Cessar fogo ou por mais fogo?

O mundo parece empenhado num jogo suicida que vai se expressar nos indicadores financeiros globais lá fora antes daqui, por conta do providencial reinado de Momo, ainda que restrito a bailes de salão e ao sistema bancário.

O ditado popular de que não se cutuca onça com vara curta bem que poderia ser traduzido agora por um “não se encurrala urso, muito menos ferido”.

Mas a onda de propaganda, esta espécie de “partido único” que vem em ondas, desde que o mundo se tornou unipolar consegue inverter situações e transformar qualquer adversário das ideias hegemônicas em em um “agente russo” (agora não dá mais para falar em “agente comunista”) e fazer com que se interdite o debate sobre a quem serve este conflito na Ucrânia.

Portanto, é melhor fazer perguntas do que produzir afirmações, porque estas acabam sendo sujeitas à desqualificação que este tsunami ideológico produz.

A primeira pergunta é porque não estamos vendo um ataque militar à semelhança dos que vimos quando um exército armado dos mesmo meios que tem o russo, com chuvas de mísseis e foguetes caindo sobre o centro de Kiev e levas de jatos supersônicos? Afinal, há ali um “distrito do Governo”, tanto ou mais cheio de simbolismo e, sobretudo, um cenário para demonstração do poderio dos mísseis, foguetes e té da artilharia russa, cujo alcance supera os 30 km de distância a que se encontram as suas forças.

Desculpem, mas isso não está ocorrendo por conta a resistência do exército ucraniano ou dos coquetéis molotov ou ainda por “problemas logísticos” do exército russo.

Nada pode ser mais esclarecedor, paradoxalmente, do que o diálogo travado entre o presidente dos EUA Richard Nixon e Henry Kissinger, seu secretário de Estado. só conhecido décadas depois de ter sido travado, publicado pela ótima Dorrit Harazim, em O Globo:

— [O bombardeio de diques que inundaria áreas enormes do Vietnã e as redes de túneis usados pelos vietnamitas para resistir aos EUA] vai afogar a população?
— Cerca de 200 mil pessoas, responde Kissinger.
— Prefiro usar bomba nuclear. Você entendeu, Henry?
— Isso eu acho que seria demais.
— A bomba nuclear, por que ela incomoda você? Pelo amor de Deus, Henry, eu quero que você pense grande… O único ponto sobre o qual divergimos é em relação aos bombardeios. Você vive preocupado com as baixas civis…
— Os civis me preocupam porque não quero que o mundo se mobilize contra você por ser um açougueiro.

Como se vê, não é uma questão de governantes serem “loucos”, “insanos”, mas das circunstâncias que envolvem os interesses que representam e a afirmação de seu poderio. Senhores simpáticos, gentis, bons pais de família, como Barack Obama e Joe Biden sentaram-se tranquilamente nas salas de segurança da Casa Branca para acompanhar, com áudio, vídeo e em tempo real a execução de terroristas ditos “islâmicos”.

É, portanto, completamente distorcida a visão de que estamos diante de um confronto entre os “bonzinhos” da Otan e o “malvado” do Kremlin, até porque o estopim disso é a intenção manifesta dos “bonzinhos” de integrar a Ucrânia à Otan – uma projeção do poder dos EUA na Europa.

O encontro entre russos e ucranianos, hoje, tem um ponto de partida sem o qual nada mais terá efeito: o cessar-fogo.

Todas as questões vêm depois dele e, talvez por isso, pareça estar havendo uma sabotagem da possibilidade de que ele aconteça.

Empurrar Putin para uma posição onde sua única saída seja ampliar a guerra é tão inocente quanto bombardear dos diques.

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