A política, fora da hora das decisões, é cheia da palavra da moda: mimimi.
Mas a política, esta mata de bambus, que se verga para lá e para cá ao vento, tem, como os bambuzais, milhares, milhões de raízes que penetram no solo e dele extraem a sua força vital e este sistema radicular é que, embora sustente hastes e folhas cambiantes, permanece firme, sólido, embora sujeito a sofrer a influência de eventos extremos: fogo, inundações, desbarrancamentos.
A Lava Jato foi um destes e fez, é claro, tombar boa parte das raízes da esquerda brasileira, goste-se ou não, majoritariamente referenciada em Lula. Isso não bastaria, porém, se não tivesse, alem do abalo, a retirada desta referência que a sustentava que é – e poucos entendem ainda – o impedimento de sua candidatura em 2018.
Esta, e nenhuma outra, foi a causa da vitória eleitoral de Jair Bolsonaro.
O resultado, publicado no Estadão de hoje, da pesquisa Ipec, mostra que está passando a época do mimimi na política.
Desmoralizada a Lava Jato, por suas atitudes bandidescas, expostas agora ao ponto de sequer mais terem a defesa que, no início das revelações do The Intercept, ainda delas se conseguia fazer, as forças da direita têm de apoia-se numa meia-verdade: a de que Lula (ou qualquer candidato petista) ajudaria o terror bolsonarista a continuar do poder, tamanha é a sua rejeição.
Sim, há rejeição (aliás, sempre houve, mesmo nos tempos de maior bonança lulista, tanto que nunca obteve vitória em primeiro turno).
Há, mesmo entre forças que se consideram “de esquerda”, incomodadas em terem ficado em papel secundário e pelo “aparelhismo” petista que, como em muitos partidos, supera o companheirismo.
E, claro, a memória de quatro ou cinco anos de mídia impiedosa, exibindo canos de esgoto a jorrar dinheiro, na mais cruel campanha de demolição já feita neste país.
Nada disso, porém, explica que se possa, numa hora difícílima como a que temos – com o país ameaçado de destruição em tudo, desde a economia ao social, da saúde pública à nossas imagem e relações com o mundo, na educação e na capacidade de convívio social – se possa deixar de lado o que fez o Brasil perder o equilíbrio e mergulhar neste poço de selvageria.
A pesquisa Ipec é a mais expressiva manifestação – quase um chamado à realidade – de que Lula, apesar de tudo o que se disse e, sobretudo, do que se fez a ele, é a raiz forte que pode aprumar a árvore Brasil. É quem tem a mostrar, em fatos e na memória popular, que o país podia viver em segurança, em estabilidade e em progresso.
A direita convencional – e a “nova direita” tucana, que lhe serviu de interface amigável com uma realidade de atraso e exclusão como é a brasileira – tenta, desesperadamente, achar uma cloroquina que a salve da gangrena que escolheu ao apoiar Jair Bolsonaro, expressa ou veladamente.
Mas todos os seus estão contaminados: Moro, Doria, Mandetta. Legitimaram este desastre de governo, a que apoiaram ou integraram.
Luciano Huck, o coelho que tentam há quatro anos tirar da cartola não vai além de colocar as orelhas de fora, assustadiço, pensando nas consequências de uma aventura num caldeirão onde não terá prêmios a oferecer.
Ciro, que tentou – e ainda tenta – uma impossível aliança com o DEM, amarga uma rejeição à direita e à esquerda e, francamente, está longe de transmitir a ideia de ser um terreno sólido.
Nomes novos, sempre uma aposta de atração de eleitores, sofrem do mesmo mal, numa nação assustada pela morte e pela crise.
Lula tem uma etapa a vencer, um obstáculo cada vez mais próximo de ser transposto, que é a sua condenação pela conspiração de Curitiba, hoje em ruínas mas ainda de pé.
Anulada, estará livre para se apresentar aos brasileiros como a reserva de que precisamos lançar mão na situação de desespero em que o país se encontra.
Paradoxalmente, é o “síndico” que fazia este prédio funcionar e seus moradores conviverem com um mínimo de civilidade. A não ser que a sua ideia de “ordem” seja a de entregar o país a milícias.
A turma do mimimi vai ficar sozinha no chororô, porque este será o embate de 2022, a não ser que prefiram, mantendo Lula fora da disputa, passar mais quatro anos sob as botas do ex-capitão.
Se alguém tem dúvida de que “terceira via” é um caminho seguro, pergunte a Rodrigo Maia onde ele termina.