Luiza, Eike e o tombo do canguru vaidoso

Antes de qualquer coisa, deixem-me dizer que não nutro qualquer simpatia pelo Sr. Eike Batista e que dele a única inveja que poderia ter, por sua linda ex-mulher Luma, desvaneceu-se no episódio torpe da coleira de brilhantes.

Mas, vendo o massacre que ele está sofrendo da mídia que, durante anos, endeusou os mesmos excessos e vaidades aos quais, agora, atribui-lhe a bancarrota – bancarrota da qual, aliás, ainda duvido – , veio-me à cabeça uma velha história.

Quando Leonel Brizola foi à Austrália – não me recordo o ano exato, creio que 1988 – e voltou de lá falando umas coisas que eu, nos meus então 30 anos, não achava verossímeis, torci o nariz.

– Olha, Brito, eu conversei com uma senhora e, na hora em que a conversa terminou ela fez questão de me dizer: “como é que são os empresários no Brasil? Nós, aqui, amamos nossos empresários.”

E eu, com meus botões: “ora, vá plantar batatas, seu Leonel! Como é que vão gostar de empresários, um bicho que vive de ganhar dinheiro nas costas do trabalhador e do consumidor?”.

Mas ele repetia. O Octavio Costa, hoje no Brasil Econômico, deve lembrar bem desta história. Numa das primeiras pesquisa, quando ele apareceu à frente e Collor não tinha nada, chegou a ser retratado de “canguru” numa capa da então Istoé/Senhor. Fernando Mollica, de O Dia, também.

Eu não discuti, mas estava preocupado com este papo, porque se aproximavam as eleições presidenciais e eu achava – e não sem razão – que os acenos de Brizola ao empresariado e aos que ele chamava (existe isso?) de “conservadores lúcidos” iam nos comer votos à esquerda, como de fato ocorreu.

Vinte e cinco anos depois, dou a mão à palmatória.

O Estado é o reitor e o principal agente do progresso econômico e social do país. Sua omissão, como ocorreu, nos últimos tempos da ditadura militar e nos governos que a sucederam, até Lula, apenas disfarça – no caso de FHC, nem disfarça –  o processo de apropriação privada – e, sobretudo, estrangeira – das riquezas deste país.

Mas há um lugar – e indispensável – para empresários que querem ganhar dinheiro apostando do desenvolvimento do Brasil e do povo brasileiro.

Hoje já não acho tão estranho o que a australiana disse a Brizola.

Li, numa destas –  em geral – tolas “sabatinas” da Folha, o que disse Luiza Trajano, dona do “Magazine Luiza”.

Ela, claro, quer ganhar dinheiro. Mas entendeu, como varejista que é, que se ganha muito mais vendendo para muito mais gente. Que é melhor ter mais gente podendo se sustentar e consumindo que pouca gente podendo esbanjar, até porque os esbanjadores não deixam de esbanjar por causa disso.

Dona Luiza, talvez por isso, tenha visto o seu “Magazine Luiza”   fechar  o terceiro trimestre com lucro líquido de R$ 25,4 milhões, quase 11 vezes mais que o  ganho de R$ 2,3 milhões obtido no mesmo período do ano passado, quando o consumo popular andava bem mais apertado.

Mas as elites brasileiras se incomodam com os pobres. Estão aí os bancos privados, levando uma surra da Caixa Econômica, porque ela ousou emprestar mais barato e para gente que estava fora do mundo do crédito. Preferem forrar suas calçadas com pedras pontiagudas, como fez uma agência do Bradesco em Manaus, para expulsar dali os mendigos. É uma versão arquitetônica do “fazer ração para peixes”.

Reclamam dos aeroportos porque eles estão cheios de gente de classe média baixa, voando pela primeira vez.

Torcem o nariz para as empregadas domésticas que ousam ter direitos trabalhistas.

E por aì vai: custo Brasil, produtividade baixa, desqualificação do trabalhador, etc…

Todos se acostumaram com um país de 30 ou 40 milhões de habitantes, cercados por 160 milhões de “selvagens”, em relação aos quais clamam por segurança, polícia, prisão. E logo, reduzindo a maioridade penal, se possível.

Eike Batista está a anos luz de parecer-se com empresários como Luiza Trajano, com seu ar de gorducha bonachona.

É – ou era – o típico temerário, aventureiro, extravagante e exibido,com tudo o que a mídia e os comentaristas de economia da grande mídia adoravam e que, com a maior cara dura hoje apontam como seu “pecado”.

Mas há algo em seu favor que os jornais não dizem: que foi dos raríssimos empresários que colocou dinheiro em uma área que os empresários brasileiros não põem: indústria pesada e infraestrutura.

E, por isso, quebrou.

Porque – e essa é uma verdade simples, embora não costume ser dita – a indústria pesada, a infraestrutura, no Brasil, ou é papel do Estado brasileiro ou é a entrega da espinha dorsal de nossa economia a interesses muito raramente coincidentes com o do país.

A entrega da Vale e de boa parte da energia elétrica (aliás, a melhor parte, a distribuição) retiraram do Estado brasileiro a capacidade de investir nestas áreas, embora não lhe tenha, de forma alguma, retirado seus deveres de gastar muito para que possam funcionar, como é o caso das linhas de transmissão, hidrelétricas e portos e ferrovias, das quais uma e outra necessitam.

O que restou, mesmo estropiada, foi a Petrobras e, pelos desafios e dificuldades que ela hoje enfrenta e vence, podemos ter ideia do que seria o nosso país se Fernando Henrique tivesse conseguido concluir seus planos de vendê-la mais do que o fez.

Eike Batista afundou-se num poço quase vazio de petróleo, o tal “Tubarão Azul”, cujo insucesso parcial devorou sua capacidade de gerar caixa para continuar os seus “negócios-bicicleta”, que só se equilibravam porque em movimento.

E porque lhe faltou, na queda, a discrição que o mundo dos negócios dá aos seus pares “bem-comportados”, como os herdeiros Globo ou os Civita, que, na sombra, conseguiram se afastar dos abismos financeiros em que se meteram.

Os que lhe dizem “bem-feito” o fazem menos por seus erros que por suas ousadias. Fossem apenas falcatruas, como as de Daniel Dantas, talvez contasse com mais apoio, até mesmo dos amigos, como Aécio Neves, que não deu um pio.

Ou de toda essa gente da mídia que lhe comeu de favor e agora o execra.

É verdade que a vaidade e a ostentação de Eike tornam seu cadáver (embora, repito, ache que o cadáver não está morto) mais “saboroso” aos jornais.

Mas o que sentem, mesmo, no fundo, é um imenso prazer em ver qualquer brasileiro ousado cair.

Num país de ratos, maldito de quem se mete a canguru.

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13 respostas

  1. A iniciativa privada é fundamental para o pleno desenvolvimento de qualquer país.

    Até o governo da China comunista já entendeu isso.

    Não há nada de errado em querer ganhar dinheiro. Dinheiro não é algo “sujo”, que deva envergonhar as pessoas. Todo trabalhador adora receber uma boa PLR para gastar e “esbanjar”.

    Empresários lúcidos e comprometidos com o desenvolvimento da sua nação e do seu povo são algo fundamental para qualquer país se tornar uma nação plenamente desenvolvida.

    Pena que a “burguesia” brasileira historicamente tenha sido tão avessa ao seu próprio povo, e sempre tenha tido tantas tendências aristocráticas.

    Cabe ao Estado sempre ter a mão firme para regular a economia, e impedir que os interesses individuais dos empresários se sobreponham sobre os interesses da coletividade. Mas é totalmente possível conciliar ambos, e mais do que possível, é necessário.

    Quanto ao Eike Batista, considero um empresário bastante CORAJOSO, que teve coragem de apostar no desenvolvimento do Brasil, que teve coragem de investir em portos, em energia, em infra-estrutura, apostando alto no crescimento do Brasil. E sinceramente, acredito que ele acabará saindo dessa situação atual, pois por mais que não tenha obtido os sucessos esperados na área de petróleo, seus investimentos são diversificados, e como o Brasil continua crescendo, e vai crescer ainda mais nos próximos anos, é provável que Eike vá ganhar muito dinheiro em áreas outras que não o petróleo.

  2. Ousar contra os princípios da republica integrista do Ipiranga que fás estradas, refinarias, plataformas, hidroelétricas e etc., desde que seja empreendimentos feito pelo governo foi um crime de mercado que teve seu destino com um corte na glotis. Estes novos empreendedores precisam ter em mente o fim do Barão de Mauá e dos Eikes da vida. Viva a republica de Borba Gato!

  3. Sempre critiquei aquilo que os nossos “empresários” representam. Sabem se queixar da carga tributária, dos encargos sociais, mas a maioria não investe um centavo na nossa economia. Pegam dinheiro do BNDS, importam produtos chineses, colocam seus rótulos neles e vendem como nacionais, driblando o governo e aplicando a lei do Gerson a toda hora. Existe uma má vontade de investir aqui, porque é mais fácil e lucrativo aplicar dinheiro no mercado. Dinheiro não tem pátria, já dizia Napoleão.

  4. Grandes empresários brasileiros execram o Estado, mas se puderem se penduram num empréstimos “barato” do BNDES, ou num contrato “gordo” de obras de infraestrutura, ou pedem “penico” na hora que a água bate na bunda. Mas me perguntava: que esse cara produz e vende pra ter tanto dinheiro? Soube que estava em todas, de Rock in Rio a mineração. Queria siderurgia, petróleo, estaleiros, porto, todas iniciativas que exigem longa maturação do capital investido. Até montadora nacional de automóveis elétricos (em parceria com chineses) ele queria fazer. Mas o poço foi secando (ou estava seco), ele perdeu a confiança do “mercado” em dar aquele retorno rápido.
    Eike quis crescer rápido, confundiu vaidade com ambição (não digo ganância), virou o alvo. Quebrou como quebraram Unibanco e Sadia em 2008 (que arrumaram fusões pra se saírem bem). O Unibanco e a Sadia apostaram no dólar baixo (dizem que a Sadia – do Ministro Furlan – pegou grana do BNDES e a jogou no mercado financeiro). Mas Eike acreditou na produção. E avaliou mal. Não se deu mal. Se deu mal quem acreditou nele, outrora incensado também (e muito) pelo PIG.
    Não foi esperto (com s mesmo) como Carlos Jereissati – grande tucano cujo negócio recebeu aporte financeiro do Governo Petista – e Andrade Gutierrez, com a Oi, ou mesmo os “grandes” Sucupira e Leman (Ambev), que pegaram grana do BNDES pra investir e depois desnacionalarizam as empresas com fusões com Portugal Telecom e Imbev. Segurará a vergonha, mas posso dizer que dará a volta por cima. De bobo não tem nada.
    E Eike nunca reclamou de “carga tributária” no Brasil, ou de “custo Brasil”, pois em vez de reclamar procurava construir.
    Ah, só não foi socorrido pela boataria de que Lula é sócio dele (como o Lulinha é sócio do Júnior da Friboi), e o sucesso dele era devido ao Governo Lula que o turbinou.

    1. Acredito que o PIG inicialmente gostava de Eike, mas nos últimos tempos começou a ficar com raiva dele, porque ele andava investindo demais em infra-estrutura, era “otimista demais”, dava entrevistas à imprensa estrangeira dizendo que acreditava no crescimento do Brasil. Isso tudo começou a irritar o PIG, que passou a torcer contra ele.

      Como sabemos, a Bolsa de Valores se baseia em notícias. Então, qualquer fracasso da petroleira do Eike, ao ser ecoado pela caixa de ressonância do PIG, tem o poder de derrubar, e muito, as ações de todas as empresas da holding dele, mesmo das empresas que não tem nada a ver com petróleo.

      Podemos até achar que o Eike “quis abraçar o mundo com as pernas”, mas talvez essa diversificação de investimentos venha a ser a salvação dele. Independente do que pensam os especuladores da Bolsa de Valores, certamente os lucros virão, em muitos dos empreendimentos não-petrolíferos dele.

      Talvez o melhor para ele no momento seja justamente essa saída da Bolsa de Valores, talvez o melhor seja ficar longe da Bolsa, e trabalhar para começar a ganhar dinheiro na “economia real”, sem se preocupar com pressões de especuladores.

  5. Ouvi certa vez uma história, de que não apenas ele herdou alguns “tesouros” do pai, mas que esse tesouro era um digno “tesouro de pirata”.

    Não discordo em nada de que demos dar mais valor aos nossos empresários nacionais, e nacionalistas, e precisamos de mais deles.

  6. O crime ou pecada seja lá o que .. Eike foi ter declarado que “era preciso uma TV e um jornal que falasse bem do Brasil, das coisas boas. E ameaçou comprar a rede TV. Foi o bastante para apanhar todo dia.#Midiazona..af…

  7. Como o velho Briza bem nos posicionou, outros Eikes já tombaram na história deste Brasil- vide Mauá no Império.
    Torço e acredito na sua recuperação .

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