Sininho não é Che Guevara, é a Sheherazade esquerdóide. E a direita gosta.

“Num país que ostenta incríveis níveis de pobreza, onde os direitos da população são frequentemente esquecidos e que sofre de uma politicagem endêmica, a atitude dos depredadores é até compreensível”.

A frase acima, há de concordar o estimado leitor e a arguta leitora, é absolutamente compatível com o que diria qualquer “blackbloquista”, destes que admitem como legítimo o exercício da violência em manifestações, antes ditas populares e agora restritas a quantidades dignas de seitas.

Esta frase, no entanto, é apenas uma versão que fiz da declaração da apresentadora Rachel Sheherazade, ao defender o bárbaro espancamento de um rapaz negro por um grupo dejovens  imbecis no Flamengo, tempos atrás.

Disse ela, ipsis literis:

“Num país que ostenta incríveis 26 assassinatos a cada 100 mil habitantes, arquiva mais de 80% de inquéritos de homicídio e sofre de violência endêmica, a atitude dos ‘vingadores’ é até compreensível”.

Assim como não defendo o vandalismo, nem o linchamento de ninguém, muito menos de Sininho ou Sheherazade, porque não sou um imbecil justiceiro, também não concordo com o movimento de “vitimização” de pessoas sobre as quais há fortes indícios que tenha planejado atos que vão além de qualquer “tática de autofesa”, como preparar coquetéis molotov ou levar galões de gasolina para pretender incendiar próprios públicos.

Elisa Quadros e Sheherazade, uma em cada hemisfério, são adeptas do exercício arbitrário das próprias razões, que acreditam legítimas.

Já levei algumas borrachadas de PM e funguei com gás lacrimogênio, o suficiente para não gostar absolutamente nada dos que, em minha juventude, chamávamos de “samangos”. A princípio, claro, na militância já os despersonalizamos para um genérico “repressão”.

E, perdoem-se as senhoras da sala, polícia é foda, desde que o mundo é mundo.

A diferença é que hoje, a regra é poder  se manifestar-se . Os abusos, brutalidades e selvageria policiais, diante de manifestações pacíficas seriam, agora, o que estaríamos discutindo se e como punir.

Mas, não.

Estamos discutindo os “musos e musas” de manifestações que, por interesses políticos – e por conta, também, de tal selvageria policial – foram, a princípio, glamourizados pela mídia.

Caetano ganhou capa de jornal com máscara preta.

Boechat defendeu os quebra-quebras.

Jabor os saudou como mais que os “carapintadas”.

Agora, os garotos e nem tão garotos, abandonados pelo sistema conservador que os viu como ferramenta de desestabilização do governo -muito mais como porta-vozes de anseios por educação, saúde, dignidade que não deram ao povo em seu secular domínio do Brasil – estão aí, largados ao chão como laranja espremida, da qual não pode ser tirado mais caldo algum e que, portanto, merecem ser lixo.

Pessoas não são lixo, não importa o que tenham feito.

Seja o garoto que roubou um cordão ou a mocinha que planejou um pueril e irresponsável incêndio.

Como também não são heróis, nem ele da distribuição da riqueza, nem ela com a fogueira “revolucionária”.

Houve uma confusão imensa entre direito de manifestação e direito de provocação e quem saiu cambeta disso foi a liberdade de as pessoas se expressarem.

Hoje, para o bem e para o mal, manifestação tem de ser feita em meio a cordões policiais.

O que, ainda que fossem todos frades capuchinhos – e estão a léguas disso – já é um constrangimento e um elemento de afastamento das pessoas.

Mas têm de estar ali, porque já se adotou como norma que, numa manifestação qualquer, meia-dúzia tem o direito de quebrar, vandalizar, incendiar.

Como escreveu um amigo: “os caras fazem bombas, quebram lojas, bancos, orelhões, pontos de ônibus – que são usados por trabalhadores para ir e voltar do trabalho todo dia! – e aí quando a força policial vai contra eles isso é perseguição política?”

A esquerda não é isso.

Sobretudo porque, divergindo de um governo social-democrata “manso e silente”, como tantas vezes nos irrita que este seja, jamais serve de combustível à máquina de propaganda de uma direita que os insuflou e que, agora, ainda tenta tratá-los como criminosos de alta periculosidade, o que não são.

São brotos tortos e deformados do lodo político a que vem sendo levado este país, lama formada por uma política que apodreceu.

O conservadorismo reage como fera às mudanças que isso precisa sofrer, numa reforma que não é possível acontecer dentro das estruturas parlamentares convencionais, parte da podridão.

Só um movimento extraordinário – mas dentro da regra suprema da democracia, o voto – pode fazê-la.

Mas não há nada que deixe mais histérica a direita do que a ideia de uma constituinte exclusiva para reforma política e de um plebiscito para legitimá-la.

Porque isso, ao contrário das vidraças quebradas e dos “ativistas queimados” é que muda a vida brasileira.

Quanto aos meninos, meninas e aos nem tanto assim, não precisam de solidariedade política, porque esta não merecem, pelo mal que fizeram ao direito político de livre manifestação.

Precisam de um julgamento justo, sem manipulações ou situações forjadas e, se culpados, de penas que não os brutalizem.

Porque, do contrário, seremos como a Sininho ou a Sheherazade, donos absolutos e intransigentes de verdades inquestionáveis e mais preocupados em linchar os divergentes  do que em consertar e avançar coletivamente.

Quando um país deixa de olhar o futuro e de discutir como chegar a ele e passa a viver exclusivamente da manchete do jornal de hoje, perde o rumo como quem anda de bicicleta olhando para o chão apenas.

E quando um país perde o rumo, é parte de sua juventude, que ainda não conhece tanto as pedras do caminho, a primeira a bater com a cabeça.

Fernando Brito:

View Comments (44)

  • Dessa vez vou discordar.

    Já estamos culpando antes de um julgamento?

    Há provas claras da participação de todos que estão enquadrados no inquérito?

    Estamos chamando os manifestantes (violentos ou não)de quadrilha?

    Realmente alguém acha que o voto é a única ação política? Que o voto é transformador?

    A polícia TEM que ser preparada para agir com menos violência qualquer que seja o caso.

    Se não vamos poder justificar o justiçamento policial de um assassino, por exemplo.

    Quem somos nós para determinar que tipo de violência é legítima e qual não é e merece porrada e inquéritos e detenções que podem ser ilegais

    Se acharmos que em alguns casos a polícia pode responder à violência com violência os blaquibloquistas já ganharam

    • Não estou culpando, Sérgio, e disse que espero que não se aceitem armações policiais na Justiça. Nem estou defendendo que se faça violência contra qualquer manifestante. As prisões e detenções podem ser ilegais. Podem, também, ser legais, até porque foram determinadas com reiteradas ordens judiciais. Isso não garante a legalidade, mas não nos permite chamar de arbitrárias. Concordo plenamente que a polícia deva ser treinada para usar a mínima força possível. E não tem nada a ver com justificar assissinato policial, como não justifico o "blaquiblocal".

      • Fernando,

        Muito se fala na polícia despreparada etc.. etc.. mas vimos que em toda parte do mundo polícia usando tudo quanto é tipo de artifício para conter uma "fúria" de pessoas que se dizem organizadas para protestar eu nem sei mas o quê. Como que um policial (pai de família) que está lá no "front" irá se comportar levando pedrada, paulada, coquetel molotov, porrada de tudo quanto é lado,uma "praça de guerra", querem que o policial faça o que? Saia distribuindo flores para todo mundo... não sou a favor abuso policial, mas os que estão do outro lado também não são santinhos...

        • Luiz Rogerio

          Acho muito perigoso esse argumento.

          O exército de Israel fala a mesma coisa: os palestinos não são santinhos ... e baixa o cacete neles lá no "front"

          A minha posição é mais moderada, mas nunca vou me arvorar a decidir o que é esquerda e o que não é.

          E rejeito a militarização da polícia em bloco.

          Não gosto da PM em nenhuma circunstância.

          Resquício da ditadura que a conjuntura, a "base aliada" não nos permitiu reverter.

          • Sérgio, obrigado pelos teus comentários. às vezes entro aqui e em outros dos chamados "blogs sujos" e, tirando o Azenha e mais um ou dois, o linchamento moral em cima desta fração dos manifestantes é incrível.

            Impressionante é que, quando convém, acreditamos na lisura da justiça, da polícia, do MP, dos jornais... Nesse momento não temos a polícia mais violenta corrupta e matadora, o judiciário do RJ não é este que produziu o Fux, o governo não é o do Sergio Cabral, até a Globo vira fonte de informação a ser reproduzida por aí...

            E realmente, comparar a Elisa quadros com a Sheherazade é desleal. Manipulação é a palavra que me ocorre.

          • Prezados Sérgio Ferreira e Bernardo, em nenhum momento coloquei que concordava com polícia metendo pau em manifestantes e vice versa, acontece que vivemos numa democracia, diferente doas anos 60 e 70 que se fosse hoje esse blog e essas conversas nem existiriam, se tá ruim pra alguns, vamos para o campo da política, e em outubro se mude o que quer, o que eu não concordo é esse campo de batalha que vira as ruas, de um lado polícia despreparada e do outro um bando querendo mudar o Brasil quebrando tudo...

        • Luiz
          Sou absolutamente contrário à violência política na democracia, e portanto contrário aos blackbocs e afins.
          Ocorre que as forças do Estado são pagas pelo cidadão para proteger os cidadãos. Não cabe jamais a uma força policial ser agressiva, apenas defensiva e de contensão. Para isso, deve ter rigoroso treinamento. Se eu levar pedradas em um front qualquer, possivelmente só vou saber pegar um arma e disparar bombas de gás ou balas de borracha com ela. Eu, um taxista, um comerciante, uma dona de casa, uma modelo, um pedreiro etc. É absurdo pensar que alguém que passou por rigoroso treinamento em academias de polícia aja da mesma forma que nós, civis despreparados.
          Se for assim, fechemos as academias, pois não servem para nada, é dinheiro (nosso) jogado no ralo.

  • Não lembro quando eu tenha concordado tanto com uma reflexão, como concordo com esta. Grande Fernando Brito!

  • Bom senso não tem bandeira nem cor! Liberdade de expressão é dizer o que se pensa, e não fazer o que der na telha! Cada cidadão deve ser responsabilizado por seus atos - na esquerda, na direita - especialmente na media em que afetam a vida e o patrimônio, público ou privado. Isto é Cidadania.
    Mas "bom senso"não compra, não se ende, não se empresta... requer uma pessoa integrada (sem divisões, como o sujeitinho aí acima, que não mostra qualquer coerência, e nem mesmo respeito pelas decisões do ParTido do qual diz ser partidário)e, sobreretudo, íntegra. Alguem de índole CONSTRUTIVA, apta e disposta a colaborar para que as coisas dêem certo.(A vidinha do sujeitinho aí por acaso piorou? Duvido, mas nese caso sugiro uma boa auto-crítica 0 se e que ele sabe o que ist quer dizer...)

  • Esse pessoal, títeres do conservadorismo, foram para a rua derrubar este governo. Agiram de forma autoritária, anabolizando a direita, sem refletir sobre o que viria com a derrubada do governo atual.

    Não foram para a rua pedir reforma política; foram com generalidades do tipo mais educação, saúde e segurança, e menos impostos.

    Esse não é o primeiro caso de extrema esquerda anabolizando a direita, e não vai ser o último. A esquerda sempre racha, e um pessoal como esse aí vai pra rua detonar aquela esquerda que enfrenta a direita.

    Não conheço o inquérito, e também não confio no Judiciário e no Ministério Público brasileiro, mas essa galera aí passou dos limites do direito de se manifestar.

  • Mande a Sininho e a Rachel Sheherazade para a Índia para elas verem o que é pobreza, para certos lugares da África também.

  • Não sou PT. Paquidermicamente falando, o elemento acima querer desqualificar Dilma e menosprezar LULA mostra que é um paquiencéfalo (cabeça dura) e não merece credibilidade.
    LULA é o maior estadista mundial da atualidade, após a morte de Mandela.
    Dilma 2014 e LULA 2018 e 2022.

  • "...e quem saiu cambeta disso foi a liberdade de as pessoas se expressarem."

    BINGO!!!

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