O texto é de 2014 e o autor é português, mas sua leitura é absolutamente necessária em tempos como os que estamos vivendo.
As afirmações, quando não os berros, prescindem de raciocínio ou, até, de racionalidade.
São mitômanos e o mito é “o produto de uma determinada classe social dominante que acaba por ser incorporado pelos membros da classe dominada, mesmo quando vai contra os seus próprios interesses.
Foi publicado originalmente no blog Chuva Ácida, de Joinville, ao qual peço licença para “”furtar” o ótimo texto.
Barthes e os petralhas, esquerdistas, comunas…
José António Baço
O tema de hoje é a vulgata que todos estamos habituados a ver repetida aqui no blog ou nas redes sociais. “Cuba”, “Venezuela”, “bolivarismo”, “esquerdista”, “petralha”, “comuna” e por aí vai. Quem profere expressões como essas julga ser portador de uma verdade inquestionável. Ou seja, as pessoas acreditam nos poderes mágicos de palavras que, uma vez emitidas, lançam um anátema inescapável sobre o interlocutor.
O fato é que todas essas palavras são cifradas e fazem parte de uma formação que o pensador francês Roland Barthes denominou “mito”. Uma advertência: a popularização da palavra levou a uma distorção do seu sentido. Barthes mantém o conceito no seu significado tradicional filosófico, ou seja, o de um discurso alegórico ou narrativa lendária que pretende dar um fundamento de natureza para a construção dos valores básicos dos povos.
O semiólogo transporta esse conceito para os tempos modernos, pois, em seu entender, o quotidiano das sociedades contemporâneas está repleto de mitos – os pequenos e os grandes – que devem ser decifrados e revelados. Uma tese que ganha corpo com a revolução digital. Apesar de ter mais de meio século, a teoria do mito mantém o seu fulgor e é uma ferramenta teórica que permite descortinar, de maneira eficiente, as contradições que marcam a evolução da sociedade atual.
O mito é o meio para um fim: a imposição de uma certa ideologia (entendida aqui no sentido marxiano, como uma consciência deformada) para a legitimação de uma ordem estabelecida. O mito encontra-se espalhado por todo o tecido social, seja no direito, na moral, na educação, na família ou na política. Mas é nos veículos de comunicação de massa – os grandes vetores de produção simbólica dos nossos tempos – que ele se torna mais cintilante.
O mito tem a função de naturalizar a história e engessar o mundo, de forma a impedir a transformação. Neste contexto, o pensador faz uma denúncia da ideologia burguesa e pequeno-burguesa (o pequeno-burguês é o indivíduo por quem ele nutre uma profunda antipatia), que cria uma espécie de falsa natureza. Mas o que se entende por naturalização da história? É fazer com que os indivíduos aceitem determinados factos como naturais, negligenciando as suas implicações sociais e históricas.
O mito é, portanto, o produto de uma determinada classe social dominante que acaba por ser incorporado pelos membros da classe dominada, mesmo quando vai contra os seus próprios interesses. Produzir essa aceitação – pela naturalização – é a sua função. Enfim, mito e ideologia são parentes muito próximos: entrelaçam-se, confundem-se e são categorias incontornáveis para desmascarar o processo de legitimação da sociedade burguesa.
O mito tem que ser invisível e natural, porque a sua identificação apontaria sempre para uma tentativa de manipulação. Barthes diz que o mito não é nem uma mentira nem uma confissão: é uma distorção. A sua função, na passagem da história à natureza, é despolitizar os fatos, transformando-os em coisas simples, inocentes. Não interessa a interdição, mas a exposição. É por isso que todos os dias a vulgata citada no início deste texto é repetida ad nauseam.
Barthes diz que o mito e a direita andam atrelados. E quando está no campo de atuação da direita, o mito toma posse de tudo, da justiça, da moral, da literatura, da estética, etc. E o mais importante: o mito precisa de uma certa fraseologia e os slogans têm um papel insubstituível neste contexto. A frase feita ajuda a apreender e a justificar o mundo de uma maneira muito mais simples, permitindo uma constatação imediata e sem maiores reflexões.
Para usar um exemplo típico dos dias de hoje, quando se diz que estamos a caminhar para a ditadura comunista parece a constatação de uma realidade inequívoca. Feita a afirmação, referendada por um slogan repetido de forma incessante, não é preciso haver constatação e a historicidade é alijada. Mas na verdade estamos frente a um processo de dominação onde o dominado é quem repete essas expressões.
4 respostas
Texto para salvar e durar cinqüenta anos.
“Mas na verdade estamos frente a um processo de dominação onde o dominado é quem repete essas expressões.” Precisa dizer mais alguma coisa?
Não deixam de ser divertidas essas tentativas de dar um aspecto profundo ao pensamento raso de gente que defende o que há de mais tosco em política e economia. E nem seria preciso ir além do primeiro parágrafo da lenga-lenga para perceber o que ela tem de mais ridículo, poderíamos até parar no “fascismo” do título, pois todos sabemos o que basta para ser chamado de fascista pelo Tijolaço. Fascista, golpista, coxinha, elite que não quer pobre no aeroporto… a lista de rotulações vai longe. E se o autor ainda tivesse a capacidade de reconhecer que todos os lados rotulam (criam “mitos”) até passaria, mas não, ele simplesmente esquece dos que sempre rotularam e só vê os “mitos” surgidos mais recentemente, tentando até mesmo estabelecer uma gênese exclusiva para esta rotulação ilegítima (pois está implícito que a outra lhe parece legítima).
Mas o que será que está por trás disso e tanto incomoda a turma “bolivariana”? Creio que que é o chumbo trocado, pois até pouco tempo as rotulações eram quase exclusivas da turminha, mas de repente a coisa mudou. E o principal é que o chumbo do adversário se revelou mais forte. Chamar quem quer se livrar da gang petista de “golpista” ou “fascista” é um evidente exagero que só os militantes levam a sério. Mas, embora toda rotulação seja simplificadora, chamar o PT de “bolivariano” está muito mais próximo da realidade, afinal até ontem eles rasgavam elogios ao Socialismo do Século XXI e tentaram seguir o mesmo caminho de domínio do Estado, com censura de imprensa, comitês populares e o restante. É isto que mais lhes dói: como nas manifestações de rua, onde antes só batiam, agora apanham. Resta então se refugiar entre os seus e empinar o narizinho em enrolações como a desse artigo.
gostei do texto do ernesto, mesmo sendo contra o golpe branco palaciego e judiciario, TODOS ROTULAM TODOS MENTEM E VERDADE , , MAS ISTO E QUE A GENTE TEM QUE SABER VC TEM QUE REFLETIR, ACHAR O ERRO ONDE ELE ESTIVER , BOLIVAR TINHA UM SONHO FAZERDE AMERICA UMA SO NACAO E ISSO NUNCA SERAJA QUE OS AMERICANOS TEMOS RICHAS INSUPERAVEIS E ISSO DE NOS CHAMAR DE IRMAOS E UM MITO MESMO, SER CONTRA PT NAO TORNA NINGUEM UM FACISTA , MAS SE VC SE ALIA A QUEM E FACISTACOMPROMETE VC E CLARO, O CERTO E QUEESTAMOS BANHADOS PELOS MITOS DISCUTINDO ELES EM LUGAR DE TIRAR OS CORRUPTOS TODOS DO PODER INCLUSO O JUDICIARIO E O PAIS PARADO 200 MILHOES DE BRASILEIROS CONTANDO QUEM SERA QUE ROBOU MAS SE FOI EM FURNAS SE FOI EM MENSALAO SE FOI NA ORBEDRETCH, ,,,,,,,ORAVAMOS ARAR COM ISSO DOS MITOS , VAMOS AO QUE INTERESA O BEM DO BRASIL , CHEGA DE DISCUTIR IMPEDIMENTO, VAMOS CONSTRUIR OS NOVOS CANDIDATOS AO GOVERNO RENOVAR EM PLENO OS DEPUTADOS SENADORES GOVERNADORES ETC…..ISTO NAO E UM MITO E UMA UTOPIA, MAS PREFIRO CORRER ATRAS DA UTOPIA QUE SER MASACRADA PELOS MITOS MORTOS DOS GRUPOS DE PODER