os coxinhas, embora não queiram, são POVO, assim como a silenciosa população dos guetos brasileiros formados por favelas e morros, desse POVO ai nada se espere. Os primeiros sonham com Miami e os segundos , sonham com um prato de comida.

      Apenas a classe operária organizada pode balançar o condomínio GOLPISTA e defenestrar os verdadeiros DONOS do PODER para o esgoto da história.

      Esperemos então pelo Retorno de Jedi, Return of the Jedi no original de 1983.

  • Não seria uma nova esperança do star wars? e no caso de onde veio os "40"... tu ta falando dai do Star Trek "The motion picture" ?

  • Jamais perderia a e esperança na Nação continental os filhos da mãe pátria estão deixando entrar tudo aquilo que os outros filhos amados, rejeitam mas jamais cairá de joelhos ante os trairas do momento isso não se faz com a nação.

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