Na madrugada, quando começavam as apurações do referendo que acabaria por aprovar a saída do Reino Unido da União Européia, algo me chamou a atenção.
As únicas áreas onde o “permanecer” ganhava com grande folga do “sair” eram justamente aquelas que sempre tiveram resistências em se sentir parte de um “Reino Unido”, que unido nunca foi totalmente.
Escoceses e irlandeses do Norte votaram em bloco pelo “remain” na União Europeia.
Os distritos londrinos, onde a imigração é mais intensa e sensível, também. Um gráfico do The Guardian mostra que o “ficar” foi amplamente majoritário nas circunscrições onde era maior o número de eleitores não-nascidos no Reino Unido, como você vê ao lado.
A batalha foi, decidida, então, na antes chamada “classe trabalhadora”, conceito que o neoliberalismo quis aposentar, muitas vezes com a cumplicidade da esquerda, ansiosa por um conceito de “classe média” que a encantava pela aceitação que produzia no jogo político.
Decidida e perdida.
A “austeridade”, desde 2008, foi transformando ilusão em pesadelo.
O mundo deu um passo atrás esta madrugada. A Europa, vários, desde o sonho de Victor Hugo dos “Estados Unidos da Europa”. O Reino Unido…bem, este parece começar a dar adeus ao “unido” que nunca foi.
Reproduzo o magnífico texto de Rosana Pinheiro-Machado, escrito sob a tristeza e a decepção desta madrugada:
Essa madrugada, para muitos no Reino Unido, foi um pesadelo. Bandeiras espalhadas pelas casas e gritos de alegria de vizinhos a cada voto para sair. Não sou europeia, mas a cada grito eu confirmava que Londres é uma ilha. Nestes últimos anos, tive a oportunidade de viver o que os ingleses chamam com orgulho de ser a Inglaterra: o interior, especialmente ao norte. A cada grito me senti expulsa. A cada grito eu entendia que este não é o meu lugar. Era o grito engasgado de muitas famílias inglesas que conheci fora da outra ilha – chamada Oxford.
Eu passei a madrugada acompanhando todos os debates em cada canto deste país. Nem vou citar aqui a questão da xenofobia – que é o tema mais discutido e mais óbvio da questão. A xenofobia é apenas um dos sintomas de uma grave crise que começou com o fim da classe trabalhadora (e sua capacidade de articulação) na Inglaterra desde os tempos de Thatcher.
Quem vive no Reino Unido, é de esquerda e acredita na democracia teve que se deparar com questões muito intrigantes nos últimos tempos. Eu vi os maiores democratas que conheço comentando que “como dar uma decisão tão importante para o povo ignorante?”. Este é o ponto central para todos aqueles que acreditam na democracia direta. Então não se pode dar ao povo a decisão porque o povo é ignorante? Quando que pode se dar ao povo então a capacidade de decidir? Quando houver debates intelectuais? Quando isso vai acontecer? Quando vai existir esse dia em que votaremos racionalmente e não com emoção? Quando teremos debatido o suficiente para escolher o rumo de um país? Eu tive que aguentar a noite vendo políticos do Labour dizendo que o povo era ignorante. Que paradoxo.
Foram semanas de movimentação. Brigas entre amigos e familiares – nada que nós brasileiros não estejamos acostumados. Foi uma decisão emocional – como sempre é – baseada na raiva que assolou a classe trabalhadora inglesa.
Muitos gritaram “devolver o país aos ingleses”. É claro que a xenofobia é uma variável importante. Mas olhar só para ela é um erro imenso. O maior problema é a vida fodida da classe trabalhadora que perde seu estado de bem estar social. Aquela fase que o encanador tinha uma casa muito parecida com o do banqueiro acabou. Tudo acabou.
Mas o que acabou principalmente é a consciência de classe (sem levar muito a sério o conceito aqui, okay?) da classe trabalhadora, especialmente do norte do país que empobreceu. O desmonte da identidade de classe começou com Thatcher, que agiu no âmago da troca de subjetividades e do orgulho de classe. Como diz Jones, tampouco penso que amar ser trabalhador de uma mina de ferro seja o ideal, mas certamente a identidade negada da classe trabalhadora resulta não apenas na xenofobia, mas no ódio irrestrito à classe política e à própria classe trabalhadora. “O problema são os pobres” – gritava uma trabalhadora da Universidade que ganha um salário mínimo e referia-se aos camponeses.
Os trabalhadores mostravam rejeição a toda forma política “Nós queremos chutar para fora todos os políticos” –mas, no fim das contas, chutou-se contra si mesmo, pois quem vai pagar a conta da recessão certamente é a classe trabalhadora.
Todas as comunidades pobres que votaram para sair anunciaram que votaram porque não aguentavam mais a austeridade – o que é uma loucura tremenda, mas que temos que ouvir e entender.
Temos, como no Brasil (pedindo desculpa por esta comparação rasa e anacrônica) uma massa perdida e revoltada e uma esquerda – o labor – incapaz de reorganizar a classe trabalhadora. Uma massa – como diria Thompson – cuja economia moral é defensiva. Ela age para não perder o que tem. É o que aconteceu aqui esta madrugada. As pessoas votavam – cegamente – pela sua vida empobrecida, mas movida pelo sentimento de ódio a tudo, muito bem aproveitado pela extrema direita, que agora se junta ao coro do “odiamos a política tradicional”.
Como sempre são os mais fracos que vão pagar pelo desmonte do Estado britânico. Não tenho esperanças numa eleição de Corbyn. A classe trabalhadora desde Thatcher odeia a si própria, assim como odeia o Outro.
Uma tristeza.
28 respostas
Trabalhadores contra trabalhadores é a coisa mais abjeta que a manipulação pode construir. E vemos isso no Brasil também. Afinal, não se pense que aquela turma que foi para as ruas exigir a deposição da Dilma fosse constituída só de riquinhos. Podia ser a maioria, e talvez quem tivesse capacidade de fazer mais barulho, mas muitos pobres são contra o que foi feito nos últimos anos. Nem sabem muito bem o motivo, mas são. Resultado de anos e anos de manipulação ideológica e de ódio. Aquela frase do Tim Maia que dizia que no Brasil pobre é de direita e tal tem seu fundamento sim.
Verdadeiro, seu comentário.
Essa é a realidade que mais dói quando pensamos que grande parte dos apoiadores do impeachment sequer sabe que vão pagar caro, muito caro, pelo retrocesso que o governo Temer está impondo.
Lá, como cá, grande parte da classe trabalhadora é manipulada…
Amei essa charge! Hoje cedo estava pensando exatamente a mesma coisa: por ironia ou não, os únicos votos civilizados foram concentrados principalmente na Escócia e na Irlanda do Norte. Os ingleses propriamente ditos (exceção feita a Londres, que é outra história) são os mesmos tacanhos tomadores de chá com bolinhos do século XIX, que ainda acham que são um império, não entendem lhufas de economia e geopolítica e odeiam “estrangeiros” mesmo que estejam cercados por eles e que até mesmo o seu fornecimento de chá dependa de outros países. Adorariam reeditar as guerras do ópio, se pudessem. Bando de tolos, serão engolidos pelos EUA de vez. E os escoceses, desta vez, são bem capazes de declarar sua independência, estou torcendo por isso.
O erudito LCBRITO e sua sabedoria copiar/colar. Mente oca.
Eu gostei do texto. Obrigado, Brito!
Se a sua opinião sobre o BRITO é esta, por que você lê e comenta, se não gosta? Não dá para entender mente assim, tão doentia, cujo prazer é masoquista. Que coisa, não?
Maria Libia, o Luis Carlos responde ao LCBrito, aquele da parte de cima do Facebook, aquele que é trouxinha…
É sem dúvida o fato mais triste deste início de século, não que a Inglaterra faça qualquer falta a UE, mas pelo que sinaliza sua saída. Alinhamento total a política de Washington que entre outras questões buscará arduamente o esfacelamento do bloco europeu, sintetizando, um passo a mais rumo a inevitável guerra.
Que junto com a insanidade e sabujice da maioria dos ingleses, venha a independência da Irlanda e Escócia.
A instabilidade bélica deve aumentar na região , berço do ocidente, neste momento a Inglaterra deveria deixar claras as intenções subliminares do brexit, tornar-se uma colônia de luxo dos interesses americanos na Europa, uma espécie de capacho felpudo e impermeável, mas ainda assim um capacho.
Tristes sombras se avizinham do céu da velha Europa.
LCBRITO: delator da Lava Jato vai entregar provas de propina para Temer. E agora?
Será que ele tem alguma prova contra o Lula?
Não? Que peninha. O Moro não consegue uma provinha sequer contra o Lula ou a Dilma. Mas consegue contra os “honestos e moralistas” do PMDB e sua corja de partidos golpistas.
Por que será? Tens uma resposta? Será que o Moro é do PT? Tenho certeza que, depois dessas provas, você virá aqui acusar o Moro e a PF de serem petistas. Para deleite de nós, desse blog. Aguardo esse dia chegar. Ah, viu o seu “machão” Bostanaro falando fininho? O cara é um frouxo, não segurou o que disse. Kkkkkk.
Vocês, coxinhas, são patéticos.
Realmente a Inglaterra perdeu seu rumo. Bem lembrado a herança Thatcher e o neoliberalismo pestilento desde então. Veremos como os londrinos irão se organizar na resistência. Sem duvida é o início de uma nova era mas tb uma oportunidade para que a Europa repense seus objetivos.
Só estão vendo um lado, vejam este: http://resistir.info/gb/vitoria_23jun16.html
Interessante. Muitos argumentam que são de fato contra essa elite que passou a decidir suas vidas sem consulta-los. O problema está mesmo na recuperação da extrema direita…
Exatamente! Noves fora a xenofobia ignorante, de que adianta manter-se unido a uma Europa subjugada ao capital financeiro e ao Império ianque? Quem sabe, bucha de canhão para enfrentar (mais uma vez…) a Rússia, com boicotes e guerra? Parece que dessa vez a questão é mais complexa, o buraco é mais embaixo… Só o próprio povo tem o direito de legitimamente decidir!
Esta é uma questão que levantei no post anterior sobre o assunto: será que o Capital ultra-liberal se voltará também contra as estruturas políticas de seus países de origem? A loucura é tanta assim??? Pelo que li acima, a resposta é positiva como já podemos supor. Se a Inglaterra também é vítima do discurso fascista anti-política – o que aqui definimos como discurso dos “coxinhas” – é sinal que a posta política única gira em torno de um fascismo globalizado. Isto nos dá uma outra dimensão quanto ao projeto verdadeiro dos articuladores deste “movimento universal”. A coisa é muito pior e mais excludente do que se imagina!!! Afinal, o que parecia uma estratégia agressiva contra os possíveis opositores ao projeto ultra-liberal da elite empresarial globalizada, algo direcionado supostamente aos BRIC’s, ao Oriente Médio e forças internas dissidentes em aliados em potencial, agora se mostra capaz de agir e avançar contra as classes políticas de seus próprios países! Isto é gravíssimo, porque nos dá uma perspectiva sombria do que virá pela frente. Não tanto com a implantação do projeto ultra-liberal, mas pela certeza da possibilidade resistência ao mesmo em todos os locais onde sua instalação se iniciou. Vai ser dolorido, mas vai ser definitivo o embate que se dará.
Imaginem, então, nos EUA, onde não há sequer uma alternativa a ser pensada contra o desmonte e desmoralização das instituições? Não há pra onde correr: tanto Trump quanto Hilary se colocam a serviço dos grupos que lideram tal processo de desmantelamento dos estados nacionais e de sua organização civil. Isto daria tempo à classe política americana de se realocar de acordo com a nova dinâmica imposta de pelo capital. Mas, mesmo esta não será poupada.
Por fim, pensando bem, quem precisa de limites institucionais,quando já não se te mais identidade de classe, identidade política, identidade cultural, identidade religiosa? Nesta virada de século o desmonte da humanidade correu a passos largos e muito bem planejados. O terreno foi preparado desde o fim da Segunda Grande Guerra. Foi como se o absolutismo financeiro, ao sucumbir diante dos valores que sustentaram a Revolução Francesa e que fomentaram a luta pelos que queriam monopolizá-los, morreu afogado, afundando abraçado com a Vênus revolucionária, e lançado ao mundo toda sua prole. Enquanto cresciam, suas crias se alimentavam dos despojos de seus genitores não deixando um único traço orgânico do que poderia de fato, conter seus apetites. É o fim da liberdade, da igualdade, da fraternidade e das utopias alimentadas pelo capitalismo como forma de libertação do homem das amarras do mundo do trabalho.
A crise que se anuncia, com a possibilidade deste projeto autofágico, é tão louca que nem Hitler poderia vislumbrar distopia tão paradoxalmente perfeita. Seria o começo do fim. Ou o fim da Idade da Loucura e o recomeço da Humanidade. Tudo vai depender das bases.
Edgar, bom camarada.
Compartilho de sua visão e vou além, haverá guerra, vivenciamos fatos muito semelhantes aos pesados fardos impostos pelo Tratado de Versalhes, obviamente com conjuntura diversa, percebemos o mundo financeiro avançar sobre estados nacionais, quebrando-lhes as instituições e devorando-os.
Mas há resistência, há também autofagia entre as nações centrais e um aumento exponencial da tensão com a China e Russia, logo, caminha-se para o fim da era, provavelmente via guerra total, vivenciamos os suspiros do capitalismo e a predominância do CAPITAL voraz, financista, escravizante, se vencerá ou não, somente o conflito o dirá.
Esta é uma questão que levantei no post anterior sobre o assunto: será que o Capital ultra-liberal se voltará também contra as estruturas políticas de seus países de origem? A loucura é tanta assim??? Pelo que li acima, a resposta é positiva como já podemos supor. Se a Inglaterra também é vítima do discurso fascista anti-política – o que aqui definimos como discurso dos “coxinhas” – é sinal que a posta política única gira em torno de um fascismo globalizado. Isto nos dá uma outra dimensão quanto ao projeto verdadeiro dos articuladores deste “movimento universal”. A coisa é muito pior e mais excludente do que se imagina!!! Afinal, o que parecia uma estratégia agressiva contra os possíveis opositores ao projeto ultra-liberal da elite empresarial globalizada, algo direcionado supostamente aos BRIC’s, ao Oriente Médio e forças internas dissidentes em aliados em potencial, agora se mostra capaz de agir e avançar contra as classes políticas de seus próprios países! Isto é gravíssimo, porque nos dá uma perspectiva sombria do que virá pela frente. Não tanto com a implantação do projeto ultra-liberal, mas pela certeza da possibilidade resistência ao mesmo em todos os locais onde sua instalação se iniciou. Vai ser dolorido, mas vai ser definitivo o embate que se dará.
Imaginem, então, nos EUA, onde não há sequer uma alternativa a ser pensada contra o desmonte e desmoralização das instituições? Não há pra onde correr: tanto Trump quanto Hilary se colocam a serviço dos grupos que lideram tal processo de desmantelamento dos estados nacionais e de sua organização civil. Isto daria tempo à classe política americana de se realocar de acordo com a nova dinâmica imposta de pelo capital. Mas, mesmo esta não será poupada.
Por fim, pensando bem, quem precisa de limites institucionais,quando já não se te mais identidade de classe, identidade política, identidade cultural, identidade religiosa? Nesta virada de século o desmonte da humanidade correu a passos largos e muito bem planejados. O terreno foi preparado desde o fim da Segunda Grande Guerra. Foi como se o absolutismo financeiro, ao sucumbir diante dos valores que sustentaram a Revolução Francesa e que fomentaram a luta pelos que queriam monopolizá-los, morreu afogado, afundando abraçado com a Vênus revolucionária, e lançado ao mundo toda sua prole. Enquanto cresciam, suas crias se alimentavam dos despojos de seus genitores não deixando um único traço orgânico do que poderia de fato, conter seus apetites. É o fim da liberdade, da igualdade, da fraternidade e das utopias alimentadas pelo capitalismo como forma de libertação do homem das amarras do mundo do trabalho.
A crise que se anuncia, com a possibilidade deste projeto autofágico, é tão louca que nem Hitler poderia vislumbrar distopia tão paradoxalmente perfeita. Seria o começo do fim. Ou o fim da Idade da Loucura e o recomeço da Humanidade. Tudo vai depender das bases.
(Desculpem , não consegui enviar. tentando novamente. Se estiver repetido, por favor eliminem).
Com ou sem a UE os trabalhadores estão prejudicados pelos agiotas desde a dama de Ferro. A Privataria subiu os preços de tudo, obviamente porque quer lucro. Estatal não precisa. Os impostos foram para os paraísos.
Com esforço podem reconstruir o pais e a libra pode voltar ao que já foi. Vão sobreviver.
Os ingleses foram reticentes desde o inicio. Não aboliram a libra.
Sou otimista. UE não é deus. Cameron não é deus. Se a Europa sera fratricida é outra decisão.
Temer é a Dama de Ferro retardatária. Ainda vamos cair no buraco pra sair daqui a trinta anos. Tenha pena de nós e não dos ingleses
UMA NOVA EUROPA?
“A luta pelo reconhecimento tornou-se rapidamente a forma
paradigmática de conflito político no fim do século XX”
(Nancy Fraser, Justice Interruptus, 1997)
O plebiscito de 23 de junho, no Reino Unido (UK), que aprovou a saída daquele país da União Europeia não pode ser visto apenas como uma vitória política da direita, como noticia intimidadoramente grande parte da mídia. Nem mesmo se atribua, embora possa ter sido uma motivação, a onde migratória que atinge todo o continente ou à insularidade britânica.
Há um enorme hiato entre o discurso ideológico e político, prevalecente desde as últimas décadas do século anterior e a dura realidade cotidiana dos trabalhadores e dos assalariados em geral.
Os mais recentes estudos sociais, políticos e sobre as instituições vigentes ressaltam não apenas a incapacidade de resposta quer do Estado quer do mercado às demandas das populações do século XXI, como as falhas dos diagnósticos com as visões, métodos e princípios que prevaleceram em quase todo pensamento do século XX.
No editorial de Le Monde, seu diretor Jérôme Ferroglio afirma que “o pior será continuar como antes”.
Sem intuito dogmático, apenas reproduzindo as reflexões da Teoria Crítica e da sociologia mais atual, o processo de globalização, restrito a algumas áreas comerciais e adotado amplamente pelo capital financeiro, pode ser identificado como a verdadeira causa do que “não pode continuar”. O Brexit e as numerosíssimas manifestações de protesto que assolam a Europa são o testemunho do descontentamento.
Mas o interesse da poderosa “banca”, o sistema financeiro internacional, se espalha pelos veículos de comunicação de massa, pelas manifestações de políticos, analistas e mesmo pelas academias. Recentemente, na mesma Inglaterra do plebiscito, professores do Imperial College e de outros notáveis centros de estudo econômico do UK promoveram um manifesto em favor do ensino da economia, que, segundo eles, havia sido substituído naquelas escolas pela “engenharia financeira”.
De início, como observa com clareza o professor do IUPERJ, José Maurício Domingues (Cidadania, direitos e modernidade), “não se vislumbram quaisquer políticas sociais que efetivamente ultrapassem as fronteiras nacionais”. Talvez esteja aí o sucesso político da “direita” que melhor soube galvanizar o descontentamento com acenos nacionalistas.
Mas não está apenas aí a sensação invasiva da globalização. Ela traz o denominado modelo neoliberal, um verdadeiro zumbi do imperialismo inglês do século XIX. Recordemos os direitos das pessoas. Há quase um consenso que seriam de três ordens: os direitos civis, de apodítico reconhecimento, que trata da liberdade individual; os direitos políticos, onde já se travam controvérsias entre filosofias e escolas; e os direitos sociais, ainda mais confusos, que o conhecido e recém falecido filósofo Norberto Bobbio apontava serem o direito ao trabalho, à saúde e à instrução. Mas há quem identifique num único e abrangente direito: o da cidadania.
O pensamento único, da globalização, do neoliberalismo, apenas considera o direito à liberdade individual, sem mesmo as amarras do liberal John Rawls (Uma Teoria da Justiça), pois a banca, que acolhe e opera com todo capital ilícito do mundo, não tem como é óbvio a preocupação ética.
O total domínio sobre as políticas “nacionais” europeias do capital financeiro, na época que se discutem os direitos intersubjetivos – ecológicos, de gênero, de raça, de religião, constitui verdadeira agressão e um enorme retrocesso social.
Creio que o diretor editorialista de Le Monde referia-se a esta condição de subordinação à banca que não mais deveria prevalecer.
Quanto a nosso País, onde um enorme retrocesso de toda ordem está em marcha, a “crise”, que acredito ocorrerá com o euro, poderá ser antecipada e este provisório governo ver-se-á, com mesóclises e tudo, em ainda maiores dificuldades.
Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado
Em 2005 a França sepultou o projeto de Constituição Européia, uma Constituição que foi elaborada entre 4 paredes, sem a participação do povo, espécie de Constituição das corporações, pelas corporações e para as corporações. Agora o Reino Unido começa sepultar uma União Europeia comandada pelo setor financeiro, pelo setor financeiro e para o setor financeiro. E vassala do Império Ianque, ainda por cima, um império que precisa da Europa como “bucha de canhão” para suas infindáveis guerras e boicotes! Parabéns ao povo! Só ele pode legitimamente decidir!
O efeito dominó vai exatamente por aí. França e Alemanha estão gravemente preocupados e farão tudo para evitar que outros países peçam a saida do bloco. Em 2005 já tinha ficado claro com o voto da França contra a constituicao; a sociedade civil se sentia excluída. Hoje de fato o buraco está ainda maior e o povo não é bobo. Por isso tudo é terrível mesmo. Previsão de grave crise política no UK.
Certamente a ultradireita xenófoba votou pela saída. Mas a ela uniu-se grande parte da esquerda desencantada com o “socialismo” moderno do capital financeiro, adotado por certa esquerda mais domesticada. Além disso, a Europa acabou se tornando um continente de hipocrisia (o “duplipensar”). Para ilustrar, 52% do povo do Reino Unido votando pela saída da UE, é válido. No entanto 95% do povo da Criméia que votou para sair da Ucrânica (golpeada) e juntar-se à Federação Russa, “não pode”! E então, boicote à Rússia! Haja hipocrisia servil!
Sim, é hipócrita, sem dúvida. Por outro lado a relação de forças no caso da Ucrânia envolve os blocos Ocidente/Oriente e aí o bicho pega mesmo. A correlação de forças se focaliza na rivalidade de blocos historicamente rivais, com a mão ainda mais pesada do Tio Sam. Falando nisso, pelo menos dessa vez os americanos (Obama tentou convencer os ingleses para ficar) perderam sua influência. A ver…
O interessante deste processo no Reino Unido é a similaridade do caráter ambíguo da movimentação política. Se por um lado a necessidade mudança e o descontentamento com a política são legítimos e justificáveis, por outro lado, o processo de cooptação das forças populares para um aprofundamento da crise política em favor dos interesses de seus principais beneficiários torna o posicionamento diante dos fatos absolutamente relativizável. Podemos dizer que o povo tem razão, mas as consequências das escolhas feitas não apontam pra uma solução, mas para uma piora. No final das contas, qualquer análise sensata deve se fiar pelos princípios a serem defendidos, sem os quais não se chega a lugar nenhum. O que está realmente em jogo? A defesa dos interesses nacionais e desopilação do fígado dos descontentes, ou a manutenção das instituições democráticas e a defesa dos mecanismos capazes de salvaguardar o direito à luta e garantir alguma perspectiva de vitória pela via democrática? Sem estas coisas, qualquer retrocesso só terá contraponto em atitudes beligerantes. O final desta história é a guerra tão desejada pela chamada “banca” como princípio higienizador da sociedade e exterminador de qualquer pensamento crítico.
Desculpe mas a Europa com 27 é uma ridicula ficção. E com a agravante da vassalagem confessa e plena diante de tudo o que quer uóxinton.
Essa servidão obsequiosa vai ao ponto de ficar cutucando militarmente a Rússia sem motivo algum fora a propaganda. (esqueceu da verdade crua: os sentimentos de Victoria Nuland ‘fuck the EU’)
Com dez, mas sem tantos refugiados e sem TTP, ela seria ate viável, não é?
Sugiro que leiam o primeiro romance adulto de J. K. Rowling, escritora de Harry Potter, que conta uma estória de adversidade de classes numa pequena cidade inglesa.
Impressionante a narrativa de uma elite que odeia os pobres. E de pobres relegados à própria sorte.
Imperdível.
Boa lembrança, mas vale também Oliver Twist de Dickens , bem como O Garoto ( filme ) de Chaplin, uma panorâmica e tanta do que é a sociedade inglesa, ainda se consideram os “senhores” do Mundo.
O sonho que forjou a ideia de uma Europa unida está sendo destruído graças ao Banco Central Europeu dominado por banqueiros alemães (principalmente) e franceses. Estão há anos impondo um austericídio aos países mais frágeis economicamente e colocando-os sob seu domínio e total dependência. Está servindo como a pá de cal a total submissão das autoridades da UE aos desígnios dos EUA (sanções), mesmo que isso implique em grandes prejuízos para pequenos e médios comerciantes e industriais europeus. Desse jeito quem vai defender a UE se os próprios cidadãos europeus que produzem estão sob o tacão dos parasitas de sempre, os banqueiros? Com as condições de vida deterioradas, desemprego e ataque aos direitos trabalhistas, vai ser difícil segurar o efeito dominó que o plebiscito britânico suscitou, por pressão do próprio povo europeu.
A visão do PCP sobre o plebiscito britânico:
http://www.vermelho.org.br/noticia/282793-1