O que não é real não vai parar de pé. Mas é terrível

Um país – especialmente um país gigante e carente como o nosso – não pode tratar, como estamos fazendo, a eleição de seu presidente como se fosse um concurso de “bebê Johnson” ou de calouros, como se via na televisão.

Na terra arrasada gerada pelos desbordamentos da Lava Jato e do golpe parlamentar, desapareceu o ordenamento político que o país construíra desde a redemocratização e abriu-se o campo para todo o tipo de aventureiros, de escassa representatividade e com os partidos reduzidos a um carimbo legalmente necessário ao “concurso” presidencial.

Quase nada guarda ligação com o processo histórico de identificação da população com ideias, programas, projetos para o país e sua vida em sociedade, embora a mídia e a parcela mais conservadora das nossas paupérrimas elites culturais o trate como “renovação da política”, ao ponto de ter chegado a glorificar Luciano Huck como tal, um simples pateta televisivo.

Faça uma lista e examine: Joaquim Barbosa, Rodrigo Maia, Henrique Meirelles, Álvaro Dias, Flávio Rocha, João Amoedo e outras insignificâncias políticas – um rol ao qual, num gesto ensandecido, acaba de juntar-se o ex-ministro Aldo Rebelo -, oferece ao eleitor um leque de “não sabemos para onde querem ir” ou então um “não vamos a lugar nenhum diferente deste inferno em que estamos”.

Nenhum deles “existe” eleitoralmente e só poderão vir a “existir” se adotados pelo sistema de comunicação dominante, o que pode, em casos extremos, servir para eleger, mas não para sustentar um governante, como nos ensinou – ou deveria ter ensinado – a “experiência Collor”.

Não integra esta lista, como você notou, o nome de Jair Bolsonaro.

Sim, ele representa algo, algo que esteve adormecido nas últimas décadas e que se libertou assustadoramente com a abertura da Caixa de Pandora, há dois anos, com o processo de ruptura da legalidade democrática materializado no impeachment de Dilma Rousseff.

A direita feroz, sem rebuços, não apenas socialmente cruel como sempre foi, mas desabrida na barbárie das relações humanas marcadas pela violência, pela brutalidade, pela intolerância.

O PSDB, que personificou o conservadorismo e o neocolonialismo no país, aparentemente, morreu do veneno que ele próprio injetou na política, quando atirou nas mãos de um desqualificado como Aécio Neves, o seu destino. O oportunismo, a vilania política, a ausência de mínimas qualidades pessoais foram um veneno para os tucanos e, ao que parece, o que sobra deles, Geraldo Alckmin, repetiu a dose, em escala ainda maior, consigo mesmo, ao criar seu monstrinho Doria, que será a base bolsonarista em terras bandeirantes.

O novo partido de direita no Brasil, assim, saiu do campo da política – e, portanto, do voto popular – para o da Justiça.

O Brasil, que tentava sair do atraso pela via da negociação e composição de interesses conflitantes, como foram os governos de Lula, decaiu à condição de um país em que a manutenção do atraso e dos privilégios depende do autoritarismo que, hoje, já não tem condições de se implantar pela via militar.

O Judiciário, que dá à mídia a cobertura de legitimidade para demolir as representações políticas da população, está partejando o que seria inimaginável há meros dois anos e que se revela na agudeza da charge de  Renato Aroeira – o melhor cronista gráfico desta quadra da história brasileira – que ilustra o post.

O que se passa hoje só não é mais terrível porque não é o real retrato do Brasil, mas a caricatura disforme que fizeram deste país.

Ainda que prevaleça, é um monstrengo que não tem condições de se impor por longo tempo, como ocorreu com o regime militar de 64.

Fernando Brito:

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  • O conteúdo desta postagem é quase perfeito. Só não o é porque Fernando Brito não explicitou o que os atentos e observadores há naos percebem, mas que deve, SEMPRE, ser dito, e escrito, com TODAS as letras.

    Na frase "O novo partido de direita no Brasil, assim, saiu do campo da política – e, portanto, do voto popular – para o da Justiça." A impressão que fica é de que esse partido do judiciário (golpista, oligárquico, plutocrata, escravocrata, cleptocrata, privatista e entreguista) é algo externo ou diferente do que o próprio Fernando Brito mostra: "O PSDB, que personificou o conservadorismo e o neocolonialismo no País...". Lamento dizer, Fernando Brito e leitores, que o PSDB, juntamente com o partido da justiça e o da banca financeira (nacional, mas sobretudo internacional) são uma espécie de "malditíssima trindade", inseparáveis, unos, embora se apresentem com três cabeças aparentemente distintas.

  • Caro FB
    Não vejo motivos de espanto da justiça, ela sempre foi seletiva.
    Não é só com o Lula.
    Mas é bom que se acorde para o que está acontecendo, faz parte da guerra não declarada e do brasileiro "cordial".
    O Lula é prisioneiro de guerra.

  • “Deixai toda esperança, ó vós que entrais”. Mensagem na porta do Inferno, na Divina Comédia. O estado está completamente dominado e aparelhado pela "elite" escravocrata, corrupta ou entreguista, isso inclui forças armadas, PF e polícias. Da mídia, sobretudo a globo, nem é preciso dizer nada. Então, não devemos criar ilusões sobre redemocratização pela via pacífica. Muito tempo vai passar, muita desgraça vai acontecer e o brazil vai se tornar mesmo aquele país de terceiro mundo que sonhamos um dia deixar de ser.

  • FAMIGLIA

    Aos poucos tudo vai ficando esclarecido. O procurador que tirou Geraldo Alckmin da mira da Lava-Jato é primo irmão de um velho aliado do tucano.

    Luciano Mariz Maia, o vice-procurador-geral da República é primo de José Agripino Maia, senador do DEM, que quase foi vice de Alckmin na eleição presidencial que perdeu para Lula em 2006. Nada acontece por acaso. Fica tudo em famiglia.

  • PSDB = bactérias estão morrendo pelo excesso de toxinas produzidos por eles mesmos. "O PSDB, que personificou o conservadorismo e o neocolonialismo no país, aparentemente, morreu do veneno que ele próprio injetou na política, quando atirou nas mãos de um desqualificado como Aécio Neves, o seu destino."

  • Claro como as águas azuis de nosso mar, o Brasil, infelizmente, está a caminho da pior experiência que um povo poderia ter. Caso o bostanaro vença a eleição, retrocederemos aos tempos medievais, dos processos da "sagrada igreja" da Inquisição. Nesses processos, o (a) denunciado (a) tinha o direito de morrer rápido (se confessasse o que não fez) ou morrer lentamente em instrumentos de tortura inimagináveis. E como chegamos a essa tendência? Pela criminosa e sórdida campanha de uma mídia canalha e um judiciário que virou "partido". Que envergonha a qualquer magistrado em qualquer lugar sério desse planeta.

  • Que nada amigo! Sexta feira, chopinho já no almoço, solzão, praia amanhã é certo. Esse negocio de política já deu, só tem safado mesmo, deixa prá lá. Eu que não voto em ninguém!

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