O que é ruim para os Estados Unidos é ruim para o Brasil

LATIMES

Paulo Nogueira Batista Jr., diretor brasileiro do FMI e criador da genial expressão “turma da bufunfa” com que define o pessoal da grana grande e da cabeça miúda, trata em artigo publicado hoje em O Globo – infelizmente, o jornal não o coloca na internet – de algo que falamos aqui, esta semana.

É o crescimento da desigualdade de renda nos Estados Unidos, que se aproxima do que foi nos anos 30, época da Grande Depressão, em que os EUA se encheram de miseráveis, até que Roosevelt  inverteu as regras da ortodoxia econômica – veja aqui, no final desta fala do presidente americano no Brasil, em 1936, com quem ele partilhava as ideias de um Estado emulador do desenvolvimento.

O discurso de Obama em favor da elevação da renda dos norte-americanos  mais pobres  não é reflexo de uma súbita “conversão” do ideário estadunidense. É o reflexo de um impasse onde a concentração de riqueza, global e internamente, os estão levando para impasses diante de um mundo onde as ideias de justiça social, após o declínio do ideário neoliberal, recuperaram seu vigor.

E é também um lembrete da caminhada – penosa e mais devagar do que poderia ser – estamos fazendo. Com defeitos, sim, mas andando não para trás, mas para o futuro. O que fica mais evidente quando o grande modelo das nossas elites anda, vigorosamente, rumo ao passado.

País menos desigual

Paulo Nogueira Batista Jr.

O tema da desigualdade vem ganhando destaque aqui nos EUA. Há poucos dias, o presidente Obama referiu-se à crescente desigualdade na distribuição de renda como “uma ameaça fundamental ao sonho americano”. Desde a década de 80, a renda e a riqueza se concentraram de forma impressionante. Os 10% mais ricos, que até então tinham algo como 1/3 da renda, passaram a responder por cerca de metade da renda, lembrou Obama. O patrimônio líquido das famílias mais ricas equivale a 288 vezes o de uma família típica — um recorde para os EUA.

Na Europa, a desigualdade também é crescente. As sociedades europeias tendem a set mais igualitárias do que a americana, mas a tendência lá também é de concentração da renda. Na Alemanha, a participação dos 10% mais ricos na renda nacional (antes de impostos e transferências) aumentou de 26% para 31% entre 1991 e 2010. Na periferia da área do euro, a crise aguda levou os governos a enfraquecerem os sistemas de proteção dos trabalhadores no afã de recuperar competitividade. Isso vem contribuindo para erodir a coesão social e abalar a estabilidade política de países como Grécia, Portugal, Itália e Espanha.

No Brasil – que sempre esteve entre os mais desiguais do mundo —, a tendência tem sido de desconcentração.

No fim de novembro, o IBGE divulgou a Síntese de Indicadores Sociais, com informações sobre a distribuição pessoal e funcional da renda. O que se verifica é que, desde a década passada, os indicadores melhoraram.

Uma fonte de dados é a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Entre 2004 e 2012, a participação dos 10% com maiores rendimentos diminuiu de 45,3% para 41,9% da renda total; a dos 40% com menores rendimentos subiu de 10,9% para 13,3%. O índice de Gini teve queda contínua desde 2004, passando de 0,556 para 0,507.

As contas nacionais também indicam melhora da distribuição na década passada. A participação do trabalho assalariado (salários brutos e contribuições sociais pagas pelos empregadores) no valor adicionado à economia (no PIB, vale dizer – Nota do Tijolaço) aumentou de 45,8% em 2004 para 50,6% em 2009 (último dado disponível). A participação da renda do capital (rendimentos das empresas, dos detentores de títulos e dos proprietários de imóveis e outros bens alugados) diminuiu no mesmo período de 41,5% para 38,5%.

A melhora nos indicadores de desigualdade parece ter três explicações fundamentais: a) o crescimento econômico com geração de empregos e formalização das relações de trabalho; b) o aumento real do salário mínimo; c) os programas de transferência de renda (Bolsa Família e outros).

Não há dúvida de que a renda e a riqueza continuam extraordinariamente concentradas. Mas, diferentemente do que está acontecendo nos países avançados, os indicadores de distribuição começaram a mostrar alguma melhora no Brasil.

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