Os “cloroclínicos”

Além da pandemia do novo coronavírus, o Brasil e o mundo estão sofrendo uma infecção generalizada da estupidez, em nome da procura de um milagre contra a doença.

E inacreditável que se pretenda adotar como método infectar propositalmente milhares de pessoas para, eventualmente, descobrir-se se possíveis vacinas são eficazes.

A ética médica repudia estes procedimento e, alguns anos atrás, houve uma condenação (tardia, é verdade) contra médicos norte-americanos que, para testar os benefícios (imensos, claro) da penicilina infectaram com doenças sexualmente transmissíveis milhares de pessoas saudáveis na Guatemala, nos anos 40. Eram, claro, pobres, pretos e guatemaltecos.

Ou quando a indústria farmacêutica recuperou os experimentos do médico nazista Heinrich Mückter, criador da talidomida e, com base em ensaios apressados e pouco rígidos, levou a milhares de malformações de fetos e produziu uma legião de crianças com deformidades físicas na Europa e aqui. Nos EUA, por jamais ter sido aprovada pelas autoridades sanitárias, nunca foi comercializada. Mesmo assim, quase 20 crianças americanas haviam nascido com efeitos colaterais da talidomida porque o remédio foi distribuído legalmente para fins de pesquisa, informa a BBC.

Claro que não acuso de nazismo ou de crueldade deliberada os que defendem esta estratégia da infecção proposital, mas chamo a atenção sobre o potencial trágico disto. Muito menos se condena a atitude generosa de quem se dispõe a se submeter, voluntariamente, à infecção.

Mas invocar o exemplo de Edward Jenner descobrindo a vacina para a varíola em 1796, infectando propositalmente o filho de oito anos de seu jardineiro, francamente, chega a ser ridículo, desprezando dois séculos de desenvolvimento da ciência médica.

O surgimento de efeitos indesejados pode não ser identificado assim, a menos que o número de pessoas propositalmente infectadas seja imenso, na casa de dezenas de milhares de pessoas, com o evidente risco de que o insucesso represente a perda de vidas em grande escala, também. Há outros problemas para esta infecção em massa deliberada, sobre como isolar e acompanhar intensamente com cuidados médicos os voluntários.

Além do mais, a corrida pela vacina não é apenas uma aventura generosa para com a humanidade, mas um contexto onde há dinheiro – e muito dinheiro – envolvido, com a disputa entre laboratórios por venderem, na casa do bilhões de dólares, o que implica sérios riscos de que o “voluntário” traga benefícios financeiros a grupos privados.

Os testes com vacinas, segundo as práticas científicas consagradas e universalmente aceitas, não podem ser feitos de forma alucinada, abandonando critérios éticos e científicos. Esta comunidade deveria, com a mesma energia, estar exigindo medidas duras de aplicação dos protocolos de isolamento e protestando contra governantes que, em nome da “liberdade econômica” transforma as pessoas em infectados involuntários, ao milhões.

Não há remédio heróico e mágico, como se quis fazer da cloroquina. Não é uma gincana, não é uma questão de “fé e vontade”, mas de ciência e ação de governos, como sempre foram os avanços da saúde pública, aqui e no mundo. Persistência, em sanitarismo, é tudo, inclusive para as grandes descobertas.

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11 respostas

  1. Já não basta tanta desgraça trazida pela covid ainda temos que ficar atentos e rejeitar os zumbis que tomaram LSD, os bolsonaristas (e que nenhum bozista se sinta excessão). Voltem para o armário de onde nunca deveriam ter saído, direita fétida, bando de imbecís, gado bolsonarista!

  2. Senhor Fernando.Vou fazer-lhe,única afirmação/ indagação.Conhece o senhor,algum médico,cujo sonho maior,não é,FICAR RICO?Então,o que esperar-se mais?

  3. Como sempre, os artigos-notas de Fernando Brito são concisos, diretos, focando no essencial. Entretanto o editor deste Tijolaço deveria ter citado também as “experiências” feitas pela Big Farma ocidental em países africanos, com os coquetéis anti-retrovirais para tratar pessoas com HIV. Milhares, senão milhões, de seres humanos do continente africano foram expostos a esse vírus que causa doença mortal e incurável; o objetivo era muito menos importante do que o teste de uma vacina, já que visava usar negros pobres da África como cobaias, para se verificar a dosagem mínima dos anti-retrovirais que deveriam ser administradas em pessoas contaminadas com HIV, de modo a evitar o desenvolvimento da patologia e minimizar os sérios efeitos colaterais dessas drogas.

  4. Primeira vez que vou discordar de Fernando Brito.
    Sou formado, graduado e pós graduado, tenho 67 anos e já tive um pequeno ataque cardíaco, li mais de cinquenta artigos científicos sobre essa doença e sei exatamente o risco que corro, mas me voluntaria para fazer essa “loucura” simplesmente porque acho que já tive (e ainda tenho) uma vida feliz que desejaria que os mais jovens também tivessem. A cada mês que atrasamos os testes de uma vacina são milhares que morrem no mundo inteiro, logo se uma percentagem pequena das cobaias pagassem o preço para saber exatamente o grau de imunização de uma vacina acho que estaríamos no lucro, pois trocaríamos a vida de centenas de milhares de pessoas pela vida de uma poucas dezenas de voluntários. Se alguém precisar de uma cobaia, pode entrar em contato que entro na experiência.
    Importante a vida é minha, se quiser colocá-la em risco por um bem maior, coloco e ninguém tem o direito de me impedir.

  5. Para mim isso é Geopolítica; a Rússia vai começar a vacinação em massa (a vacina passou por todos os passos exigidos pela comunidade científica) possivelmente no início de setembro, a Big Pharma ocidental não aceita a ideia de perder o lucro avaliado em centena de bilhões de dólares, daí o desespero. Ouvi dizer que os russos procuraram o Butantã para produção conjunta e receberam um não como resposta. Os EUA acusaram a Rússia de espionar a Pfizer (https://veja.abril.com.br/mundo/hackers-russos-tentam-roubar-dados-de-vacinas-contra-covid-19/).
    Joguem no Google tradutor: https://www.gazeta.ru/science/news/2020/08/10/n_14781355.shtml

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