O Valor de hoje traz uma matéria que faz um chocante retrato sobre as responsabilidades do principal “nó” das grandes cidades brasileiras.
Bilhões são desprezados por Estados e municípios para mobilidade
Nela se diz que Estados e Municípios só conseguiram se habilitar a R$ 479 milhões dos R$ 12,4 bilhões oferecidos, a fundo perdido,e de mais R$13,9 bilhões a juros modestos, oferecidos pelo Governo federal para obras de metrô, trens, corredores expressos e outras iniciativas de melhoria da mobilidade urbana nas cidades médias, grande e metrópoles brasileiras.
No total, R$ 26,3 bilhões, mais do que todo o investimento na Copa.
Portanto, apenas 4% dos recursos já foram devidamente mobilizados, embora se considerarmos os que foram contratados este percentual suba para algo em torno de 10 a 15% do total.
E porque isso acontece?
Porque os governos locais, no Brasil, são desaparelhados e incapazes de viabilizar projetos, além de não terem recursos ou prioridades políticas para fazer as contrapartidas que necessariamente lhes competem, como desapropriações, licitações, projetos.
Além do que – e sempre esquecem isso quando falam no volume de créditos do BNDES – também perderam sua capacidade de se financiar através de títulos públicos, apenas por operações de crédito.
É incrível que, sendo esta do “Valor” uma das exceções, os jornais não iluminem – e critiquem – este desparelhamento e, até, a falta de vontade política dos governos locais em aproveitar as possibilidades que estão abertas, muito embora abri-las valha aos Governo Federal muitas críticas por, assim, alimentar o “déficit público”.
E boa parte desta incapacidade vem do fato de que, com as privatizações de empresas estaduais e com o desmonte dos seus órgãos técnicos, a capacidade de oferecer projetos de qualidade, que já não era uma maravilha, caiu a níveis trágicos.
A realização de grandes eventos, poucos compreendem, funciona como um instrumento de pressão sobre estas administrações, mergulhadas em suas carências, se mobilizarem para grandes intervenções.
No passado, quando o Governo Federal deixava Estados e Município à míngua de recursos e sem linhas de financiamento, essa pressão funcionava “ao contrário”.
Aqui no Rio, se não fosse a realização da Conferência Mundial do Meio-Ambiente, Brizola jamais teria conseguido os recursos para construir a Linha Vermelha. Mesmo com a Rio-92, foi um parto arrancar os recursos do BNDES, que exigia – e só quem passa pela Linha Vermelha na hora do rush pode avaliar o que isso seria – uma praça de pedágio em plena pista, como forma de dar “viabilidade econômica” ao projeto.
Embora pareça loucura, num Rio de Janeiro engarrafado até o gargalo, na época houve quem dissesse que Brizola estava fazendo um estrada só para os chefes de Estado que vinham ao Brasil para a Conferência passarem.
Insolitamente, coube ao técnico da Seleção, Luis Felipe Scolari, hoje, dizer o óbvio:
“Há quantos anos não se fazia uma obra no aeroporto de Guarulhos? Há 20 anos que não se fazia uma obra lá.”
Exatamente: o terminal 2 começou a ser construído pouco depois da inauguração do Aeroporto, no Governo Figueiredo e terminado no Governo Itamar Franco, em 1993.
A verdade é que a Copa “empurrou” os governos locais a tomarem a peito seus deveres.
Sem ela, muito provavelmente os investimentos em mobilidade urbana – ainda que atrasados diante de nossas necessidades – estariam entregues à modorra dos órgãos burocráticos, ou à dos de controle (TCU, Ibama, Ministério Público, etc…) que sempre – com razão ou sem razão – criam entraves quase inultrapassáveis.
A Copa, meus amigos, “botou pressão” sobre estes processos, ainda bem.
E isso exige um presença animadora e fiscalizadora deste andamento, sempre complexo em obras públicas.
Ou alguém acha que Brasília teria saído sem JK e seu “braço executor”, Israel Pinheiro?
Se estas obras deixaram algo claro é que o Governo Federal precisa, urgentemente, aparelhar-se para criar uma ferramenta para “chuchar” os responsáveis locais pelas obras. Técnica e politicamente.
É muito para quem tem a tarefa de coordenar, como o nome diz, a adequação dos projetos, o Ministério do Planejamento.
Precisávamos, mesmo, é de um “Ministério da Execução”.
14 respostas
E em BH, além de não se ampliar nem um centímetro o metrô (mas agora o prefeito anda falando em fazer o ramal subterrâneo para a Savassi), fizeram para a Copa um BRT (BurRice em Transporte) que deixa toda a pista central dos corredores vazias para o BRT andar e joga todos os outros ônibus para as pistas de carros agravando os congestionamentos. Isso sem reduzir em um só ônibus convencional nas ruas. Não sei quem foi o gênio que inspirou esses engenheiros de tráfego.
Não se pode perder de vista que o relatório da Ernst&Young lá viu que o contrato operava em superfaturamento (a taxa de retorno era maior do que a prevista em contrato, gerando enriquecimento ilícito para as empresas, por meio da tarifa!) e, com as obras do BRT, ficou-se no vermelho, obrigando a “subir” as tarifas!
No Brasil há três níveis de Governo. Cada qual com a competência deles (quando eles não são comuns, como Saúde, Educação e Transportes).
Tem Corregedorias da União e dos Estados (e algumas nos Municípios), Tribunais de Contas da União, Estados (e alguns nos Municípios), Ministério Público Federal e Estadual, Órgãos Federais e Estaduais do Meio Ambiente, e outros “controladores” das despesas e da execução.
Para fazer uma creche ou Unidades de Básica de Saúde o Governo Federal exige – claro – um projeto base. Esse projeto de engenharia pode ser um dos modelos atualmente pré-estabelecido para ser licitado. Caso aceite o projeto, o valor é liberado. O mesmo vale para os projetos do Minha Casa, Minha Vida, que são projetos padrão, que se atendem aos requisitos há uma pré-aprovação.
As pequenas e médias prefeituras não tem expertise para esses projetos básicos como creches ou Unidades Básicas de Saúde.
Enfim, a “gestão” de projetos e execução obras no Brasil foi desprestigiada durante anos. E isso vale para grande obras como para pequenas.
A crise dos anos 80 e 90, a falta de crescimento e de perspectivas profissionais desestimularam a profissionais de engenharia se formarem. Esse apagão de mão-de-obra foi fruto de décadas de falta de obras pelo Brasil. Por isso o projeto e execução de obras ainda rasteja Brasil afora, sequer saindo do papel. Mas podes acreditar, o destravamento está acontecendo. E a partir de 2015 creio que as soluções mais simplificadas serão adotadas.
Isso passa, inclusive, pelo modelo de licitação de grande obras – como o Regime Diferenciado de Contratação (RDC) – em votação no Congresso Nacional. O Governo Federal está aprendendo, e isso vale para os Estados, e para os municípios maiores.
Não falta só médicos pelo Brasil. Há falta também de engenheiros.
Excelente comentário!
Infelizmente essa mídia burra está levando o povo a acreditar que a presidenta DILMA é que tem de comandar todas as obras inclusive pondo a mão na massa, a mídia golpista manipulou o povo de uma tal forma que, hoje ouvi uma criança do primário dizendo que a escola dela está em greve porque a presidenta gastou todo o dinheiro com a copa, isso me dá uma tristeza profunda, não conseguimos ver um futuro promissor com o povo sendo manipulado desse jeito.
Os órgãos de controle (TCU, CGU, MPF, TCEs, MPEs, etc…) estão muito bem aparelhados técnica e financeiramente, ao contrário dos órgãos executores da União, Estados e Municípios (principalmente). Os primeiros só sabem dizer um “NÃO PODE” e um “TÁ ERRADO”. E os segundos não conseguem nem fazer, conforme demonstra o post, quanto mais fazer certo e rápido, otimizando a aplicação dos recursos públicos, pois foram desmantelados na década de 90 e assim continuam, com raras exceções. Precisamos estruturar e valorizar mais os órgãos que são vidraça e não os que são pedra. Grosso modo, precisamos deixar de ser um país dos “bachareis” para ser um país dos “engenheiros”.
Adoram embargar obras, mas nada de punir os responsáveis por desvios, fraude em licitações e assemelhados, atrapalhando a vida das pessoas só para mostrar que podem.
Pela vontade e pelo dever de ser participativo, envolvi-me na briga para um novo Posto de Saúde no bairro onde moro em Floripa, o Campeche. E quase perdemos a verba disponibilizada para o Posto, inclusive com projeto padrão do GF. Requeremos, uma parte pequena de um terreno pertencente à União e Adivinhem quem estava melando o processo…IPHAN, sob a alegação que o Francês Frans Exuperri pousou ali para fazer o primeiro correio aéreo da América, então era histórico. Tudo bem preservar a história, mas já tem praça, com marco e placa e tudo referenciando. Foi uma guerra de jogo-de-empurra de “autoridades”…e o povo esperando o Posto de Saúde. Mas para uma Elite jogar futebol Americano , o terreno servia. Enfim vencemos, um mês antes de findar a liberação da verba Federal.
Narrei este fato para ilustrar, por baixo, o que ocorre Brasil afora…mas para os “analfabetos políticos” “ganços globais” a culpa é da Dilma!!!
É algo que eu tenho comentado muito aqui em casa.
Quer criticar, critique, mas não seja massa de manobra burra! Não adianta ficar de choradeira com o “governo” e com “o país”. Não basta se indignar, tem que raciocinar, ver o que não está dando certo e por quê exatamente não está. Quem é o responsável? Os problemas do RJ são problemas da administração do RJ! Dinheiro tem, dinheiro se gasta, muito, e poderia gastar muito mais! O poder público não tem nenhuma construtora, tudo que faz tem que contratar outras empresas para fazer. Se foi mal feito, culpa de quem?
As obrigações de cada um são até separadas na Constituição, por isso não podemos ficar com críticas genéricas e indignação apenas. Precisamos nos informar melhor sobre o que acontece, como acontece e como tem que acontecer, como realmente funciona a administração para poder cobrar dos responsáveis certos.
No Blog do planalto de Abril, tinha uma notícia que a verba para mobilidade Urbana era de 146 bilhões e abrangia 51 cidades. Aí no teu blog diz 12,4 bilhões e poucas cidades? Quem está certo? O seu blog ou o blog do planalto?
No Blog do planalto de Abril, tinha uma notícia que a verba para mobilidade Urbana era de 143 bilhões e abrangia 51 cidades. Aí no teu blog diz 12,4 bilhões e poucas cidades? Quem está certo? O seu blog ou o blog do planalto?
http://blog.planalto.gov.br/governo-federal-investe-r-143-bilhoes-em-303-empreendimentos-de-mobilidade-urbana/
Usei os dados do Valor. É possível que o Blog do Planalto some fontes de outros programas ou que o Valor faça um corte temporal nas verbas autorizadas, excluindo os investimentos anteriores.
Fernando, boa tarde.
essa é só uma das vertentes da miopia (conveniente) de se atribuir toda a responsabilidade, de tudo, ao Governo Federal.
Parece que o Brasil não é um república federativa, que não existem estados e Municípios, só o Poder central, a União.
Ontem o “fimtástico” fez o maior auê com a saúde. Tudo bem que a situação não está nada boa, mas, do que foi levantado de irregularidades, o que é responsabilidade dos municípios, dos estados e da União.
Pelo que sei, no caso da saúde, municípios que se credenciaram à gestão plena do SUS recebem as transferências diretamente do Governo Federal, e não me consta que essas transferências têm deixado de ser feitas.
E aí? Se falta médico, a responsabilidade é de quem? Do Governo federal? ora, faça-me o favor…
Ótimo trabalho de repercutir a matéria do Valor, pois, quem lê o Valor, senão a elite da elite? Falta comunicação do Governo que chegue a todos os brasileiros. Com horas e horas para deslocamento de casa ao trabalho, à escola, ao lazer, que cidadão não iria para cima do prefeito exigir obras para melhorar a mobilidade urbana, sabendo que há dinheiro para esses investimentos? Com boa informação a política se enriquece e a vida fica melhor.