A reação da Anvisa à ameaça de ‘dedo-duro’ de Jair Bolsonaro, exigindo, na sua live semanal, “os nomes” dos funcionários da Agência que aprovaram a aplicação de vacinas para Covid para crianças é das melhores coisas que já aconteceram neste governo e, particularmente, aos militares brasileiros.
O almirante Barra Torres, indicado por Bolsonaro para exercer uma função (para a qual, aliás, é habilitado, por ser médico) não entregou ao presidente a sua dignidade, como outros oficiais generais o fizeram.
Ao assinar a nota que reproduzo abaixo, à testa dos outros diretores da Anvisa, Torres honrou ambas as condições: a de profissional de Saúde e a de oficial das Forças Armadas.
Não é, para ele, “um manda e o outro obedece”.
A Anvisa já havia sido firme na questão óbvia dos comprovantes de vacina para viajantes internacionais, que o governo rejeitou e protelou até receber ordem do STF para cumprir a exigência.
E publicou, em sua página, todos os documentos e até depoimentos em vídeo dos dirigentes de Sociedades Médicas de áreas relacionadas à pediatria e imunologia, tanto quanto a resolução de recomendar o uso da vacina. Não há nenhum nome “escondido”, ao contrário.
Portanto, a razão de Bolsonaro “exigir o nome” das pessoas é única e exclusivamente a de lê-los diante de sua matilha. Quem sabe, lá o prédio onde mora o médico ou o técnico da Anvisa não tem um valentão bolsonarista pronto a hostilizá-los aos gritos, acusá-los de culpados por tragédias, gravar no celular e colocar para “viralizar nas redes”.
Ou seja, apresentar “fake news” para mostrar que o presidente é o melhor conselheiro médico-científico do país e sempre tem razão.
O almirante ‘cortou o T’ de Bolsonaro e disparou uma salva de tiros de advertência sobre a demagogia presidencial, com todos os diretores de seu costado e também com fogo da torre principal.
Exatamente o inverso do que faz o Ministro da Saúde, ao dizer que vai mandar a questão “para estudos” e até ao Judiciário (hein?) e aplicá-la sabe lá Deus quando.
O que não surpreende a quem, desde sua indicação, disse que ter caráter e aceitar ser Ministro da Saúde de Bolsonaro são coisas incompatíveis.
A nota da Anvisa:
Em relação às declarações do Sr. Presidente da República durante “Live” em mídia social no dia 16 de dezembro de 2021 a Agência Nacional de Vigilância Sanitária comunica:
A Anvisa, órgão do Estado Brasileiro, vem a público informar que seu ambiente de trabalho é isento de pressões internas e avesso a pressões externas.
O serviço público aqui realizado, no que se refere à análise vacinal, é pautado na ciência e oferece ao Ministério da Saúde, o Gestor do Plano Nacional de Imunização – PNI, opções seguras, eficazes e de qualidade.
Em outubro do corrente ano, após sofrer ameaças de morte e de toda a sorte de atos criminosos, por parte de agentes antivacina, no escopo da vacinação para crianças, esta Agência Nacional se encontra no foco e no alvo do ativismo político violento.
A Anvisa é líder de transparência em atos administrativos e todas as suas resoluções estão direta ou indiretamente atreladas ao nome de todos os nossos servidores, de um modo ou de outro.
A Anvisa está sempre pronta a atender demandas por informações, mas repudia e repele com veemência qualquer ameaça, explicita ou velada que venha constranger, intimidar ou comprometer o livre exercício das atividades regulatórias e o sustento de nossas vidas e famílias: o nosso trabalho, que é proteger a saúde do cidadão.
Meiruze Sousa Freitas, Diretora
Cristiane Rose Jourdan Gomes, Diretora
Romison Rodrigues Mota, Diretor
Alex Machado Campos, Diretor”