O ‘e daí?’ de Petrópolis

Não se deve perder tempo com discussões sobre se uma tragédia, como o mosquito, é “federal, estadual ou municipal”.

As soluções – necessariamente de médio e longo prazos – para os problemas que causam desastres é de políticas públicas, não há dúvidas, passam pelos três níveis de governo, porque envolvem identificação, projetos e obras que, quase nunca, estão ao alcance executivo de prefeituras e frequentemente excedem a capacidade financeira dos Estados.

Há, porém, algo que está repetidamente evidente: o socorro imediato às vítimas de grandes catástrofes não pode ficar condicionado a esta disputa entre entes de governo, como estamos vendo acontecer em Petrópolis, com a ausência quase completa de qualquer força de socorro federal para o momento de emergência que, há cinco dias, aquela cidade está vivendo.

Do ponto de vista dos valores humanitários que revelam, as ações de voluntários que, às centenas, vemos nas reportagens de televisão merecem as mais emocionadas palmas. Mas heroísmo não é política pública.

Da primeira vez que escrevi sobre a catástrofe petropolitana – primeira e, até agora, única, pois desastres não se prestam a exploração política – , poucas horas depois dos desabamentos, chamei a atenção para algo que, agora, está evidente: a necessidade de termos um aparato que permita ajuda intensa, imediata e tecnicamente capaz do governo federal brasileiro em situações assim.

“Temos Força Nacional de Segurança, Batalhões de Choque, pelotões disto e daquilo e nenhum mecanismo de reação rápida a estas tragédias que se repetem a todo instante. No máximo, Corpos de Bombeiros mal-equipados e com carência de pessoal que, independente da dedicação pessoal admirável com que muitos se comportam, não têm meios para agir na extensão que estes desastres ocorrem.”

Isto, na manhã do dia 16. Hoje, na manha do dia 20, continuam a se repetir na televisão as imagens de grupos de moradores escavando barreiras com enxadas e até a de um pai que, vagando por um túnel-canal de um dos rios, vai tateando o lixo acumulado à procura do corpo do filho, porque não há bombeiros por ali. Quatro dias depois!

300 ou 400 homens treinados, com equipamentos de remoção de escombros – serras, miniescavadeiras (bobcats) para remoção em condições delicadas, detectores de sons, torres de iluminação para trabalhos noturnos, etc -não fariam toda a diferença?

Porque o Exército Brasileiro não pode ser convocado a formar uma unidade assim? Os eventos dos últimos meses mostram que, infelizmente, não seriam uma força ociosa. Ainda mais quando temos um governo que se vangloriou de ter trazido um batalhão assim de Israel para as buscas por sobreviventes em Brumadinho? Convenhamos, transportar tropas de Tel Aviv é muito mais complicado que de Belo Horizonte ao Rio ou daqui para São Paulo ou Florianópolis.

E não faltariam aeronaves da própria FAB, da Marinha e do Exército para transportá-las até os locais necessários, porque elas já existem e são muito mais facilmente acionadas dentro da organização militar do que pelas súplicas de pessoal dos Bombeiros dos Estados.

Infelizmente, o Plano Estratégico do Exército 2020-2023 fala apenas vagamente em um “subprojeto de Cooperação com a Defesa Civil nos Comandos Militares de Área”, sem constituir Organização Militar com este fim e sem atribuição de efetivos para equipá-la. Mas, ao contrário, no mesmo plano, ampliam-se e criam-se batalhões de Polícia do Exército.

Se as Forças Armadas não consideram socorrer a população em desastres, é papel do Governo e do Presidente da República sugerir e determinar isso aos seus comandantes.

Pior ainda é ter de assistir o governador do Estado, Cláudio Castro, dizendo que não precisa de ajuda e que é a “técnica” que justifica a falta de pessoal e equipamento.

Sugere-se ao governador, já que gosta de ser “operacional” com seu coletinho da Defesa Civil que vá dizer isso aos pais, mães e filhos que, desesperados, puxam barro com enxadas quase impotentes contra montanhas de lama, procurando corpos de suas famílias e de vizinhos.

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