A eles, com eles e por eles, um Feliz Natal

É sempre arriscado, pela pieguice que teima em tomar conta da gente nestes dias, escrever uma crônica de Natal, embora temas haja em profusão.

Pode-se fazer a triste escolha entre a fome que toma conta da vida de milhões de brasileiros, sobre a crueldade do adiamento da vacinação de nossas crianças só para satisfazer o ego negacionista do presidente da República, sobre o cínico lavar de mãos deste governo em relação à crise, sobre a imolação de nossas florestas, sobre este “armai-vos uns aos outros” que é o primeiro mandamento presidencial, e de sobra as dores das ausências de uma pandemia subestimada e tratada com desídia pelas autoridades públicas.

Há ainda, olhando por outro lado e apesar de tudo, uma imensa confiança que vem crescendo quando vemos que, sozinho, o nosso povão transforma as dores em decisão e que – mesmo com tudo o que ouviu, repetido nauseantemente pela mídia – vai retomando quase que sozinho e por instinto de sobrevivência, os símbolos de seus desejos de felicidade e progresso.

E que deixa atônitos todos “sabidos” que achavam que sua guerra contra a esperança estava vencida e a esquerda andaria por décadas de cabeça baixa.

Prefiro, porém, falar que estes tempos que virão não têm somente a marca dos nossos direitos, mas sobretudo a de nossos deveres para com o futuro, este mesmo que, na noite de hoje, vamos ver em nossos filhos e nossos netos.

Não é possível que a não lhes leguemos, a eles e a todas as crianças brasileiras, neste país rico e imenso, o direito a habitarem uma terra onde tudo não esteja, como está, semidestruído: a educação, a saúde, o direito de comer, de morar, de não serem expostas, nas calçadas, como troféus miseráveis da teima em sobreviver dos brasileiros. Que as vejamos , impassíveis, a correr pelas ruas, atrás do inevitável destino de viverem ao abandono ou na delinquência que os levará à cadeia e à morte ainda jovens.

Será tão difícil entender que é só o que lhes estamos dando, sem apelação?

Que todos – ao menos em parte – nos deixamos ficar insensíveis a deixar sem reação gritarem por armas, por mais cadeias, bordoadas, jatos d’água que varram de nossos olhos esta multidão de gente (sim, gente, gente apesar do que lhes fazem) como se das mangueiras jorrasse a água de Pilatos?

“Roubo” a frase sábia de minha amiga jornalista Cristina Serra: “Um país que não protege suas crianças morre com elas.”

Não aceito que elas morram, mesmo que mortas em vida pela desnutrição, pela ignorância, pela brutalidade de acharem que armas ou “arminhas” são a maneira de enfrentar problemas.

Muito menos que morram por balas sem pai nem mãe que as acham nas vielas, nos quintais, dentro de suas casas, por mais pobres que sejam ou que cresçam para tomarem tapa na cara ou tiro da polícia.

Penso que, depois de um ano inteiro escrevendo sobra a gente “importante” da política e da economia, posso me permitir pensar nos garotos felizes da escadaria do Morro do Turano, no Rio de Janeiro, na pequena grande felicidade que a enxurrada que desce o morro lhes dá e que o celular da vizinha Carla Vieira registrou.

Há 40 anos, quando se iniciou minha jornada ao lado do compromisso de Leonel Brizola com as crianças e com a educação, que depois dele segue comigo e com tantos outros, ainda que sem a fé maravilhosa com que ele se dedicava, contra tudo e todos, às crianças brasileiras é este o voto que renovo e com que teimarei seguir nos anos que restam.

Àquele que, pela nossa vontade soberana, caberá, para o ano, receber às costas o honroso fardo de fazer do Brasil um país menos triste, relembro que não há maior programa de transferência de renda e de sonhos que a educação e o cuidado com os meninos e meninas do Brasil.

A eles, com eles e por eles, um Feliz Natal, hoje, e natais felizes a cada ano em que se possa crescer sem medo de ser feliz.

 

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