13/12, o Dia da Vergonha das Elites. Por Samuel Pinheiro Guimarães

 

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Muitos anos depois, o povo brasileiro (as elites já conheciam) ficou sabendo, através de documentos do governo norte americano, da ativa participação dos Estados Unidos no golpe de 1964, e sua sequência, o AI-5, instrumento importante de poder ditatorial para garantir a implementação de uma política econômica neoliberal.

Essa política, na época comandada por Roberto Campos com o auxílio ativo de economistas americanos, tinha como objetivos, entre outros, o arrocho salarial que permitiria aumentar os lucros das empresas; a concessão de privilégios ao capital estrangeiro; a abertura comercial e a livre movimentação do capital estrangeiro.  

A política econômica do governo golpista de Castelo Branco, apesar de sua resistência final desesperada, foi sofrendo alterações nos governos militares que o sucederam em direções contrárias aos interesses norte-americanos, como no caso das políticas nuclear; de informática; de comércio exterior; de fortalecimento das empresas estatais etc.

O governo de Fernando Collor retomou, com grande empenho, a política econômica inicial do golpe de 1964, terminando abruptamente com a política de informática, praticando uma abertura comercial radical e unilateral, com graves prejuízos para a economia, em especial para a indústria nacional, e muito favorável aos interesses exportadores dos Estados Unidos e de outras grandes potências industrializadas.

Mais tarde, depois do honroso interregno de Itamar Franco, honesto, nacionalista e democrático, surge das sombras do Plano Real a figura de Fernando Henrique Cardoso, príncipe dos sociólogos, principal ideólogo das classes conservadoras e mais ricas da sociedade brasileira.

Fernando Henrique recolocou em prática, com ardor e malemolência, o programa neoliberal do Consenso de Washington: privatizar ao máximo; abrir a economia; rigoroso equilíbrio fiscal, âncora cambial; redução do Estado.

Teve FHC, nesta tarefa inglória, a entusiástica ajuda dos grandes conglomerados de imprensa, em especial da Rede Globo, que tem um papel hegemônico na formação do imaginário e da interpretação dos eventos ao deter cerca de 40 % da audiência total de televisão.

O governo de Fernando Henrique foi um fracasso retumbante do ponto de vista da realidade: privatização das empresas estatais, aumento da dívida pública, aumento da dívida externa, elevado desemprego, altíssimas taxas de juros, destruição da indústria nacional, alinhamento da política externa com os EUA, assinatura do TNP- Tratado de Não Proliferação – e de todos os acordos de não-proliferação e controle de armas de interesse dos Estados Unidos.

FHC somente foi contido em seu objetivo de eliminar, através da aceitação dos compromissos da ALCA, toda a possibilidade de ação desenvolvimentista do Estado brasileiro graças ao amplo movimento de opinião pública que levou ao encerramento das negociações.

Os EUA, todavia, não desistiram até hoje de seu objetivo de construir uma área de livre comércio nas Américas, como provam os acordos com o Chile, o Peru, a Colômbia e os Estados da América Central e a permanente perseguição midiática que se realiza contra o Mercosul.

Até hoje, na grande mídia, o governo Fernando Henrique é celebrado como de grandes resultados devido ao controle da inflação sem se lembrar dos danos estruturais causados à economia e ao Estado brasileiros e da destruição ou alienação das empresas de capital nacional.

Todavia, o povo não se engana e rejeitou, nas urnas, as políticas nefastas de FHC.  

Suspendido o programa neoliberal de FHC e do PSDB  com a vitória democrática do Presidente Lula e de seu extraordinário governo de 2003 a 2010, e com a vitória de Dilma Rousseff,  a campanha das classes hegemônicas para a reconquista do poder e a retomada do programa neoliberal recomeçou assim como as denúncias de corrupção midiatizadas contra o PT e contra Lula.

Esta operação política-midiática se realiza graças à conivência  do Judiciário, desde a primeira instância de Curitiba, nova república do Galeão, com Moro,  até o Supremo Tribunal Federal, e cada um de seus Ministros, coniventes com as contínuas ilegalidades cometidas por Moro, e a solícita ajuda do Ministério Público e do Procurador Geral Rodrigo Janot.

O golpe e os golpistas que destituíram Dilma Rousseff tinham uma agenda já preparada, a Ponte para o Futuro, agora não mais neoliberal mas sim ultra neoliberal.

Seu objetivo é o mesmo de Castello Branco, Fernando Collor e Fernando Henrique: a partir de uma visão equivocada da sociedade e da economia, impedir, para alegria dos competidores internacionais,  o desenvolvimento da sociedade brasileira e a construção de uma sociedade moderna, democrática e inclusiva, menos desigual e mais harmônica.

Seus principais instrumentos são:

  • a PEC 241 aprovada pelo Senado Federal, neste fatídico dia 13 de dezembro;
  • a reforma da Previdência, com sua privatização e danos econômicos e sociais para todos os brasileiros, em especial os indivíduos e classes mais frágeis e os municípios mais pobres;   
  • a revogação da legislação trabalhista, através da terceirização e da doutrina de prevalência do “negociado sobre o legislado”;
  • a privatização dos bancos oficiais e das empresas brasileiras,  em especial da Petrobrás, que, com o pré-sal, poderia fazer do Brasil   um dos maiores produtores e exportadores de petróleo do mundo;
  • o alinhamento da política externa brasileira com os interesses americanos na América do Sul, no que diz respeito à Venezuela, e no mundo no que diz respeito aos BRICS.

A PEC 241  é um verdadeiro segundo golpe de Estado:

  • de iniciativa de um governo ilegítimo, resultado de um golpe de Estado reconhecido como tal no mundo;
  • de implementação acelerada por um governo corrupto e corruptor, até a sua medula,  como revelam o seu modo de operar e as denúncias contra o Presidente Temer e seus principais Ministros;
  • por ser uma emenda constitucional aprovada depois de um processo aparentemente constitucional porém graças a uma série de irregularidades regimentais, cometidas pelos Presidentes da Câmara e do Senado, o último, aliás, acusado de corrupção e objeto de onze processos, sendo declarado réu em um deles;  
  • devido à ausência de debates públicos sobre as consequências da PEC que afetarão a todos os brasileiros, sem que tenha havido discussão  minimamente adequada e refletida  no próprio Congresso, corrompido, que age como constituinte;   
  • cometido por ato legislativo eivado de toda sorte de inconstitucionalidades;
  • que determina e consagra na Constituição as políticas econômicas e sociais  a serem seguidas por cinco governos futuros durante vinte anos, medida sem precedente em qualquer pais do mundo;
  • que privilegia os indivíduos mais ricos do Brasil, detentores de títulos públicos, cujos juros estarão preservados por vinte anos de qualquer regulamentação  ou restrição e terão prioridade para pagamento;
  • que privilegiará os investidores e empresas  estrangeiras que penetrarão em todas as brechas na economia que serão criadas pela inação do Estado e a fraqueza das empresas de capital nacional, a primeira forçada pela PEC 241 e a segunda pelo enfraquecimento dos bancos oficiais.

Este programa ultraneoliberal implantado a toque de caixa é resultado de um pacto entre, de um lado, os políticos acusados de corrupção e, de outro, as elites hegemônicas brasileiras e seus comparsas estrangeiros, no sentido de que a aprovação legislativa destas medidas econômicas, de redução do Estado brasileiro e de arrocho salarial, seria a contrapartida de sua “absolvição” pelo Judiciário das acusações e processos de que são alvo.  

13 de dezembro de 2016 será o Dia da Vergonha das elites brasileiras.

O povo brasileiro jamais aceitará este programa econômico e social, reacionário e catastrófico, e lutará permanentemente pela sua revogação e pelo seu direito a um futuro mais democrático, mais justo, mais próspero e mais soberano.

Daqui a muitos anos, como ocorreu com o golpe de 1964, o povo brasileiro (as elites já bem sabem) tomará conhecimento dos interesses e da ativa participação americana que se encontram por trás do golpe de Estado de 13 de dezembro de 2016.

∗ O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, ex-ministro da  Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE) no Governo Lula, gentilmente enviou este artigo para o Tijolaço. Espero que seja o primeiro de muitos.

     

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5 respostas

  1. Resumo perfeito e claro de tudo que temos acompanhado pelo Tijolaço e outros blogs livres. A esta altura é evidente que a facção estúpida da classe média, que bateu panelas e desfilou fantasiada palhaça, já percebeu que foi enganada. Mas ainda não chegou no ponto de admitir isto, parte jamais vai admitir, porque como todos sabem, quando um burro empaca a coisa é difícil.

    1. “É mais fácil enganar as
      pessoas do que convencê-las
      de que foram
      enganadas.” (Mark Twain)

  2. Texto mais que perfeito! Mostra com visão panorâmica o que subjaz à pauta que vem sendo seguida sistematica e freneticamente no Legislativo, no executivo e no porra do Judiciário. Todo mundo unido em busca de defender o interesse elitista contra a nação e recebendo sua parte pessoal pra vender assim a alma! Vão pagar um dia, quero crer!

  3. O Brasil vive um processo político bem diferente do da Argentina, mas há semelhanças dessemelhantes. Macri corresponde exatamente a Collor, e a propaganda em torno de Cristina corresponde à propaganda sobre a corrupção dos marajás, procurando desmontar os nacionalismos do governo Sarney que, apesar de tudo, tinha o sentido de brasilidade e responsabilidade da presidência. Itamar também tinha esse sentimento, embora um pouco limitado na compreensão da realidade nacional. Já o governo FHC, primou desde o primeiro dia por ser anti-nacional e por mostrar claramente seu desprezo pelos destinos do povo brasileiro. O pouco de responsabilidade social que nele se viu, partiu não dele, mas das exigências de Antônio Carlos Magalhães para dar seu apoio político necessário ao governo. O Brasil se encontrou com seu destino nos governos petistas, em coalizão com partidos de centro muito fisiológicos. Hoje, o Brasil está rendido. CCom a velha desculpa de combate à corrupção, deram um golpe de estaddo nas forças populares e progressistas, que haviam sido eleitas pelas urnas. E puseram, para escárnio da população ingênua que os apoiou, os maiores corruptos do país no poder, depois de usarem de chantagem com eles para que eles apoiassem o golpe votando na deposição da presidente. Agora, os também notórios corruptos do partido de orientação neoliberal, querem exercer diretamente o poder, destituindo os pequenos corruptos que lhes auxiliaram sob chantagem a dar o golpe de estado. Todo este absurdo, onde a justiça também partícipe do golpe tenta também governar além de suas atribuições e tenta inventar meios inexistentes para perseguir os grandes líderes populares, este absurdo, que já enfiou o país numa das maiores crises de sua história, só cessará quando tivermos eleições livres e diretas para a presidência e também para as duas casas legislativas federais. Isto acontecido, e cessada por completo a atuação dos agentes supostamente jurídicos que destruíram boa parte da economia do país com uma bazófia escandalosamente visível de um farsante “combate à corrupção”, a estrada estará novamente livre para a grande marcha do povoo brasileiro em direção a seu brilhante futuro.

  4. Perfeito! Mas infelizmente o povo brasileiro na sua maioria não sabe, não se interessa por política e nem sabe essas coisas, agora novela da globo! Se perguntar todo mundo sabe, até as mais velhas, lembram até dos personagens, triste, enquanto tivermos a mídia em favor dos grandes empresários isso sempre acontecerá.

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