Outra cartilha é possível

Roda nas redes a cena em que, num programa de TV, o jornalista Ernesto Lacombe cortou o lamento da colega Sílvia Popovic sobre a morte da menina Ágatha Félix para dizer que a culpa da situação era de Leonel Brizola – “que proibiu a polícia de subir o morro” e que os bandidos do tráfico eram “iguais aos palestinos”, que “colocam mulheres e crianças na frente” como seus escudos.

Ainda que a falta de inteligência se autoexplique, como Brizola deixou o governo do Rio de Janeiro há “apenas” 25 anos, é bom que se situem algumas coisas que ainda são repetidas mecanicamente por gente como ele.

Quando começou o primeiro governo de Brizola, Lacombe tinha 16 anos. Começou a trabalhar como jornalista no Governo Moreira Franco (aquele que “acabou” com a violência em seis meses, lembram-se?) No segundo governo Brizola, ficou apenas um ano por aqui, pois foi iniciar sua carreira na Globo de Santa Catarina, de onde só voltou no governo Marcello Alencar, o da “gratificação faroeste”, que premiava as “ações de combate” de policiais.

E, portanto, um “especialista”, não é?

A resposta a esta “acusação” pode ser dada, com toda a serenidade, pelo próprio responsável pela Polícia Militar nos dois governos Brizola: o Coronel PM Carlos Magno Nazareth Cerqueira, não sem antes situar quem foi este oficial: negro, filósofo, psicólogo, chefe do Estado Maior da Polícia Militar quando Leonel Brizola ganhou as eleições pela primeira vez.

Não foi, portanto, “trazido” por Brizola, assumiu antes de sua posse, depois de 18 anos em que a PM era comandada por coronéis do Exército. Cerqueira tinha na cabeça o que falta aos governantes de hoje, a ideia sobre o que seria ajustar a polícia à democracia:

(…) as intervenções policiais não [deverão mais ser] são percebidas mais como enfrentamentos, mas como administração de conflitos, exigia uma outra definição da missão que não privilegiava a ideia do “combate” e do “policial combatente”, própria de uma filosofia de guerra, para identificar a repressão policial. Era preciso terminar com a ideia equivocada da incompatibilidade do policiamento com a observância dos princípios regulados pelos instrumentos internacionais sobre os direitos humanos.

Sobre as idiotices de Lacombe, uso a narrativa de Cerqueira:

Vivemos uma experiência ímpar, durante o governo Leonel Brizola, como Comandante-geral e Secretário da Polícia Militar do Rio de Janeiro, pois, entendendo que a eficiência se solidifica, justamente, sobre o alicerce teórico do respeito aos direitos humanos, procurávamos conduzir a prática policial obedecendo e fazendo com que meus comandados obedecessem ao que hoje a nova Constituição consolida. Teríamos construído uma polícia adequada a um regime democrático, prestadora de serviços públicos e protetora do cidadão.
Não foram raras as acusações de que a polícia estaria manietada, sendo impedida de combater o crime, proibida de subir os morros e arrombar barracos e acumpliciada com o crime organizado. Não eram raros os gritos de que “direitos humanos era coisa de socialismo moreno acumpliciado com os poderosos marginais que infestavam os morros cariocas”.
Acreditamos que todos estejam bem-intencionados, embora alguns seriamente equivocados. Não é matando bandidos que se previne o crime.
Não é à toa que países acostumados com as práticas democráticas, como os Estados Unidos, afirmem que a contenção do crime não pode perder de vista as liberdades públicas, os direitos individuais, e que o sucesso absoluto (se é que existe) nesse combate só seria possível em regimes ditatoriais que permitissem controles não democráticos da população.
É preciso pensar sobre isso; é preciso acreditar nisso, não só a polícia, mas, infelizmente, ainda, uma grande parte da população brasileira; é preciso acreditar nas práticas democráticas, como aquelas capazes de possibilitar uma convivência humana digna e harmoniosa; é preciso acreditar que os direitos humanos são consequência da prática de deveres do Estado, das instituições e dos cidadãos.

A “cartilha” que Wilson Witzel diz que vai distribuir nas favelas, mandando os pobres se entocarem em buracos quando as tropas chegarem deveria ser substituída, nos quartéis, por manuais com ideias como as de Cerqueira, estas recolhidas no livro Sonho de uma Polícia Cidadã, de 2010, patrocinado pela própria PM do Rio de Janeiro.

Mas, infelizmente, somos governados agora por seres que preferem “fazer arminha” e dar socos no ar, comemorando mortes.

Fernando Brito:

View Comments (23)

  • Tenho muita esperança que um dia o governador Rambo da Silva faça uma cartilha para os moradores do Leme e Leblon se comportarem quando o Terminate Squad do BoPE carioca estiver invadindo torres de luxo atrás dos verdadeiros traficantes...

    • É o que sempre digo: quem mora no morro não é o traficante, é o que se chamava "vapozeiro", aquele que vende à varejo. Querem prender traficante? Vão nos Jardins, no Leblon, em Copacabana, em Brasília...

  • Lacombe, profissão jornaLIXO.
    Canalha, canalha, canalha!
    Como não assisto televisão há alguns, nem tinha conhecimento desse sujeito, mas sei muito bem que o Brasil fascista, é resultado do lixo que esse e outros Datenas produzem diariamente.

  • Cada policial que morre é resultado direto das mortos que eles perpetram nas ruas. E esse ciclo só terminará quando o ódio e a sabotagem dos ricos contra os pobres, terminar.
    Vencíamos esse ódio quando essa poderosa e podre ralé do Brasil derrubou Dilma e prendeu Lula.
    Enquanto ela mandar, nada mudará.

    • Tudo está deslocado no Brasil. As polícias militares foram uma solução permanente para um problema temporário, a Guerra do Paraguai. E se quisermos tratar os PMs como deveriam mesmo ser tratados, teríamos casernas, treinamentos de sobrevivência, marchas de 20 km, disciplina espartana, cortes marciais, e muito amor pelo Brasil e os brasileiros. Exatamente o inverso do que temos hoje, infelizmente

  • Ex-global, mas continua com a cabeça lá. Nunca vi proferir tanta bobagem em tão pouco tempo. Um imbecil ao cubo (imbecil³). PQP. Vai estudar, babaca.

  • O que revolta é que essa gente fala o que quer e ninguém responde à altura. Algumas questões que eu colocaria:

    Pra quê subir o morro em 1982 ? Se estávamos em plena ditadura e, como se sabe, "não havia bandidos naquela época" ?
    Quer dizer então que, depois de dezoito anos de ditadura, havia tráfico organizado nos morros ?
    Os governadores da ditadura não mandavam a polícia subir o morro ? E os governadores seguintes ?

  • Quando esses caras entenderem que o traficante sabe que a polícia vai atirar para matar, talvez pensem em mudar essa política burra de que bandido bom é bandido morto. Sabendo que serão mortos, só lhes resta cair atirando. E inocentes seguirão morrendo nessa guerra insana. E se algum bolsominion vier com o argumento de que estou defendendo bandido, já respondo antes: deixa de ser burro e VTNC.

  • Lacombe não é aquele cara que apresentava esportes na Globo e vinha se apresentar com uma calça tão justa, que seus órgãos pareciam saltar de sua roupa, eu ficava imaginando como a Globo admitia isso., logo depois a Globo pôs ele na rua. Não sei se por suas vestes indecentes ou pela indecência ideológica.

  • Cara mais FILHO DA PUTA!!! quero ver esse verme quando acertarem a cabecinha do filho dele

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