Tivesse o Brasil um Ministério Público, estaríamos diante de um escândalo centenas de vezes maior do que o do “Mensalão”, até hoje presente nas acusações que se faz a Lula. E que revela que o Poder Legislativo se tornou uma casa de chantagem e de venda de votos muito, muitíssimo maior do que sempre foi, desde a aprovação da reeleição no governo Fernando Henrique Cardoso.
Numa entrevista sem papas na língua ao The Intercept, o ex-líder do PSL, deputado Delegado Waldir (aquele do coldre de pistola na cinta), agora desafeto de Bolsonaro e, segundo ele próprio, “muito fã do Moro“, diz que o voto favorável à reforma da previdência foi comprado com R$ 20 milhões em emendas para cada deputado, como também foi comprada a eleição de Arthur Lira à presidência da Câmara, na qual ele distribui os mimos, ao ponto de ser “quem manda no Governo, não o Bolsonaro”.
Corrupção, é bom lembrar, é “solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”. Uma emenda orçamentária é, claramente, uma vantagem e, em troca de voto, definitivamente indevida.
A entrevista não é escandalosa porque não se sabia que isso estava acontecendo, mas porque um dos seus negociadores e beneficiários o admite com todas as letras.
É uma confissão. Aberta, direta, não uma versão.
“Aconteceu na Reforma da Previdência, na eleição do Lira [para a presidência da Câmara] e em mais uma [votação] que não me lembro”, disse Waldir. “R$ 10 milhões [por voto em Lira]. E na [reforma da] Previdência, R$ 20 milhões por parlamentar.”
Precisa mais?
Entretanto, o assunto mal repercute na mídia, à exceção de uma replicação na Folha de S. Paulo.
Há um processo aberto no Supremo Tribunal Federal sobre o uso de “emendas secretas”, que é exatamente o que o Delegado Waldir descreve:
O [Arthur] Lira e o [Rodrigo] Pacheco têm o controle dos recursos. “Dei R$ 10 milhões para você, R$ 20 milhões para o Fernando, R$ 30 milhões para o Waldir”. Quem tem esse controle é o assessor de orçamento, o Lira e o Pacheco. Ninguém mais tem.
O Brasil não vai sair disso sem partidos, porque é exatamente este “varejo” de parlamentares que não têm vínculo senão com sua própria eleição que transformam o Congresso em uma mixórdia que, embora assim, rouba todo o poder para si.