Vamos todos fingir que é normal o presidente do Tribunal Superior Eleitoral pegar carona com um sedizente presidente da república (com letras minúsculas mesmo) para ir a Lisboa, supostamente para participar das cerimônias funerais do maior democrata português da contemporaneidade. É normalíssimo, porque o tal presidente do tribunal é quem vai pautar um processo que pode significar o fim do que se usou chamar, na mídia comercial, de “mandato” do sedizente presidente da república. O tal presidente de tribunal é inimigo notório da companheira de chapa do sedizente presidente que urdiu um golpe para derrubá-la. Mas, claro, tem toda isenção do mundo para julgar ambos.“Nada haverá de suspeito”, como diria o insuspeito jornalista Ricardo Noblat. Quem ousaria dizer o contrário?
A carona (ou boleia, como diriam nossos irmãos lusos) veio a calhar. É, antes de mais nada, uma bela viagem 0800, com todos custos cobertos por mim, por você, por nós, obsequiosos bobões. A ideia é só aproximar réu e julgador e – por que não? – usufruir um pouquinho do que a capital portuguesa tem de melhor a oferecer: as tabernas, o fado, as ginjinhas, as pataniscas de bacalhau ou os famosos pastéis de Belém. Nestes tempos bicudos, nada melhor que uma “escapadela” para enfrentá-los com maior disposição. Ninguém é de ferro. As exéquias do democrata lusitano certamente são a menor das preocupações do réu e de seu julgador, pois vê-los prestar suas últimas homenagens ao gigante da política portuguesa parece tão obsceno quanto fosse ver Lula prestá-las a Augusto Pinochet.
Vamos todos fingir que neste país chamado Brasil há um patriótico chefe do ministério público, que faz muito bem em ir a Davos. Lá vai cantar uma ode ao combate à corrupção que se usou chamar de sistêmica ou organizada pelas bandas de cá. Ou, quiçá, até de uma forma de governança. Isso também é normalíssimo, porque em Davos se reúnem bancos e fundos de envergadura global para traçar estratégias sobre novos investimentos e analisar a conjuntura política e econômica no planeta. Claro, faz sentido. Com as proezas ditas de si e de seu poderoso órgão acusador, vai atrair enorme interesse por investimentos nobres em seu país. Finjamos que grandes empresas adoram investir em economias tingidas de corrupção sistêmica, certificada pelo chefe da acusação.
O poderoso órgão de acusação, regiamente sustentado com nossos impostos, como é sabido também, sacrificou no altar da moral purgatória mais de um milhão de empregos e pôs fim a um projeto de desenvolvimento nacional e de uma sociedade inclusiva. Mas, claro, tudo com a melhor das intenções. Fez um nobre serviço à democracia do tal Brasil, permitindo ao réu a caminho de Lisboa instalar-se no poder sob as bênçãos de seu julgador caroneiro, para liquidar, num verdadeiro off-sale, os ativos econômicos do país, as jóias da família. Disso empresários em busca de lucros gostam. Mas esse deve ser o menor problema do chefe do ministério público, pois vê-lo em Davos parece tão obsceno quanto ver George Soros num Encontro Nacional dos Procuradores da República em Comandatuba.
Vamos todos fingir que temos um preocupado ministro da justiça que declara publicamente apoio ao governo do Amazonas para debelar, em seu sistema penitenciário, a guerra assassina entre facções de traficantes. Normalíssimo, oras. O azarado ministro, de boa-fé, não se lembrou ter negado o pedido desesperado de uma governadora, de uso da Força Nacional que, talvez, pudesse ter salvo a vida de trinta e poucos brasileiros em Roraima, massacrados na vindita de uma facção contra outra, que dizimara quase sessenta concidadãos em Manaus.
É aceitável, afinal, que o governador do Amazonas, destinatário do apoio do tal ministro da justiça, tenha sido financiado em sua campanha eleitoral pela empresa copiosamente remunerada para administrar a penitenciária onde trucidaram os quase sessenta brasileiros. Faz todo sentido, por isso, que pontifique: “nenhum dos mortos era santo!”, como se aplaudisse os padrões da administração penitenciária contratada de seu doador. E faz todo sentido que o tal governador se julgue Deus, para condenar os trucidados ao fogo eterno. Não é que ele mesmo poderia estar lá, se fossem levar a sério, no tribunal do julgador caroneiro, o imperativo de cassação de seu mandato por compra de votos? Deixá-lo falar de falta de santidade é tão obsceno quanto imaginar o cramunhão ser canonizado.
A literatura popular alemã contém antiquíssimo anedotário de autoria controvertida sobre uma cidadezinha chamada Schilda. Seus habitantes, os ingênuos Schildbürger, são os protótipos de néscios que fazem, com naturalidade, tudo de forma a nada dar certo. Inventaram um papel higiênico que se pode usar nos dois lados: a prova de sua eficiência está na mão… O Brasil de nossos fingimentos virou uma enorme Schilda.Fazemos os maiores absurdos, mas não perdemos a esperança ingênua de acertar. E não entendemos quem ouse não concordar.
Um julgador pegar carona com um réu a ser por ele julgado; um chefe do ministério público ir a Davos para ajudar a atrair investimentos numa economia que chama de podre, ou um ministro da justiça se esquecer de que negara meios a uma governadora para evitar um massacre, mas que agora, diz, vai dá-lo a um outro governador que faltou bater palmas para o banho de sangue no xilindró sob sua responsabilidade: tudo isso não é muito diferente do uso de papel higiênico nos dois lados. Mas quem fica com as mãos borradas somos nós que fingimos estar tudo bem.
Bem vindos à Schilda brasileira!
*Eugênio Aragão é ex-subprocurador daPGR e ministro da Justiça no mês final do Governo Dilma.
18 respostas
Como o PHA sempre repete… Dilma acertou por ultimo.
Fosse Eugenio Aragao o Ministro da Justica, nao teriamos chegado `a situacao de descontrole.
Estevan banqueta, alucinógeno é com o outro, aquele do helipóptero.
Esse Estevão esta me parecendo mais o luiz estavão, assim minúsculo mesmo. Esse conglomerado de células cancerígenas tem o direito de relinchar o que quiser, mas não pode fugir da verdade. A verdade é que é preferível ser um humano que sofre do que um verme com conforto.
É surreal. Imaginem, eu , prefeito de uma cidade, convido o juiz do TRE que vai julgar as minhas contas pra viajarmos juntos e o juiz aceita. Jantamos, almoçamos, tomamos café, nos confraternizamos juntos!!! Esse é o BRAZIL coxinha.
Gente! Eugênio Aragão é um gênio fino, capaz de mostrar com elegância (mesmo ao falar do tal papel higiênico) o que acontece no nosso país que foi transformado na casa da mãe Joana ou num hospício muito louco (como no Asylo famoso da literatura nacional). E os golpistas desembestados tão por aí, viajando e curtindo a vida adoidado. E o povo? Que se lasque!
Este ranheta usa papel higiênico dos dois lados e depois aproveita para limpar o nariz e a boca. A merma coisa sai de todos os lugares.
Nenhum conflito de interesses, nenhuma suspeição para julgar, afinal Ele está acima do bem e do mal. suas sábias opiniões bipolares sobre o mesmo tema, a depender da capa, são mostras da sua imparcialidade.
A primeira atitude dos covardes em reação a quem os desnuda é desqualifica-lo. Tentam humilhar o Senhor Eugênio Aragão, mas no maximo que conseguem é ofende-lo, pois seus detratores sim é que se rebaixam as posições humilhantes de capachos e traidores da nação. Como eu já disse, não passam de vermes com algum conforto.
BRITO: como ousas chamar um socialista de “democrata”? Você está ofendendo os coxinhas pois, segundo eles, um socialista jamais poderia ser um democrata.
CARLOS BRITO: e você? Entendeu tudo o que postou? Entendeu?
Bom, então comece explicar de que maneira o povo americano entendeu que o socialismo não funciona se, desde a sua fundação (você já leu sobre os “pais da América”?) eles NUNCA experimentaram um governo socialista. Essa é uma questão que eu gostaria que explicasses, com suas próprias palavras. Sinceramente todo historiador deve estar ansioso para entender a sua tese sobre o “socialismo norte americano”.
TE PEGUEI, coxinha papo de papagaio.
A História mostra que foi preciso muito sangue derramado para conter os ímpetos socialistas na terra do tio Sam. Existiu um socialismo cristão por lá desde o século 19, anterior portanto à revolução russa. Nos primeiros anos do século 20, um forte movimento sindical de cunho socialista e anarquista foi reprimido com tortura, prisões, pena de morte e deportações. Durante o macartismo, a partir da década de 1950, comunistas passaram a ser acusados de “espionagem” em favor da URSS e executados na cadeira elétrica. Mas, nos anos 1960, ativistas dos direitos civis como os Panteras Negras continuavam a se identificar como comunistas ou socialistas.
É esta a “experiência norte americana” com o Socialismo? Cadeira elétrica? Só esquecem de um detalhe: Sanders concorreu com Hillary pregando que é um Democrata Socialista. Mas, como coxinha só lê o Sardenberg, o Azevedo e assiste o Bonner, é impossível eles saberem disso. Por isso inundam os blogs com seus discursos prá lá de patéticos.
Gente, alguém me ajude! Estou cansado de bater em coxinha. Tomem o meu lugar por uns tempos.
Você chama de cabritice um juiz do supremo, que deve julgar o Temer, viajar com ele para Portugal? Isso, no mínimo, deveria soar muito estranho para quem usa a lógica e o bom senso. Mas como você é coxinha e não sabe usar esses dois atributos (nem se usar um de cada vez), está perdoado pela aberração proferida. Mas, da próxima vez, pense antes de postar essas maluquices. Se é que tens a capacidade de pensar.
Comentário bom é do tipo: puxa presidente, o senhor é até bonito. Como conheceu a dona Marcela? Quando foi seu primeiro beijo nela?
Coxinhas se superando, mais e mais.
Perfeito o Aragão. Nos transformamos nessa farsa continuada,desde aquele maldito 17 de abril quando nossos gloriosos parlamentares expuseram nossas bundas na janela…
O que é “Schilda”?
|Ler o texto…
Tudo isto nos leva de volta à pergunta (afinal, perguntar não ofende): onde se meteram os “líderes populares” que deveriam estar mobilizando a população para protestar contra barbárie instalado no país? Desconfio que é o tal balanço de fim de ano que está se prolongando por algum motivo e ocupando os “líderes” do MST, MTST, CUT, FBP, FBSM, sindicatos em geral (principalmente o dos petroleiros), partidos de Esquerda, UNE, LPJ, etc.
Mons amis, o Janot ir a Davos é o cúmulo da demonstração de estupidez subdesenvolvida. Se hienas convidam o gordo gnu para um festim, é porque querem saber qual a melhor maneira de abatê-lo. É um propaganda tão negativa do país que poderá ter efeitos os mais inesperados. Tanto poderá acarretar uma corrida de piratas predatórios (pleonasmo, menos para a Inglaterra) que compreenderão que o país está sem qualquer defesa e que podem pilhar à vontade, quanto poderá ter como consequência o isolamento completo do país e o afastamento de todos os negócios que pela própria época difícil impõem riscos, já que ficarão temerosos com semelhante atestado de destruição de todas as instituições e de absoluta insegurança jurídica. Benza Deus, o que não fazem pessoas inadequadas quando em postos chaves.