A um passo da ilegitimidade. Por Vladimir Safatle

Multidões vão de mobilizar, na esperança de que não aconteça, definitivamente – porque em grande parte ela já ocorreu – a ruptura democrática.

Se ela acontecer, porém, o que nos aguarda é dramático.

Concordo em boa parte com o quadro – devo dizer o pesadelo? – desenhado hoje por Vladimir Safatle em sua coluna na Folha.

O governo Temer não existirá

Vladimir Safatle, na Folha

A partir de segunda-feira (18), o Brasil não terá mais governo. Na democracia, o que diferencia um governo do mero exercício da força é o respeito a uma espécie de pacto tácito no qual setores antagônicos da população aceitam encaminhar seus antagonismos e dissensos para uma esfera política. Esta esfera política compromete todos, entre outras coisas, a aceitar o fato mínimo de que governos eleitos em eleições livres não serão derrubados por nada parecido a golpes de Estado.

É claro que há vários que dirão que o impeachment atual não é golpe, já que é saída constitucional. Nada mais previsível que golpe não ser chamado de golpe em um país no qual ditadura não é chamada de ditadura e violência não é chamada de violência. No entanto, um impeachment sem crime, até segunda ordem, não está na Constituição. Um impeachment no qual o “crime” imputado à presidenta é uma prática corrente de manobra fiscal feita por todos os governantes sem maiores consequências, sejam presidentes ou governadores, é golpe. Um impeachment cujo processo é comandado por um réu que toda a população entende ser um “delinquente” (como disse o procurador-geral da República) lutando para sobreviver à sua própria cassação é golpe. Um impeachment tramado por um vice-presidente que cometeu as mesmas práticas que levaram ao afastamento da presidenta não é apenas golpe, mas golpe tosco e primário.

Temer agora quer se apresentar como líder de um governo de “salvação nacional”. Ele deveria começar por responder quem irá salvar o povo brasileiro dos seus “salvadores”. Seu partido, uma verdadeira associação de oligarquias locais corruptas, é o maior responsável pela miséria política da Nova República, envolvendo-se até o pescoço nos piores casos de corrupção destes últimos anos, obrigando o país a paralisar todo avanço institucional que pudesse representar riscos aos seus interesses locais. Partido formado por “salvadores” do porte de Eduardo Cunha, Renan Calheiros, José Sarney, Sérgio Cabral e, principalmente, o próprio Temer. Pois nunca na história da República brasileira houve um vice-presidente que conspirasse de maneira tão aberta e cínica para derrubar o próprio presidente que o elegeu. Em qualquer país do mundo, um político que tivesse “vazado” o discurso no qual evidencia seu papel de chefe de conspiração seria execrado publicamente como uma figura acostumada à lógica das sombras. No Brasil de canais de televisão de longo histórico golpista, ele é elevado à condição de grande enxadrista do poder.

Mas não havia outra chance para tal associação de oligarcas conspiradores. Afinal, eles sabem muito bem que nunca chegariam ao poder pela via das eleições. Esta Folha publicou pesquisas no último domingo que demonstravam como, se a eleição fosse hoje, Lula, apesar de tudo o que ocorreu nos últimos meses, estaria à frente em vários cenários, Marina em outros. O eixo central da oposição golpista, a saber, o PSDB, não estaria sequer no segundo turno. Temer, que deveria também ser objeto de impeachment para 58% da população, oscilaria entre fantásticos 1% e 2%. Estes senhores, que serão encaminhados ao poder a partir de segunda-feira, têm medo de eleições pois perderam todas desde o início do século. Há de se perguntar, caso fiquem no poder, o que farão quando perceberem que poderão perder também as eleições de 2018.

Os que querem comandar o país a partir de segunda-feira aproveitam-se do fato de o país estar em uma divisão sem volta. Eles governarão jogando uma parte da população contra a outra para que todos esqueçamos que, na verdade, são eles a própria casta política corrompida contra a qual todos lutamos. Diante da crise de um governo Dilma moribundo, outras saídas, como eleições gerais, eram possíveis. Elas poderiam reconstituir um pacto mínimo de encaminhamento de antagonismos. Mas apelar ao poder instituinte não passa pela cabeça de quem sempre sonhou em alcançar o poder por usurpação.

Diante da nova realidade que se anuncia, só resta insistir que simplesmente não há mais pacto no interior da sociedade brasileira e que nada nos obriga à submissão a um governo ilegítimo. Nosso caminho é a insubmissão a este falso governo, até que ele caia. Este governo deve cair e todos os que realmente se indignam com a corrupção e o desmando devem lutar sem trégua, a partir de segunda-feira, para que o governo caia e para que o poder volte às mãos da população brasileira. Àqueles que estranham que um professor de universidade pública pregue a insubmissão, que fiquem com as palavras de Condorcet: “A verdadeira educação faz cidadãos indóceis e difíceis de governar”. Chega de farsa.

Fernando Brito:

View Comments (35)

  • É como acontece na história. Quando o poder é roubado por usurpadores e facínoras, começa a insurreição. E eu verei Cunha pendurado pelo pescoço.

  • Existem 172 Deputados neste Congresso eleito com o apoio econômico MASSIVO E INCONSTITUCIONAL DE EMPRESAS com consciência jurídica, respeito a Constituição e ao voto do CIDADÃO para barrar este Impeachment FAJUTO ???
    Esta é a questão que saberemos a logo a SEGUIR...

  • O Congresso legitimamente eleito, numa democracia representativa, cassará o mandato de uma presidente que cometeu grave crime fiscal. Todas as fábulas que se criam em torno desse fato são para fazer de conta que o PT é um grande partido e que tinha um governo voltado para o povo.

    • Eu queria ver um bunda-mole como esse Safatle nas barricadas que ele propõe levantar. Babaca, picareta petralha.

    • Tá certo. Cunha e cia bem representam vocês. Nisso eu concordo contigo e os outros patetas.
      E tem mais. Se Dilma cometeu crime fiscal como tu apregoas, onde estão os governadores que tiveram a mesma atitude?

      • E onde está o próprio vice-presidente que também assinou os tais decretos? Convenientemente esquecidos.

        Alisson e ernesto (se é que são duas pessoas distintas): vocês são tão corruptos quanto aqueles que vocês estão querendo colocar no poder!

        Mas não se preocupem. Segunda-feira continuamos com a presidenta que foi eleita pelo voto do povo. Por mais burra que seja.

  • Sarney, Renan e afins só se tornaram crapulas agora?
    Impressão minha ou eram aliados até agora pouco?
    PicareTagem intelectual pura!

  • A questão ainda a ser respondida... EXATAMENTE...

    https://www.youtube.com/watch?v=ThbpUlM_n9E

    Não sei se o Herbert Vianna ainda apóia a esquerda e continua não topando o Lobão... Se SIM...
    Os Para-Lamas deveriam refazer a letra atualizando a lista dos políticos para o evento do golpe do Impeachment...

  • Senhor Vladimir, Temer não irá tolerar desordeiros irresponsáveis em seu governo.
    Ameaças civis de movimentos sociais ou quem seja serão combatidas no rigor da lei.
    Se Dilma sair, façam oposição dentro da regra do jogo (assim como o impeachment é do jogo).

    • Qual legitimidade tem ou terá o Temer para tolerar ou não tolerar o que quer que seja???!!! Por favor, leia e busque ensinamentos sobre a necessidade da existência do "crime de responsabilidade" para ser aplicado o impedimento do presidente da república. Não tem jeito, não houve tal crime, o desejo político é que esta forçando a barra com as pedaladas para transformá-las em crime, portanto, e como cada um, durante sua vida, desenha seu próprio retrato, e por ser golpe sim, quem o praticar, por consequência, é golpista. Daqui há 10, 20 ou 30 anos, vocês serão lembrados como golpistas, é fato!!!

      • Temer também obteve 54 milhões de votos e o destino quis (a se confirmar) que sucedesse a Presidente da República.
        As pedaladas, no volume vultuoso que ocorreram, são sim um crime orçamentário que nos levaram à crise. O desejo político foi um combustível extra, e sem ele não estaríamos aqui discutindo. Mas é a regra do jogo: uma vez fundamentado juridicamente, vira processo politico.

  • O STFede!

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    Esposa do Ministro do STF Luis Roberto Barroso abre Offshore com nome de solteira

    Tereza Cristina Van Brussel Barroso esposa e sócia do ministro do Supremo Tribunal Fedreral Luís Roberto Barroso, abriu em 09 de junho de 2014 a Offshore TELUBE FLORIDA, LLC, a offshore está registrada nos Estados Unidos com o nome de solteira Tereza Cristina Van Brussel na Ilha de Key Biscayne, o endereço da sede é um imóvel da própria Offshore, porém no registro a esposa de Barroso apresenta como seu endereço particular o de um conhecido operador de Offshore’s de brasileiros que tem problemas com a justiça brasileira a “Barbosa Legal” na 407 LINCOLN ROAD PH-NE, MIAMI BEACH também na Flórida.
    O endereço da Telube e do imóvel ficam 350 Ocean Dr UNIT 302N, na Ilha Key Biscayne estado da Flórida fica à poucos minutos do centro de Miami e é um lugar lindo para conhecer. Ela fica conectada à Miami através da ponte Rickenbacker.
    O imóvel fica em uma das areás mais valorizadas da Florida, que também é sede da Offshore e tem um estimado em USD 3 milhões o que daria hoje uns R$ 12 milhões de reais.
    (…)

    FONTE: http://vetorm.com/?p=558

  • Golpistas, não levem a mal não, mais não há comparação entre a explanação de acusação pró-impecheament feita por Miguel Reale Junior no plenário da Câmara agora de manhã, e a defesa da presidenta Dilma Roussef feita por José Eduardo Cardoso, logo em seguida. Depois da defesa demolidora de Cardoso, fiquei com dó de Reale Junior, eis que, o Presidente da Câmara fez questão até de lembrar que ele ainda tinha 10 minutos de tempo para a acusação. Ocorre que, os argumentos para o impecheament são tão frágeis que não deu para o jurista preencher o vácuo. Bem que, após o ‘lembrete’, Reale Júnior ainda tentou alguns minutos de embromatio juris. Na verdade, não sei o que pensar: é Reale Júnior que é um jurista mediano ou Cardoso que é brilhante? Na explanação de Reale Júnior notei que mais uma vez restou extrapolado os limites da denúncia, conforme determinado ontem em ata do STF. Os argumentos são tão fracos que Reale Júnior precisou usar de novo a expressão ‘conjunto da obra’. Eu sinceramente esperava mais competência de Reale, e, senão competência, esperava mais equilíbrio da tal ‘jurista’ Janaína Paschoal, e menos ingenuidade de Hélio Bicudo. Ora, Janaina Paschoal parecia estar sob possessão demoníaca num vídeo que circula nas redes sociais. O mínimo que o povo brasileiro merecia é ter um – a - jurista de nível a frente de um processo de tal importância para o país.
    Bem, o que interessa é o seguinte: se parte da população não sabia que há uma tentativa de golpe em andamento no país, acabou ficando sabendo hoje, por via reflexa – porque não podemos contar com a isenção do monopólio mídiatico - , só de ouvir as explanações da acusação e da defesa hoje de manhã na Câmara dos Deputados. Basta comparar. Eu tenho comigo que a vida política dos deputados que endossarem essa agressão ao estado democrático de direito poderá restar acabada em 2018. Simplesmente porque não esperaremos a história ser contada.Nós temos obrigação democrática de denunciar agora e sempre, dia e noite essa tentativa de golpe. Sim. Eis que, mesmo que parte dos deputados venham a mostrar bom senso durante a votação - para não dizer ‘caírem a ficha’ - , vamos ter que nos manter permanentemente mobilizados para que a presidenta possa governar até o fim do seu mandato. A turma pró-golpe fabricou a crise econômica ao fazer terrorismo econômico, bem como parte da Câmara resolveu boicotar e rechaçar as propostas e tentativas do governo a favor da economia. O país está parado por causa de uma crise econômica fabricada. Quem acompanha a política sabe que crise econômica foi diuturnamente retroalimentada pela mídia golpista. A extrema direita simplesmente não aceitou o resultado das urnas e está forçando um terceiro turno – sem voto, diga-se de passagem - , desconsiderando o voto depositado na urna pela maioria do povo brasileiro. E, para tanto, como se não bastasse, resolveram usar a empáfia, a soberba e o rancor de um político que é réu em processo de corrupção para tentar apear do poder uma presidenta eleita legitimamente. Ora, o senhor presidente da Câmara não tem moral para conduzir um processo dessa importância para o país. Sequer deveria estar ocupando a presidência da Câmara. Se houvesse mesmo motivos consistentes para um impecheament da presidenta da república, o mínimo que a Câmara teria feito seria retirá-lo da presidência da casa para não manchar o processo. É inacreditável que teve até um bolão - do golpe - sendo arquitetado por Paulinho da Força, aliado incondicional de Eduardo Cunha, dentro da Câmara. Portanto, ruptura constitucional não é aceitável em hipótese nenhuma, mas com esse viés de irresponsabilidade e imoralidade, é de lascar.
    Em tempo 1: a presidenta mostrou por A mais B porque sempre manteve José Eduardo Cardoso ao seu lado, ignorando críticas de parte da militância petista. A presidenta é inteligente e sabe o que faz. Cardoso é competente sim.
    Em tempo 2 : será que alguém emprestou 100,00 reais para Lobão e Alexandre Frota entrarem no tal bolão?

    • Sandra, o impítimam não foi bem escrito pelo fato da doutora Janaína não ser especialista neste tipo de ação. Ela é doutora em direito Possessório, a parte do direito que trata com exorcismo e demo-cracia (governo do diabo). Nunca ouviu a expressão advogado do diabo?
      A Dilma mostrou por A + B que se colocar A no lugar de B, a frase não fica certa. Então, o lugar do Cardoso nunca deveria ter sido o MJ. Escalou o cara certo na posição errada.
      Não sei quem emprestou, mas se receberam o dinheiro, fatalmente devem ter comprado salaminho. Agora que os coxinhas estão andando com o Alexandre Frota, não querem mais filé. Só pedem salaminho. Enquanto os petralhas comem mortadela, os coxinhas entram fundo no salaminho. Domingo será um festival de salaminho.

  • O choque diante do assalto ao poder será inevitável. O povo tem muito pouco a perder, quem viver verás. O retumbante choro dos golpistas virá com atraso...

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