Janio de Freitas: viva a nova (i)moralidade!

pombal

No meio da hipocrisia da grande imprensa, que noticia como simples curiosidade o encontro entre um cidadão que ocupa a Presidência da República por artes de um processo de impeachment originado por outro cidadão que, por reiterada ordem do Supremo Tribunal Federal, está afastado de seu cargo, de seu mandato eletivo e proibido de pisar na Câmara, há ainda esperança.

Janio de Freitas, em sua coluna de hoje na Folha, rompe esta crosta de cinismo e trata, com a condenação moral que merece, o que não foi tratado: o encontro Temer-Cunha é o de cúmplices, o de “protetor e protegido”. Papéis que, a cada hora da política, podem se alternar.

Ponto de encontro

Janio de Freitas, na Folha

Michel Temer e seu governo agem para salvar Eduardo Cunha na Câmara. Talvez não fosse preciso dizer mais nada sobre a atitude de Temer. Afinal, apesar de todo o esforço da Lava Jato e dos pró-impeachment para incriminar petistas, na opinião nacional ninguém simboliza mais a calamidade política do que Eduardo Cunha. Está dito quase tudo sobre protetor e protegido. Mas Temer leva a algumas observações adicionais.

Descoberto por jornalistas o encontro sorrateiro de Cunha e Temer na noite de domingo (26), o primeiro fez o que mais faz: negou. Não falava com Temer desde a semana anterior. Com a mentira, comprovou que a combinação era de encontro oculto. O segundo deu esta explicação: “Converso com todo mundo. Embora afastado, ele é um deputado no exercício do seu mandato”.

A frase é uma medida da lucidez de Temer ou da honestidade de sua resposta ao flagrante: “afastado” mas “no exercício do mandato”. Nada de muito novo. Mas a pretensa justificativa de que “conversa com todo mundo” excede o aspecto pessoal. Se é isso mesmo, em quase seis anos de convívio com o Poder ainda não o compreendeu. À parte a liturgia do cargo, de que Sarney tanto falou, o Poder requer cuidados com sua respeitabilidade. Ao menos no sentido, tão do agrado de jornalistas brasileiros, cobrado às aparências da mulher de César.

O sítio de alto luxo não combina, mas não tira o título do Palácio do Jaburu, nem, muito menos, a sua condição de uma das sedes do mais alto poder governamental. O recepcionado aí para a barganha de espertezas não é, porém, como “todo mundo”. É um múltiplo réu no Supremo Tribunal Federal, tão excluído do exercício de mandato que está proibido até de simplesmente entrar na Câmara dos Deputados, Casa aberta a todos. Proibição, ao que consta, sem precedente. Não no conceito, de moralidade ao menos duvidosa, que o atual morador aplica ao uso do palácio de governo.

Eduardo Cunha viu-se necessitado de reforço em duas instâncias. Na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, à qual encaminhou recurso contra a decisão do Conselho de Ética, que o considerou passível de perda do mandato. E também na substituição de Waldir Maranhão, em exercício na presidência da Casa, por alguém de sua confiança, para assegurar-lhe decisões favoráveis nas manobras de defesa ao ser julgado em plenário.

Já na segunda-feira (27), Temer fazia iniciar a ação do seu pessoal em favor da eleição de Rogério Rosso para presidir a Câmara. É o preferido por Eduardo Cunha. E viva a nova (i)moralidade.

Facebook
Twitter
WhatsApp
Email

9 respostas

  1. Está cada dia mais difícil fingir que este impeachment não é GOLPE.
    Coxinhas, comentários, por favor. Estão gostando do presidente (sic) de vocês?
    Ficou bom agora que acabou a corrupção e a economia deu saltos de qualidade, né?

  2. Socorro. Vão pulverizar as cidades. Esta no Viomundo. O ditador quer assassinar as crianças.

  3. Alem de golpista é o governo Recua. Comete um erro e recua, comete outro e recua. Uma presidência não é escola.

  4. Vera Chvatal permalink
    14/05/2016 17:35

    Repassando:

    O GOLPE E A DOUTRINA DO CHOQUE

    Amigas, amigos,

    É importante entender o que está acontecendo. Tem muita gente perplexa com o número de medidas absurdas tomadas de imediato pelo governo golpista. Ministros corruptos, o fim do ministério da cultura, da representação de mulheres, da população negra etc etc. Dá até a impressão de que os golpistas estariam cometendo algum erro, exagerando, pois pareceria óbvio que isso gerará muita insatisfação e revolta, que é escancarado demais. Mas não é assim que funciona. O golpe está utilizando uma doutrina de guerra conhecida, a doutrina do “shock and awe” (choque e pavor), muito explicitada e comentada na época da invasão americana do Iraque de 2003. Quem não conhece procure no Wikipedia. A doutrina do choque é baseada na idéia de executar uma série de ações rápidas, no uso avassalador da força no começo da batalha, para “paralisar a compressão do adversário e destruir sua vontade de lutar”. É assim que se tomam medidas aparentemente desproporcionais. O resultado é deixar o inimigo (no caso, nós) paralisado, atônito, ou em pânico. Isto é um gesto deliberado, calculado, estudado. E funciona. Olhe ao seu redor. O que mais se escuta é “é absurdo demais o que está acontecendo”, “meu deus eu não consigo nem mexer direito, é tanta destruição”, “como podem tão rápido terem feito tantos absurdos?”, e gente perguntando quando é a próxima manifestação sem obter resposta. Pois eles sabem exatamente o que estão fazendo. Estão em guerra contra uma boa parte da população. A resposta adequada é não se surpreender (já escrevi sobre iso antes aqui, a importância de não se surpreender), manter o foco, não desesperar. O objetivo do golpe agora é deixar as pessoas paralizadas durante este período de impeachment para justamente evitar o máximo as manifestações. Os golpistas planejaram isso por meses, se não anos, por isso o ar de confiança que sempre exibiram. Colocaram todas as peças no tabuleiro: chocar a população mais à esquerda com uma verdadeira hecatombe institucional, blindar os resultados desastrosos do processo com uma mídia completamente e explicitamente investida no golpe (a Globo principalmente), e abertamente posicionar os mecanismos de repressão mais eficazes e truculentos para conter qualquer resposta organizada. O ministério da Justiça fundido com o de Direitos Humanos é que nem uma placa “cuidado cão-guarda”, não é por princípio que colocaram o advogado de facção criminosa, é por cálculo. Do ponto de vista deles, não há outra opção, é isso. É guerra. Se fizessem menos do que isso, numa tentativa de conciliar, a nossa resposta seria muito maior, porque não estaríamos atônitas e atônitos. A guerra tem as suas técnicas seculares. Essa é uma delas.

    É preciso acordar, deixar o choque passar e ir à luta sem medo. LUTA.

    —> Não asfixie o seu espaço de representação do que está acontecendo, tornando-o apenas um espaço de estarrecimento parente o absurdo. Não fique sozinha. Não lamente, lute. Simplesmente manter-se informada do absurdo mais recente do que está acontecendo é a pior coisa que vc pode fazer.

    —> Converse com as pessoas, mas não no sentido de apontar “o absurdo”, mas sim no sentido de ações concretas. No meu caso, eu perdi a vergonha, em qualquer lugar falo para as pessoas do que está acontecendo, aponto a culpa que Globo tem na história, falo da necessidade de parar de assisti-la. Nunca abro o registro da resignação. É pequeno, é simbólico, mas é um gesto. Perturba a narrativa.

    —> Tenha uma agenda clara das manifestações e reuniões às quais você vai comparecer. E saiba quais são as suas principais redes de mobilização.

    INSTALE O TELEGRAM, E USE EMAIL ENCRIPTADO.

    As bombas caem por todos os lados, mas você tem que focar em uma de cada vez, sem perder o fôlego.

    Uma dessas bombas, por exemplo, é o fim do ministério da cultura. É preciso mobilizar-se em torno a isso. Não falta gente revoltada. Essas pessoas só precisam de um lugar e uma hora onde protestar. Sem medo.
    Responder

    Leonardo Boff permalink*
    15/05/2016 0:00

    Vera, considero sensatas as suas reflexões e penso da mesma forma. Creio que está em curso algo ainda mais grave, de um golpe parlamentar se passar como está ocorrendo em quase toda as cidades a um golpe policial. Isso pode abrir a um golpe militar, por algum tempo, na tentativa de equilibrar as forças em disputa…Oxalá os militares não acabem gostando do poder. E há um ponto que assinalei aqui no blog a presença de agentes da inteligencia norte-americana para enfrentar, no quadro da nova guerra fria com a China que esta penetrando na A. Latina e no Brasil, para impedir um projeto autônomo da setima economia do mundo, o Brasil. A situação é complexa e precisamos estar atentos. Ficar calmos mas denunciar as estratégias longamente pensadas de chegar ao poder como forma de garantir e sedimentar os privilégios de classe dominante, a velha Casa Grande. Que tenhamos luz no meio da crise. Abraço lboff

  5. … Para os(as) ainda defensores(as) da nazigolpista “alucinada e semianalfabeta [Janaína Paschoal]”, segundo o Ciro Gomes.
    O consciente e impávido Ciro Gomes aproveita para desancar também o “comprável” Judiciário e o [ressentido e invejoso] ‘Hélio Bic(ud)o de Tucano’!

    https://www.youtube.com/watch?v=gzbv1gcm1ME

  6. Tarefa inglória a de fazer o mimi entender a diferença entre moral e imoral. Isso se aprende mais cedo na vida, e esse tempo há muito já passou (inutilmente) para o usurpador.Agora que encontrou seu alter ego no cunha só lhe resta o último estádio do inferno dantesco.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *