A Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) fez uma pesquisa para descobrir o que todo mundo já sabia.
Que a internet está crescendo vertiginosamente.
Até aí tudo bem. A pesquisa é fundamental para dar subsídio concreto às ações de governo.
Thomas Traumann, titular da Secom, em entrevista ao blog do Planalto, admitiu que “o brasileiro hoje passa mais tampo na internet do que passa assistindo TV, ouvindo rádio ou qualquer outra coisa. Isso mostra que para nós como governo, nós temos que investir mais na internet.”
Bom saber.
Entretanto, o ministro patinou quando aborda a questão da “confiança” da internet.
No post do Blog do Planalto que descreve a sua apresentação, o texto é o seguinte:
Cresceu a confiança dos brasileiros nas notícias veiculadas nos diferentes meios de comunicação. Os jornais continuam como os mais confiáveis: 58% confiam muito ou sempre, contra 40% que confiam pouco ou nunca. Na PBM 2014, esses valores eram de 53% e 45%. Televisão e rádio têm nível de confiança similares. No caso da TV, 54% confiam muito ou sempre, contra 45% que confiam pouco ou nada. No caso do rádio, 52% confiam muito ou sempre, contra 46% que confiam pouco ou nunca.
Dentre os veículos tradicionais, a revista é o único que inverte essa equação: 44% confiam muito ou sempre, contra 52% que confiam pouco ou nunca.
Já em relação às novas mídias, a desconfiança predomina. Respectivamente, 71%, 69% e 67% dos entrevistados disserem confiar pouco ou nada nas notícias veiculadas nas redes sociais, blogs e sites.
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Na apresentação de Traumann, que traz uma síntesa da pesquisa, ele mostra os seguintes gráficos:
Não vou comentar a “confiança em propaganda” porque me parece um conceito idiota. Você confia mais numa propaganda de TV do que num banner? Por que? Não tem sentido. A pergunta é confusa e tendenciosa em prol dos meios tradicionais.
Quanto à confiança em notícias, a comparação entre “jornais” e “blogs” é totalmente injusta, quase de má fé.
O fato da Secom fazê-la assim, à seco, sem fazer nenhuma observação sobre a profunda diferença qualitativa entre as plataformas, explica a instituição ter injetado tantos bilhões na Globo nos últimos anos, e quase nada na internet.
Olhemos o gráfico detalhado da confiança em blogs, no relatório completo da Secom:
Observe que 5% confiam sempre nos blogs; 20% confiam muitas vezes; 48% confiam poucas vezes e 21% nunca confia.
Interpretar estatísticas sobre um universo que trabalha com a inteligência humana requer, obviamente, inteligência.
A frase de Traumann, em sua apresentação, é tola: “Já em relação às novas mídias, a desconfiança predomina. Respectivamente, 71%, 69% e 67% dos entrevistados disserem confiar pouco ou nada nas notícias veiculadas nas redes sociais, blogs e sites.”
A pesquisa não fala nada sobre “confiar pouco ou nada”, tampouco sobre “desconfiança predomina”.
Os resultados da pesquisa falam em “confiar poucas vezes”.
“Confiar poucas vezes” é bem diferente de “confiar pouco ou nada”, ainda mais se tratando de um universo genérico de um setor caracterizado por uma monstruosa diversidade.
Apenas 21% disseram “não confiar nunca” nos blogs.
De qualquer forma, a diferença principal entre blogs e jornais é que os primeiros são legião.
Há centenas de milhares de blogs no Brasil.
Jornais, há poucos, são geralmente antigos, com distribuição local, e, no Brasil, em virtude do monopólio, tem quase todos a mesma opinião, usam a mesma linguagem, e até mesmo partilham dos mesmos colunistas.
A relação do leitor com o blog é diferente da relação do leitor com a mídia tradicional.
Parece-me antes saudável que poucos internautas respondam “confiar sempre” nos blogs.
Em relação aos jornais e TV, 17 a 18% dizem “confiar sempre” nesses meios. Isso é que não acho saudável.
O cidadão moderno tem de ser desconfiado dos meios de comunicação, seja quais forem eles, tv, jornal ou blog.
O leitor de blog é um cidadão mais moderno que o espectador de TV. Aliás, esta é a razão pela qual ele prefere um blog a um jornal.
O blog costuma ser mais transparente, de um lado, e seu leitor é muito mais crítico, de outro.
O cidadão só acredita numa denúncia de um blog, se vier acompanhada de provas.
Mesmo em se tratando de análise política, sempre me impressiona o grau de independência dos leitores de blog. Há leitores que nos acompanham por anos, são fãs do nosso trabalho, mas se discordam de algum ponto-de-vista, não hesitam em demonstrá-lo, às vezes com veemência.
O leitor de blog confia antes em si mesmo e em seu próprio bom senso do que no blog, e isto para mim é o certo.
A relação entre blogueiro e leitor é muito mais complexa, contraditória e democrática do que a relação entre colunista de jornal e seu leitor, porque a interação é a base desta relação.
O leitor de blog é diferente do zumbi da mídia, que acredita em tudo que uma revista diz, por exemplo, mesmo que a informação venha baseada em fontes anônimas e delações de bandido.
Se eu fizer uma denúncia grave contra um político e falar que a fonte é anônima, ou que o delator é um bandido, meus leitores vão rir da minha cara. E isso é saudável.
Além disso, o leitor pode até confiar muito num determinado blog, mas se perguntado se confia nos blogs, de maneira geral, responderá que não, obviamente.
Somente um imbecil completo confiaria “sempre” em todos os blogs, até porque eles são contraditórios entre eles mesmos. Um sujeito que confia no Tijolaço não confia nos blogs da Veja, por exemplo. E vice versa.
Ele responderá o que nessa pesquisa? Que confia “poucas vezes” nos blogs, certo?
A mesma coisa vale para sites e redes sociais. Eu confio em alguma coisa ali, não em tudo, obviamente.
A partir disso, Thomas Traumann conclui que “a desconfiança predomina” em blogs, sites e redes sociais?
É por causa dessa maneira de pensar, ignorante, preconceituosa contra a internet, que o governo enche as burras da Globo e deixa a internet à míngua, com resultados pífios para o próprio governo.
Ninguém fica sabendo quase nada sobre o governo, como se constatou quando teve início a campanha eleitoral deste ano.
Enquanto isso, a família Marinho, que já é a mais rica do país, fica ainda mais rica.
E a sociedade, menos informada.
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O problema é que a pergunta sobre Blogs é genérica. Há Blogs e Blogs. Tem Blog da vizinha, tem seu Blog, de um jornalista serio.Portanto a pergunta está mal formulada e não difere alhos de bugalhos e leva a uma distorção do resultado da pesquisa feita.
Quanta gente carecendo de inteligência neste governo! Acordem, pelo bem do Brasil!
Não sei se carecem de inteligência. Mas que excedem em "esperteza" e aliança com a velha mídia não tenho a menor dúvida. Ainda bem que não são pesquisadores de curas para doenças. Muita gente ia morrer com o remédio errado, pois interpretam/distorcem que é uma beleza
Parabéns, Miguel do Rosário, matou a pau, ou melhor, matou a cobra e mostrou-o. Fica evidente que estas pesquisinhas da SECOM (ô órgão complicado, sô!) servem apenas de pretexto para enricar mais ainda os Marinho e Cia.
A jornalista que respondia pela SECOM, pelo que me lembro, pensava como pensava como pensa o atual, nada mudou, embora a expectativa como o atual era muito positiva. Não espero nada dessa mudança de Ministério, embora torça muito que seja diferente do que tem sido.
FERNANDO
Gostaria de sua abordagem sobre o 247 so aceitar COMENTARIO de quem e cadastrado no FACE.
Isso nao e puro monopolio da informacao da google. Reclamam com razao da globo mas querem implantar esse novo monopolio
Entretanto, o que a secom deveria fazer era, reservar uns 30% do orçamento da união para ser gasto apenas com blog competente, como Nassif e PHA
Pois é, e Dilma bota a maior fé nessa turminha da SECOM...
E alguém tem alguma dúvida de que a intenção do tal Traumann, com esta pesquisa aí, é, simplesmente, arranjar uma justificativa para continuar injetando milhões na Globo? Dilma, querida presidenta, acorda! Com uma SECOM deste tipo, a platinada pode continuar faceira da vida! Vai ter muito fôlego para bater e bater, pesado, todo santo dia, no governo. Olha, vou te contar, é revoltante esta síndrome masoquista que assola este governo. Haja estômago e paciência!
Concordo que o ministro patinou feio. Em minha opinião, penso que demonstrou um respeito demasiado e denunciante.
Respeito demasiado, porque na medida em que sabemos ser ele um ministro e, portanto, uma pessoa esclarecida e bem informada, é perfeitamente óbvio imaginarmos que seja sabedor de tudo que a grande mídia vem aprontando de errado e abusivo nos últimos tempos. Assim sendo, não seria difícil concluir de que sua avaliação retratou mais o respeito que parece ter pela grande mídia, que pela resposta que os eleitores deram nas urnas em forma de uma clara falta de confiança e condenação por tantas mentiras e tantas baixaria fartamente patrocinadas por essa grande mídia.
Denunciante, porque entendi que ele denuncia a si mesmo ao deixar explícito não reconhecer a grande evolução de poder e confiança, que os blogs sérios, imparciais e altamente profissionais vêm conquistando progressivamente. Posso estar fazendo um julgamento antecipado e, de certo modo, implicante, mas, parodiando o piscar de Janot, já me deixou preocupado o fato do ministro piscar tão prematuramente.
pergunta mal formulada sobre os blogs. deve ter sido intencional. Pra mim, que sou leitor assiduo deste e do PHA, DCM e uma meia duzia de mais quinze, responderia que não confio em blogs. Blog me lembra Uol, G1 e similares. Ou ainda aquelas mentiras corriqueiras na internet que chegam por email. Ministrinho tendencioso esse.