Cofre não faz necessariamente política social. Mas, vazio, a arruina.

arrecadarj

É claro que o problema de queda – ou de elevação muito discreta, para ser exato – da arrecadação pública não veio de uma “incompetência” de Guido Mantega ou de sua equipe.

Os fatores essenciais foram o resfriamento da economia, acentuado pelo terrorismo econômico, e a crise econômica mundial, que mostrou, com os obscenos índices de desemprego exibidos na Europa e nos Estados Unidos (que agora se recuperam) a face monstruosa de uma crise que aqui se evitou.

Mas, também, como resultado da política contracionista adotada já em meados de 2010, que prosseguiu com mais intensidade em 2011.

Que, simultaneamente, apostou na redução da carga tributária – algo desejadíssimo, mas jamais reconhecido, pelos críticos de Mantega – como mantenedor – mais que os gastos do governo, incluídos aí os investimentos públicos – do nível de animação econômica e, como de fato em parte foi, do nível de emprego – mais que o de renda – dos trabalhadores.

Ontem, na Folha, o economista Pedro Rossi, da Unicamp, cita cálculos de como a renúncia fiscal – adotada ao longo de todo o governo Dilma – é muito menos eficaz como multiplicador da atividade econômica que o gasto em investimentos, embora possa, de fato, no curto prazo, reduzir o impacto sobre o nível de emprego.

recdespA expansão das receitas totais nos três primeiros anos do Governo Dilma, em parte pela menor expansão da economia mas em parte também por esta política de estímulo ao emprego, notadamente o industrial, ficou, como se vê no gráfico ao lado, retirado do ótimo Brasil Debate, cresceu em ritmo muito inferior ao da média dos últimos anos, sem que isso tenha tido o poder de conter a redução da atividade econômica, expressa no PIB.

A resposta dos agentes econômicos a isso foi, todos sabem, pífia. É só olhar os efeitos de um toral de desonerações que chegou, já em outubro, a R$ 75 bilhões, muito menores que, por exemplo, os investimentos do PAC, que não somaram ainda R$ 50 bilhões.

Recordo-me de uma visita de um alto dirigente da General Motors ao Ministério do Trabalho, logo após o anúncio do “pacote de bondades” da presidente Dilma à indústria automobilística.

O que ele vinha fazer?

Anunciar a demissão de quase dois mil trabalhadores da unidade da empresa em São José dos Campos – uma novela que se arrasta, em parte, até hoje – sob a alegação de que isso não ia afetar o nível de emprego, pois iriam contratar em outra unidade.  Claro, 500, no lugar de dois mil.

Na minha modesta capacidade de previsão, a primeira ação de Joaquim Levy será frear esta “reforma tributária” sem “reforma tributária” representada pela renúncia fiscal do Governo Federal.  Se houver alguma desoneração, a partir de agora, será extremamente seletiva e avara.

Sinal disso foi o anúncio de que não será estendida a isenção de IPI para automóveis.

As “mãos de tesoura” de Levy, tão alardeadas, certamente vão tirar um naco do financiamento, via Tesouro, dos créditos do BNDES, o que já vinha ocorrendo com Mantega,  vão se voltar essencialmente para as despesas de custeio- cujo controle vai se tornando flácido em governos de continuidade e são menos férteis para a atividade econômica, que para as de investimento, até porque as “porteiras” neste campo estarão guardadas por Nélson Barbosa mas, sobretudo, por Dilma Rousseff.

Mas vão se voltar para outro lado, também, porque Levy tem uma a tradição de arrecadador.

E, como pode ser politicamente conservador mas burro não é, sabe que cortar demais nos gastos – sobretudo os de investimento – se reflete em queda na arrecadação.

Não acredito que Levy provoque um “choque” de cortes, exceto alguns de efeito mais “publicitários” que reais, muito menos de juros, embora também aí possa haver algum “sinal” à fome do mercado. Mas nem de longe, para quem gosta de comparar, parecido com a “bomba atômica” que Armínio Fraga trazia sob o sovaco.

Reproduzo, no alto do post, um gráfico com o desempenho da arrecadação do Estado do Rio de Janeiro no período em que Levy foi Secretário da Fazenda.

O “mercado” está muito preocupado com quem ele colocará como Secretário do Tesouro, o que diz não aos gastos.

Deveria estar também com quem irá para a Secretaria da Receita Federal.

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9 respostas

  1. Correto. Acho que não vem nenhuma concessão grande ao rentismo. A última palavra é da Dilma. O que eu acho muito importante agora é a escolha de um Ministro da Justiça capaz de recuperar a isenção da Polícia Federal, capaz de dialogar com as diversas instâncias jurídicas do país, inclusive o STF.
    É também importante a escolha do Ministro das Comunicações e de um porta-voz. O golpe eleitoral/midiático perpetrado por uma revista lixo e ecoado pela TV/jornais mostra como estamos mal nessa área. É preciso também divulgar melhor o que está sendo feito, caso contrário só fica a pauta negativa da “grande” mídia. Por que financiar mídias golpistas?
    Por fim um Ministro da Casa Civil que converse com todos, alinhave apoios e obtenha sugestões para uma governabilidade melhor.

  2. Estudos como esse do economista Pedro Rossi são valiosos para que a administração Dilma tome decisões que tenham como objetivo de estimular a economia. E um estímulo não apenas colateral, como esse estudo aponta. O ganho da indústria automobilística, por exemplo, tem um fator negativo a longo prazo, pois deixa de lado uma política eficiente de transportes coletivos de qualidade. Tivemos um aprofundamento dos problemas urbanos com mais carros circulando pelas cidades. E outra: estimula o pensamento de viés burguês, que ter carro é sinônimo de liberdade e ascensão social. Resgatemos o antigo nome desse veículo individual: CARRO DE PASSEIO. Não deveria ser “carro de trabalho”, como é hoje utilizado. Transporte coletivo de qualidade tem, ao mesmo tempo um apelo para a racionalidade, a questão ecológica e também ideológica. Para nos deslocarmos para o trabalho, deveríamos, toda a sociedade, estarmos no mesmo barco (ônibus, trem, metrô ou mais o quer que seja).

    1. Isso é fácil propor para os outros. De dentro de um Mercedes Benz ou um BMW, O aumento de carros se deveu, também, a melhoria da distribuição de renda que permitiu a ascensão social materializada pela melhoria do conforto das famílias. A indústria automobilística é uma alavanca de um vasto setor industrial e que pode melhorar a balança de pagamentos, desde que o MUNDO cresça também (um pouco melhor do que a ALEMANHA).
      Pressionado pela situação das contas do Governo (que inclui as despesas do Judiciário e do Legislativo – que estão aumentado seus honorários!), o Governo da Dilma, da fase progressista (que também não é burra!),já anunciou que o IPI volta com tudo, em janeiro/2015…

  3. Se não fosse o pessimismo do Pig agourento e a SONEGAÇÂO desenfreada das ‘elites’ econômicas do BRASIL, o País estaria numa situação privilegiada, com muito mais investimentos produtivos e um PIB muito maior. LEI DE MÍDIAS e RECEITA FEDERAL NELES !!!!

    “O BRASIL PARA TODOS não passa na REDE GLOBO de SONEGAÇÃO & GOLPES – O que passa na REDE GLOBO de SONEGAÇÃO & GOLPES é um braZil-Zil-Zil para TOLOS”

  4. Muito do incremento da arrecadação dos últimos anos adveio por conta da Nota Fiscal Eletrônica – e do E-Fiscal (ou SPED Fiscal), que é um sistema de escrituração contábil eletrônica – e da ampliação do regime do SIMPLES para um número maior de pequenas empresa – a partir do ano que vem qualquer empresa, independente da atividade econômica, poderá aderir ao SIMPLES. Houve a criação do regime do Micro Empreendedor Individual – MEI.
    Essa formalização atingiu também o mercado de trabalho. Essa formalização gera incremento de receitas, como a previdenciária e a do FGTS, mas também impacta em despesas como a do seguro desemprego.
    O próximo passo será a implementação do E-Social (ou SPED Social) que incorporará a folha de pagamento – e outros sistemas afins – à escrituração eletrônica. Segundo especialistas, além de facilitar a fiscalização, essa ação reduzirá a sonegação previdenciária, do FGTS e do Imposto de Renda retido na fonte – em até 50%. Mais um instrumento eficaz contra a sonegação. Era já pra ter sido implantado no fim de 2014 e durante o ano de 2015 já seria uma realidade.
    Essas ações de incremento de arrecadação pela melhoria no poder de fiscalização, assim como uma política de aumento de alíquotas de contribuições sociais para os empregados com um turn-over elevado – como política compensatória para inibir os “acordos” para saques do FGTS e obtenção de seguro-desemprego – ou até mesmo a redução do número de parcelas do seguro-desemprego (justificável em períodos de pleno emprego), devem ser empregadas ao longo do próximo ano.
    Nisso a Fazenda deve trabalhar, e muito.
    Além de propor, claro, como Piketty sugere, aumentar a alíquota dos Impostos de Transmissão Causa Mortis (sobre a Herança) – ITD – de competência estadual, para permitir a transferência de rendas dos mais ricos para os mais pobres. Nos EEUU, a alíquota de imposto similar é progressiva – quanto mais rico, maior a alíquota – e chega até a 60%. Por essas e outras há um grande volume de doações para Universidades e Fundações investirem em pesquisa. Eis algo de bom a ser copiado dos EEUU. Isso tem os mesmo efeito que o Imposto sobre Grandes Fortunas – proposta de FHC posta na Constituição Federal, mas até hoje não regulamentada por lei – teria. Bastaria o Senado Federal autorizar, por resolução, o estabelecimento de um novo teto dessa alíquota – que hoje é de 8% -, com disposto no art. 155, parágrafo primeiro, inciso IV.
    Piketty tem razão. A perpetuação da herança é uma barreira que mantem os filhos da elite acomodados, e vai contra aquilo que tanto apregoa essa elite, a meritocracia.

  5. Meu caro Fernando Brito, o novo Ministro da Fazenda já que no atual momento a Grande Mídia só publica que o Governo deveria começar cortar nos gastos públicos. Que tal começar cortando de uma vez só, Hum Bilhão de Reais nas Verbas de Publicidade Federal na Grande Mídia, pergunto: Seria isso possível?

  6. O aumento de venda de carros no Brasil está mais ligado a retirada o IPI, que diminuiu os preços dos veículos, e queda dois juros que incidem sobre as prestações do que um aumento real dos salários dos trabalhadores. O pequeno aumento ou recuperação de compra que houve na massa salarial, por si só não seria responsável pelo boom de vendas de carros no mercado. Na Europa, o transporte coletivo tem qualidade invejável. Se compararmos ao usuário nacional de transporte coletivo que é tratado aqui com menos consideração que gado, sobretudo nos grandes centros urbanos. Em tempo: sou professor universitário e não tenho nem Mercedes ou outro veículo automotor. E utilizo o transporte coletivo sempre. E quando a necessidade é premente, utilizo-me de taxi. Para que não paire qualquer incompreensão.

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